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AMIGOS QUE O TEMPO NÃO APAGOU DA MEMÓRIA

18 / março / 2020

por Marcos Vinicius Cabral 


Parado em um sinal de trânsito na Presidente Kennedy com a General Barcelos, Centro de São Gonçalo, voltei no tempo.

Fechei os olhos, ar condicionado do carro ligado, som sussurrando uma canção que não consigo distinguir, eu viajei. 

Não foi o vendedor de bala, nem a distribuidora de propaganda de GNV com um panfleto na mão e tampouco o representante de uma empresa que fabrica  panos de chão, que impediram-me de voltar no tempo.

Fiz uma viagem de trinta e poucos anos, quando garoto aos quinze, sonhava ser alguém na vida.

Exímio desenhista, gols de faltas de Zico, aventuras de Batman e caricaturas de conhecidos eram minhas especialidades. 

Mas também adorava escrever poemas e lê-los para amigos, que demonstravam grande apreço por mim até o “e aí, o que achou?”.

Depois saiam e sem falar uma palavra, me agrediam com aquele silêncio. 

Devastador, confesso!

Sonhava ser um novo  Drummond, um Quintana, um Borges, um Gabriel García Márquez.

Mas o horizonte me apontava para uma outra direção: um sonho que todo menino tem.

Pensando bem, sábio foi Samuel Rosa do Skank, quando de forma brilhante sintetizou o sonho de todo garoto, como nos versos de “É Uma Partida De Futebol”, do álbum O Samba Poconé. 

“Bola na trave não altera o placar

Bola na área sem ninguém pra cabecear

Bola na rede pra fazer o gol

Quem não sonhou em ser um jogador de futebol?”, canção de 1996.

Ser jogador de futebol, era algo concreto e não abstrato na minha vida.

Tão concreto que apesar de rubro-negro, treinei no Vasco e no Fluminense,  quando os clubes não tinham a infraestrutura que têm hoje.

Eram um abstratismo só quando se falava em categorias de base.

No Gigante da Colina reprovado fui, enquanto no Tricolor, passei com sobras vestindo a 8 e jogando de meio campista.

Porém, mais triste do que a lágrima dos meus olhos ao saber que meu pai não teria condições de arcar com as despesas com passagens de ônibus, foi ver o sorriso de seu Altair se desfazer quando fui lhe entregar o meu material, no Campo da Vidreira, no Vila Lage, onde era a sua escolinha e dizer que não poderia mais treinar.

Restou as peladas, como na Vila Olímpica, na Telerj, no Fluminensinho e os amigos que fui acumulando por esses lugares.

Na Vila, conheci a galera da Marca Olho, na Venda da Cruz, em Niterói, como Ricardo Astrô, Roberto Trac-Trac, Mauro, Siri, Pereira, Julinho, César Cavalo, Bode Cego e alguns outros que se juntaram à galera do Barreto como Quinho, Luizinho, César Pesão, Guta, Flávio, Deco, Marquinho, Zé Luiz, Russo, Patinho, Cemir, Dadão, entre tantos.

Até hoje, muitos deles, conseguem a proeza de manter vivo o futebol no Fluminense, numa rua ao lado da Universo, na Marechal Deodoro, em Niterói, sábado sim e sábado não.

Mas a bola, essa esfera redonda, inseparável amiga, me fez e faz sentir saudades desses e de outros seres humanos. 

Como os do Marajoara, no Fonseca, do Barreto, do Jovem Fla, do Grupo dos 30 e por fim, os do Barabá.

Cada um deles, em algum lugar nesse mundo, talvez não pense no quanto fomos ricos enquanto estivemos juntos, ali nesses lugares, jogando futebol.

Foi uma riqueza que dinheiro nenhum pôde comprar.

Uma riqueza que ninguém conseguiu perceber.

Mas afinal…

Pode parecer um exagero mas só quem viveu esse romantismo das peladas nos anos 1980, pode agora se pegar tentando esquecer o que o tempo não pode – por mais que queira – apagar.

Enfim… o sinal abriu, os carros buzinaram, engrenei a primeira e parti com meu carro torcendo para que nenhum outro sinal dali por diante estivesse vermelho.

Não estava. 

Parei no acostamento para enxugar, ops, ou melhor, para tirar um cisco do olho.

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