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MICHELI, O PAREDÃO

Em uma das tradicionais enquetes que fazemos com o intuito de estimular a resenha entre a rapaziada que acompanha o Museu da Pelada, perguntamos se tiravam o chapéu para Marcelinho Carioca e fomos surpreendidos com um comentário de Alexsandro Micheli: “Eu tomei o gol duzentos dele”. Em alguns segundos a nossa ficha caiu e fortaleceu aquela história que o mundo da bola é cruel e gira mais rápido do que se possa imaginar. Micheli fez parte daquela campanha histórica do Flamengo-PI na Copa do Brasil de 2001, que vinha dando o que falar até enfrentar o poderoso Corinthians e ser goleado. 

Muito solícito, o goleirão topou conversar com a equipe do Museu da Pelada e, sem fugir de nenhuma pergunta, falou sobre sua carreira, pelada e até mesmo aquela goleada que interrompeu o sonho na Copa do Brasil.

Como surgiu sua paixão pelo futebol?


Como todo brasileiro, essa paixão já nasce com a gente. E vim de uma família que todos os meus tios jogaram. Profissionalmente só eu e um tio e hoje em dia tenho um primo que está dando continuidade. Está no juvenil do América MG e já foi convocado várias vezes para seleção da sua categoria.

Onde jogou suas primeiras peladas?

As primeiras peladas foram em um campo pertinho de onde meus pais moram em Ubá-MG. Hoje infelizmente o progresso acabou vencendo e já não existe mais.

Sempre foi goleiro? Geralmente, nas peladas, os goleiros são aqueles que não têm muita habilidade com os pés…

Desde criança gostava de jogar no gol. Já nasci com esse dom. Não tive esse problema de ser ruim na linha e me mandarem para o gol. Já nasci dentro dele.

Qual era o goleiro que te inspirava?


Foram vários, mais sempre fui fã do Taffarel. Um goleiro extremamente técnico e seguro. Foi referência para muitos goleiros consagrados que atuam até hoje. Cheguei a jogar contra ele no Campeonato Mineiro de 96.

Como surgiu o convite para treinar em um time?

Tenho um amigo da minha cidade (Ubá -MG) que o primo dele era treinador do juvenil do Cruzeiro na época. E foi assim que surgiu a oportunidade de fazer um teste no Cruzeiro em 1988.

Por quais times jogou?

Comecei no infantil do Cruzeiro em 1988, e por lá me profissionalizei em 94. Joguei em alguns times de Minas, Tupi, Valério, Ipatinga, Paraisense e Mamoré, depois joguei um Carioca pelo Itaperuna, também joguei no Flamengo do Piauí.

Você jogou junto com o Ronaldo a Taça BH, né? Como era sua relação com ele? Ainda tem contato?


Sim, jogamos juntos em 93 quando ele chegou no Cruzeiro. Eu já era juniores e ele infantil. Já chegou no nosso juniores sendo titular e fazendo gols. Fomos campeões da Taça BH de juniores, titulo que o Cruzeiro não conquista há mais de nove anos. Ele já se mostrava totalmente diferenciado. Ele era um meninão, super simples, brincalhão. A última vez que estive com ele foi em 2004, em um jogo das Eliminatórias para Copa de 2006, contra a Argentina em BH. Ele fez três gols de pênalti.

Qual era a sua maior virtude embaixo das traves?

Sempre fui muito tranquilo. Saía muito bem nas bolas cruzadas na área, mas era horrível com as saídas com a bola no pé. Peguei a época em que começou a ser proibido o goleiro pegar a bola com a mão quando recuada. Aquilo quando começou foi um caos!

Consegue eleger seu maior momento na carreira? Algum jogo inesquecível…


O grande momento que carrego comigo foi quando fui convocado pelo Renê Simões para seleção brasileira sub-17. Para mim ser convocado para uma seleção é algo formidável. Infelizmente, um ano ano depois sofri um acidente no ônibus do Cruzeiro e quase tive meu braço amputado. Fiquei três anos longe do futebol e isso quebrou uma sequência muito boa que eu estava tendo. Um jogo inesquecível… foram os dois jogos da Copa do Brasil de 2001 contra o Sport Recife. Nas ocasiões, fui eleito o melhor jogador em campo, quando defendia o Flamengo do Piaui. 

E o pior?

Nesse caso não foi o pior, mas foi horrível. Eliminamos o Sport Recife e iríamos pegar o Corinthians. O nosso time começou ser a sensação, pois era um time simples, e nunca, até então, um time do Piaui havia ganhado um jogo pela Copa do Brasil e nós chegamos às oitavas. Só que pegamos o Coringão que era praticamente uma seleção. Fiz de tudo para o nosso treinador jogar fechado e sair nos contra ataques, só que ele preferiu encarar de igual para igual. Resultado: tomamos de 8 a 1. Jogamos tudo o que tinha feito até então por água abaixo. Nesse jogo que eu tomei o gol 200 do Marcelinho pelo Timão.  

Qual foi a sensação de levar o gol 200 do Marcelinho?


Indiferente por ter sido o gol 200 dele, mas a sensação é a pior possível quando um goleiro toma gol. Para o goleiro, tomar gol em qualquer situação, sendo os 200 do Marcelinho, os 1000 do Pelé ou em um amistoso é a pior possível. Quando se toma um gol todos estão vendo e comemorando a sua ineficiência de não ter evitado a bola entrar. Faz parte. Costumo falar que goleiro nasceu para tomar gol e não evitar.

O que fazia quando o Pé de Anjo ajeitava a bola para soltar aquelas pedradas venenosas?

Isso era complicado rapaz. Pouquíssimos jogadores batem na bola igual a ele. Só que eu costumava copiar o Dida, que quando jogava no Cruzeiro invertia a barreira nas faltas contra o Marcelinho. E nesse jogo que fiz contra ele, apesar de ter tido poucas faltas, inverti a barreira e tive êxito. Deu certo, ele não fez gol de falta. Fez um de pênalti, que por sinal quase peguei, e o primeiro que foi o de 200, uma jogada do lateral Andre Luiz, que foi no fundo e cruzou para o Marcelinho pegar de primeira. Um golaço, por sinal.

Por fim, ainda joga alguma pelada?

Muito pouco. A última foi no dia 4 de junho desse ano e me resultou uma ruptura total do tendão de aquiles. Estou de molho até então nas peladas, mas pelo visto só vou ficar nas arquibancadas agora.

SAUDADE DO CEREZO

por Serginho 5Bocas


A maior lembrança que guardo de Toninho Cerezo foi na Copa da Espanha quando ele, apesar de não ter jogado na estreia por suspensão automática, gastou a bola nas quatro partidas seguintes em que esteve em campo. Eu vi e posso afirmar que ele fez parte de um dos melhores meios de campo, se não o melhor, de todos os tempos, mas quem foi Cerezo?

Volante que iniciou e se consagrou no Atlético Mineiro, alguns achavam que ele era desengonçado, outros implicavam com sua meia arriada e diziam que era um grande peladeiro, todo o mais puro desdém ou desconhecimento de causa mesmo. O certo é que fez parte de uma geração mineira espetacular e ao lado de Reinaldo, Paulo Isidoro, Marinho, Eder, Palhinha, entre outros, fez história no Galo.

Marcou presença em duas Copas do Mundo (78 e 82) e quase esteve na terceira (86), sendo cortado poucos dias antes da competição por contusão. Na verdade, Telê fez uma opção entre os “velhos” e os lesionados, escolhendo levar, Falcão, Zico, Sócrates e Junior, deixando Cerezo de fora.


Cerezo por duas vezes foi considerado o melhor jogador do Campeonato Brasileiro numa época em que as feras jogavam todas por aqui. Depois da Copa de 82, foi levado para a Itália, onde jogou na Roma ao lado de Falcão e na Sampdoria, comandando uma garotada espetacular. Neste período, venceu um Campeonato Italiano, duas Copas Itália, uma Recopa Europeia e um vice na Liga dos Campeões em 1992, já aos 37 anos.

Cerezo ainda teve fôlego aos 38 anos para comandar o São Paulo de Telê no Mundial de Clubes contra o Milan em 1993. Jogou tanto nesta partida que ganhou o carro Toyota de melhor em campo.


Na seleção, seu melhor momento foi em 1982 com o mesmo Telê. Estava jogando o fino até a derradeira partida contra os italianos, quando ficou injustamente marcado porque passou uma bola perigosa na intermediaria para o lateral Júnior, que perdeu a dividida para Paolo Rossi e daí saiu o segundo gol. Depois ainda foi infeliz, porque foi atrasar de cabeça para o goleiro um cruzamento despretensioso de Antognoni e originou o escanteio do terceiro gol italiano. A tarde foi muito madrasta com Cerezo.

Aquilo tudo foi uma tremenda covardia do destino com um “cracaço” de bola. Ele, ao lado de Falcão, formava uma dupla de encher os olhos, seus talentos eram complementares e também tinham muita coisa em comum. A saída de bola era primorosa e ambos apoiavam o ataque constantemente.


Quem dera hoje tivéssemos um peladeiro desse na seleção brasileira, alguém que fizesse a transição da defesa para o ataque com a rapidez, facilidade e a tranquilidade que Cerezo fazia, que estivesse no campo todo e se apresentasse para o jogo com a qualidade que ele disponibilizava para o time.

Ai que saudade do Cerezo!

Nota: Meu sonho de infância como de qualquer garoto flamenguista daquela época era ser Zico, até começar a jogar campo e querer ser Falcão ou Cerezo, que jogavam na “minha”, o Pelé e o Garrincha dos volantes. Não deu para mim nem de longe.

 

 

QUATRO FINS DE ANO

por Claudio Lovato


Roberto Paulo terá mais um fim de ano de recordações. Há 12 anos, desde que parou de jogar, seus fins de ano têm sido assim. Ele participa de peladas com ex-companheiros, confraterniza com eles, toma sua cerveja, dá boas risadas e então volta para casa para se entregar às recordações dos tempos em que seu nome era gritado no maior estádio do Brasil.

O fim de ano de Raul será de reflexão. Ele acaba de fazer 34 anos e decidiu parar. Alguns amigos tentaram dissuadi-lo da de decisão.  Acham que ele poderia jogar em bom nível por mais dois anos, pelo menos. Mas ele quer parar. Quer mais tempo para a família e para si próprio. Ele, porém, tem medo de estar tomando a decisão errada. Não sabe se está preparado para parar. Não sabe se algum dia estará. Por isso terá um fim de ano de reflexões importantes e inevitavelmente inconclusas. 


(Foto: Ricardo Nogueira)

Para Zé Maurício, o fim de ano será de pura preocupação e tristeza. Foi dispensado pelo clube que defendeu por três anos e, até agora, ninguém demonstrou interesse em contratá-lo. Seu empresário – isto não é segredo para ninguém – está muito mais preocupado em resolver a vida de outros quatro ou cinco jogadores antes da dele. Ele não se engana: nunca foi e nunca será um craque; é um volante que muitos consideram apenas um quebrador de bola. Ele já aprendeu: não cabem ilusões quanto a isso – e, de resto, nem quanto a qualquer outra coisa nesta vida.


Hélio está feliz da vida neste fim de ano. Tem 19 anos e sabe que vai passar a fazer parte do grupo principal no ano que vem. Tanta dificuldade, tanta solidão longe de casa, tantos sacrifícios, mas ele chegou lá, e por isso está feliz neste fim de ano. Levou camisas do clube para o pai, para os irmãos e para os primos. Levou para a mãe um vestido fino e três pares de sapato comprados numa loja cara de shopping center. Hélio está onde sempre quis e não passa por sua cabeça que possa existir neste momento, neste mundo de meu Deus, alguém, uma pessoa sequer, que não esteja como ele está: feliz.

JOIA DA COLINA

Embora esteja sempre relembrando os craques do passado, o Museu da Pelada não pode deixar de lado as promessas que têm um futuro brilhante pela frente. Durante a pelada de fim de ano do volante Michel, do Grêmio, na favela da Kelson’s, conhecemos o menino Léo Araújo, joia da base do Vasco.


Com apenas dez anos de idade, o lateral-direito do sub-10 da Colina já acumula diversos títulos com a camisa cruzmaltina, sobretudo contra o Flamengo.

– Já joguei três finais contra o Flamengo e ganhamos todas! Eles secam a gente porque sabem que na final eles perdem sempre!

Vale destacar que Léo faz parte das equipes de futebol de salão e de campo do Vasco da Gama e, por isso, precisa de muita organização para conciliar as atividades com os estudos na Escola Municipal Cantor e Compositor Gonzaguinha, onde cursa o quarto ano do Ensino Fundamental.


Antes de chegar ao Vasco, no entanto, o garoto jogava futebol de salão pelo Clube Vital, em Quintino. Durante um duelo contra o cruzmaltino, no ano passado, comeu a bola e foi convidado para treinar em São Januário.

– Me sinto muito feliz em estar vestindo a camisa do Vasco da Gama e conquistando vários títulos. Enquanto houver um coração infantil o Vasco será imortal! – disse o jovem cheio de personalidade.

Ao ser perguntado sobre qual era o seu maior sonho e quem era a grande inspiração no futebol, o lateral não titubeou:

– Me inspiro no Daniel Alves e no Michel, que é aqui da comunidade. Sonho em jogar no Real Madrid e conseguir ajudar a minha família.

A torcida do Museu da Pelada é que o sonho desse jovem se torne realidade e que ele continue com alegria nas pernas para resgatar a poesia perdida do futebol brasileiro!

O ENTORTADOR

por Eliezer Cunha


Um time: Flamengo. Um elenco: Zico e mais 10. Um enigma: Júlio César ou quem preferir; Uri Geller apelido dado a ele que lembrava o paranormal israelense que fazia muito sucesso na época como entortador de talheres. Zico e mais dez já não eram mais os ovacionados, queríamos ele, que a bola simplesmente chegasse a ele. O entortador de zagueiros.

Jogo fácil ele brincava com os adversários, jogo difícil era ele a esperança de furar e desmontar qualquer bloqueio. “Passa a bola para o o Uri Geller”, gritava a torcida, levantávamos a todo passe para ele dado, a esperança de gol aumentava consideravelmente.

Por que tanta esperança em um menino de pernas tortas franzino que acabava de chegar do time do Remo, esquecido por todos, diretoria, jogadores, torcida e imprensa? Aliás para quem tem Zico e mais 10 não precisávamos mais de nada. Então eis que surge ele, o Uri Geller, e rouba as cenas das tardes de domingo.

Quanto aos zagueiros e principalmente os laterais, restavam a apreensão dos vestiários “Ele joga?”, perguntavam os zagueiros e os treinadores. “Quantos na sobra?”, perguntam os cabeças de área. “Um, dois, três?”, respondiam os treinadores. Sacrificavam quase o meio de campo todo para barrarem o Uri Geller.

Escutávamos gritos de desespero dos laterais: “Volta para marcar ponta desgraçado…”. Víamos a reedição de nosso moleque travesso Garrincha, nossa esperança nas cores vermelho e preto. Deixarmos para trás, enfim, nossos traumas em preto e branco, parodiando Chico Buarque. Não existe mais esquemas, táticas, treinos, retrancas …. passa a bola para o Uri que ele resolve.

A alegria enfim voltou as campos brasileiros, a várzea triunfará novamente e nos redimirá do óbvio e do taticamente correto, sob o comando de um menino franzino e esquecido num canto do país.