OS AMIGOS DA MANET
texto: Sergio Pugliese | foto e vídeo: Guillermo Planel
Pode ser Uber ou amarelinho, não importa, adoro ouvir histórias de motoristas, suas reclamações, suas opiniões sobre política, temperatura, conquistas, violência, obras e comportamento em geral. Os caras passam o dia transportando todo o tipo de gente, acompanham as transformações da cidade, muitoooooos são formados e trocaram recentemente de profissão, ou seja, alguma pautinha sempre sai desses papos. No final, quase sempre tem troca de cartões e o início de uma nova amizade. Com o Henrique, do amarelinho, foi assim. Logo que me despedi de dois amigos e segui a corrida, ele abriu os trabalhos:
– Amizade é tudo, né parceiro?
– Amigos são mais importantes do que muitos parentes, com certeza!
– É isso! E estou vivendo um dilema justamente por isso…….. – disse, olhos fixos no espelho.
– Perdeu algum amigo?
– Minha mulher recebeu um convite para trabalhar em Londres, em hotelaria. Meu irmão mora na Europa há alguns anos…..
– Mas isso é bacana!!!!
– Claro, ruim não é, mas e como fica a minha resenha de domingo com os amigos da pelada?
Peraí, o cara subiu no meu conceito estratosfericamente em segundos!!!! Sabe aqueles medidores dos desenhos animados que explodem quando alguém dá uma martelada? Foi isso!!!!
– Verdade, não sabia desse outro lado – comentei, semblante preocupado.
– Vi que são jornalistas, né? Por isso estou passando o meu ponto de vista.
– Mas lá deve rolar uma peladinha também – tentei amenizar.
– Cara, mas lá não vai ter um Orelha, um Marquinhos Diarréia, um Pedrinho Chuta-Chuta.
Verdade, pensei. Fazia todo sentido o seu coração amargurado.
– É, um Marquinhos Diarréia acho que não vai encontrar por lá, mas de repente um Peter Kick-Kick……
– KKKKKKK, mas é diferente. Não vai ter o churrasco no Trailer do Careca, nem as zoações. Eu, por exemplo, não sou o Henrique, mas o Hula ou o Zé Gotinha ou o Paralisia Infantil….
Ah, o bullying, pensei, realmente não faz parte do universo peladeiro.
– Aí é impossível, parceiro, Paralisia Infantil é imbatível. Já explicou isso para a sua mulher?
– Pirou? Isso ninguém entende, só nós mesmos…..
– Então seja o que Deus quiser!
– Isso, Deus é peladeiro, vai dar tudo certo!
Claro que antes de me despedir, trocamos cartões, anotei o endereço da pelada, Praça Manet, em Del Castilho, domingo, às 8h, e no fim de semana seguinte estava lá. Quando cheguei rolava Barcelona x Real Madrid, clássico espanhol em Del Castillo!!!! Sentiram a troca de Castilho por Castillo para “espanholar” ainda mais o clima? Casa cheia para prestigiar o Torneio Liga da Europa! O Henrique chegou marrento com a camisa do Arsenal e, pelo climão festivo, entendi sua tristeza em deixar tudo aquilo para trás. A outra certeza foi quando a bola rolou: sua desenvoltura em campo facilitou o meu entendimento sobre o “Paralisia Infantil”.
Valeu, Henricão!!!!!!!!!
“se reciclou aonde?”
Popular entre os boleiros, a frase “Jogou aonde?” ganha uma nova versão de PC Caju após os fiascos de Tite no Corinthians e Muricy no Flamengo.
O INVENCÍVEL
Por Zé Roberto Padilha
Com poucos recursos, o Vasco apostou desde o ano passado na contratação de um jogador que não está à venda em nenhum clube. Para obtê-lo, pouco importa se a janela europeia está fechada ou aberta. Muito menos, ele pode ser adquirido em um troca-troca ou a imprensa criticá-lo pela idade avançada. Seu nome: entrosamento. Nem por isto seu preço é baixo no mercado esportivo, para obtê-lo foi preciso enfrentar a ira de sua enorme torcida que queria a cabeça até do Almirante após a derrota de 6×0 para o Internacional. E aberto o inevitável caminho para o rebaixamento. Para obtê-lo e estar, hoje, há muitos jogos invictos e disputando o bicampeonato carioca, foi preciso nadar na contramão da mesmice.
Jorginho e Zinho comemoram um gol do Vasco ( Foto: Reprodução)
Primeiro, manter o treinador após uma pancada daquelas. Jorginho e Zinho formam uma admirável dupla de ex-atletas corretos profissionalmente, poucas vezes expulsos de campo e que nunca deram trabalho aos seus treinadores. Podem se impor ao grupo como exemplos, têm moral para pedir seriedade e disciplina, ao contrário de medalhões espertos que fugiam da concentração para ir ao encontro das suas Marias Chuteiras, quepassavam mais tempo de chinelinhos no departamento médico, suspensos pelo milésimo cartão amarelo do que jogando. E que, após assumirem a direção de um clube de futebol, distribuem bíblias nos vestiáriosachando que suas santas páginas vão apagar a lambança das que escreveu jogando. Segundo, manter o elenco, mesmo diante das suas visíveis limitações.
Já fui um dia figurinha de álbum de futebol. Não carimbada, é claro. Fotografado para o álbum Panini do campeonato carioca de 1976, cansei de passar por torcedores do Flamengo irritados de tanto “bater na minha cara”. As minhas, do Jaime, do Toninho, Rondinelli e do Cantarelli vinham aos montes no pacotinho, e cadê que saia a carimbada do Zico para eles fecharem o álbum? Só era possível sua confecção porque o torcedor, o treinador, a imprensa sabia o seu time de cor. O escalavam com os olhos fechados. Hoje, o único time carioca que consigo escalar é o do Vasco. Nem o do meu Fluminense ouso tentar, como saberquando é o Magno Alves, o Osvaldo ou o Marcos Júnior que começam jogando? A zaga, então, é um enigma dos horrores, nem Osvaldo de Souza ou Mãe Dinah ou Alfred Hitchcock ousam opinar.
Jogadores comemoram o título da Taça Guanabara (Foto: Reprodução)
Jogando o tempo todo juntos e sabedores de suas limitações, Rodrigo chega forte e dá chutões, Luan faz corretamente suas coberturas, o novo lateral direito usa sua juventude e o esquerdo a sua experiência. Marcelo Mattos marca e não tenta nada mais do que não sabe, o paraguaio cobre as subidas do Madson, o Andrezinho joga o seu correto feijãozinho e o Nenê puxa a bola para lá e para cá e se joga buscando uma faltinha. E todos vão para a área esperar uma falha do Jefferson. Na frente, Jorge Henrique tem sido o melhor do time e o Riascos… bem, Riascos é um risco até para ser analisado. É pouco, mas é constante. Estão no mesmo lugar, se doam muito e socorrem o colega ao lado. São humildes e se superam. Quando falham, tem um ótimo guardião a consertá-las: Martín Silva. Não são capazes de empolgar nem as caravelas de Cabral, mas se nestes navios negreiros seus porões se entrosassem, como o time do Vasco, certamente haveria revolução, não escravidão, na chegada ao porto seguro onde o futebol conseguiu libertar meia dúzia.
POBRE MESSI
por Paulo Cezar Caju
“A seleção de 82 ter perdido não foi bom para ninguém, foi ruim para o futebol como um todo e, principalmente, para a nossa arte.”
A resenha é livre, eu sei, e justamente por isso volta e meia perco a paciência com o que ouço. Na semana passada, com Carlos Roberto e Moreira, no Bunda de Fora, boteco de Ipanema, ouvi a seguinte pérola de um rapaz próximo a nós: “Se o Messi não ganhar uma Copa do Mundo não valerá nada o que fez até hoje”. Meu Deus, muitos concordaram!!! Coitado do Cristiano Ronaldo, então, que terá menos chances ainda, pensei. Eusébio já passara por isso. Essa discussão é cruel, malvada, injusta. Isso vem de longe. Em 34, Leônidas não conquistou a Copa, Domingos da Guia não ganhou a de 38 e Zizinho, olha isso, Zizinho e Ademir Queixada não venceram a de 50!!! Eles não valem nada? Jair da Rosa Pinto!!! E o Cruyff? Platini?? E Zico e Falcão em 82? Muito jogador ganhou a Copa do Mundo e você sequer lembra. Tudo bem, estavam lá, tiveram estrela, saíram no pôster, mas peraí estou falando em contribuição, marca. Caramba, o Zico foi o Rei do Maracanã, campeão mundial pelo Flamengo e encantou multidões. Até hoje, no Jogo das Estrelas, tem o seu nome gritado. Isso é marca, isso é paixão, isso é futebol!!! A seleção de 82 ter perdido não foi bom para ninguém, foi ruim para o futebol como um todo e, principalmente, para a nossa arte. Depois, o Dunga ganhou. E daí??? Romário o carregou nas costas com o seu talento. Vencer é maravilhoso, mas deixar marcas, mesmo sem ter vencido uma Copa, é para poucos e bons. Carlos Roberto e Moreira, da Selefogo, continuavam mandando ver no chope. Craques!!!! Fico pensando, então, nos que sequer participaram de uma Copa do Mundo, como eles dois, Dirceu Lopes e muitos outros. Pedi a conta e passei pelo garotão que continuava firme em sua teoria. Ri e, no táxi, rezei para Deus livrar o pobre Messi do ostracismo.
– texto publicado originalmente no jornal O Globo, em 26 de abril de 2016
Adílio + Andrade + Torcedor
teste de fogo
texto: Sergio Pugliese | vídeo: Simone Marinho | fotos: Marcelo Tabach
Sabe aquelas notícias malas que, além do susto, nos fazem pensar se os exames médicos estão em dia? A do camarada Fábio Varsano foi uma dessas. De cara, lembrei dele, moleque, na sala de escuta do Jornal do Brasil monitorando os movimentos da Polícia Militar, Civil, Bombeiros, cemitérios, Instituto Médico Legal, Defesa Civil e acompanhando os noticiários de rádio e tevê. Eu chefiava a reportagem e quando ele estava ali, enclausurado naquele cubículo, eu relaxava, pois dificilmente seria surpreendido pela concorrência. Caxias, ligado, esperto, competente, “levar furo” não fazia parte de seu dicionário. Depois, libertou-se da saleta, deslanchou e brilhou na redação!
– Parece que está no CTI!!! – ouvi alguém dizer, na outra ponta da mesa, num boteco, habitat natural dos jornalistas.
O problema é que jornalista tem o grave problema de aumentar, acrescentar o seu molhinho na história, e temi que quando chegasse na ponta onde eu estava já fosse tarde demais, missa de sétimo dia, essas coisas. A verdade é que todos tínhamos levado furo e o Fábio acabara de postar uma mensagem no Facebook tranquilizando sua legião de fãs e contando o passo a passo do drama vivido.
– Ele está bem!!! Vamos brindar!!!! – sugeriu Moreira, seguido por Ahmed, Aquino, Octávio, velhos companheiros de guerra.
Em casa, ainda inspirado pelo excesso de geladas, pensei numa homenagem inusitada ao antigo parceiro de redação, após ler esse trecho de seu relato: “Eu sofrera uma parada cardíaca e tive que ser levado às pressas para outro andar, o da neurologia, onde usaram um desfibrilador para me reanimar. Colocaram tubos pela minha garganta e, sedado, fui para a cirurgia. Agora com quatro ‘stents’ ao lado do coração, sei que é preciso cuidar muito bem deles. Por isso, eles já foram batizados de Zico, Júnior, Andrade e Adílio, pois, afinal, só me deram alegrias”. Que tal um encontro entre os homenageados e o rubro-negro “de coração”?
– Só se for agora!!! – gritou, em coro, a equipe do Museu da Pelada.
A primeira medida seria combinar a visita-surpresa com Flávia Ribeiro, mulher de Varsano e jornalista top de linha. Autorizada!!! Em seguida, convencer os craques. Para isso, entramos em contato com o dentista-peladeiro Lulinha, queridíssimo das estrelas da Gávea. Marrento, pediu apenas alguns minutos. Adílio e Andrade toparam!!!! Zico, na Índia, e Junior, não localizado, quem sabe topem um futuro encontro?
– Já tinham batizado criança com o meu nome, cachorro, mas stent nunca imaginei – divertia-se Adílio, no táxi, a caminho de Laranjeiras.
Laranjeiras??? Mas Fábio não é rubro-negro? Sim, sim, mas por conta da comodidade até dá suas braçadas no Fluminense. E foi justamente nadando que sentiu o desconforto no peito, que mais tarde culminaria num infarto agudo. Os amigos mais próximos já sugeriram a transferência do título de sócio para a Gávea. Ele está avaliando. O interfone toca!!!! Estão achando que seria surpresa, né? Não, o jornalista farejou pegadinha quando a mulher disse que o Museu da Pelada gostaria de entrevistá-lo sobre o nome dos quatro stents. Muiiiitooo estranho, achou. Pressionada, soltou uma gargalhada e confessou. Mas qual fã não gostaria de receber a visita de dois ídolos de infância?
– Adílio, Andrade!!!! Podem entrar!!!
Quantas vezes aquela dupla fez o coração de Varsano explodir de alegria? Adílio marcando o gol do Mundial em Tóquio!!! Andrade emplacando o sexto gol na histórica vitória do Mengão de 6 a 0 no Botafogo!!! Adílio emocionou-se. É gratificante ser homenageado tantos anos após ter pendurado as chuteiras. Andrade também tremeu o queixo ao lembrar-se da bactéria que quase o matou após uma cirurgia no joelho. A videomaker sugeriu uma rodinha com os três trocando passes na sala. Claro!!! Apareceu uma bola!!! Flavinha afastou os copos da mesa. Toca daqui, toca dali até que Adílio fingiu passar a bola para Varsano, mas a trouxe de volta com o bico do tênis: “aí é sacanagem comigo”, reclamou o fã, que só presenciara essas molecagens das arquibancadas. Abraçaram-se para a foto histórica, vivos, realizados, corações rubro-negros pulsando fortes!
Fabio com o pai Claudio e o irmão Daniel
De pai para filho: Fabio com o filho Pedro, em campo, no Maracanã
De geração para geração: Claudio, Fabio, Pedro e Daniel Varsano