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Eles e Ela

fotos e vídeo: Simone Marinho | edição: Izabel Barreto

Diversidade, amizade, inclusão, espírito de equipe. Tudo isso faz parte do universo da pelada. A história de Nathália Coutinho é um exemplo disso. Apaixonada por futebol, ela quebra barreiras jogando com homens. Conheça essa história, contada em parceria com a Juntos, agência com foco em Comunicação por Causas. ‪#‎OcampoÉparaTodos‬ ‪#‎Juntos‬‪ #‎DNAJuntos‬

PROFISSÃO: RESERVA

por Zé Roberto Padilha

O Teatro Muncipal não tem um banco de reservas como o do Maracanã. O ator ensaia durante a semana, decora o texto,  sobe no palco e dá o seu recado. Não serve como exemplo. No cinema, então, se estiver escalado no banco nem aparece na fita. Como explicar para os outros artistas a triste vida de um artista da bola escalado no domingo para ficar na reserva? Palavra de quem passou um bom tempo por ali: nada é pior na vida de um jogador que ser reserva da equipe. Só quem sentou no banco paraRogério Ceni alcança a extensão deste martírio.


O desconforto já começa quando as imagens percorrem aquele “fosso das ilusões perdidas” antes do começo da partida. Eles sabem que vai ter um engraçadinho na sala, no sofá junto à família torcendo e cornetando: “Olha lá os sujas roupas! Não fazem nada, recebem em dia e ainda ganham gratificações”. Cada close dado naquele amarelado grupo representa meio milhão de reais a menos no mercado da bola. Quando o time dana a ganhar, como o Vasco, que o Jorginho não é maluco, nem o Zinho, para mexer e onde ninguém se machuca para alcançar o pôster, os reservas vão definhando. No banco, na memória da mídia, dos torcedores e quando você procura…Cadê o Guinazu? Ouviram falar do Serginho? E para onde foi aquele centroavante que nos deu o título de campeão contra o Botafogo?

Depois que assinei meu contrato profissional, em 1972, fui reserva dois anos do Lula. Não tinha bola suficiente para concorrer com um ponta-esquerda da seleção brasileira. Quando ele era convocado, disputava uma Taça Guanabara, entrava nos amistosos excursionando pelo país. Se não fosse vendido ao Internacional, em 1974, e Carlos Alberto Parreira assumisse e me desse a brecha que sonhava, estaria hoje trabalhando no Bradesco. A paixão e a permanência em um banco seria maior que a vivida dos gramados.

Por ali vivi, sentado e apreciando, experiências inusitadas. Era novo, podia esperar, aprender os truques daquela fascinante profissão ao entrar aos poucos nas partidas. Mas tinha craque rodado impaciente e estressado. Já chegava com o dedo cruzado para secar o titular e esclarecia: “Escuta, menino, aqui não é local de hipocrisia. Torcer é na arquibancada. Não torço contra o Samarone, nem contra o Cláudio (que eram da sua posição), apenas desejo que eles joguem mal. Sofram uma leve lesão, nada séria, para que eu possa entrar.” E filosofava: “Na pior das hipóteses, uma derrota cairia bem. Treinador é tudo igual: vai ter que mexer no time e aí temos chances!” E finalizou: “Não estamos aqui para bater palmas para macaco dançar!”. Calma, Bernardinho, estou falando do banco de jogadores de futebol!

Para os que acham que acabou o martírio dos reservas junto ao texto, a tragédia avança depois da partida. Quando o juiz apita, ainda vem o preparador físico com o estádio vazio os aquecer para uma corrida. E tome abdominal, flexões, piques que poucos assistem com os refletores desligados. Ah, tem gente que presenciou sim. Quando um reserva chegou em casa, seu filho, gente boa, que permaneceu na arquibancada o esperando, ainda lhe deu uma força: “Treinou bem, hein pai!” Uma pena não ser no teatro, senão a gente pedia para fechar a cortina. E terminava com uma agonia que vai continuar no banco de reserva do nosso time já no próximo domingo.

O TRATOR

por Sergio Pugliese


Zé Neto posa ao lado de Sergio Pugliese no Clube dos 30, em São Conrado (Foto: Reyes de Sá Viana do Castelo

Zé Neto sempre foi determinado, tinhoso, cabeça dura e aos 16 anos cismou de transformar um terreno baldio de Santa Teresa num campinho de pelada. Pediu uma força ao administrador regional do bairro, que deu ok na liberação do espaço, mas esquivou-se da limpeza e terraplanagem. Mão de obra não faltava, afinal peladeiros unidos são capazes de tudo!!! Mas só um trator seria capaz de remover tanto entulho. Onde conseguir um trator? Zé Neto lembrou-se que sempre via vários nas obras de demolição do Morro de Santo Antônio, onde hoje é a Avenida Chile, Petrobras e Catedral Metropolitana.

– Um dia parei ao lado de um tratorista e perguntei quanto custaria uma fugidinha em Santa Teresa – divertiu-se, em nossa resenha, no Bar do Gomes, em Santa Teresa.

E teve um maluco que topou! Durante 15 dias, ele e Zé Neto, de carona, subiam as ladeiras estreitas do bairro até o futuro campinho. A cena divertia os moradores, mas o terreno foi limpo e a arena de terra batida inaugurada meses depois!!! Óbvio que, após tanto esforço, conseguir autorização para jogar no campo era uma árdua tarefa. E a fila era grande!!!! Como só o time de Zé Neto tinha regalias, mandava e desmandava nos horários, ele e os parceiros de panela, Albino e Otávio Carneiro, Briguilim e Aloísio Ribeiro Aguiar, foram batizados de Política Futebol Clube. Mas a ideia era agregar e logo iniciaram-se memoráveis campeonatos envolvendo Morro dos Prazeres, de Robô e Ancelmo, Morro da Coroa, de Macumba, Largo do Guimarães, de Tutuca e Wanderley, Paula Mattos, de Jaburu, Áurea, de Erivan, e Beco Ocidental, de Almir e Taba.  

– Aquele campo marcou época! – suspirou Zé Neto.

Tempo bom!!!! O campinho virou a Praça Odylo Costa Neto, com área de lazer e uma quadra de salão, de cimento. Zé Neto, hoje com 65 anos, foi meu primeiro vizinho e, da porta de casa, na Rua Constante Jardim, sempre via o fominha correndo para as peladas ou praticando “cooper”. Disposição de touro e fama de odiar derrotas. Após me mudar para vários endereços do bairro, perdi o seu contato e fui reencontrá-lo, carequinha da Silva, na pelada dos 80 anos de Armando Pittigliani, o Pitti, no Clube dos Trinta, em São Conrado. Esbaforido, suado, saía do campo com passos rápidos, como se não tivesse jogado. “Não acredito que seja o Zé Neto?”, brinquei. Carinhoso, me levou a um a um dos convidados de Pitti para dizer que me vira molequinho. E bastaram alguns minutos para eu descobrir que a cabeça raspada, além de herança familiar, era fruto do tratamento para frear o câncer de próstata. Dois meses antes enfrentara a décima operação e já estava em campo novamente.  Monstro!

– Sempre fui maratonista e por conta disso superei grandes dificuldades – revelou.

Não pude ficar muito tempo na festa do Pitti e marcamos um encontro para a semana seguinte, em Santa Teresa, onde ele mora até hoje. Papo ótimo, mas seriam necessárias várias colunas para registrar o histórico de peladeiro do engenheiro José Alves Ferreira Neto, que começou aos 11 anos na seleção do colégio São Bento, passou pelo Lagoinha, de Giba e Alexandre, Capri, de Hugo Aloy, Nelsinho, Nilo, Cláudio Bocão, Augusto, José Santoro e Xanduca, e Santa Teresa F.C., do Seu Miguel, que lotava de torcedores o campo 8 do Aterro, nas manhãs de domingo. E ainda teve o timaço da Serpro, com Luiz Mário Griner, Sergio Guerreiro e Alair, campeão de um torneio empresarial em cima do IBGE. E a seleção da Faculdade Santa Úrsula, campeã carioca universitária, e o Petropolitano, do goleiro Ricardo Bronze, mais ASBAC, PUC, Monte Líbano, Piraquê, Clube dos Trinta, de Jayme Lima, e Caiçaras, de Joca, Gilberto Dentista, Jean Jaques, Sérgio Aquino e o saudoso Vitinho.

– A morte de Vitinho, meu grande amigo, me quebrou, me desestruturou emocionalmente – recordou, emocionado.

Mas Zé Neto reergueu-se. Desde os 51 anos, quando o câncer foi descoberto, ele vem se reerguendo. Mas a primeira operação foi devastadora. Emagreceu 30 quilos e amigos preconceituosos afastaram-se imaginando tratar-se de Aids. Começou a beber e decidiu separar-se de Celina, após 21 anos de casamento, mais os oito de namoro, com quem teve os filhos Patrícia e José Alves. Tinha certeza de que morreria, delirava, sofria. O oncologista Emílio Karan acompanhava de perto e participou de quase todas as cirurgias.

– Minha família sempre manteve-se perto, mas minha cabeça estava horrível – comentou.

Mas um dia, Zé Neto recorreu aos momentos de glória da infância e resgatou o trator, a máquina que afastou escombros, limpou o terreno e o ajudou a realizar seu sonho juvenil. Então, assumiu a direção e buscou uma força sobrenatural para animar-se, levantar-se da cama, sacudir a poeira e dar a volta por cima. As dores na coluna eram insuportáveis e incontáveis vezes caiu no chão, fraco. Mas Zé Neto nunca gostou de perder, se curvar aos adversários, e não seria no momento mais crítico da vida que entregaria os pontos. Na rua, encontrou o parceiro Xanduca, que o intimou a voltar a jogar. Zé Neto animou-se e foi rever a pelada dos amigos do Capri. Revigorante! Os parceiros!!! A bola!!! Alguns meses depois, o furacão Zé Neto estava de volta! Nunca mais deixou os campos. Apaixonou-se pela cuidadora Tiana, com quem está casado há quatro anos, recuperou a auto estima, o amor no coração, o prazer de viver. A próxima operação está marcada, a próxima pelada também.

PAGOU MICK!


Sob os olhares do pé-frio Mick Jagger, a Islândia venceu a Inglaterra por 2 a 1 e conseguiu a classificação histórica para as quartas de final! Acha que a modesta seleção islandesa tem chance de conquistar o título?

DOCE VINGANÇA

por Zé Roberto Padilha

Deus, sabemos, é brasileiro. Ele, primeiro que todo mundo, sabia que não poderia agradar a todos os torcedores cariocas, fanáticos, que ditam seu humor em casa, no trabalho e no convívio com os amigos, de acordo com o resultado do seu time no domingo. Sendo assim, pelo equilíbrio social e paz na terra, criou de um lado a nação rubro-negra. De outro, Fluminense, Vasco, Botafogo, América…. 


William Arão comemora um gol pelo Botafogo

Ontem, não foi apenas a torcida tricolor que torceu contra o Flamengo. Os torcedores alvinegros, inconformados com a perda de William Arão, enviaram ventos minuanos traiçoeiros de Porto Alegre, que desviaram o rumo da bola naquele corner para que seu ex-meia direita “traidor” marcasse de cabeça o gol contra que abriu o placar no Fla x Flu. Para eles, pelas efusivas comemorações nas arquibancadas do Estádio Beira-Rio, este foi o quarto gol do Botafogo contra o Internacional. 


Rafael Vaz se transferiu, recentemente, do Vasco para o Flamengo

Logo depois que a nação rubro-negra voltou a sorrir, na distante Arena das Dunas, com o empate, foi a vez dos torcedores vascaínos se unirem a torcida tricolor para se vingar do seu ex-zagueiro artilheiro, Rafael Vaz.  Secaram tanto o menino, que ele provou que além de goleador, sabe também fazer uma assistência. Contra. Melhor que ser líder da Série B, e vencer o CRB no sábado, com direito a gol olímpico, foi se vingar de outro “traidor”. 

Hoje, podemos notar pelas ruas e calçadas, por onde andarmos: quem está triste é Flamengo. Os demais seres exultantes, Deus distribuiu entre os clubes para que tristeza e alegria fossem sentimentos compartilhados entre os torcedores. E vingança, aprendemos não com Ele, mas com o fanatismo da bola, com a paixão que domina a razão, é um prato que se come frio no domingo à tarde. No inverno do Campeonato Brasileiro, então…