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SAUDADES DO BATE BOLA

por Luis Filipe Chateuabriand


Na apresentação, João Carlos Albuquerque, o Canalha – um exemplo de simpatia, gentileza e bom humor para introduzir os assuntos.

Nos comentários, de São Paulo, Paulo Vinícius Coelho, o PVC, um colosso de informação, de dados, de estatísticas, de estudos táticos, de seriedade profissional e de inteligência aplicada ao jogo.

Ainda nos comentários, de São Paulo, Mauro Cezar Pereira, com sua capacidade de análise crítica impressionante, clarividência sobre as questões estruturais de futebol, caminhos a serem apontados.

E, dos estúdios do Rio de Janeiro, Lúcio de Castro, com toda a sua irreverência, a visão do futebol como instrumento de integração social, a vontade de ver o jogo como espelho da vida, algo lúdico, simples, prazeroso.

E estava pronto o quarteto, para ser assistido, e aplaudido, na hora do almoço, de segunda a sexta.

Como brinde, um programa especial: quando o Canalha pediu a reapresentação da reportagem sobre a contratação, pelo Flamengo, do técnico Waldemar de Lemos – irmão do outro técnico, mais famoso, Oswaldo Oliveira.

A torcida do Flamengo, irada, começou a reclamar, aos palavrões, perante um atônito assessor de imprensa do clube, que comunicou quem era o novo técnico.

E daí, veio o coro de torcedores, absolutamente genial: “Ah, ah, ah! Fora Waldemar!”.

Waldemar nem tinha assumido, e já pediam sua saída.

Um clássico de nosso futebol!

Por essas e outras, o Bate Bola é inesquecível!

E sempre será!

Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!

NEM TUDO ESTÁ PERDIDO

por Zé Roberto Padilha


Na quarta, em meio a um equilibrado Campeonato Carioca, em que Botafogo e Vasco estão mostrando que terão dificuldades em subir, e o Fluminense tentará se manter, caso não invista, eis que surge o desequilíbrio.

O outro patamar.

Se apresenta um time de futebol diferenciado. Capaz de nos lembrar da Máquina Tricolor, da Academia do Palmeiras, do Expresso Cruzmaltino, do Botafogo e Santos que eram a base das nossas maiores seleções.

Se apresenta aquele que vai buscar o título maior do futebol brasileiro e mundial.

O que o Flamengo mostrou, quarta à noite, contra o bom time do Madureira, há muito não assistíamos. Uma exibição de almanaque, onde a técnica apurada, os deslocamentos incessantes, a vontade de jogar bola aliado a um enorme entrosamento não nos deixou sequer levantar para ir a geladeira buscar uma latinha.

Bola e jogadores, apaixonados, pareciam saudosos uma dos outros e se entregaram, de corpo e alma, a 90 minutos de puro êxtase.

Mais que uma exibição, foi um sopro de esperança no desacreditado futebol brasileiro.

Espero que o Tite tenha assistido a partida. Se colocar o Daniel Alves na lateral, o Neymar no lugar do Diego e naturalizar o Arrascaeta, o maestro, basta trocar as vestes rubro-negras pela amarelinha.

Deixe, por favor, aqueles Firminos, Fernandinhos, até mesmo Jesus quietos por lá. Há muito não estão identificados com a gente. Mal falam português, não jogam ao nosso lado como Gabigol, Everton Ribeiro e Bruno Henrique.

Daí não teremos apenas uma grande seleção de volta. Daquelas que dá vontade de ir a Teresópolis assistir ao treino, colecionar figurinhas, até voltar a pedir autógrafos.

Mais do que favorita para buscar outro título mundial, teremos novamente o orgulho de ser o país que pratica, forma e exporta o melhor futebol do mundo.

Parabéns, Flamengo.

GEOVANI E O TEMPO

por Rubens Lemos


Geovani nasceu em 1964. Nasceu tarde demais. Seu estilo refinado é natureza pura dos anos 1950/60, faixa dos craques de nenhuma correria e inteligência superlativa. Práticos da lei máxima de que no campo corre a bola e aos craques era facultado o direito ao prazer de saber movimentá-la, com sutileza e brilho.

Eram os tempos de Didi, Gerson, Dirceu Lopes, Ademir da Guia, Mengálvio. Suavam pouco, alegravam multidões na toques clássicos. Na morosidade de arapuca. Homens de raciocínio superior, de ocupação de espaços pela diminuição do campo no compasso dos passes que aproximavam a bola dos artilheiros. Geovani foi desse naipe, da tal categoria.

Na cronologia correta, teria disputado Copa do Mundo. Ou brilhado ainda mais do que luziu com seu jogo faceiro e delicioso, entorpecente de criatividade, de invenções em segundos de eternidade, de imortalidade genial guardada em jogadas absurdas, de tão belas.

Depois de Roberto Dinamite, o artilheiro do sorriso triste e impiedoso com zagueiros e goleiros, Geovani é o maior ídolo contemporâneo do Vasco.

Se nasceu depois da hora, Geovani veio subverter a era de um Vasco freguês caloteiro do Flamengo, início da década de 1980, Zico liderando a tropa que ganhava campeonatos com a naturalidade de um casal de adolescentes tomando sorvete ao primeiro dos namoros. O Vasco tinha Dinamite de Dom Quixote. E um monte de esforçados e brutamontes.

Em 1982, um garoto baixinho e gordinho, nascido no Espírito Santo, chegou e Impôs uma qualidade absoluta, ritmo acadêmico de veterano, visão periférica de uma partida, imperador do meio-campo em dribles de minifúndio e lançamentos longos como se houvesse um novo Gerson, ambidestro. Geovani tomou conta da cátedra de melhor meia-armador de minha geração de torcedores.

Geovani arquitetava, organizava e compunha. Roberto Dinamite e Romário concluíam a obra de engenharia, executavam o projeto e verbalizavam a cantoria de gols.

A história, exemplar em seus castigos, mostra em seus replays que faltou Geovani para o Brasil estilizar beleza e improvisação. Geovani é o jogador (ele e Dinamite) com mais títulos cariocas conquistados pelo Vasco. Foram cinco, três deles sobre o Flamengo de Zico.

Foi chamado de lento e exagerado perfeccionista. Tratava a bola com carinho e carícia de namorado. Exatamente o traço da casta nobre dos idos do futebol acadêmico, categórico e intelectual. Sem força. Na ginga e no jeito.

Sem ele na seleção brasileira, perderam-se duas Copa do Mundo sintomáticas pela falta de um cérebro na criação da meia-cancha: em 1986, viajaram Elzo e Alemão.

Em 1990, Dunga e o tal Alemão, bom maratonista, obscuro criativo. Sebastião Lazaroni, especialmente, o técnico medíocre do Mundial da Itália, será praguejado pela memória nacional por não ter convocado Geovani e levado seu compadre Tita. Ou cinco zagueiros.

Geovani arquitetava, organizava e compunha. Roberto Dinamite e Romário concluíam a obra de engenharia, executavam o projeto e verbalizavam a cantoria de gols.

A Geovani, Romário deve muitos dos seus gols, recebendo livre na área lançamentos de 40 metros, fita métrica na chuteira do Pequeno Príncipe, assim batizado o regente cruzmaltino. Tenho que dizer aos meninos de hoje. Se vocês tivessem visto Geovani, glorificar Firmino, Fernandinho e Jô, seria castigo implacável da proibição do videogame ou da exaltação da mediocridade.

Geovani, guerreiro suave, conquistou o maior campeonato da vida: superou um câncer e fez transplante de medula. Com a força extraordinária da fé e a luz radiosa dos homens escolhidos para gerar felicidade em milhões. Geovani veio depois e fez sua hora, impondo o batuque das rodas de samba em tardes vascaínas que liderou na solidão da maestria. Dos precursores de Maracanã com 100 mil pessoas.

A MALDIÇÃO DE ARUBINHA DO ANDARAHY

por PH Gomes


Foto do Arubinha. Fonte: Sport Ilustrado, edição 265, de 1943.

Um acidente. Com jogo atrasado. 12 a 0. Quatro gols de Niginho. Uma costela quebrada de Oscarino. A maldição de Arubinha contra o Feitiço do ataque dos Camisas Negras. Uma história que virou lenda e tornou o futebol carioca ainda mais curioso.

Lá nos anos de 1920 e 1930, os Camisas Negras inscreveram o nome do Vasco da Gama na eterna história de títulos do futebol carioca. Era o time a ser batido. Era o favorito das finais. Enfrentá-lo era sinal de derrota ou vitória sofrida, especialmente pelos times do subúrbio carioca. Por outro lado, o Andarahy Athletico Club era o time da fábrica, dos trabalhadores da Confiança, do misterioso zagueiro Dondon da canção do vascaíno Nei Lopes. Em 29 de dezembro de 1937, haveria mais um confronto dos Jaquetas Verdes contra o vitorioso Camisas Negras. O resultado? Sem milagres ou novidades – vitória maioral do Vasco da Gama. O que mais chamou atenção? O acidente envolvendo os jogadores vascaínos a caminho do jogo na cancha das Laranjeiras. Apesar do susto, o Diário A Noite noticiava: “Todos bem, apesar da costela partida de Oscarino”. O que ficou na história? A Uruca dos 12 anos. Como assim?


Notícia do jogo. Fonte: Diário A Noite, edição 9298, de 30/12/1937.

O Andarahy enfrentou um verdadeiro bombardeio, sem dó, nem piedade. Ao final do jogo, os jogadores estavam desnorteados. Arubinha, reserva do time, espectador do desastre e treinado na mandinga, não se fez de rogado e transformou sua fúria numa maldição contra o Vasco da Gama: 12 gols, 12 anos sem glórias no futebol carioca. Na surdina, foi a São Januário e enterrou um sapo na cancha vascaína. História verídica? Não se sabe. Mas, a partir daquele jogo, os Camisas Negras tiveram muitas dificuldades para ganhar jogos e títulos. Até 1945, nenhum título carioca, muita perturbação e incredulidade. A Cancha de São Januário foi revirada aos quatro cantos. Nenhum vestígio de sapo ou mandinga foram encontrados. Verdade ou não, a uruca de Arubinha durou apenas nove anos, quando o Vasco de Ondino Vieira quebrou o encanto obtendo o cetro de 1945 e nos anos posteriores alcançou as cabeças das competições locais. Por certo, o voluntarioso e místico Arubinha, do banco de reservas dos Jaquetas Verdes, assinou seu nome na história do Futebol Carioca e virou até estampa de camisa.

FEDERAÇÃO SUBURBANA: NOTÁVEL INICIATIVA DE MÁRIO CALDERARO AGRUPOU TIMES DO SUBÚRBIO CARIOCA

por André Luiz Pereira Nunes


Graças aos notáveis esforços de Mário Calderaro, então presidente do Engenho de Dentro Atlético Clube, em 24 de agosto de 1936, foi fundada a Federação Atlética Suburbana em conferência realizada na sede da mencionada agremiação alvi-anil, campeã carioca, em 1925, pela Liga Metropolitana de Desportos Terrestres (LMDT).

O projeto foi corroborado pelo experiente desportista Benedito Sarmento, o qual tivera marcantes atuações na crônica esportiva e como representante da Associação Atlética Suburbana, Liga Brasileira, Liga Metropolitana e outras entidades que impulsionaram o esporte menor na cidade do Rio de Janeiro. Sarmento, que granjeara grande simpatia nas rodas esportivas, morreria a 25 de junho de 1938.

Já o dinâmico Calderaro, residente à Rua Dr. Bulhões 77, tinha a intenção de reunir e valorizar os pequenos times, notadamente os do subúrbio da Central, que eram costumeiramente desprezados e excluídos pelas ligas que organizavam o futebol carioca. Seu clube, o Engenho de Dentro, sofria essa mesma segregação. Mesmo tendo se sagrado campeão da Sub Liga Carioca, em 1935, fora preterido no ano seguinte do certame principal da Liga Carioca de Football, criada dois anos antes, e precursora da profissionalização do esporte no Brasil.

– O meu clube sentiu-se ferido nos seus direitos a partir da escolha do Jequiá e da Portuguesa para figurarem no campeonato da Liga Carioca, visto que fomos campeões, em 1935, da Sub Liga, declarou na ocasião ao jornal O Imparcial.

Engenho de Dentro AC, Del Castilho FC, Modesto FC (Quintino), CA Central (Engenho Novo), Adélia FC (Engenho de Dentro), Mavílis FC (Caju), Ríver FC (Piedade), SC Abolição, Magno FC (Madureira) e SC América (Lins de Vasconcelos) estiveram presentes na convenção inaugural. O Ramos FC também compareceu, mas por conta da repercussão do encontro, passou a fazer restrições quanto a sua participação. Segundo o seu presidente, Vitório Caruso, a adesão definitiva não se concretizaria, pois considerava que a reunião tinha apenas caráter preparatório. O motivo, no entanto, era bem outro. Por ser filiado à Liga Carioca, temia uma punição e a sua consequente desfiliação.

A assembléia, presidida por Calderaro, proclamou presidente da nova entidade Manoel de Oliveira Brandão Sobrinho, então mandatário e principal esteio do Del Castilho, falecido a 15 de julho de 1947. Entre os dirigentes fundadores, se encontravam presentes, além dos já mencionados, Victor Paolino, José Carvalho Barbosa, Manoel Afonso Lisboa, João Machado, Mário Natividade, Oscar Jacques, entre outros.

Participaram do certame: Ríver, Adélia, SC Oposição, Abolição, Del Castilho, Central, Magno, Modesto, Mavílis, Engenho de Dentro, SC Mackenzie e Argentino FC (Cascadura). O Modesto sagrou-se campeão do Torneio Início, disputado no campo do Ríver, na Avenida João Pinheiro, enquanto o Del Castilho foi o vice-campeão. Pelo Campeonato Suburbano, o SC Mackenzie, do Méier, foi o vencedor inaugural, enquanto o SC Abolição, o qual possuía campo na Rua Cantídia Maciel, no Largo da Abolição, por onde passavam os bondes de Cascadura e Engenho de Dentro, o segundo colocado.


Mário Calderaro era uma figura muito conhecida no subúrbio carioca. Além do Engenho de Dentro, presidira a Associação Comercial Suburbana e fora sócio do Vasco da Gama. Contava com apenas 39 anos, quando em 28 de janeiro de 1940, menos de um mês após assumir a presidência da Federação Atlética Suburbana, se encontrava presente ao campo da Rua Henrique Scheid para assistir a partida entre Adélia e Ideal, de Parada de Lucas. No momento em que o Adélia consignava o segundo tento, Calderaro deixou-se contagiar pela emoção, o que foi fatal para seu coração cansado de vibrar durante as competições esportivas. Socorrido imediatamente, foi levado a um automóvel, o qual rumou rapidamente para o posto de assistência do Méier, mas durante a viagem sobreveio a morte.

Quando planejava quatro anos antes fundar uma entidade nos moldes da Federação Suburbana, poucos foram os que acreditaram na sua realização. Mas contra todos os entraves, desavenças e descrenças, enfrentando os obstáculos que lhe antepunham, conseguiu tornar realidade o que constituiu um motivo de orgulho para o esporte carioca. Quis o destino que falecesse justamente em seu posto de honra e no mesmo local onde seu clube tivera seus maiores dias de glória.

Desfrutando de um largo círculo de relações, se impusera à admiração de todos pela sua dedicação e abnegação à causa das pequenas agremiações dos subúrbios. Com a sua morte, perdeu o esporte menor um dos seus mais abnegados defensores, um verdadeiro benemérito de sua causa. Hoje seu nome batiza uma rua no bairro no qual viveu e devotou a sua maior paixão: o futebol.

Quando assumiu a presidência do Engenho de Dentro encontrou a agremiação com 93 sócios. Deixou-a com mais de 400. Sobre a criação de uma entidade suburbana independente, Mário declarou ao Imparcial, em 14 de agosto de 1936:


– Sempre pensei na possibilidade, e porque não dizer francamente, na conveniência dos clubes menores se congregarem em uma entidade independente. Na minha opinião uma liga suburbana com clubes eficientes, disciplinados e bem dirigidos seria o ideal para o esporte menor. Regulamentos facilmente compreensíveis, 11 medalhas de ouro para os jogadores campeões e 11 de prata para os do segundo colocado. Taça de posse temporária ao vencedor e de posse definitiva para o clube que fosse tricampeão fariam sucesso, ressaltou.

A existência da Federação Atlética Suburbana perduraria por apenas seis anos. O motivo de sua dissolução, em março de 1943, tinha relação com os critérios adotados pelo Conselho Nacional de Desportos (CND), os quais estabeleciam que apenas uma entidade deveria congregar clubes. Portanto, as equipes tiveram que solicitar adesão à segunda e terceira categorias da Federação Metropolitana de Futebol (FMF), presidida por Manuel do Nascimento Vargas Netto. O então presidente da Federação Suburbana, João Carlos Machado, figura proeminente do Ríver, passou a presidir a Segunda e Terceira Categorias de Amadores da supracitada entidade, sendo um dos artífices, em 1949, do histórico Departamento Autônomo, que congregou importantes equipes, como Campo Grande e Portuguesa, e revelou inúmeros talentos para o futebol brasileiro.