Escolha uma Página
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Geral

BALTAZAR, ‘CABECINHA DE OURO’ PRECISA COMO O BIG-BEN

por André Felipe de Lima


Baltazar, o “Cabecinha de ouro”, foi um dos maiores artilheiros da história do Corinthians e ídolo alvinegro muito bem descrito pelo saudoso jornalista Solange Bibas: “O Cabecinha de Ouro é como o Big-Ben de Londres: infalivelmente certo!”. Cabeçada com ele significava meio gol. Mais certo meter a bola na rede com o cocuruto que chutá-la da marca do pênalti e concluí-la em gol. “Com a cabeça, nem Pelé foi melhor do que eu”, dizia Baltazar, cujo nome era Oswaldo. Decidiram chamá-lo assim devido à semelhança com um irmão mais velho, esse sim com o “Baltazar” devidamente descrito na certidão de nascimento.

As glórias do passado ficaram no baú, em jornais e revistas empoeiradas e carcomidas pelo tempo. Poucos hoje se recordam do grande centroavante, o segundo maior goleador da história do Corinthians, com 266 gols, ficando atrás apenas do atacante Cláudio, que marcou 305 vezes. Ambos foram contemporâneos e jogaram naquela que, para muitos, foi a melhor equipe que o Timão montou, entre 1950 e 1954, contando, principalmente, com os goleiros Gylmar dos Santos Neves e Cabeção; os defensores Homero, Murilo, Olavo, Belfare, Idário, Goiano e Touguinha; os volantes Roberto Belangero e Julião e os avantes Cláudio, Luizinho, Baltazar, Rafael, Nelsinho, Carbone, Simão e Mário. Uma penca de craques que teve como treinadores no período Newton Senra, Rato (grande craque do Timão nos anos de 1920) e Oswaldo Brandão, talvez o maior treinador que o Timão já teve.


Tudo que puderam disputar, eles conquistaram. Com essa leva de cobras, o Timão foi tricampeão paulista, de 1951 a 1954; três vezes campeão do Torneio Rio-São Paulo, em 1950, 53 e 54, e até mesmo vencedor da Copa Marcos Pérez Gimenez, considerada uma pequena “Taça do Mundo”, de 1953, um quadrangular para o qual o Timão acabou convidado após a desistência do Vasco. Realizada na Venezuela, a competição teve o Corinthians campeão após bater a Seleção de Caracas, o Barcelona e a Roma, que foi no lugar do Milan, que, igualmente ao Vasco, desistiu do torneio. Foi o único título dessa leva memorável de conquistas que o “Cabecinha de ouro” não ostenta no invejável currículo.

O próprio Baltazar não era afeito a entrevistas e, segundo perfil publicado pela revista Placar, em 1970, nunca gostou muito de paparico de torcedor. “Todos o achavam muito mascarado”, escreveu a revista. Mas Baltazar reconhecia o jeitão esquisito: “Eu sou assim. O passado não me interessa”.

Mesmo de perfil azedo, Baltazar não pode ser esquecido no passado. Nem pelos torcedores mais jovens e jamais pelos mais antigos. É um verdadeiro herói corintiano, que até o final da década de 1990 era figura indispensável em formações dos sonhos do Timão, como mostrou edições da própria Placar e dos jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S.Paulo. Sempre que rolava uma enquete promovida por estes veículos para a escolha dos melhores do Timão em todos os tempos, Baltazar era nome certo. Mas a virada do ano 2000, marcada pelo tal “bug do milênio” nos computadores, parece ter apagado —, não das máquinas e acervos, mas da memória de muitos — a figura do incomparável Baltazar, o “Cabecinha de ouro”, que hoje completaria 93 anos. Hora mais que oportuna para resgatá-lo.

O ADEUS AO ÚLTIMO GUERREIRO PALESTRINO

por Omar Franco


 No inicio da madrugada dessa última quinta feira, em meio às turbulências de noticias de bastidores do futebol mineiro, mais uma estrela se apaga entre nós, indo morar onde brilhará ainda mais, ao lado do símbolo que mais lhe emocionava em vida: a constelação do Cruzeiro do Sul, nome a qual se inspirou o clube do coração do Sr. Nogueirinha.  

João Nogueira Júnior, ex lateral-direito e dono de uma habilidade ímpar, era o único (e último) sobrevivente de duas gerações de campeões. Jogou pela Sociedade Esportiva Palestra Italia, – nome de fundação do Cruzeiro Esporte Clube, que posteriormente foi alterado por questões políticas em decorrência da Segunda Guerra Mundial; e continuou atuando pelo clube, já com a nova denominação.

Nogueirinha, que era chamado de o “craque ermitão” (quando não estava treinando ou jogando, se trancava no quarto e só tinha atenção para os seus livros acadêmicos), nasceu na famosa cidade de Três Corações, que também tem outro filho ilustre – o rei Pelé. Jogou pelo time estrelado no período de 1939 (então Palestra Itália) a 1947 (já com a nova denominação de Cruzeiro Esporte Clube), tendo sido tricampeão mineiro de 1943/44/45. Também atuou pela seleção mineira dos anos 40.


Uma das histórias mais emocionantes desse guerreiro palestrino é justamente o incrível encontro entre ídolo e fã, onde uma mera frase de efeito acaba se servindo de combustível incentivador de busca de um sonho. O Nogueirinha era fã do craque Niginho, da família Fantoni, um dos maiores expoentes da história do Cruzeiro Esporte Clube e da Italia, e quando soube que seu ídolo, então jogador do Vasco da Gama, iria jogar amistoso pela seleção brasileira em 1938, logo foi ao seu encontro. Quando a delegação passou por São Lourenço, a caminho de Caxambu, o Nogueirinha, com sua turma de fãs, já estava na estação à espera dos seus ídolos.  O garoto se aproximou da janela do trem, onde se encontrava o Niginho, e assim vaticinou:

– Ainda vou jogar com você!

O craque com todo sua humildade e gentileza, respondeu:

– Então, vá treinando, que um dia a gente acaba no mesmo time, meu jovem!

Cumprindo a profecia, um ano depois, estavam os dois jogando pelo mesmo clube  – o Palestra Itália.

Nogueirinha não foi só um profissional exemplar em sua carreira futebolistica, mas acima de tudo, um ser humano incrível, além de um apaixonado pelas cores e símbolo do Palestra Itália mineiro e pelo Cruzeiro Esporte Clube. Um exemplo eternizado nos corações de toda uma nação azul e branca!

Descanse em paz, guerreiro palestrino e cruzeirense!!!

AFONSINHO: O LIVRE

por Paulo Escobar


Na cidade de Marília vem ao mundo talvez um dos jogadores mais livres que o futebol brasileiro viu nascer. Aquele que viria a jogar com os pés e a cabeça em conjunto e que por conta disso pagaria dentro e fora dos gramados.

Afonsinho, meio-campo daqueles clássicos, que sabia bem o que fazer com a bola nos pés, se negou a crer na ideia de que jogadores de futebol deveriam somente se ocupar dos assuntos relacionados à bola. Não fez aquela maldita separação entre futebol e política, como se um assunto não tivesse nada a ver com o outro.

Em tempos de torturas e desaparecimentos fora dos campos, dentro dos campos reinava a escravidão na qual os jogadores estavam submetidos, amarrados aos clubes, sem poder decidir ou escolher aonde viriam a jogar.

Existem aqueles que enxergam as correntes que os escravizam e se acostumam a carregá-las, e existem aqueles que se sentem desconfortáveis com arrastar as correntes que o prendem, percebem que andam de maneira mais pesada. Afonsinho, que desde muito cedo aprendeu a olhar a vida de maneira mais livre, ou libertária, não aceitou ser escravizado pelos poderosos do Futebol.


Um jogador com a técnica e habilidade que Afonsinho possuía não tinha como ficar de fora das Copas de 74 e 78, as ideias defendidas lhe custaram a não convocação. Imaginem um jogador que na época foi perseguido até pelo seu cabelo comprido e sua barba, pois era questionado pela aparência revolucionária que o mesmo tinha.

Para Zagallo foi um incomodo ter um jogador com a aparência do Afonsinho, e para muitos clubes era um problema possuir entre suas fileiras um jogador pensante, ou posicionado publicamente contra a ditadura militar. As suas ideias impediam que muitos enxergassem o seu futebol, pois o futebol é impiedoso em suas decisões quando do outro lado temos um jogador que questiona as estruturas do mesmo.

Muitos jogadores admiravam Afonsinho por ter sido o primeiro no mundo do futebol a conseguir o passe livre, mas poucos tiveram a coragem de tomar a mesma posição. Um meio-campo que se negou a viver uma vida afastada da realidade, e que não deixou nada a dever aos grandes meias dentro dos gramados.


Afonsinho não teve o reconhecimento devido, pois neste mundo as histórias oficiais são contadas por aqueles que detém poder. É melhor não deixar em evidencia os jogadores que foram marcantes dentro e fora dos campos. Afonsinho jogou no Santos de Pelé, alguns nem sabem disso, e em tempos de amarras foi mais livre que o Rei.

Nosso meia foi um anti-herói pois os heróis do mundo do futebol são aqueles que somente se dedicam a jogar com os pés e a calar a boca. Heróis são aqueles que decidem viver a vida distante das realidades que cercam seus povos, e que representam a moral e os bons costumes impostos, ou que aceitam serem modelados e escravizados pelos “donos” do futebol.


Os anos passaram e o tempo imparável chegou até Afonsinho, mas uma coisa não passou dentro dele, a vontade de ser livre e através do futebol proporcionar sentimentos de liberdade e ensinamentos profundos. O nosso craque continua ensinando a molecada mais pobre a ser antes de tudo bons das ideias e depois habilidosos com os pés. Não foi um ídolo momentâneo, continuou sendo grande até os dias de hoje.

Não sei se a escravidão deixou de ser uma pratica no futebol, não sei se existem jogadores realmente livres dentro das estruturas do futebol, não sei se eles realmente decidem aonde jogar ou o que fazer de maneira autônoma. Mas sei que Afonsinho foi livre e quem dera neste futebol carente de Afonsinhos tivéssemos mais craques livres e sem medo de se posicionar no que diz respeito as realidades que cercam os seus povos.

BRASIL, O REI DAS COPAS FORAS…

por Serginho 5Bocas


É raríssimo uma seleção nacional, de qualquer modalidade esportiva, ser tão adorada pelo mundo. Contra tudo e contra todos, o Brasil ainda é assim no futebol.

Americanos são imbatíveis no basquete, chineses dão aula quando o assunto é tênis de mesa, quenianos são pódios garantidos quando o assunto é provas de corrida de média e longa distância, jamaicanos deitam e rolam nas provas de corrida de velocidade, mas poucos tem o carisma e personificam tanto a arte em um esporte como o brasileiro no futebol.

O “X” da questão é que esta idolatria toda não se transforma em predomínio ou protagonismo na hora do “vamu ver”, o Brasil realmente não é bom nisso! Quando somos favoritos é uma desgraça, como damos mole!

Vi onze Copas do Mundo, contando com esta que acabou recentemente e posso afirmar que demos “doce” pelo menos numas cinco delas. Por isso tenho que concordar com o dono do bar que frequentava, quando ele dizia que o Brasil era o rei das Copas foras.

1978 na Argentina foi infame, o 6×0 dos hermanos sobre o Peru foi de doer. Sei até hoje o nome dos atacantes peruanos: Munhantes, Cubillas e Oblitas e do famigerado goleiro argentino Quiroga, mas se Coutinho tivesse levado Falcão e não tivesse feito tantas invenções como escalar Edinho como lateral esquerdo ou colocar em campo dois laterais direitos ao mesmo tempo (Nelinho e Toninho) contra a Argentina, entre outras esquisitices, não sei não…


Veio 1982 e a bruxa de Sarriá resolveu sacanear todo mundo, pois me desculpem os derrotistas de plantão, mas o nome “tragédia” só foi dado porque só mesmo uma tragédia para definir o que foi aquele time perder para os italianos naquele dia. Falem o que quiserem, mas o Brasil de 1982 jogou Copas foras naquele 5 de julho, foi de chorar lágrimas de esguicho, como diria Nelson Rodrigues. Sem mais comentários para não chorar de novo.

1986 e o que poderia dar errado quando tínhamos um goleiro que não havia levado gol em quatro partidas seguidas daquela Copa, quando ainda no primeiro tempo do jogo das quartas de finais contra a França já tínhamos aberto o placar e estávamos sobrando na partida? Fim de jogo, mais posse de bola, muito mais chances de gols, perdemos nos pênaltis e mais uma vez, jogamos Copas foras novamente. Desta vez, enterrando uma geração de monstros que saíam de cabeça erguida para o mundo, mas sem a consagração que muitos daqueles craques mereciam.


1998, depois da final antecipada contra a Holanda em que Ronaldo teve talvez a sua maior atuação em Copas do Mundo, veio a final e todos dizem até hoje que o Ronaldo amarelou naquele jogo, que nos vendemos para a FIFA, enfim, cada versão escabrosa, mas o que sei é que os franceses entraram com sangue nos olhos e nos venceram de novo, consagrando os donos da casa, mas sei que foi mais uma Copa fora, molinho, molinho…

2006 e a seleção sensação. Havia tempo que não reuníamos tanta gente boa numa mesma seleção, tinha tudo pra dar samba, não deu. Veio um joelho na meia lua da entrada da grande área, uma bola alçada sem que o goleiro saísse para cortar e novamente os franceses, sempre eles, nos mandaram pra casa sem dó nem piedade. Outra geração maravilhosa de jogadores de baralho, de outra Copa fora…


Depois disso nunca mais chegamos com protagonismo na competição, nunca mais choramos com gosto, só ironizamos, rimos de nós mesmos, pois a cada Copa vamos banalizando as derrotas e pelo menos estamos aprendendo a entender que não somos mais os mocinhos do filme, que não jogamos mais Copas foras, agora só participamos…que fase!

Que pena…

Forte abraço

Serginho5bocas

UMA FESTA DE FUTEBOL

por Claudio Lovato


Começou assim: havia uns meninos jogando bola no campo que ocupava a maior parte da praça. Era um bando de garotos de nove, dez, onze anos correndo atrás da bola numa bela manhã de sábado, como crianças devem fazer.

Em volta, nas mesas que cercavam o quiosque do Mazinho, os velhos jogavam dama ou dominó.

Encostado ao balcão do quiosque, tomando a segunda cerveja do dia, Albério de repente disse para o velho amigo Mazinho:

– Vou lá bater uma bola com os meninos.

Mazinho riu e disse:

– Rapaz, você não tem mais cinquenta anos… Nem sessenta nem setenta…

Albério já estava com quase oitenta. 

Lá no terrão, a criançada adorou quando viu o vovô se aproximando, e logo a bola lhe foi passada. Albério ainda guardava traços de sua antiga majestade e fez uma irretocável dúzia de embaixadas.

O pessoal que jogava nas mesas começou a fazer as piadas inevitáveis e, então, Carlinhos da Matriz, que havia sido contemporâneo de Albério nos tempos de profissional, calçou os mocassins e começou a trotar, as pernas tomadas pelas varizes, em direção ao campo. Quando chegou, logo recebeu a bola enviada por Albério, e os dois deram início a uma troca de passes, sem deixar a bola cair. 


(Foto: Wildes Barbosa)

A gurizada que estava por ali, em volta do campo, fazendo outras coisas, notou a movimentação. O mesmo ocorreu com os adultos – casais, grupos de amigos – que estavam em frente às casas, conversando, ouvindo música, tomando cerveja, e, em pouco tempo, vários deles se aproximaram do alambrado para assistir a brincadeira, da qual agora já participavam alguns adolescentes, rapazes e moças.

No campo, pelo menos três bolas já eram usadas, e foi então que os outros veteranos decidiram – uns mais entusiasmados que outros – se divertir também, e se juntaram a Albério e Carlinhos da Matriz, e depois quem veio foi o próprio Mazinho, que deixou o quiosque sob os cuidados do filho, mas o filho logo foi para o campo também, porque era o que todos estavam fazendo, até as mães e as avós estavam agarradas no alambrado, e uma delas era a mulher de Albério, Rosália, que não sabia se achava graça ou se ficava preocupada por causa do coração do marido, e lá pelas tantas o que se viu era que havia mais gente dentro do campo do que fora, as calçadas quase vazias, as casas deixadas para trás com as portas abertas, as mesas esquecidas com as peças de dama e dominó abandonadas sobre elas, e a folia corria solta no terrão, e tudo estava tão bom que ninguém se preocupou em fotografar ou filmar ou fazer relatos por WhatsApp, e dali a pouco um sapato voou, um pé de mocassin marrom, mas isso não impediu que Carlinhos da Matriz continuasse batendo bola, e as crianças corriam pra lá e pra cá, e os velhos trocavam seus passes, e os jovens tentavam organizar rodas de altinha, e então os mais jovens passaram a trocar passes com os mais velhos, e os mais velhos iam para as rodas de altinha, e a essa altura alguém já havia colocado para funcionar o sistema de som do quiosque do Mazinho, e aquilo virou uma festa que durou a tarde toda, varou a noite, invadiu a madrugada, e, para alguns deles, tornou-se lembrança que ardeu em chama linda e inextinguível pelo resto de suas vidas.