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A CARTA DA BOLA PARA RONALDINHO

por Rafytuz Santos


Caro Gaúcho,

Aqui vai uma confissão de quem vive o futebol como ninguém…

Por tempos eu fui tratada de qualquer forma, anos e anos sendo chutada por jogadores pernas de pau ou até mesmo acima da média em Copas do Mundo, Libertadores, Brasileirões, Liga dos Campeões… anos se passavam e eu sempre era tratada sem o mínimo respeito, com o único objetivo de marcar o gol.

Mas em 1997 isso mudou! Um menino franzino, rápido e sorridente me fez feliz, como eu não era desde as épocas “Pelésticas”! Me dominava com maestria, me passava pelos vão das pernas mais envergonhadas, me fatiava por cima dos mais inúmeros penteados, me jogava por baixo das mais amontoadas formações de barreiras, me balançava nos seus encantadores elásticos…

Como esquecer os momentos com você? Quando sambou comigo na Inglaterra (e eu nunca tinha feito isso hahaha). Quando me fez viajar pelos céus na cobrança de falta na Copa do Mundo de 2002. Quando te vi sendo aplaudido pelo rival… E até quando ia me chutar, você olhava para o outro lado, para não me ver sofrer! Com você eu me sentia uma varinha mágica nas mãos de um bruxo!

Ronaldinho Gaúcho, meu filho! Ninguém me tratou como você, e sentirei saudades das suas bruxarias.

Hoje por você eu paro de rolar… E jamais rolarei como você fazia.

DA GRATIDÃO, GUSTAVO, NINGUÉM SCARPA

por Zé Roberto Padilha


Uma pena, Gustavo Scarpa, você ter trilhado o nosso mesmo caminho, porém, ter sido levado por mãos e conceitos tão desprovidos de reconhecimento. E de gratidão. Eu, Gilson Gênio, Mário Marques, Zezé, Paulinho, Wallace, Joaquinzinho e Escurinho, só para falar dos canhotinhos revelados como você pela base, crescemos aprendendo a cultuar a instituição Fluminense FC.

Antigamente, pelas mãos de Roberto e Paulo Alvarenga, Pindaro, Pinheiro e Sebastião Araújo, entre tantos, ela formava atletas e cidadãos. Poderíamos até defender outras camisas, como o fizemos posteriormente, mas jamais deixamos de levar com a gente o respeito e a admiração pelo tricolor das Laranjeiras.


Quando soube que fui trocado pelo Doval, sem consulta naquele troca-troca do Presidente Horta, declarei ao Jornal do Brasil que não queria ir para o Flamengo. Não era verdade, me expressei mal. Eu não sabia era como deixar o Fluminense após o tanto que ele fez por mim. E agora, depois que vários profissionais do clube transformaram uma promessa como a sua em realidade, o colocaram na vitrine, na seleção brasileira sub-20, em 2015, e na principal ano passado, por causa de quatro míseros meses de salários atrasados você vira às costas para quatro anos de ajuda de custos, luvas, prêmios, salários em dia que lhes possibilitaram crescer.

E, sem se despedir da gente, como uma mercadoria que ganha um novo rótulo, sem conteúdo ou coração, desembarca no Parque Antárctica como se as cores tricolores, que o formaram, fossem uma mancha. Não um certificado ISO de qualidade e tradição. Como torcedor, fiquei desapontado. Nem apareceu por lá para se despedir da Young Flu, agradecer as massagens do Gerônimo, os sucos que tomou no Bar do Fidélis após cada treinamento.


Mas não se iluda. Independente dos novos rumos que tomastes, um dia a ficha vai cair, o tempo, senhor da razão, vai lhe mostrar cenas de um retrovisor com uma bela história. E você irá retornar às Laranjeiras para agradecer. Dar um abraço no Abel, um aceno para a gente nas arquibancadas ou na TV.  Porque da gratidão, Gustavo, ninguém Scarpa

Jair Pereira

o rei da resenha

entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | vídeo e edição: Daniel Planel

Somos muito fãs de todos os personagens que já entrevistamos, claro, mas não podemos negar que temos um carinho especial por aqueles que demonstram ser craques na resenha também! Ex-meia do Vasco da Gama e um dos treinadores mais vitoriosos do Brasil, Jair Pereira é unanimidade nessa lista.

Durante a resenha na famosa Pelada da Barra, comandada por Carlinhos Cortazio, tivemos o privilégio de bater um papo com essa figura inenarrável, que relembrou histórias divertidíssimas da sua carreira e arrancou gargalhadas da nossa equipe.


Na hora de falar sério, no entanto, Jair não escondeu sua tristeza com o fato de estar desempregado. Após uma bela carreira como jogador, tendo vestido as camisas de Vasco, Flamengo, Bonsucesso e Madureira, e muitos títulos como treinador, o ex-meia luta contra o ostracismo.

Na base do “maré, maré; jacaré, jacaré”, foi campeão da Taça de Prata (espécie de Série B da época), bicampeão sul-americano e mundial com a seleção de base, campeão paulista, campeão da Copa do Brasil, campeão mineiro, bicampeão da Supercopa, comandou o Atlético de Madrid e hoje lamenta a inatividade:

– O futebol é o único lugar em que a experiência está velha. Eu sou melhor agora do que quando comecei. Eu sou formado, fui atleta, campeão, treinador, coordenador…

Nesse momento apareceu o craque Mário Português, que, ao ser questionado sobre a questão, não titubeou.

– Por que o futebol brasileiro está desse jeito? Nossa experiência como atleta é muito importante para a coordenação técnica. Deixar de usar é burrice dos clubes!


Logo em seguida, o parceiro Reyes de Sá Viana do Castelo levantou a bola para Jair Pereira contar mais um causo. Dessa vez sobre um torcedor chato que, diferentemente dos demais, o elogiou do início ao fim de uma partida só para despertar sua curiosidade e poder xingá-lo diretamente.

– Me olhando, né? Queria falar que você é burro olhando nos seus olhos! – disparou o exigente torcedor.

Para fechar a resenha com chave de ouro, Jair explicou o que é “maré, maré; jacaré, jacaré”, tática que prevaleceu durante toda a sua vitoriosa carreira:

– Maré, maré é tocar a bola e jacaré, jacaré é dar o bote para recuperar a posse!

Obrigado, Jair Pereira!

GARRINCHA, CANTO VAZIO

por Rubens Lemos


Manoel dos Santos Garrincha foi o mais brasileiro de todos os brasileiros do futebol. Representou a molecagem, a irreverência, a habilidade, a coragem e assumiu a paternidade do drible, a prova da superioridade de um homem sobre o outro no quadrilátero de um campo. Morreu há 35 anos, num 20 de janeiro de 1983. 

Garrincha seria barrado para a Copa de 1958 por não passar num teste psicológico. Teria de fazer um desenho e explicar com coerência o que havia desenhado. Errou, pois caneta ele dava nos outros, não segurava com as mãos.

Garrincha era um passarinho em forma de gente. Garrincha nasceu para jogar bola, não para entender de ciências.

Na volta olímpica do Estádio Rasunda, em Estocolmo, Brasil campeão do mundo pela primeira vez, o psicólogo João Carvalhaes berrava para Nilton Santos, compadre do deus das pernas tortas:

– Ele é muito mais do que aquilo que você disse Nilton. O homem é um monstro.


– Agora é fácil falar né, Doutor Carvalhaes? – devolveu Nilton Santos, que intercedeu para Garrincha ficar mesmo reprovado no psicoteste.

Garrincha driblava com ternura. Era amado pelos meninos.

Em seu livro Histórias do Futebol, João Saldanha conta que o Botafogo foi excursionar em 1957 (ele de técnico) em Fortaleza.

Concentrada num hotel à beira-mar, a delegação era acordada antes das 7h com a algazarra de meninos magros e pobres. Procurando o comparsa. Que saía correndo, driblava cinco de uma vez, brincava de mocinho e bandido, se deixava prender, mergulhava em grupo nas ondas, sentava e puxava assunto.

– Vem cá, com essas cabeçonas, vocês são “tudo filho” do Dutra?

O Dutra era o Marechal Eurico Gaspar Dutra, dono de uma cabeça enorme e que presidira o Brasil entre 1946 e 1951. Garrincha foi tratado por muitos como um tolo, mas quem sai com uma sacada assim é tudo, menos burro.

Dois anos antes do episódio com a molecada em Fortaleza, Garrincha era convocado pela primeira vez, pelo conservador técnico Zezé Moreira. O bairrismo era pior do que discurso de xiita em rede social e formaram-se duas seleções para o Torneio Bernanrdo O’Higgins, disputadO contra o Chile. Zezé treinava o escrete formado pelos cariocas e Vicente Feola o time só de paulistas.

A atuação não sinaliza para um grande currículo. O Brasil empatou por 1×1 diante de 70 mil pessoas no Maracanã graças a um gol de pênalti marcado pelo vigoroso zagueiro Pinheiro, do Fluminense. Atuava-se com cinco na frente a a linha atacante escalada: Garrincha, Válter Marciano, Evaristo de Macedo, Didi e Escurinho. O potiguar Dequinha, de Mossoró, foi o volante.

Garrincha explodiria mesmo em 1957, sempre fintando preconceitos e tratados de gorduchos que jamais dominariam uma bola. Em amistoso antes da Copa, driblou a defesa inteira da Fiorentina e voltou para espezinhar o goleiro Sarti.


Fintou-o de novo e caminhou com bola até o fundo das redes. Quase é linchado, por cartolas e companheiros. A genialidade de Chaplin lhe custou dois jogos na reserva e talvez tivesse evitado a Copa do Mundo. Garrincha jogou contra os russos e assombrou o mundo.

Garrincha deu outra Copa do Mundo ao Brasil jogando por ele, Elza Soares, sua Diva e por Pelé. Aliás, com Pelé e Garrincha, a seleção nunca perdeu para ninguém. Foi em 1962, no Chile, quando o Negão se machucou e Garrincha foi ponta-direita, meia-esquerda, centroavante, quarto-zagueiro e, se Gilmar precisasse, iria para debaixo das traves.

O Garrincha que me sobrou está nos filmes, nos livros. Nos depoimentos de amigos mais velhos. O Garrincha que é morto cada vez que se elege um segundo melhor do mundo.Garrincha, na verdade foi o primeiro.

Pelé não pertenceu a espécie humana. Era um extraterrestre de tão monstruosamente espetacular. Olhe bem para o lado direito de um campo de futebol. Para o canto extremo. Está quase sempre vazio. Um lugar feito para Garrincha e a sua ausência  parece ser uma homenagem. Bem torta, a gravura de sua vida.

Pelada da Barra

pelada da barra

vídeo e edição: Daniel Planel

Há muito tempo a equipe do Museu estava para visitar a famosa pelada do parceiro Carlinhos Cortazio e não havia data melhor do que a festa de fim de ano. O que nos impressionou, logo de cara, foi o carisma do anfitrião e a quantidade de craques que estavam presentes.

Basta entrar no Facebook de Carlinhos para entender o que a pelada representa na sua vida. Além das dezenas de fotos ao lado de ídolos do futebol brasileiro, seu nome no Facebook é “Carlos Cortazio Pelada da Barra”, praticamente um sobrenome. Antes de chegar ao aconchegante Clube da Barra do BNDES, no entanto, o racha rodou por vários campos.

– A pelada começou em 1966 na PUC. Depois jogamos na Superintendência de Transportes Oficiais, Ilha da Fantasia, num campo onde hoje é o Windsor, sítio em Vargem Grande, Santa Mônica, Riviera e estamos aqui há seis anos.

Nesse tempo, craques como Adílio, Zico, Nei Conceição, Jair Pereira, Dé Aranha, Silva Batuta, Arturzinho, Mendonça, Afonsinho, Andrade e muitos outros deram aquele tapa ao lado de Carlinhos Cortazio. Mais do que companheiros de peladas, os craques se tornaram grandes amigos do anfitrião, que serviu um delicioso churrasco regado à cervejas geladíssimas. Se alguém duvida dessas amizades, é só ver a “declaração” do craque Nélio ao amigo boleiro em uma postagem no Facebook:

“Não é o seu aniversário, mas toda reverência a esse velhinho que amo de paixão e que tem por mais de 40 anos sua pelada na Barra da Tijuca!!! Carlos Cortazio, queria agradecer a solidez da sua amizade e a ternura das suas palavras quando estamos juntos todas as segundas. Um grande beijo no seu coração e obrigado por fazer parte do seu ciclo de amizade”.

Podemos dizer que o grupo de pelada montado por Carlinhos Cortazio é o sonho de todos aqueles que têm uma paixão pelo futebol. Afinal de contas, quem nunca teve vontade de bater uma bolinha com o ídolo?