O FIM DOS 1000 TOQUES
por Vinícius Vieira
Ontem, após a eliminação da Espanha na Copa, vi alguns jovenzinhos e até mesmo jornalistas, um tanto preocupados com a queda do “futebol arte espanhol”. Bom, acompanho Copas do Mundo desde 1982, não sou tão velho, nem tão novo, mas posso afirmar que não acabou o “futebol arte espanhol”, acabou uma geração que jogava diferente de qualquer seleção espanhola vista em Copas do Mundo até 2010.
Na verdade, a seleção dos 1000 toques na bola era praticamente um time, o Barcelona, enxertado de dois ou três jogadores de outro clube, um deles o goleiro, vestindo uma camisa diferente da que envergavam aos finais de semana.
Jamais uma seleção jogou tão igual a um clube como a Espanha de 2010. Se buscarmos alguns vídeos de atuações espanholas em outras oportunidades, teremos o desprazer de ver um futebol não muito bonito, sempre corrido e marcado como a maioria das seleções europeias sempre praticaram.
A Espanha nunca foi diferente, nunca incomodou muito em Copas do Mundo, mesmo quando esta foi realizada em seus domínios, então podemos dizer que não morreu uma forma de jogar, morreu apenas uma geração que jogava de uma forma diferente e que, quase toda, defendia a camisa de um único clube, que não coincidentemente, jogava dessa forma.
Fique claro que não é nenhum desmerecimento a jogadores do talento de Iniesta e Xavi e companhia, apenas uma constatação de um fato que está registrado na história do futebol.
SIM, ELES SÃO HUMANOS!
por Marcos Vinicius Cabral
Criada pelo francês Jules Rimet, em 1928, após ter assumido a presidência da FIFA, a Copa do Mundo é hoje o evento esportivo mais importante do planeta.
Desde a primeira edição em 1930 – realizada no Uruguai e vencida pela equipe Celeste – até a mais recente – estamos nas oitavas de final da Copa de 2018, na Rússia – muitas coisas aconteceram nessas 21 edições.
Se vivo fosse, o “pai da Copa do Mundo” – falecido em 1956 na modesta cidade francesa de Suresnes – estaria surpreso com a grandiosidade que o evento se tornou e estarrecido com a quantidade de jogadores talentosos que não ganharam o tão almejado título.
A lista, extensa, diga-se de passagem, teve no sábado (30), a inclusão de mais dois nomes de peso: Messi e Cristiano Ronaldo!
Desclassificados pelos algozes franceses e uruguaios, os dois maiores gênios da atualidade e detentores de dez prêmios de melhor jogador do mundo da FIFA – cada um com cinco – viram o sonho se tornar frustração.
O craque argentino Messi – há quem diga ser melhor que Maradona – sucumbiu para uma França mais organizada e com um talentoso Mbappé – autor de dois gols – que com apenas 19 anos, ditou o ritmo da partida na vitória por 4 a 3.
Já o português CR7, teve atuação discreta na derrota por 2 a 1 e viu a dupla Cavani/Suárez, comemorar a classificação às quartas de final.
Portanto, é uma pena para o futebol, para a Copa do Mundo e para os que torciam pelo sucesso desses dois exuberantes jogadores, que tenham que voltar aos seus países de mãos vazias.
E nos deixa a única certeza sobre esse esporte chamado futebol: sim, Messi e Cristiano Ronaldo, são humanos!
Donizete
NO CAMPO COM PANTERA
entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | fotos e vídeo: Daniel Planel
Em clima de Copa do Mundo, a equipe do Museu da Pelada voltou a marcar presença na pelada do parceiro Carlinhos Cortázio. O personagem da vez foi o artilheiro Donizete Pantera, que fez história não só no Brasil, mas também no México, adversário da seleção amanhã pelas oitavas de final da Copa do Mundo.
Embora a explosão não seja a mesma dos tempos de Vasco e Botafogo, Donizete exibiu boa forma física e demonstrou desenvoltura a ponto de questionarem na pelada um retorno aos gramados.
– Tenho que emagrecer uns quatro quilos para ficar em plena forma! – brincou Donizete.
Nascido em Pratos, Minas Gerais, o atacante se mudou para Volta Redonda aos cinco anos, quando seu pai foi convidado para trabalhar na Companhia Siderúrgica Nacional. Na nova cidade, foi aprovado no Voltaço, se profissionalizou no clube e só saiu após conquistar o acesso à elite do futebol carioca.
O bom desempenho despertou o interesse do São José-SP, que contratou Donizete e foi vice-campeão paulista em 1989, perdendo na grande final para o São Paulo.
– Do São José fui para o Botafogo com a missão de substituir o Maurício e fui bicampeão carioca!
Foi aí que surgiu uma oferta irrecusável do Tecos-MEX. Junto com Hernani Banana e Gonçalves, chegou com status de craque, mas a demora para se adaptar ao novo país quase lhe custou a rescisão do contrato.
– Devo muito ao Hernani, que no momento mais difícil, quando eu estava para ir embora, pediu para a diretoria confiar em mim.
Não deu outra! Donizete não só se adaptou, como foi o melhor jogador da temporada e levou a modesta equipe ao título mexicano.
O goleador, no entanto, sentia saudade do Brasil e precisava mostrar serviço no país de origem. Após cinco temporadas de sucesso no México, retornou ao Botafogo em 95 para formar dupla com Túlio Maravilha e conquistar o Campeonato Brasileiro daquele ano.
Se já não fosse o bastante, foi campeão da Copa Libertadores três anos depois, pelo Vasco, ao lado de Juninho Pernambuco, Felipe, Pedrinho e do parceiro de ataque Luizão, marcando gol nos dois jogos da decisão contra o Barcelona de Guayaquil.
Apesar de não saber estipular quanto seria um Botafogo de 95 x Vasco de 98, Donizete não ficou em cima do muro para escolher sua melhor dupla.
– Tive a felicidade de jogar com essas duas feras (Túlio e Luizão) e me sentia muito bem ao lado deles. Mas acho que casei melhor com o Túlio, até porque joguei mais tempo com ele! – revelou o Pantera.
Hoje em dia, Donizete se divide entre as peladas e a sua mais nova empresa, a Pantera Sport, para agenciar novos jogadores.
– Canário belga solto está muito difícil! – brincou, em alusão à dificuldade para a descoberta de novos talentos no futebol brasileiro.
ABC, TERMÔMETRO SENTIMENTAL DE UM POVO
por Rubens Lemos
O Palmeiras da Segunda Academia ganhou o Campeonato Brasileiro de 1972 no bailado em câmera lenta de Ademir da Guia. Quando veio a Natal para jogar contra o ABC, dia 3 de dezembro, estava classificado por antecipação para a segunda fase e poupou quatro dos seus principais astros.
Ademir da Guia ficou descansando em São Paulo e o destaque era na artilharia para o meia-atacante Leivinha e o controvertido artilheiro César Lemos, o César Maluco, irmão de sangue dos também goleadores Caio Cambalhota e Luisinho Tombo, um dos principais ídolos do América do Rio de Janeiro.
Natal recebeu com indignação provinciana a decisão tomada pelo clube palestrino, hospedado no Hotel Internacional dos Reis Magos diante do mar da Praia do Meio.
O Palmeiras era campeão paulista e tivera três titulares entre os convocados para a seleção brasileira campeã da Minicopa, realizada naquele ano com jogos no recém-inaugurado Estádio Castelo Branco, o Castelão.
O público feminino tentava invadir o hotel, hoje aos escombros, pela boate Bambelô, brigando por um mero aceno do goleiro Emerson Leão, titularíssimo do gol do Brasil e dono, segundo a mídia especializada, do par de pernas masculinas mais bonito do país. Sua imagem em
propaganda de cueca aparecia em outdoors espalhados de Boa Vista a Porto Alegre.
Leão, conhecido pela antipatia pessoal, proporcional ao talento debaixo das traves, desceu à piscina de óculos escuros, estirou-se nas cadeiras para o bronzeado, olhou sem sorrir para as fãs, respondeu entrevistas aos monossílabos e voltou ao seu quarto.
O mais tranquilo era o veterano Dudu, remanescente da primeira versão da Academia, no início dos anos 1960, quando entrou no time para substituir o pernambucano Zequinha, campeão mundial na reserva da seleção brasileira na Copa do Chile.
Dudu era o ponto de apoio para os solos de Ademir da Guia. Carregava o piano para o craque de aspecto dispersivo e afinado como um violino Stradivarius. Ademir da Guia usava o cérebro em contraponto ao fôlego e a partida adaptava-se ao seu ritmo, não o contrário.
Dudu estava escalado junto a outro volante, Zé Carlos, seu conformado reserva, numa formação aparentemente defensiva, mas com quatro homens no ataque: Os dois insinuantes e dribladores pontas Edu e Nei, mais dois atacantes de área, o argentino Madurga e Fedato, que jogaria no Náutico de Recife quatro anos depois.
Para o lugar de Luís Pereira, o mítico técnico Osvaldo Brandão, discreto em suas caminhadas esguias, escolheu o jovem João Carlos, revelado pela Portuguesa Santista e de conteúdo oposto ao do titular. Era força e garra, nada do requinte e da vocação ofensiva de Luís
Chevrolet.
O ABC esperava se despedir com dignidade. Havia sido suspenso por dois anos de competições nacionais pela escalação irregular contra o Botafogo (RJ) do zagueiro Nilson Andrade e do lateral-esquerdo Rildo, expulsos contra o Ceará e do meia Orlando, sem autorização da CBD.
Os jogos do alvinegro motivaram Natal. O Castelão revelava-se o palco digno para os desfiles de Alberi, o rei da cidade, com atuações exuberantes que o levariam à conquista da Bola de Prata da revista Placar como melhor de sua posição no Brasileiro.
Uma atuação convincente aos jurados diante do Palmeiras seria crucial para a vitória na disputa contra Tostão do Vasco, Jairzinho do Botafogo, Palhinha do Cruzeiro e Doval do Flamengo, seus concorrentes diretos.
A cidade, que havia parado quatro dias antes para ver Pelé em discreta atuação na vitória por 2×0 sobre o representante potiguar, especulava sobre o interesse do Fluminense por Alberi, contratação que chegou a ser tratada pelo representante do clube em Natal, jornalista
Aluizio Menezes, e não concretizada.
Com a bola rolando, Leão perdeu a pose. Alberi queria o duelo com Ademir da Guia e adorou a solidão do brilho. Deslocou-se como pantera pelos dois lados e procurando tabela com o centroavante Petinha. Aos 25 minutos, caiu nas costas de Dudu e deu de cara com o zagueiro João Carlos.
Aplicou-lhe um drible seco e bateu rasteiro, com força, no canto esquerdo da trave voltada para a direita das cabines de rádio. Leão esticou-se e segurou sem rebote. Alberi dominou o primeiro tempo jogando por ele e pelo seu companheiro de criação, o meia-armador
Danilo Menezes, ausente por problemas médicos.
O Palmeiras abriu o placar aos 3 minutos do segundo tempo com Zé Carlos chutando fraco de fora da área. Falha do goleiro Tião. Em jogada individual, Madurga enganou a defesa alvinegra e chutou sem chances para o goleiro espigado e contratado ao Bonsucesso(RJ) para
caprichar em erros capitais ao longo da campanha do ABC.
No seu pragmático tático, Brandão recuou Madurga ao meio, o Palmeiras fechou-se e passou a tocar a bola para passar o tempo. Faltou apenas combinar com Alberi. Em nova arrancada, aos dribles, o Negão fintou João Carlos que cometeu pênalti. Alberi bateu forte e Leão foi buscar
no fundo das redes.
O ABC acordou e a Frasqueira eletrizou o estádio de arquitetura impecável. Alberi pediu bola. Recebeu na entrada da grande área. Vieram o humilhado João Carlos e o quarto-zagueiro Alfredo Mostarda. Numa finta, passaram os dois. Alberi tentou driblar Leão, os dois se
enroscaram e a bola sobrou para Maranhão, que chutou fraco demais.
Bola de Prata/1972: Aranha (Remo), Marinho Chagas (Botafogo), Figueroa (Inter), Beto Bacamarte (Grêmio) e Piazza (Cruzeiro). Osni (Vitória), Alberi (ABC), Zé Roberto (Coritiba) e Paulo Cézar (Flamengo)
O lateral-direito Eurico tratou de empurrar para as próprias redes. O empate por 2×2 fez Leão cumprimentar e aplaudir Alberi. O encontro com Ademir da Guia só aconteceu durante a entrega da Bola de Prata (foto), que os dois receberam, cada um na sua posição. Alberi, guia do show do dia sem Ademir, eterna inspiração aos súditos de 46 anos depois. Viva o ABC, 103 anos do termômetro sentimental de Natal.
PS.Nesta sexta-feira(29 de junho), o ABC, recordista brasileiro de títulos estaduais(55), faz aniversário e a lembrança de seu craque maior é homenagem merecida.
O PULSO AINDA PULSA
por Mateus Ribeiro
A música “O pulso ainda pulsa” é um dos grandes sucessos dos Titãs, uma das maiores e mais importantes bandas do rock nacional. A letra da canção, lançada no final dos anos 80, enumera uma quantidade gigantesca de enfermidades, mas no final de toda estrofe, relembra que existe esperança, através do verso que nomeia a música.
Você deve estar se perguntando o motivo de eu começar um texto sobre futebol falando sobre música. Acredite se quiser, existe uma conexão com a seleção argentina de futebol. Dessa forma, digamos que o nome do texto poderia ser “El pulso todavía pulsa”, mas vamos deixar em português mesmo.
Antes de qualquer coisa, é importante ressaltar que em nenhum momento comparo os jogadores da seleção, ou qualquer outro profissional da AFA com as doenças citadas na canção, pois seria ofensivo. Minha intenção é mostrar que mesmo com todas as adversidades, a Argentina conseguiu se manter viva, e mostrar par aseu povo que ainda há esperança. Para quem não se lembra da música, basta clicar no link abaixo:
Todos devidamente apresentados, vamos lá.
A seleção da Argentina apresenta inúmeros problemas, e quem acompanha o mínimo de futebol sabe disso. Não é de hoje que os resultados não aparecem, ao contrário das decepções, que surgem com a mesma facilidade que Higuaín perde gols. Basta lembrar as duas edições da Copa América que foram perdidas para a tradicionalíssima seleção do Chile (que por sinal, nem para a Copa 2018 conseguiu se classificar). Isso pra não falar de algumas outras derrotas para Brasil, Uruguai, e alguns outros tropeços que foram pesados demais para os torcedores argentinos. A última (e talvez a pior) dessas cacetadas foi a derrota para a Alemanha na final da Copa de 2014. Ganhar o tri mundial no Brasil seria uma redenção para uma geração capitaneada por Messi. Seria. Pena que Gotze acabou com o sonho.
De qualquer forma, ser finalista de um Mundial poderia servir de incentivo. O ponto chave é que depois da final da Copa, um caminhão de desgraça estacionou na garagem dos hermanos, e parece que não tem hora pra sair. Além das já citadas derrotas para o Chile, a classificação para a Copa 2018 foi um trabalho de Hércules. Além da habitual bagunça proporcionada pela cartolagem argentina (que deve ter estudado junto da cartolagem tupiniquim), treinadores foram contratados e demitidos durante as eliminatórias, jogadores de qualidade duvidosa foram convocados, e em nenhum momento, a Argentina passou perto de ter um time apresentável. A sorte dos nossos vizinhos é que na última rodada, quando o boi já estava com três patas atoladas, Messi decidiu, e colocou a Albiceleste na Copa. A pulga mostrou que o pulso ainda pulsava.
Enfim, a Copa chegou. E logo na primeira rodada, um empate inesperado diante da Islândia. Dúvidas sobre a capacidade técnica do time começaram a pipocar. E essas dúvidas quase se tornaram certezas depois da sapatada aplicada pela Croácia. Depois dos 3 a 0, Messi não prestava mais. Sampaoli já não era mais o salvador da Pátria (nunca foi, aliás, apesar do amor que a imprensa brasileira nutre pelo cover de Marcelo Bielsa). A eliminação estava por um fio.
E a vergonha absoluta de ser eliminada na primeira fase não foi concretizada por minutos. No final do jogo, Rojo usou sua perna direita para tirar a Argentina do vermelho.
O drama argentino estava acabado. Maradona estava (ainda deve estar) alucinado. Messi acordou. Sampaoli continua contestado, porém, está aliviado. Mascherano, um dos pilares da equipe, teve sua pele salva, já que seus erros quase custaram a vida da Argentina na Copa. Apesar de todas as adversidades, o pulso ainda pulsa.
Agora, a Argentina pega a França. Teoricamente, os franceses são favoritos. Mas não se pode subestimar os argentinos. Nunca, em hipótese alguma. Até porque não é novidade para eles chegarem tropeçando nas fases finais. Podem perder e voltar pra casa. Mas também podem ganhar e embalar. Afinal, enquanto há vida, há esperança. E apesar de parecer o contrário, existe muita vida ali. Apesar da dificuldade, o pulso ainda pulsa.
Mesmo com toda a bagunça administrativa, mesmo com um treinador que está longe de ser unanimidade, mesmo com alguns jogadores contestados, mesmo com uma bagunça tática gigantesca, a Argentina está nas oitavas de final. E todo o cuidado do mundo é pouco quando se trata da Argentina.
Talvez, Messi enfim encarne o espírito de Maradona em 1986, e leve o time nas costas. Talvez, tal qual em 1990, a Argentina chegue ganhando aqui, empatando ali, e batendo pênaltis acolá.
O cenário do drama está montado. E tudo pode acontecer. Afinal, estamos falando de futebol, e da Argentina. El pulso todavía pulsa.