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Mauro Galvão + Odvan

MURALHA DA COLINA

texto e entrevista: Wesley Machado | fotos: César Ferreira | vídeo: Ramatis Pessoa | edição de vídeo: Daniel Planel 

No dia 28 de maio, os moradores de Campos dos Goytacazes-RJ tiveram o privilégio de ver o reencontro de dois grandes parceiros do futebol. Mauro Galvão e Odvan, zagueiros que se complementavam, aliando técnica à força, bateram um papo descontraído com a equipe do Museu da Pelada.

Na hora de posar para a foto que ilustra o texto, o brincalhão Odvan ficou preocupado com a bola, a qual Mauro considerou “velhinha”.


Wesley Machado, Odvan, Mauro Galvão e Ricardo Antônio (Divulgação)

– O Edmundo vai pegar no pé da gente – disse Odvan.

Mauro Galvão e Odvan afirmaram que ainda disputam alguns jogos festivos pelo time de master do Vasco e pela Seleção Carioca.

Mas quando propus que os dois fossem fotografados batendo uma bolinha (de futsal), Mauro falou que não tinha necessidade.

– Todos sabem que nós jogamos bola – comentou Mauro.

A conversa passou pela carreira dos dois, que jogaram e conquistaram vários títulos em grandes clubes e na seleção brasileira.

No final, ao ser perguntado sobre uma história boa de concentração, Mauro falou que tinha uma que não podia contar.

– Só depois da meia noite – desconversou Mauro, que comemorou com o Odvan o fato de ter marcado o gol do título do Vasco no Carioca de 1998.

Os dois se abraçaram, deram risada e reafirmaram a grande amizade que construíram dentro e fora dos gramados.

Quem também estava presente no Encontro de Colecionadores de Camisas de Futebol no Instituto Federal Fluminense (IFF), era César, artilheiro do Campeonato Brasileiro de 1979 pelo América-RJ e autor do gol do título do Grêmio na Libertadores de 1983. Natural de São João da Barra-RJ,  o goleador mora atualmente na cidade natal, vizinha a Campos, no norte do estado do Rio de Janeiro.

O MAESTRO

por José Dias


Errou quem imaginou, ao ler o título da postagem, que falaria sobre o grande JÚNIOR – o MAESTRO.

Esse eu também vi jogar e trabalhamos juntos.

Tenho observado, há algum tempo, através do noticiado pela imprensa (não gosto de “mídia”), as mais diversas informações, notas, críticas, elogios, reportagens de página inteira, meia página ou coluna sobre os personagens que exercem nos clubes as funções de treinador, supervisor, vice-presidente e, mais um novo na praça – diretor executivo. O treinador é o mais visado.

1. Treinador – Convivi com pelo menos 40 profissionais, dentre professores, técnicos, treinadores, treineiros e curiosos. Foram 40 cabeças pensando de forma diferente uma das outras. Autoritários, complacentes, vingativos, omissos, inseguros (principalmente), indiferentes, donos da verdade, competentes, incompetentes e, muitas vezes taxados de desonestos. 

Treinador que durante o início de uma temporada conseguiu manter sua equipe “n” jogos sem perder ou na 1ª colocação da competição que estava disputando e, de repente, assume um outro clube. Qual a expectativa? Se a nova equipe estiver mal, é que vai melhorar. Afinal de contas, chegou o “salvador”. Porém o que pode acontecer e acontece muitas vezes. Com poucos jogos sob sua direção a nova equipe vai mal. E aí? Mais um treinador demitido. Por que, sei lá?

Para esse eu tiro meu chapéu!

ZAGALLO – Numa de minhas ideias será o grande homenageado.


(Foto: Reprodução)

Vi jogar e trabalhamos juntos e se não fosse por ele, com certeza não estaria aqui, no Museu, chateando os que acompanham.

Existe um princípio na Administração que diz – uma pessoa vai bem em algum lugar e, desempenhando a mesma função num outro, não consegue obter os mesmos resultados.

O que aconteceu? Sei lá, principalmente no futebol. O “cara” é durão, não se submete à pressão de dirigente, da torcida, da imprensa e principalmente dos jogadores – seu destino, “a forca”. Significa, também, que o oposto pode surtir algum efeito, mas nunca duradouro. Vai ter seus 15 minutos de fama – seu destino “a forca”.

O profissional que desempenha esta função deve receber, da direção do clube, todo o apoio logístico possível para bem poder trabalhar. Se o grupo de jogadores colocados a sua disposição não for de primeira linha, o que se pode esperar – muito trabalho e muito empenho de todos para superar a diferença que os separa de outras equipes e em hipótese alguma o treinador poderá ser responsabilizado por uma não conquista de títulos e, em alguns casos, um possível rebaixamento.

Mas o clamor da torcida, da imprensa que não lhe é simpática, do patrocinador, que às vezes não é tão patrocinador assim e, principalmente, da direção que se acovarda, tornando-se incapaz de assumir suas responsabilidades e culpas. Direção que deveria enfrentar os descontentes e mantê-lo no cargo.

Um dos argumentos é de que recebem muito bem e têm a obrigação de andar atrás deles, forem onde forem. Treinador não é babá! Tampouco é “bedel” de escola. Aliás, ninguém é. Qualquer empresa sabe como lidar com seus funcionários, por que só no futebol tem que ser diferente.


(Foto: Reprodução)

Agora, no dia em que os treinadores se conscientizarem que são apenas funcionários com a missão de orientar a equipe tecnicamente e taticamente e que existem outros funcionários, pelo menos um para cada função, e deixarem a ideia de que só eles têm a solução para todos os problemas, talvez passem a ser olhados de outra maneira.

Mas o que será que os treinadores pensam? Sou assim porque preciso me proteger. Não dou oportunidades para outros porque podem querer me dar “uma rasteira”. No fim, quem se ferra sou eu! “Farinha pouca, meu pirão primeiro”!

Muitas coisas mais poderiam ser ditas e poderíamos ser injustos.

Para encerrar, vou dizer uma coisa jamais dita na história deste País – pode ser o melhor treinador do mundo, se não ganhar, f……-se (acertou quem completou com …errou).

NAQUELE TEMPO ERA ASSIM…

por Victor Kingma


Victor Kingma

1969 – O homem na Lua e o milésimo gol de Pelé

Certos acontecimentos marcantes, ocorridos em determinada época, são constantemente relembrados devido à sua importância histórica. E quando o assunto é futebol, então, os boleiros nunca se esquecem. Mas nem sempre as pessoas se lembram de outros fatos importantes acontecidos na mesma ocasião.

Esse texto volta ao tempo e relembra alguns fatos relevantes que aconteceram em 1969, um ano marcado por acontecimentos extraordinários. É uma oportunidade para os contemporâneos recordarem e os mais jovens tomarem conhecimento sobre como era a vida, os costumes e o que de importante acontecia, há quase cinco décadas.

Na música, três grandes sucessos estouravam nas paradas de sucesso: “As Curvas da Estrada de Santos”, de Roberto Carlos, “Aquele Abraço”, de Gilberto Gil e “País Tropical”, de Jorge Ben, na interpretação marcante de Wilson Simonal. 

No cenário da música internacional o destaque foi a realização, em agosto, do Festival de Woodstock, para muitos o maior evento de rock and roll de todos os tempos. Realizado em uma fazenda em Bethel, New York, o evento reuniu quase 400 mil pessoas e contou com a presença de astros consagrados como Janis Joplin, Santana e Jimi Hendrix.

O grande sucesso na televisão brasileira era a novela Beto Rockfeller, na TV Tupi. Escrita por Bráulio Pedroso e estrelada pelo ator Luiz Gustavo, a trama representou uma revolução na teledramaturgia, pois pela primeira vez em uma novela foram abordadas gírias e situações do cotidiano, em substituição aos dramalhões tão comuns na época.  

Na política vivíamos os anos de chumbo e um acontecimento marcante, que ganhou manchete no mundo todo, foi o seqüestro do embaixador americano Charles Elbrick, em 04 de setembro, numa ação idealizada pelo Movimento Revolucionário 8 de Outubro – MR8.  O embaixador foi libertado dias depois, trocado por 15 presos políticos, entre os quais Wladimir Palmeira e o ex-ministro José Dirceu.  


O fato de de maior repercussão mundial, no ano de 1969, aconteceu no dia 20 de julho quando os astronautas americanos Edwin Aldrin, Michel Collins e Neil Armstrong pousaram na lua. Armstrong, o comandante da nave espacial Apollo 11, entrou para a história como o primeiro terrestre a pisar o solo lunar.

E no futebol?

No futebol, todas as atenções estavam voltadas para a partida disputada entre Santos e Vasco, pelo torneio Roberto Gomes Pedrosa, em 19 de novembro daquele ano. Pela primeira vez na história um jogador estava prestes a marcar mil gols em sua carreira. E esse feito extraordinário foi reservado pelos deuses do futebol exatamente para o maior de todos os tempos, que futuramente seria escolhido o atleta do século.

65.157 pagantes estavam no Maracanã naquela noite de quarta feira e milhões de telespectadores de todo o Brasil acompanhavam em frente aos aparelhos de TV, assistindo a transmissão em preto e branco. Aliás, as cores das camisas dos times envolvidos.

O jogo, empatado em 1 x 1, caminhava para o final quando, aos 33 minutos do segundo tempo, o zagueiro Fernando, do Vasco, comete pênalti. Pelé pega a bola e a coloca na marca. Atrás do gol uma multidão de repórteres e fotógrafos aguardam a conclusão do lance para eternizarem o momento.

Embaixo das traves o goleiro argentino Andrada, que estava tendo uma exibição de gala, aguardava, imóvel e confiante, a cobrança. Ele havia prometido a si próprio que não entraria para a história como o goleiro que tinha levado o milésimo gol.

Pelé, o maior artilheiro que o futebol já viu, corre vagarosamente e toca a bola no canto esquerdo do goleiro que voa como um felino, chega a tocar na pelota mas não evita o gol. O relógio marca 23h17 daquela noite histórica.

Enquanto Andrada, desolado, socava o chão por não conseguir fazer a defesa, Pelé, emocionado, era carregado nos braços, entre microfones e flashes,  após realizar o feito inédito.

O rei do futebol, que ainda viveria o ápice de sua carreira no ano seguinte, ao conquistar o tri-campeonato mundial, no México, como protagonista de uma seleção de sonhos, marcaria em toda a sua carreira 1283 gols.


(Foto: Reprodução)

O mais bonito deles, segundo seu próprio relato, foi assinalado contra o Juventus, na Rua Javari, pelo Campeonato Paulista de 1959, após dar três chapéus consecutivos nos zagueiros Julinho, Homero e Clóvis e o quarto no goleiro Mão de Onça. Entretanto, aquele gol de pênalti, assinalado no Maracanã, naquela noite de quarta feira, 19 de novembro de 1969 foi, com certeza, o mais difícil e inesquecível de toda a sua consagrada e inigualável carreira.

CORRIDA CONTRA O TEMPO

por Fabio Lacerda


Todo artilheiro carrega consigo um peso às costas. Quando está brigando pela artilharia é natural que o clube que ele defende esteja almejando as primeiras colocações dos certames. Dizem que ser goleiro é a pior posição em campo porque uma falha compromete a performance individual, coletiva e coloca em risco o êxito do time. Mas quem escolhe jogar de centroavante abraça a causa coletiva e individual. 

Fred desencantou no Brasileiro depois de cinco rodadas. Artilheiro solitário na vitória sobre o Avaí, no Independência, jogo válido pela quinta rodada. Artilheiro por três vezes do principal campeonato do país, autor do gol mais rápido do mundo quando ainda era juniores do América-MG, este moço faz valer o jargão das Alterosas: mineirinho come quieto para comer mais! 

Único jogador do país que pode ser artilheiro do Campeonato Brasileiro por quatro vezes, Fred também está na cola de Romário na Copa do Brasil. O Baixinho é o maior artilheiro da segunda competição mais importante do país com apenas três gols à frente do goleador de Teófilo Otoni – 36 contra 33. Fred é o maior artilheiro da Copa do Brasil numa única edição com 14 gols marcados pelo Cruzeiro em 2005.


No seleto e restrito grupo de artilheiros por três vezes do Brasileiro, Fred está lado a lado de Dario “Peito de Aço”, o único jogador que parava no ar como helicóptero e beija-flor, Túlio, o artilheiro irreverente que era frio como um iceberg à frente do gol, e Romário que cravou seu nome no lugar mais alto da tabela de artilheiros já veterano (primeira vez que foi o maior feitor de gols em Brasileiro ele tinha 34 anos em 2000). 


A ida de Fred para a França defender o Lyon em 2005 até 2009 afastou o artilheiro de cinco edições do Campeonato Brasileiro. O que isso quer dizer? Muita coisa! O atacante foi viver numa das cidades mais belas da França, cuja gastronomia é uma referência mundial. Mas o camisa 9 à moda antiga poderia ter comido a bola por aqui. Sua ida ao Lyon traçava uma sequencia de títulos nacionais, porém, a chance de ganhar uma Liga das Campeões ou uma Copa da UEFA, agora chamada de Europa League, era inimaginável diante dos gigantes do Velho Continente. E esse hiato de cinco anos no Brasil o coloca diante de um desafio: fazer mais 63 gols nos próximos três ou quatro anos para tornar-se o maior artilheiro e superar Roberto Dinamite com 190 gols, honraria esta que o “camisa com cheiro de gol” sustenta desde 1989. Provavelmente, o atacante do Atlético-MG tenha se deparado com essa informação após quem vos escreve ter entrado em contato com sua assessoria de imprensa para escrever ao MUSEU DA PELADA. Espero ter aguçado esse desejo e desafio no atacante do Leste de Minas, região esta que carrego no meu coração pelo fato de meu pai ter nascido no Vale do Aço e ter chegado ao Rio de Janeiro aos 14 anos. 


Fred chegou a 128 gols na história dos Campeonatos Brasileiros – 13 gols pelo Atlético-MG, 91 pelo Fluminense e 24 pelo Cruzeiro – deixando Serginho Chulapa para trás. Ainda neste Brasileiro, Túlio com 129 gols, e Zico, com 135, serão superados. Se os próximos quatro anos contando com a competição em andamento o Fred tiver uma média de 15,5 gols por edição de Brasileiro, ele tornar-se-á o maior artilheiro da história dos Campeonatos Brasileiros. Aos 33 anos, somente lesões graves podem desvirtuar o artilheiro do caminho. Em 2012 e 2014 pelo Fluminense, Fred balançou as redes 20 e 18 vezes, respectivamente. Ano passado foram 14 gols dividindo a artilharia com Diego Souza (Sport) e William Pottker (Ponte Preta e atualmente no Internacional). 

A verdade é que, se tivesse rechaçado a ida para a França, hoje, Fred já teria superado Roberto Dinamite e estaria aumentando sua diferença para o ex-camisa 10 do Vasco que atingiu a marca de maior artilheiro jogando pela Portuguesa de Desportos sob o comando de Antônio Lopes, em 1989, quando o seu time de coração sagrou-se campeão brasileiro. Ironia do destino não!? 


Nessa crônica, peço com todo o respeito a opinião de Paulo Cezar Lima, nosso embaixador do Museu da Pelada que também jogou na França entre 1974 e 1975. É possível fazer esse prognóstico, Monsieur Caju? Embora tenha feito o primeiro gol no Campeonato Brasileiro, Fred já foi às redes 19 vezes em 25 partidas em 2017. Será que o jogador sedento por gols vai acelerar a partir de agora para reduzir a diferença para Roberto Dinamite e levar o Galo Doido ao tão sonhado título de campeão brasileiro depois de 46 anos? Apostem suas fichas! Nunca duvidemos de um artilheiro nato! 

CACÁ, UM ÍDOLO BOTAFOGUENSE, PARTIU

por André Felipe de Lima


(Foto: Reprodução)

Carlos de Castro Borges, o lateral-direito Cacá, esteve próximo de realizar um sonho para qualquer jogador de futebol: defender a seleção brasileira em uma Copa do Mundo. Em abril de 1958, o técnico Vicente Feola preparava a lista que de craques que iriam à Suécia para defender o escrete. Cacá era nome certo, mas, na última hora, Feola desistiu de levá-lo e convocou De Sordi e Djalma Santos. Até hoje o motivo para corte de Cacá não ficou muito claro. João Havelange, que à época era o mandachuva da seleção, mostrou-se surpreso com a saída de Cacá e acreditava, num primeiro momento, que o jogador é quem pedira para sair: “Todo atleta deve se sentir honrado em vestir a camisa da entidade que representa a sua pátria. Eu, quando fui convocado para as seleções de natação e water-polo, sempre me senti orgulhoso de ver o meu nome dentre os convocados. É estranho que um jogador de futebol procure fugir a um chamado para o qual ele, mais do que nunca, devia estar disposto a dar o máximo de sua capacidade física, técnica e mental.”

A pinimba de Havelange com Cacá pode ter origem no fato de o craque ter sido o precursor da luta pelo “passe livre” no futebol brasileiro. Bem antes do grande Afonsinho, com a sua luta pelo passe livre no começo dos anos de 1970, Cacá já peitava a cartolagem para ter os seus direitos preservados. Exigia sempre cláusulas que lhe garantissem o passe livre após o término dos contratos. Isso aconteceu com o América, seu primeiro clube, e de forma traumática. Cacá incomodou [e muito!] os cartolas de sua época ao se recusar a voltar ao América, em setembro de 1955, mesmo com o clube exigindo juridicamente seu passe e ignorando a cláusula contratual que facultava ao atleta o passe livre.

De 1950 a 1954, Cacá permaneceu como amador do América, que defendia desde os juvenis, no final dos anos de 1940. Tentara ingressar nas divisões de base do Botafogo, clube que ficava próximo de sua casa e da praia, onde também jogava bola. Mas o Botafogo não o quis. “Eu sempre fui torcedor do Botafogo e, por isso, frequentava o Clube com o meu pai, antes mesmo de começar a minha carreira de jogador. Como eu conhecia o Octávio Morais, ex-jogador, eu tinha contato com alguns jogadores do Botafogo da época, entre eles o Nilton Santos”. No América, pelo menos, conseguia conciliar os jogos do time amador e com os da praia, dos quais não abria mão de jeito algum.

Em 1952, Cacá vivenciou uma fase muito boa no América sendo, inclusive, convocado para compor a seleção brasileira que se preparava para disputar os Jogos Olímpicos, em Helsinque. Mas, surpreendentemente, Cacá pediu dispensa da seleção. Não teve culpa alguma no imbróglio. Se houve culpada, foi a diretoria do América que o requisitou, agora como profissional, para um jogo — o primeiro jogo oficial da carreira de Cacá — contra a toda poderosa seleção do Uruguai, bicampeão mundial, em Montevidéu. 

Cacá era vítima das manobras dos dirigentes, que fazem o que bem entendem com os jogadores. Ali, o jogador começou a ficar mais atento com os cartolas. Afinal, ele era um exemplo de jogador e, mais: um jovem craque, com um potencial para ser ídolo da torcida. Mal iniciara sua carreira profissional no América do Rio, em outubro 1954, quando assinou seu primeiro contrato, Cacá foi agraciado com o prêmio Belfort Duarte pela sua desportividade em campo.

Mesmo sendo exemplo dentro e fora dos gramados, Cacá não foi respeitado pela diretoria do América. Em setembro de 1955, após uma renhida negociação com os cartolas para que liberassem o seu passe para o Fluminense, que sinalizara querer contratá-lo, Cacá vencera, enfim, uma guerra jurídica contra o América. Não foi fácil. A diretoria do América recorreu de todas as formas para mantê-lo no clube. O Ministério do Trabalho chegou a intimar a antiga Confederação Brasileira de Desportos [CBD] e a antiga Federação Metropolitana de Futebol [FMF], em vão, para que decidissem sobre o caso “Cacá”, mas ninguém quis interferir para não melindrar a cartolagem. Cacá estava prestes a perder a causa de forma injusta e lastimável.

Naquele período conturbado de sua vida profissional, Cacá, que era o capitão do time, cursava o segundo ano da faculdade de engenharia na antiga Escola Politécnica da Pontifícia Universidade Católica, na qual se formaria em dezembro de 1958. Teve de, provisoriamente, trancar a matrícula para tentar resolver a situação com o América. “Eu não podia mais permanecer no clube. Depois de combinar um encontro com os diretores para reformar o contrato, e eles faltarem sem uma palavra de justificativa, vi que estava sobrando e que o melhor seria procurar outro ambiente. Na verdade, o América nunca mostrou interesse por mim. Do contrário teria concordado em procurar-me […] Não estou lutando por dinheiro, mas por convicção”, disse ao jornal O Globo, no auge da tensão com os cartolas, que tentaram de todas as formas prejudicar a imagem de Cacá para forçá-lo a permanecer no clube.

Cacá tinha direito ao passe livre por acordo e cláusula assinada logo expirasse o contrato. Além do passe livre, outro fator garantia a ele defender outro clube em 1955: Cacá, até outubro, não havia disputado uma única partida pelo América por conta de uma cirurgia de apêndice. Mas ele estava decidido e, desiludido, não mais desejava defender o América: “Juro por minha fé de ofício, pelo prêmio de disciplina que me foi conferido — o prêmio ‘Belfort Duarte’ — que jamais tive intenção de fugir aos meus compromissos legais, como algumas pessoas do América pretendem insinuar, alegando até, o que é inteiramente absurdo, que forcei a operação do apêndice só para ganhar tempo e não jogar mais este ano, de maneira que ficasse livre para me transferir… É falso. Vou contar o que houve. Tenho um músculo distendido desde o dia 9 de julho. Machuquei-me em S.Paulo, ao enfrentar o Corinthians pelo Torneio Charles MIler. Nesse ínterim, fui operado. A 5 de agosto, deixei a Casa de Saúde e retornei aos treinos. Somente depois que o médico declarou que eu não estava restabelecido da distensão e que precisava continuar o tratamento, foi que comecei a faltar aos exercícios. Mas ainda não estou bom. Tanto que continuo tomando aplicações no Fluminense. Por causa da operação, permaneci apenas vinte dias inativo. No entanto, os que me acusam em Juízo, falam em dois meses de ‘ausência premeditada’.”

A indignação de Cacá com o América por pouco não o fez abandonar a carreira de jogador. O craque ameaçou pendurar as chuteiras caso os órgãos esportivos competentes ou mesmo a Justiça do Trabalho proferissem decisão favorável ao América.


(Foto: Reprodução)

No fim de outubro, a pendenga foi resolvida e Cacá estava livre para defender o novo clube, que tinha no comando o treinador Gradim. Foi o técnico, aliás, quem sugeriu aos diretores do Fluminense que o contratassem após descobrir, durante um almoço informal, que Cacá estava com o passe livre. Gradim procurou Augusto Borges, pai de Cacá, e disse estar interessado em levá-lo para as Laranjeiras. O pai de Cacá conversou com o filho e expôs a situação. Cacá, já bastante indignado com a desgastante relação com o América, aceitou desde que as cláusulas que lhe garantissem ser dono do próprio passe e o de poder estudar mesmo em dias de jogos, se assim fosse exigido pela Universidade. Os diretores do Fluminense aceitaram as condições impostas por Cacá talvez para evitar briga futura com um jogador bem informado e convicto dos seus direitos profissionais. Começava a mudar, ali, com Cacá, a relação dos clubes com seus atletas.

No Fluminense, Cacá jogou como zagueiro, substituindo Píndaro, que formava a zaga com o goleiro Castilho e o zagueiro Pinheiro, este último um dos grandes amigos que Cacá teve após abandonar o futebol. Foram 123 jogos e o título de campeão do Torneio Rio-São Paulo, em 1957, com o Fluminense. Um período em que conquistou muito prestígio. Mas o melhor estava por vir, no Botafogo, onde aportou em março de 1958, no auge e convocado para a seleção brasileira que se preparava para a Copa do Mundo. Foi, infelizmente, cortado, mas a trajetória que construiria no Alvinegro, que um dia o rejeitou, seria a mais auspiciosa de sua carreira.

Em General Severiano, Cacá brilhou ao lado do centromédio Pampolini, goleiro Manga, do lateral-esquerdo e grande amigo Nilton Santos, do lateral Rildo, do magistral Garrincha, do mestre Didi, do artilheiro Quarentinha, do “formiguinha” Zagalo, do “possesso” Amarildo e do “trombador” Paulo Valentim. Dois destes craques foram grandes amigos de Cacá: Pampolini e Nilton Santos, este último, uma amizade que começou em 1955, quando ambos defendiam um selecionado carioca. Ademir de Menezes, ídolo vascaíno, também foi amigo de Cacá, que era o titular absoluto da lateral direita do Botafogo até 1961, quando uma insistente contusão na coxa o tirou do time na campanha do título carioca daquele ano. Abriu-se, portanto, a vaga para o jovem Rildo, mas Cacá, enfim, conquistara seu primeiro campeonato. Em 1957, perdera a final para o mesmo Botafogo, quando defendia o Fluminense, após a acachapante goleada de 6 a 2.

Em 1964, Cacá foi contratado pela Portuguesa de Desportos em um período de êxodo de cariocas para o Canindé. Muitos craques seguiram para lá, como o lateral Jair Marinho [ex-Fluminense], o grande amigo de Cacá, o meia Pampolini, o centroavante Henrique Frade [ex-Flamengo] e o extraordinário Dida [ex-Flamengo]. Dois anos depois, Cacá decidiu pendurar as chuteiras.

Carioca, de Botafogo, bairro da zona sul, Cacá nasceu no dia 31 de agosto de 1932. Sua fama de líder dentro e fora dos campos sempre foi notada e devidamente reconhecida pelas torcidas do Fluminense e do Botafogo. Muitas décadas após deixar os gramados, tornou-se amigo inseparável de Nilton Santos. Quando este foi internado em 2007, Cacá o visitava todos os sábados, o que se sucedeu até o dia da morte de Nilton Santos, em 27 de novembro de 2013.


Cacá não fez fortuna com o futebol, mas não teve do que se queixar com o que o esporte lhe proporcionou. Tornou-se um bem sucedido engenheiro civil e manteve uma vida tranquila. Foi um dos poucos craques de sua época que não insistiram com o futebol, mas como treinador: “O futebol foi o trampolim que eu soube explorar para ter sucesso na vida”. E a sua primeira obra como engenheiro foi a construção da casa do amigo Didi, na Ilha do Governador, em 1959, um ano após se formar. Da engenharia da bola para a dos prédios, Cacá foi um craque que deu certo.

Na quarta-feira, dia 7 de junho de 2017, vítima de câncer, Cacá partiu, e deixou tristes os botafoguenses e, sobretudo, nós, que amamos o futebol de verdade.

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