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NETO DE PEIXE


Luiz Garrincha

Com muito orgulho, recebemos diversas mensagens dos nossos queridos seguidores. São críticas, elogios e sugestões que nos motivam a seguir em frente. Na última segunda, fomos surpreendidos com um recado de Luiz Garrincha, neto de ninguém menos que uma das maiores lendas do futebol mundial.

Resenha pra lá, resenha pra cá, descobrimos que Luiz treinou em clubes até os 16 anos e, mesmo com a pressão por ser neto do anjo das pernas tortas, se saía muito bem nos jogos. O curioso é que Luiz jogou no mesmo clube que abriu as portas para Garrincha, o Esporte Clube Pau Grande.

– Todos falavam que eu levava jeito,  mas não continuei a carreira. Às vezes, com um bom drible, também entortava uns marcadores.

Embora tenha abandonado os gramados, Luiz não consegue ficar muito distante deles, pois se juntou a Ronaldo Fenômeno e se tornou uma espécie de olheiro, sempre atrás dos novos talentos. Ao ser perguntado sobre a possibilidade de surgir um novo Garrincha, não titubeou:

– Acho difícil! Hoje eu vejo o futebol com muita maquiagem! Ele fez a história dele sozinho, sem ajuda de empresários. Hoje o futebol virou um negócio.

Fora de campo, Luiz Garrincha conseguiu marcar um gol de placa que deixaria até seu avô orgulhoso. Numa iniciativa louvável, fundou a ONG Mané Garrincha, que conta com o apoio da CBF, do Botafogo e de Flávio Lopes, representante das lojas do clube alvinegro. Localizado na Vila Cruzeiro, o projeto social recebe 1550 crianças para vários tipos de atividades.

Em março deste ano, por exemplo, Luiz Garrincha proporcionou uma experiência incrível para as crianças, organizando uma excursão até o Museu da Seleção. 

– Pra mim é uma honra, pois pude ver a história da nossa seleção. Só tenho a agradecer a todos que possibilitaram nossa visita – disse Caio César, de 17 anos, em entrevista para a CBF TV.

E a família Garrincha segue fazendo gols de placa…

DÊ-LHE O BANCO E LHES DIREI QUEM É

por Zé Roberto Padilha


por Zé Roberto Padilha

As câmeras do Globo Esporte, durante o jogo do Vasco contra o Bahia, se revezaram entre o gramado e o banco de reservas de São Januário. Pela primeira desde que chegou como solução no segundo semestre do Campeonato Brasileiro de 2015, Nenê ficava entre os reservas. E poucos cumpriram seu papel como ele: mesmo com o péssimo primeiro turno, fez do segundo uma emocionante escalada de recuperação que durou até a última rodada. Ano seguinte, trouxe o seu time de volta a primeira divisão e ainda ajudou o clube a ser bi-campeão carioca. E jogando todas as partidas.

Mas na medida em que encarava com naturalidade sua estada no banco, torcendo e comentando normalmente os lances com seus companheiros, vibrando com o gol da sua equipe, a reportagem, que virou seu foco para lá atrás de revolta e inconformismo, foi deixando de lado suas tomadas. Foram atrás de audiência, não de anuência.


Nenê no banco de reservas

Aí vem o clássico com o Fluminense, dentro de São Januário, e novamente Nenê é escalado para o banco de reservas. Durante a semana, Rodrigo, dispensado e contratado pela Ponte Preta, joga o veneno no ar de Campinas:

– O próximo a ser dispensado será o Nenê!

Mas o Nenê não é o Rodrigo, joga pela arte, não pela violência. E a arte é um produto da paz, do amor, já a violência é o desaguar da revolta, da insatisfação, do futebol ruim que andam praticando. Sem lhe dar o troco, os repórteres nem se aproximaram dele para dar entrevistas, aí o meio da bola, que é cruel, joga no ar pelas resenhas: “Deve estar acomodado. Nem reclamou do treinador!”.

Mas se o futebol não é justo, os deuses que o amparam são. No ultimo sábado, entrou quando o time estava perdendo por 2×1, ajudou a organizar o meio-campo para alcançar o empate e se colocou no lugar certo para definir, com um chute forte e cruzado, a vitória. Nenê foi, mais uma vez, o herói vascaíno. E quanto tempo o Vasco não sabe o poder e o carisma de um deles.


Se já nutria admiração pelo seu futebol, depois da partida contra o Fluminense passo a admirá-lo como homem. Na política há uma máxima: “Dê-lhe o poder e saberemos o homem que é!”. No futebol, a partir de sábado, a máxima passa a ser: “Dê-lhe o banco. E conhecerás de perto a grandeza de um jogador!”. Mesmo chateado como tricolor, um apaixonado pelo futebol como eu não poderia deixar de reconhecer: Parabéns, Nenê! Agora, com o seu exemplo, sua humildade, muitos jogadores passarão a encarar o banco de reservas como ele foi concebido, um trunfo, uma banco de dados, não uma reunião de cacos. Uma estratégia para o treinador e não uma tragédia na vida de cada um jogador.

MADEIRA DE LEI E DE VIDA, UM DOMINGO NA VÁRZEA EM MAUÁ

por Marcelo Mendez


(Foto: Reprodução)

São as singelezas que definem o futebol de várzea.

Acordar cedo num domingo, ver o dia começando, os carrinhos de feira rumo às frutas e verduras na periferia, os desejos de bom dia sendo trocados, o cheiro de frango assado vindo das máquinas que ficam nas calçadas, os instrumentos de samba sendo preparados para logo mais tarde, o jogo no campo do bairro, nas primeiras, ou segundas horas da manhã.

O que há de mais poético no rolar da bola marrom se encontra pelas ruas estreitas que nos levam para os campos dos arrabaldes do Brasil.

Dessa forma, rumamos eu e Marcelo Ferreira para o campo do América de Mauá. Um terrão situado na fronteira do Jardim Kennedy com o outro dos Jardins da periferia, o Jardim Mauá. No campo, mais do que apenas um espaço pra as atividades ludopédicas, se encontrava a resistência do mundo bucólico das províncias ante esse urbanismo louco, individualista e solitário dos dias de então.

A cancha fica no alto de um vale, adornado por comunidades um raro matagal e suas trilhas, onde o tempo é muito diferente da vida nos outros jardins de pedras que vivemos. Ali, garotos que não têm (E não precisam ter…) super smartphones, andam a cavalo, passeiam assim em seus domingos matinais.

Perto de mim, carrinho de vendedor de churrasquinho, bar do campo, isopor de cerveja, rosto colado na grade e muita alegria. Teríamos um jogo e nele, para muito mais que só o jogo, um personagem roubou a cena…

MADEIRA, A RESERVA POÉTICA NECESSÁRIA…


Madeira em ação no comando do Scorprions Mauá (Foto: Victor Limeira/Diário da Várzea

Madeira não é um sujeito que se rende fácil aos padrões vigentes do que se tem como recomendável, segundo as conveniências.

Brasileiro, nordestino, trabalhador, morador da cidade de Mauá, mais do que o técnico do Scorpions, Madeira é o que há de mais autêntico dentro da luta que é para o povo simples, sobreviver nesse mundo louco que vivemos.

Madeira é diretor, presidente, massagista, torcedor, apaixonado e tudo mais do seu time. O seu Scorpions enfrentaria o Dragões Nova Mauá, pela terceira rodada do campeonato de várzea da cidade. Aos que leem mais desavisados, isso pode não valer lá muita coisa e, então, para isso serve a crônica aqui escrita.

Aos 30 segundos de jogo, Madeira já vocifera contra a arbitragem! Na beira do campo, ele pula, vibra, xinga, torce, dirige a equipe. Não perde lá seu tempo com táticas mirabolantes, é sábio e entende que isso de nada serve para vida. Ali, ele fica de olho em tudo:

No arbitro auxiliar que não manda os adversários ficarem sentados no banco, na mesária que fica de olho no “zap-zap”, nas bolas que são chutadas para longe, nos erros da arbitragem, na cera do adversário, nas caneladas de seu atacante que perde gol feito, nos erros do bandeira que está a 50 metros dele… Madeira é o olho da vida!

Corre pra la e pra cá, invade o campo de jogo, dá dura em seus jogadores, reclama quando leva o primeiro gol, reclama do tempo, dos acréscimos… Luta! Madeira é sabedor do quanto é necessário na vida, se posicionar. Lutar pelo que se crê, não desistir jamais do que se sente, nunca… Nunca abandonar sua paixão!

O amor que Madeira tem pelo seu time de várzea é o que salva o mundo dessa mesmice, desse não-amor que os tempos bicudos nos impõe.

Como tal não podia ser diferente, Madeira arrumou mais um quiprocó por lá e foi expulso do campo. Do lado de fora enquanto reclamava sua sorte, viu seu time empatar o jogo.

Vibrou como se fosse um Rei, se alegrou como se a vida fosse bela e decerto, a de Madeira é bela sim.

É bela a vida de Madeira porque ele a encara com força, com vitalidade, com poesia, com paixão. Nada falta a ele porque em suas atitudes de coração ele é pleno. É uma honra para esse cronista ficar perto de um homem assim por alguns minutos. Madeira é um homem que faz bem a vida e faz o mesmo bem ao futebol de várzea. Por isso tudo falo dele hoje aqui nessa crônica…

Madeira é a única chance que a alegria tem para ser eterna.

A FORÇA DA POESIA

:::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


(Foto: Nana Moraes)

O duro é ter que ouvir José Mourinho, técnico do Manchester United, declarar após a conquista da Liga da Europa sobre o Ajax, que poetas não conquistam títulos. É a comprovação do engessamento da arte.

Qual a diferença dos marcadores que o nosso Mané Garrincha entortava para os de hoje, que não conseguem alcançar o Messi? Os “especialistas” insistem em dizer que os craques do passado não teriam vida fácil hoje. É muito desagradável ouvir essas baboseiras.

O que houve ao longo dos anos foi um dever de casa bem feito pelos adeptos do futebol força e, talvez por isso, os técnicos italianos, seus maiores garotos-propaganda, sejam os mais valorizados do mundo. Não gosto do estilo, mas isso é o mais gostoso do futebol, o confronto de escolas. E a Itália cumpre muitíssimo bem esse papel do ferrolho.


Romário disputa bola com Baresi na final da Copa de 94.

Perguntem ao Romário quem foi seu melhor marcador e ele dirá Baresi. Reparem quem dirige os melhores times do mundo. Marcello Lippi foi campeão do mundo em 2006, após fazer um trabalho excelente na Juventus. Em 2011, Roberto Mancini foi campeão pelo inglês Manchester City. Claudio Ranieri deu o título inglês de 2016 ao Leicester. O que dizer de Carlo Ancelotti, campeão pela Juve, Milan, Chelsea, PSG, Real Madrid e Bayern???? Agora temos o Antonio Conte, atual campeão pelo Chelsea, e o Massimiliano Allegri, da Juve.

Por que esses técnicos são tão valorizados? Porque aprenderam a criar sistemas defensivos fortíssimos para impedir a penetração de jogadores talentosos como, por exemplo, Neymar .

Na final de 70, quebraram a cara, kkkkk!!!!


Aprenderam a ganhar títulos se defendendo. Mas vale a reflexão: como furar esses bloqueios fortíssimos? Investindo cada vez mais no futebol-arte, na tabela rápida, na velocidade e no preparo físico, sim! Os atletas sem técnica estão cada vez mais preparados fisicamente.

O Barcelona é o melhor exemplo de que o futebol-arte ainda tem espaço. O Messi é um velocista, mas sabe o que fazer com a bola, pensa antes desses zagueiros-robôs programados para marcar e dar carrinhos. O Iniesta é franzino, mas sua rapidez de raciocínio é espantosa. O Pelé tinha um preparo físico invejável e, por isso, superava os brucutus.

Moral da história? Treinem, craques, treinem porque a turma do futebol-força está fazendo o dever de casa direitinho e precisamos provar que não há muros capazes de frear nossa poesia.


– texto publicado originalmente no jornal O Globo, em 29 de maio de 2017.  

Alex Kamianecky

XERIFÃO DO BEM

entrevista: Sergio Pugliese |  texto: André Mendonça | fotos e vídeo: Guillermo Planel | edição de vídeo: Daniel Planel

No último sábado, a equipe do Museu da Pelada levantou cedo! Embora o compromisso fosse apenas à tarde, a ansiedade pelo encontro era tanta que fomos os primeiros a chegar ao evento, na verdade ao bar vizinho da Livraria Folha Seca, onde “Alex Coração Americano – O Campeão do Jogo Limpo”, biografia de Alex Kamianecy, o maior e mais leal zagueiro da história do América-RJ, seria lançada. E o dono do bar se deu bem porque quando o autor chegou, o americano roxo Silvio Kohler, eu, Sergio Pugliese, Guillermo Planel e Alexandre Niemeyer já estávamos na décima gelada.


O escritor Silvio Kohler e o zagueirão Alex

– Sou do Sul e adoro uma loura. Desce mais uma! – já chegou avisando Silvio enquanto puxava uma cadeira e juntava-se a nós e a Rodrigo Ferrari, dono da Folha Seca, a mais carioca das livrarias.  

Aos poucos a Rua do Ouvidor foi tomada pelo vermelho das camisas dos torcedores. E eram muitos!!! Quem diz que essa torcida é pequena engana-se. É grande e fiel às tradições. Por isso, os gritos de “Sangue” na chegada do grande ídolo. Aos 71 anos, bronzeado e malhadão, chegou caminhando lentamente, elegante e discreto, da mesma forma como atuava, apesar da força física. Rapidamente o cercamos para a esperada entrevista e mandamos na lata, talvez inspirados por tantas Originais.

– Zagueiro que se preza recebe Belfort Duarte?

O troféu era destinado aos jogadores mais leais do campeonato e ironizado por zagueiros-zagueiros como Moises, do Vasco.

– Acho que segui o caminho certo, era o meu estilo.


(Foto: Reprodução)

E seguiu mesmo. Pelo América, foram mais de 600 jogos e o título da Taça Guanabara de 74. Em 77, recebeu o prêmio Belfort Duarte e figurou entre os 40 pré-convocados para a Copa de 70, mas não fez parte da lista final, assim como seu parceiro Eduzinho, que prestigiou o evento e, assim como Alex, considera essa ausência de 70 o momento mais triste da carreira.

Para lhe arrancar um sorriso, no entanto, basta falar do América. Se alguém ainda tem dúvidas da paixão de Alex pelo clube saiba que quando o xerifão do bem se transferiu para o Sport, após mais de 10 anos no Mecão, exigiu uma cláusula no contrato para não entrar em campo contra a ex-equipe.

– O América sempre fez parte da minha vida.

Por tanta dedicação e lealdade com os companheiros, Alex se tornou um ídolo incontestável do clube. Por isso, a onda vermelha e branca ia tomando cada vez mais conta da Rua do Ouvidor para conseguir um livro autografado do craque. Uma forma, talvez, dos saudosos torcedores relembrarem os anos gloriosos do Mecão, que hoje está na Série B do Carioca e não disputa nenhuma das divisões do Brasileirão.


Alex e Tia Ruth.

– O América é fora de série!! – ironizou um torcedor.

Torcedora símbolo do alvirrubro, Tia Ruth, de 92 anos, precisou segurar a emoção ao abraçar seu maior ídolo, entregar duas rosas – uma branca e outra vermelha – e cantarolar em seu ouvido uma música de Roberto Carlos:

Eu tenho tanto pra lhe falar / Mas com palavras não sei dizer / Como é grande o meu amor por você!

Alex chorou e retribuiu o carinho da torcedora com sorrisos sinceros e uma longa dedicatória em sua biografia. A fila de autógrafos já dobrava a esquina. Álvaro Canhoto, lenda do futebol de salão, era um desses fãs. Eduzinho Coimbra, outro. A torcida entoava ”Hei de torcer, torcer, torcer, hei de torcer até morrer…”. Guillermo Planel registrava tudo com sua câmera, Pugliese comentou comigo sobre o belíssimo hino do América, composto por Lamartine Babo, “o mais bonito de todos”, segundo ele, em seguida chamou o garçom e em homenagem ao Mecão brindamos mais uma.