A IDADE IDEAL
por Zé Roberto Padilha

Fico triste, como ex-jogador, quando se referem a um atleta de 31 anos, como Vitinho, que está sendo cotado pelo Fluminense, de ter passado do ponto. Isto é, subestimam neste momento, onde todo o cidadão, atleta ou não, se encontra “no auge” de sua capacidade física, técnica e mental.
Vitinho, para todos nós, que assinamos o primeiro contrato profissional, em média, após os 20 anos, quando termina a possibilidade de atuar nas divisões de base, e o último aos 37 anos, se encontra “no ponto ideal”. Ou esqueceram o momento único vivido por John Arias, que alcançou os 28 anos no Mundial de Clubes?
Vitinho tem uma característica que tem faltado a um time técnico, de toque de bola, como o do Fluminense. Quantas vezes você gritou “chuta!” e o Nonato, Martinelli, Ganso, só atendiam se estivessem dentro da grande área. De fora, só o Lima tem arriscado, mas tem errado o alvo, embora seja o único que tenta.
Vitinho chuta, e muito bem, de fora da área. E com as duas. Claro, uma de cada vez, senão cai.
Aos céticos, lembro a todos a trajetória de um dos nossos maiores craques. E a idade que tinha quando alcançou o seu auge: Arthur Antunes Coimbra.
Nascido em 1953, Zico foi campeão mundial pelo Flamengo, em 1981, quando tinha 28 anos. Um ano depois, aos 29, esteve no seu melhor momento junto a seleção brasileira que mais encantou o mundo, a de 1982.
Não me lembro de ninguém ter duvidado de sua capacidade, do Sócrates, do Júnior e do Leandro, pelo contrário, exaltaram seu preparo físico e técnico.
Sendo assim, seja bem-vindo, Vitinho. Será muito útil ao Fluminense. E ajudará a quebrar esse preconceito que tem, infelizmente, abreviado a carreira de muitos jogadores.
Felipe Melo, Marcelo, Filipe Luis, Diego Ribas, entre outros, poderiam ter dado uma continuidade maior a sua carreira caso não sofressem tal preconceito. Um desperdício, com todo o respeito, trazer o Renè e aposentar o Marcelo.
Enfim, nosso precoce “veterano” Vitinho deve estar chegando. Ele ainda tem muitos chutes a nos ajudar a reencontrar os caminhos das vitórias.
INTELIGÊNCIA NATURAL
por Zé Roberto Padilha

O mais fascinante, e misterioso, de tudo o que cerca o futebol é que ele não se aprende. Ou o garoto nasce com esse dom, essa vocação, e vai aprimorar seus fundamentos, ou vai passar o resto da vida em atrito com aquela que não o escolheu para viverem juntos: a bola.
Tive muitas escolinhas e fui, durante cinco anos, treinador das divisões de base do Fluminense, em Xerém. É impressionante. Nas escolinhas, com cinco minutos já tinha laudos para dizer aos seus pais: investem. Leva jeito. Ou esquecem. Leva pra estudar.
Será que existe outro ofício que não seja capaz de ser aprendido? Você, que tem um filho ruim de bola em casa, sabe do que estou falando. Nasceu runzinho, permanecerá ruinzinho. E se afastará dos gramados porque sua autoestima será afetada pela incapacidade de fazer bem feito.
Diante deste quadro, fico admirado quando um jogador, além do dom, consegue dominar todos os requisitos inerentes a sua posição. Ainda mais quando ele atua no meio-campo, e precisa filtrar o passe rude dos zagueiros e o transferir para os mais habilidosos que estão à sua frente.
No fim de semana, observava um jogador que conseguiu dominar todos os fundamentos da sua posição. E ele nos deu uma verdadeira aula. De domínio absoluto de bola, precisão no passe, deslocamentos e coberturas impecáveis.
E fazia a bola correr, sem correr com ela. Por uma razão especial: se avançar muito e perderem a bola, o espaço percorrido será o mesmo da retomada. Melhor tocar. Ficar e proteger.
Quer outra especialidade? Para ter equilíbrio em espaços cada vez menores, domina a bola com a perna de apoio para a boa estar à feição de dar continuidade.
E faz esse movimento tão naturalmente que poucos percebem. De repente, nem ele.
Desse jeito, desliguei a televisão, domingo, saciado. Quem ama o futebol merece todo dia ver o Jorginho jogar. Observar um atleta capaz de dominar cada requisito de suas inúmeras funções.
E saber que ainda existe espaço nesse mundo, dentro desse fascinante laboratório cercado de gramas, para a sobrevivência e brilho da Inteligência Natural.
QUATRO DÉCADAS ENTRE O BOTÃO E O ÍDOLO
por Reinaldo Sá

A virtualidade atravessa a presencialidade depois de quatro décadas.
Quem, na infância, nunca sonhou em jogar ao lado dos seus ídolos? Ou em ouvir, de dentro do campo, os gritos que ecoam nos estádios — a cada drible, jogada clássica ou lançamento em profundidade?
Foi assim que um botonista da época colegial — mesmo não sendo tricolor — viveu um encontro marcante. O respeito pela instituição clubística estava acima de qualquer paixão, pois o mais importante sempre foi vencer.
Essa história, que completa quarenta anos em 2025, não poderia passar em branco. Trata-se do registro de um clássico de futebol de mesa, realizado na Escola Municipal Camilo Castelo Branco, durante uma semana de inverno de junho de 1985. O torneio contou com oito colegas, reunidos em torno de uma tradicional mesa da marca Estrelão.
Foi nesse cenário que ocorreu uma vitória épica: o autor do texto venceu um tricolor de raiz, o saudoso Flávio Capilé, que representava com orgulho o São Paulo. O choro copioso de Flávio ao ver o botão madrepérola estampado com o nome “Deley” marcar um gol no canto direito da madeira galaliteada com o nome “Barbiroto” — então goleiro titular do São Paulo — marcou todos os presentes.
Parecia que aquele encontro estava escrito nas estrelas. Quatro décadas depois, a virtualidade da adolescência se transformou em uma emoção real e adulta: a presença de Deley, aquele mesmo ídolo de botão, agora de carne, osso e memória, com sua maestria única e eterna vestindo a camisa tricolor.
ONZE CONTRA DEZ: A MÁQUINA QUE ASSUSTAVA
por Zé Roberto Padilha

Jogar com dez jogadores. Isso pode, Arnaldo?
Nosso time, a Máquina Tricolor, que tinha quatro tricampeões mundiais, três que seriam posteriormente convocados para a seleção brasileira, conquistou, invicto, a Taça Guanabara de 1975.
Quando iniciou o segundo turno, ao entrar em campo, o Fluminense foi surpreendido com uma liminar expedida pela FERJ: seus adversários só aceitariam entrar em campo se tirasse um do nosso time. Isto é, com menos um, seria mais competitivo o campeonato.
De fato, com Paulo César, Edinho e Rivelino voando, estava sendo mesmo uma covardia. A renda cairia, os torcedores adversários nem apareceriam para ver seu time ser goleado.
* Acho que essa foi a primeira crônica de ficção que escrevo. Levado pela emoção de ver a foto do nosso time que esperava o nosso protetor, Zé Mário, o ponto equilíbrio, a suspensão da máquina, terminar a sua entrevista. Aí sim, estaria completinho. 11 contra 11. Para azar dos outros.
MESTRE PÉRIS RIBEIRO
por Elso Venâncio

Ser chamado de mestre é um privilégio de poucos. Mestre Ziza, Mestre Didi, Mestre Armando Nogueira, Mestre João Máximo… O meu mestre e conselheiro, como também de muitos no jornalismo, foi Péris Ribeiro. Escreveu vários livros de futebol, entre eles três edições da biografia “Didi, o gênio da Folha Seca”, que recebeu da Associação de Cronistas Esportivos do Rio de Janeiro (ACERJ) o Prêmio João Saldanha, na categoria literatura, em 2011. Se Armando Nogueira foi o Machado de Assis da crônica esportiva, Péris Ribeiro foi o Armando Nogueira do Norte e Noroeste Fluminense, especialmente de nossa terra natal, Campos dos Goytacazes.
Dono de uma memória privilegiada, Péris era o Google do futebol, como o gaúcho Luís Mendes, “o comentarista da palavra fácil”. Os dois sempre foram requisitados pelos estudantes de comunicação para pesquisas. A partir desse contato, com sua alta capacidade de diagnosticar talentos, Péris tornou-se um incentivador de vários nomes da imprensa campista. Um verdadeiro mestre, no sentido literal do termo!
Enquanto repórter, Péris conviveu com Pelé no auge, quando trabalhava na revista Placar, em São Paulo. Flamenguista de coração, se encantou com o Santos, que passou a ser o seu segundo time. Falava sempre de um dos grandes esquadrões da bola: Gilmar; Lima, Mauro, Calvet e Dalmo; Zito e Mengálvio; Dorval, Coutinho, Pelé e Pepe.
Na juventude, Péris vibrou com o melhor Goytacaz que viu em campo: o do supercampeonato campista de 1966 e do bicampeonato fluminense, em 1966 e 1967. Amante do futebol-arte, acompanhou o apogeu do Americano na conquista do eneacampeonato campista, de 1967 a 1975. Sua admiração pelo Americano aumentou quando os ídolos Dudu e Chico Preto trocaram o Goytacaz, clube mais popular da cidade, pelo alvinegro. Uma das formações na época contava com Haroldo; Cachola, Zé Henrique, Marlindo e Joaquim; César e Adalberto: Cidinho, Chico Preto, Luís Carlos e Paulo Roberto.
Campos foi o único município brasileiro a ter um campeonato profissional de 1952 até 1979. “O fim dessa competição foi um duro golpe no futebol campista”, afirmava Péris Ribeiro. Curiosamente, seu maior ídolo não foi o amigo e conterrâneo Didi, nem Pelé, mas, sim, Mané Garrincha.
Com orgulho, Péris costumava lembrar que só a cidade de Campos teve dois bicampeões do mundo no Chile, em 1962: Didi e Amarildo. E estava certo, pois Gilmar nasceu em Santos; Djalma Santos era paulista da capital; Mauro, mineiro de Poços de Caldas; Zizinho, baiano de Ilhéus; Zito, paulista de Roseira; Didi, campista; Garrincha, de Pau Grande (Magé); Vavá, pernambucano de Recife; Amarildo, campista; e Zagallo, alagoano de Atalaia.
Péris Ribeiro faleceu no domingo (20), aos 80 anos, em Campos. Enfrentava problemas no esôfago, além de uma pneumonia. Anos antes, já havia demonstrado sua resistência ao vencer um Acidente Vascular Cerebral (AVC), ocorrido em 2004, mantendo a memória intacta. Viveu com dignidade até o último dia, bem acompanhado pela incansável esposa, Graça. No próximo domingo (27), o mestre Péris será homenageado pelo Flamengo no telão do Maracanã, que exibirá uma foto sua vestindo a camisa rubro-negra. Nada mais justo do que essa reverência a um dos grandes nomes do jornalismo esportivo brasileiro!