A BICUDA DE TINUCA E AS PIZZAS DA MAFALDINHA…
por Marcelo Mendez
Em um sábado à tarde, de algum sol, decidi ir até o campo do São Paulinho do meu Parque Novo Oratório.
Fiquei sabendo que ali haveria a final de um torneio, a “Copa Pacotão”, que, perguntando aqui e ali, descobri tratar-se do nome do patrono do torneio, um empresário dono de um boteco nas quebradas do Parque São Rafael, que era o incentivador da coisa toda.
– Repórter, o vencedor, além do troféu, ganhará uma rodada de pizzas, lá na Mafaldinha Pizzas… – me contou a fonte que conheci ali, na grade do campo. E munido de informações necessárias, fui ao jogo em questão.
O match que valia o troféu e as pizzas da Mafaldinha era entre os times do Pouca Perna F.C. e o Em Cima Da Hora. Um time era do bairro do Vera Cruz e o outro do Sonia Maria, na divisa com Santo André. A eufórica torcida de uns 15 cachaças que se somavam a mim na arquibancada do campo do São Paulinho me falavam maravilhas do time do Pouca Perna. E então começou a peleja.
A partida era de uma ruindade intrínseca. Disputada a plenos bicões, chutes tortos, trombadas e raspadas de canela, o jogo corria. Os times, talvez sabedores dos encantos lá das pizzas, corriam e se esforçavam com uma dignidade inexorável. Eram homens atrás de réquiens, de glórias curtas que a várzea pode dar. Nesse momento me chamou atenção o camisa 11 do time do Pouca Perna.
Em um daqueles 0 x 0 virginais e indecentes, o jogo seguia. Após um desvio no fundo, o moço da camisa 11 se viu com a bola à sua frente, limpinha, solta, fácil de ser empurrada ao fundo das redes. Sabedor de tal primazia que esse momento do jogo pode oferecer, ele a recebeu, ajeitou seu corpo e então, de frente para um desesperado goleiro, enfiou seu pé embaixo da bola e a isolou sobre o gol:
– Puta que pariu, Tinuca! Como tu é ruim, porra! – esbravejou um dos 15 torcedores a meu lado, arremessando ao campo seu copo de plástico cheio de cerveja.
Tinuca…
Só pela exclusividade do nome, Tinuca já mereceria destaque nessa crônica. Afinal de contas, quantos Tinucas existem no mundo? Que coisa maravilhosa é a sensação de ser então único: Tinuca!
Observando-o em campo, vi que o seu futebol era de uma inapelável ruindade. Um grosso. Alto, de pernas infindáveis, meio arcado, Tinuca corria. Era comovente ver o quanto nosso limitado atacante se esforçava.
Tinuca tinha uma retidão de caráter épica!
Talvez por isso, a bola o procurava. Tinuca teve mais outras quatro chances de fazer o gol. Errou todas. A paciência do bebum da torcida já estava acabando quando então se fez a magia no campo do São Paulinho.
Eram uns 44 minutos do segundo tempo, quando todo mundo se preparava para os pênaltis. Já não se olhava tanto para o campo, quando uma bola sobrou na frente de Tinuca a uns 30 metros do gol adversário. Sem pestanejar e nem fazer análise, o nosso camisa 11 enfiou o bico da chuteira na bola. A pelota fez uma viagem com mil curvas até que encontrou o ângulo do time do Em Cima da Hora.
GOOOLLL!!!
De maneira impressionante, Tinuca fez o maior de todos os gols. Os cachaças vibravam, os parceiros de time o saudaram e todo mundo estava feliz. As pizzas da Mafaldinha estavam garantidas! Graças a Tinuca!!!! Através dele se fez a arte.
Porque afinal de contas o espanto e a surpresa são as maiores características de uma obra de arte. São fatores que a definem como tal, ou até mesmo nossa indignação capenga diante da beleza artística, quando dizemos “Minha nossa, como é belo!”. Pois bem:
Belo nesse dia foi o Tinuca. Minha nossa!
REINALDO VENCE DISPUTA!
Como era de se esperar, a batalha foi dura, decidida nos últimos votos, mas o artilheiro Reinaldo superou Careca e foi eleito o craque da semana! Veja belos lances do ídolo do Atlético-MG!
BOM SENSO
:::: por Paulo Cezar Caju ::::
Kkkkkkkkkkkkkk. O Bom Senso acabou??? A solução para moralizar o futebol acabou??? O projeto revolucionário, liderado pelo zagueiro Paulo André? Pelo amor de Deus, chupou laranja com quem??? Esse projeto nem nasceu, né? E bom senso, cá para nós, está em extinção há tempos.
O curioso é que o projeto morre assim que Tite assume a seleção. O Tite era do Corinthians, o Paulo André era do Corinthians, que bom senso é esse? Por falar em Tite, ele saiu da “nova arena” do Botafogo, kkkkkk, quando o Flamengo ganhava de 3 a 1. Foi ele sair e o Botafogo meter dois. Não teve o bom senso de esperar o jogo terminar, mas tá valendo.
Bom senso também não tiveram os políticos que, nessas Olimpíadas, correm mais do que o Bolt para entregar as obras…..pela metade, cheias de gambiarras.
Bom senso não está tendo o Cuca, técnico reconhecidamente ofensivo, um dos poucos que ainda montam times interessantes, jogando de forma covarde, ganhando com medo perder. Deixa o Palmeiras jogar com alegria, Cuca!!!
Falcão voltou para o Inter e Argel, que garantiu não ficar uma semana desempregado, voltou para o Figueirense. Sobre o que falávamos mesmo? Ah, bom senso!!! Bom senso deveria ser não ficar repetindo figurinhas.
Os jornais noticiam os desdobramentos do atentado em Nice, aquele em que um doido, sem qualquer bom senso, atropelou e matou várias pessoas. Passei muitas férias em Nice, assisti muito aquela espécie de réveillon francês.
Chega, PC!!!! Sei que misturei as estações, um bom senso com o outro, mas minha cabeça é assim mesmo, uma mistura de nostalgia e inconformismo. Mas adoro uma boa gargalhada: o Bom Senso acabou, Kkkkkkk!!!!!
– texto publicado originalmente no jornal O Globo, em 22 de julho de 2016
OS RENITENTES
por Claudio Lovato
O senhor de bigode grisalho e boné amarelo sentado na cadeira de plástico entrelaça os dedos das mãos, levanta a cabeça, olha para o grupo diante dele e diz:
– Hoje vamos marcar lá em cima!
Lá no fundo, sem que ninguém lhe dê atenção, Nilo do Espírito Santo acende a vela recém tirada da embalagem diante da imagem de Nossa Senhora Aparecida.
– Vamos chegar junto na saída de bola deles! – enfatiza o homem que todos chamam respeitosamente (já foi mais respeitosamente) de seu Deco.
Zé Alípio, o Netinho, escondido na terceira fila atrás de Toninho Dedão e Marcelo Voadeira, olha para o lado, encara a parede vazia e suspira.
Bruno da Bênção, às costas de Netinho, deixa escapar (não fez nenhuma força para conter) um “tsc”, que todos fingem não ouvir.
Rafa Careca bate palmas duas vezes, confiante, em uma tentativa de incentivo.
Lá fora, os quero-queros cantam; são muitos, ao que parece.
Oito derrotas consecutivas.
E então o homem de bigode, seu Deco, diz:
– Vamos para o jogo!
II
Os dedos indicador e médio da mão direita, amarelados de nicotina, amarelo vivo de solidão reiterada e de alertas desde sempre ignorados, seguram agora não o cigarro de praxe, mas uma caneta bic azul já quase sem tinta. Na outra mão, a prancheta.
Ele diz:
– Hoje é esperar, deixar os caras virem. Quando tomarmos a bola, só vamos sair na boa!
Nilo do Espírito Santo olha para a imagem de Nossa Senhora Aparecida, retira uma vela usada da embalagem de plástico e pega no bolso do abrigo a caixa de fósforos meio molhada da chuva de outro dia.
– Deixem eles com a bola, porque, como a gente já sabe, posse de bola e controle do jogo são duas coisas diferentes! – diz o veterano de muitas batalhas, mas que hoje, naquele grupo, já é tratado pela maioria apenas como “O Velho”.
Netinho, sentado na quarta fila ao lado de Rubão Mão de Vaca, olha para o lado, em direção à janela basculante em cima da porta que dá para o banheirinho, e bufa.
Bruno da Bênção, sentado bem em frente, volta-se para o companheiro e solta um xingamento, sussurrado, entre dentes, dirigido a seu Deco. Netinho e todos os que ouviram balançam a cabeça em sinal de concordância.
Rafa Careca bate palmas três vezes; um esforço perseverante.
Lá fora, os quero-queros cantam baixo, sem muita força. Provavelmente são poucos, e esparsos.
Nove derrotas consecutivas.
E então o homem do bigode, seu Deco, diz (apenas diz, não exclama):
– Vamos para o jogo, moçada.
III
As mãos trêmulas agora repousam na prancheta colocada sobre os joelhos, que também parecem tremer. A caneta azul é a mesma do último jogo, mas ela já não é útil, porque a tinta secou há pelo menos dois dias.
Dez derrotas consecutivas e ele diz:
– Hoje vamos com duas linhas de cinco, e o Edu Zebra um pouco mais adiantado.
Nilo do Espírito Santo posiciona o toco de vela em frente à imagem de Nossa Senhora Aparecida. Vai acendê-la, mas a caixa de fósforos está vazia. Ele pensa no que fazer.
– Mas não é cinco-quatro-um. São duas de cinco. E, quando eles vierem para cima da gente, o Edu tenta se posicionar um pouco mais à frente, nas costas dos zagueiros deles, e aí é bola comprida nele, de preferência com lançamento do Netinho. – explica aquele que, nesse grupo, já foi veterano, já foi velho e agora é tratado como um adareço fora de moda que eles têm que carregar no pescoço, à força, por alguma razão desconhecida.
Netinho, sentado na quinta fileira de cadeiras, quase na porta do vestiário, muito perto de onde está agora seu tio Nilo do Espírito Santo (agachado e pensativo em frente à imagem de Nossa Senhora Aparecida), fecha os olhos, sorri e, para surpresa geral, para grande espanto corroborado por muitas bocas abertas, bate palmas – uma, duas, três, quatro vezes.
Bruno da Bênção, de um ponto diametralmente oposto ao de Netinho, agarra com força os braços da cadeira em que está sentado, tem os olhos semicerrados e, de repente,solta um assovio daqueles altos e cortantes, do tipo que dói no ouvido de quem está perto, e então começa, ele também, a bater palmas.
Rafa Careca, tomado pela euforia, levanta-se da cadeira e grita, com os dois braços levantados:
– É isso aí, porra!
Lá fora, os quero-queros dão início a uma balbúrdia infernal. Parecem ser mais de cem, ou mais de mil.
O barulho de um trovão como jamais ouvido anteriormente naquela região faz tremer, com sua fúria ancestral de mágoas por muito tempo guardadas, as paredes descascadas do velho vestiário.
E o homem de bigode e boné amarelo, num tom firme e peremptório que ele próprio, tempos depois, admitiria que considerava impossível para aquele momento, diz (exclama) então:
– Vamos lá ganhar esse jogo, caralho!!!
IV
Nilo do Espírito Santo posiciona a vela em frente à imagem. Ele sente muita gratidão. A vela é nova, vermelha e longa, e o isqueiro de plástico preto reluzente funciona que é uma beleza.
Às suas costas há um vozerio animado, feliz, e cada palavra pronunciada remete ao desejo urgente de ir para o campo.
Nilo sorri e pensa (mais uma vez) que, quando chegar seu dia, seu momento derradeiro, sua despedida definitiva, ele quer que seja ali, no meio daquilo, e ele tem uma certeza secreta de que assim será.
Ele nunca quis outra coisa tanto quanto isso.
PARABÉNS, FLUMINENSE!
No dia em que o Fluminense completa 114 anos, o Museu da Pelada presenteia os torcedores com belos gols da dupla que fez história com a camisa tricolor, o Casal 20, formado por Washington e Assis!