SANTA EUFORIA
:::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
O povo brasileiro anda muito carente. Também pudera, a situação não está fácil, com políticos nos assombrando a cada dia com suas decisões estapafúrdias, fraudes, desemprego, violência, falta de compreensão, amor e solidariedade.
A carência é tanta que ouvi o Casagrande, nosso querido Casão, dizer que a seleção brasileira que goleou o Uruguai hoje é a melhor do mundo. Repete!!!
Ouvi não só dele, mas de outras pessoas que sonham ver nosso futebol novamente no topo do mundo. Isso chama-se carência ou excesso de euforia. O Dunga também ganhou de quatro do Uruguai e vários dos jogadores atuais estavam na goleada do 7×1.
Ah, mas o esquema do Tite é diferente!!!! O esquema ou o discurso, a disposição dos atletas com o professor amigão? E se o Brasil jogasse sem o Neymar, como o Uruguai jogou sem o Suárez e com o goleiro reserva?
Também sou brasileiro, mas vejo o futebol com outros olhos e de forma isenta. O Brasil é uma seleção tentando se reconstruir.
É claro que os jogadores odiavam o Dunga e amam o Tite. E esse é um ótimo primeiro passo, mas quais testes de verdade a seleção fez?
Gosto do Douglas Costa, do Marcelo e acho o Philippe Coutinho acima da média. Os outros são normais e alguns nem mereciam estar lá.
É óbvio que Tite aposta todas suas fichas em Neymar e acende todos os dias muitas velas por ele. Um craque pode fazer a diferença, como Romário e Fenômeno já fizeram, mas é pouco, muito pouco. Pior, é arriscado.
Mas a seleção venceu e agora periga os políticos surfarem nessa onda de otimismo e anunciarem que estamos nos transformando numa nova potência mundial. E a vida continua!
ALCINO, VERDADEIRA MALUQUICE DE CRAQUE
por André Felipe de Lima
Para a maioria dos torcedores do Remo, de Belém do Pará, não há dúvida: o centroavante Alcino é o maior ídolo da história do clube. Polêmico ao extremo, conquistou a torcida dentro de campo. Fora dele, ia do céu ao inferno com uma facilidade assustadora.
Hoje, dia 24, o craque, que morreu prematuramente, em 2006, completaria 65 anos. Fica aqui, a homenagem deste jornalista e pesquisador a um jogador cuja história se mistura com as glórias do Remo.
Alcino Neves dos Santos Filho. Esse nome está na memória de todos os torcedores paraenses, especialmente os do Remo. Dentro de campo, gols à vontade e alguns gestos pouco ortodoxos, fora dele, muitas polêmicas. Muitas mesmo.
Ganhou um apelido: “Negão Motora”. Alguns dizem que em função de sua “paixão” por automóveis. Outros garantem, porém, que o apelido veio após uma situação para lá de constrangedora.
Na tarde do dia 26 de maio de 1984, Alcino, em franca decadência, defendendo o Rio Negro, de Manaus, achava ser o ator Jack Nicholson, quando este protagonizou o filme Um estranho no ninho, sucesso de Hollywood dos anos de 1970.
Completamente fora de si, alegando estar “cansado da concentração”, onde morava de favor, arrombou o armário onde estava guardada a chave de um microônibus do clube e rodou pela cidade. Horas depois, completamente embriagado, atropelou o motorista de caminhão Manuel Amadeu da Silva, de 41 anos, que, segundo a imprensa da época, teria morrido em seguida.
Alcino fugiu e ao retornar à concentração os dirigentes do Rio Negro suspenderam seu contrato. Para piorar, recebeu ameaças de morte de amigos da vítima. “Foi uma fatalidade, não sou culpado de nada”, desculpava-se.
Sua vida sem compromisso e desregrada acabou conduzindo-o ao cadafalso.
Até mesmo dentro dos gramados extrapolava os limites, como descreve reportagem da revista Placar, de maio de 1980, que abre o texto com base no depoimento anônimo de um ex-companheiro de time do “Motora”: “Quando jogava no Remo, de Belém, o centroavante Alcino cultivava um hábito: antes de entrar em campo, fumava um cigarrinho de maconha. Enquanto os companheiros esperavam na boca do túnel, o roupeiro ficava na porta do vestiário, para avisar a quantas andava o aquecimento especial do grandalhão.”
Alcino era um cara contraditório, capaz de um dia cometer desatinos, como o de pegar um ônibus e sair desvairadamente pelas ruas, ou, em outro, ir à rua das Olarias, próxima ao estádio da Portuguesa de Desportos, para jogar uma saudável pelada com os garotos do bairro.
Foto: Gazeta Press
Alcino não dispensava essa relação com o povo, com o torcedor. Sempre parava no bar “Lusa do Canindé” para um papo com os torcedores. Às vezes classificavam seu comportamento como infantil. Alcino descia à rua para dançar com as crianças, e até gostava quando o chamavam de John Travolta.
Nunca soubemos se Alcino era feliz ou triste.
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Alcino está na Letra “A” de “Ídolos – Dicionário dos craques do futebol brasileiro”,
CHELSEA E TOTTENHAM DOMINAM COM 3 ATRÁS
por Pedro Redig, de Londres
Quem acompanha o Campeonato Inglês de perto já reparou. Os times que estão na frente são os que atuam com três jogadores atrás. São eles o virtual campeão Chelsea e o Tottenham, num distante segundo lugar.
Nunca fui chegado a escrever sobre táticas mas a maneira como estes dois times jogam é fascinante demais e merece ser esmiuçada. O Chelsea trocou a base sólida de Ivanonic, Cahill, Terry e Azpilicueta por um time que joga agora num flexível 3-4-3.
David Luiz comanda o centro da defesa junto com Cahill e Azpilicueta. Os alas Moses e Marcos Alonso voltam quando o time é atacado e a linha de três de repente vira uma barreira de cinco, além do incansável Kanté batalhando na frente da defesa. Quando o time sai com a bola, Azpilicueta cai na lateral direita e avança junto com Moses. Alonso faz o mesmo pelo lado esquerdo.
David Luiz e Cahill também arriscam suas arrancadas sob a proteção extra de Kanté. Os dois zagueiros de área já marcaram gols preciosos para o Chelsea. A formação inspirada no sistema defensivo conhecido como ‘catenaccio’ e aprimorada pelo técnico italiano Antonio Conte tornou o Chelsea praticamente imbatível. Pedro, Hazard e Diego Costa na frente também são apoiados pelos alas e Alonso aparece muitas vezes como um verdadeiro ponta.
O Tottenham tem um sistema de três no meio da defesa ainda mais excitante do que o do Chelsea. Dier, Vertonghen e Alderweireld atuam com Kyle Walker na ala direita e Justin Rose na esquerda. Quando o time ataca, os alas se mandam para a frente, num verdadeiro rolo compressor.
O sistema é diferente do Chelsea – um 3-4-2-1 com Wayama e Dembele patrulhando o meio campo e Erkisen e Ali criando chances para o matador Harry Kane.
Walker tem um vigor físico impressionante e estaria sendo observado pelo Barcelona. Rose anda machucado mas é sólido na defesa e chuta bem de longe. A cultura dos alas é tão forte que até o reserva de Walker, Kieran Trippier, impressiona. Ele tem mais técnica do que o titular e fornece cruzamentos para muitos gols. Quando o time perde a posse de bola, Trippier muitas vezes pressiona os centrais adversários antes de correr de volta para a posição original na lateral direita.
O sucesso do Chelsea e do Tottenham é uma prova de que o sistema de três atrás pode funcionar porque torna os times mais flexíveis, permitindo ocupar mais espaço no futebol corrido de hoje em dia. Jogando com três atrás, os dois times são os que sofreram menos gols na temporada. Do jeito que atuam, parece que tem sempre mais gente na defesa e mais gente no ataque.
O ala foi uma invenção consagrada pelo brasileiro Nilton Santos. E o Brasil teve sucesso com três no centro da defesa. No time que venceu a Copa do Mundo de 2002, Edmílson partia para o ataque para fazer gol. Júnior era lateral esquerdo mas ia sempre à frente pelo Flamengo e a Seleção. E o que dizer de Marinho Chagas, Nelinho, Leandro?
O ala de hoje em dia é mais complexo porque opera num sistema que envolve todo o time. Antigamente, partir para cima era mas uma iniciativa de laterais aventureiros. Cafú e Roberto Carlos também servem de exemplo para estes europeus que atravessam o campo feito locomotivas, consagrando o futebol de três.
CRAQUE DAS LENTES
texto: André Mendonça | fotos: André Durão
André Durão
Depois de um longo tempo, a equipe do Museu da Pelada apresenta mais um “Craque das Lentes”. A fera da vez é André Durão, fotógrafo do portal Globoesporte.com há mais de 10 anos, que, gentilmente, nos enviou uma bela galeria de fotos sobre futebol. Apaixonado pela fotografia desde os 13 anos, André nos contou um pouco sobre a brilhante carreira e a relação com o esporte.
Embora não tenha sido um craque dentro das quatro linhas, o fotógrafo tratou de se destacar na beirada delas. Em 1982, fez sua estreia no Maracanã, ainda como estagiário, auxiliando o fotógrafo Ari Gomes, e se encantou com a atmosfera do estádio. No ano seguinte, começou a carreira profissional no Jornal do Brasil e passou a ganhar destaque por conta dos cliques na beira do gramado.
– Ainda trabalho nos gramados e minha ideia é nunca parar. Se o Globoesporte.com deixar, quero ficar até não conseguir mais fotografar. Espero que esse dia demore muito a chegar!
Aos 13 anos, após muito insistir ao pai, foi matriculado em um curso na Associação Brasileira de Arte Fotográfica (ABAF) e passou a ter dificuldades para conciliar as aulas com as peladas e os treinos de basquete, esporte preferido no qual se destacava na juventude. Federado no esporte da bola laranja por 16 anos, desde a categoria infantil, André precisou tomar uma decisão difícil, e abandonou os treinos do basquete para se dedicar exclusivamente à fotografia.
Apesar de, na época, ter sido um duro golpe para o garoto, não temos dúvida que foi uma decisão extremamente sábia, o que pode ser comprovado pelo vasto currículo de coberturas do fotógrafo: Copa do Mundo, Olimpíadas, Copa das Confederações, Copa América, Mundial de F-1 e mundiais de vários outros esportes pré olímpicos.
– Acho que foi a escolha certa! Me dedico muito ao que faço. Quando saio para fotografar, não vejo como um compromisso e sim como uma oportunidade de brilhar e fazer uma bela foto, que é o que mais gosto – disse André, que também ressalta a importância do respaldo familiar para se alcançar o sucesso.
Estudioso, o fotógrafo revelou que costuma analisar os jogadores antes das partidas para se posicionar da melhor forma possível e fazer os mais belos registros. Admitiu, no entanto, que assim como o bom goleiro, o bom fotógrafo precisa de sorte.
– Vejo qual é o lado que o jogador costuma correr para comemorar, qual jogador chuta de longe, qual faz mais gols de cabeça etc. O resto é ficar prestando atenção na partida e esperar um lance bonito. Só quem adivinha o que vai acontecer é a Mãe Dinah – brincou.
Se as competições em que cobriu já não fossem o bastante para comprovar o êxito na profissão, podemos falar ainda dos estádios que foram palco dos cliques do fotógrafo. Tendo fotografado em quase em todos do Brasil e alguns do exterior, como San Siro, na Itália, o craque elege o palco da estreia como o mais especial.
– O Maracanã, sem dúvidas é meu estádio preferido. Também gosto muito de fotografar jogos da Libertadores fora do Brasil, pois a pressão da torcida deixa você mais ligado nos lances!
No fim, ao ser perguntado se é melhor com a câmera ou com a bola, André foi taxativo:
– Pergunta pra galera do Globoesporte.com. Me chamam todo dia para fotografar, mas para a pelada só fui chamado uma vez! – finalizou, de forma divertida.
BIGUÁ, O PRIMEIRO ‘DEUS DA RAÇA’ RUBRO-NEGRO
por André Felipe de Lima
Torcedores rubro-negros na faixa dos 40 anos cresceram vendo o zagueiro Rondinelli, o que marcou, de cabeça, o gol do título estadual de 1978 sobre o Vasco, como o “Deus da raça” do Flamengo. Mas, na década de 1940, outro defensor rubro-negro, o ex-lateral-direito Biguá, merece a primazia sobre o apelido. Até o surgimento de Leandro, foi ele o mais emblemático lateral-direito que passou pelas hostes da Gávea. Hoje, dia 22, Biguá faria 96 anos.
Mario Filho foi um dos que reconheceram a disposição do guerreiro Biguá: “Era tido como um índio. Se não fosse o cabelo de boneca japonesa seria tomado por preto. Era baixo, atarracado, de pernas grossas, de poltrona. Mas, tocando no chão, subia feito uma bola de tênis. Quando se enfurecia parecia um daqueles indígenas dos poemas de Gonçalves Dias. Ou melhor, um apache ou sioux de fita americana, de machado em punho para escalpelar um pale face [pele branca – referência a luta dos indígenas nos Estados Unidos].”
Moacir Cordeiro — assim se chamava o ídolo — nasceu em Irati, interior do Paraná, em 1921. Tinha personalidade. Foi marcador implacável, mas não era técnico. Ao lado de Modesto Bria e Jayme de Almeida formou uma eficiente linha média do Flamengo dos anos de 1940. Para o extraordinário ponteiro-esquerdo Félix Lostau, da “La máquina” do River Plate, nos anos de 1940, Biguá foi o seu melhor marcador.
Biguá teve um grande amigo dentro e fora dos gramados, o ponta-esquerda Chico, do Vasco. E, no próximo sábado, 25, haverá clássico entre Vasco e Flamengo. Os dois craques do passado são símbolos históricos de que o futebol permite paz entre rivais.
O grande Biguá foi titular absoluto nas equipes do Flamengo que conquistaram o primeiro tri-campeonato carioca para o clube em 1942, 43 e 44. Quem o admirava era o zagueiro Domingos da Guia, que já em final de carreira no Corinthians convidou Biguá para trocar a Gávea pelo Parque São Jorge. Biguá quase aceitou. Prevaleceu, contudo, a paixão pelo Flamengo. “E no dia em que o Corinthians jogasse contra o Flamengo, como é que eu ficaria?”. Amava tanto o Flamengo que, do banco de reservas, chorou ao ver os mais jovens conquistarem o campeonato estadual de 1953, que abriria o caminho para o segundo “tri” do Rubro-negro.
O jogo de despedida de Biguá, contra o Botafogo, no dia 3 de novembro de 1953, foi uma das passagens mais bonitas da história do Flamengo. Pegou uma bola e chutou para torcida guardá-la como emblema daquele dia inesquecível. A torcida o aplaudiu efusivamente.
Após uma volta olímpica no gramado do Maracanã, o craque entregou suas chuteiras ao novato meia Carlinhos, o futuro “Violino”, como seria chamado ao longo da década de 1960. Após Biguá “passar” a chuteira para Carlinhos, o craque tentou chutar uma bola para a arquibancada, mas foi tão sem força que a pelota caiu na geral.
De tão emocionado, Biguá correu em direção ao primeiro túnel que viu. Era o do Botafogo. Carlito Rocha, o folclórico cartola alvinegro, apertou-o contra o peito e disse: “Pena que no futebol haja poucos iguais a você”.