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OS FATOS SEMPRE TIVERAM DIDI, NELSON…

por André Felipe de Lima


“Jogador é o Didi, que joga como quem chupa laranja”. O autor da frase, o mitológico ex-roupeiro do Botafogo, técnico de futebol de praia e “filósofo da bola” Neném Prancha estava coberto de razão. Talvez não tenha aparecido no futebol brasileiro um jogador com tanta classe. Que fazia dos gramados uma passarela. Didi era um modelo de elegância dentro e fora de campo. Esguio, não abaixava a cabeça de forma alguma e era capaz de lançamentos que deixavam a “menina” — como ele se referia intimamente à bola — nos pés de algum companheiro de time. Nos tempos de Fluminense, Carlyle e Orlando Pingo de Ouro marcaram muitos gols graças ao “garçom” Didi. No Botafogo, a lista de gente bem servida por ele contempla Paulo Valentim, Garrincha, Quarentinha, Amarildo. E na seleção? Vavá e até Pelé se esbaldaram nas redes adversárias após serem prontamente atendidos por Didi, o elegante, frio e calculista.


Jogava bola como se disputasse uma partida de xadrez. Não foi à toa que recebeu de Nelson Rodrigues o apelido de “príncipe etíope de rancho”, comparando-o ao personagem dos primórdios do carnaval carioca. Mario Rodrigues Filho endossa as palavras do irmão mais novo: “Jogava em pé, a não ser quando aparentemente se desequilibrava para enfiar um passe. Zezé Moreira apontava aquele preto de pescoço alto, feito de foca, equilibrando a cabeça, como o maior atacante do Brasil. Maior do que Zizinho”.

Se o Mestre Zizinho, provavelmente deprimido com a perda da Copa de 1950, já se preparava para antecipar o fim da carreira — o que, graças a Deus, não aconteceu imediatamente após o fatídico Maracanazo —, não teria com o que se preocupar quando viu aquele rapaz longilíneo realizar coisas indescritíveis com a camisa do Fluminense.

Didi só não foi convocado por Flávio Costa, em 50, por ser ainda muito garoto. Um jovem Didi que encantou [logo quem…] os nossos algozes uruguaios um mês antes de a Copa começar no Brasil. Foram dois amistosos entre a “Celeste Olímpica” e o Fluminense, o “timinho”. Veja como as edições de 5 e 7 de junho da Gazeta Esportiva descreveram a performance do “timinho” e de Didi contra Obdúlio Varela, Julio Perez, Schiaffino e cia.: “O Fluminense agradou bastante, demonstrando ser um conjunto bem treinado, sem individualidades de destaque, mas com completo entendimento e identificação entre seus elementos, além de apresentar jogadores em estado físico perfeito. Com tais predicados, ele fez ver aos torcedores e cronistas uruguaios que o esquadrão designado para apresentar o Uruguai está longe do melhor estado físico exigido a seu jogo de conjunto, isso, o que é mais grave, a pouco menos de um mês da data em que estarão em campo em Porto Alegre jogando seu primeiro jogo de campeonato, que seria com a França […] Todos os cronistas frisam a importante contribuição do Fluminense, para pôr em relevo as falhas da seleção nacional, dando eventualmente o ensejo de saná-las, graças ao novo técnico Lopez, em cuja atuação se deposita grande confiança. Do quadro brasileiro, deixou profunda impressão a parelha dos zagueiros Píndaro e Pinheiro, bem como Didi, estranhando-se que não integrem a seleção brasileira para o torneio mundial”.


A trupe que intimidou o Uruguai e arrancou dois empates heroicos no estádio Centenário [1 a 1 e 3 a 3] foi composta por Veludo, Píndaro [Pé de Valsa] e Pinheiro; Waldir, Pé de Valsa [Emerson] e Mario; Santo Cristo, Didi, Silas, Carlyle e Tite.
O Fluminense liderado por um jovem Didi não deu colher de chá a um escrete uruguaio cansado e sem maiores pretensões no Brasil. Deu no que deu.

Zizinho estava coberto de razão ao definir Didi como herdeiro do futebol mágico, incomparável dele. “Herdei do Mestre Ziza o bastão de organizador de jogadas do futebol brasileiro”, lembrava sempre o craque, que ao deixar os gramados tornou-se treinador. Dos melhores, frise-se. Moldou seleções, como a boa peruana da Copa de 70, e grandes times, como a “Máquina Tricolor” de Francisco Horta nos anos de 1970. Mas nunca uma seleção brasileira. Fazer o quê… “Pior para os fatos”, diria o torcedor tricolor Nelson Rodrigues, ardoroso fã do Didi. Mas a verdade é que os “fatos” sempre tiveram Didi, Nelson.

Não o quiseram como técnico, mas nunca abririam mão do seu futebol.


Durante a Copa de 1958, nenhuma bola saía da defesa e chegava a Vavá, Garrincha, Pelé ou Zagallo sem antes passar por Didi, o maior “armandinho” de toda a história das pelejas nacionais. O frio Didi. Um comandante e seus comandados, embora Bellini fosse o capitão daquele escrete. Sem o meia, talvez faltasse ao Brasil a calma necessária para virar o jogo em cima dos suecos na final da Copa.

Os alvos escandinavos abriram o placar logo aos quatro minutos. Um goleiro Gilmar atônito. Todos estavam atarantados. Menos Didi, que foi ao gol, pegou a bola e, enquanto era abordado por desesperados companheiros, caminhava tranquilamente ao centro de campo para reiniciar o jogo como se toda eternidade estivesse a seu favor. “Não foi nada. Vamos encher [de gols] esses gringos”, dizia um Didi, que, naquele momento, estava mais para monge tibetano que para jogador de futebol. Mas só naquele momento, porque depois fez dois lançamentos de mais de 30 metros até Garrincha acertar os ponteiros com Vavá lá na frente e marcar o gol de empate. No final, a taça Jules Rimet debaixo dos braços e a estatística do cronista esportivo francês Gabriel Hanot: Didi acertou 48 passes, que para Armando Nogueira eram igualmente melífluos, brandos como o olhar da personagem machadiana Capitu. Não há como refutar a tese filosofal de Prancha. Entre chupar uma laranja e o futebol não havia diferença para Didi. “Eu não precisava correr. Quem precisava correr era a bola”. Didi domava as coisas e o tempo. A bola apenas o obedecia, resignadamente, porém feliz.

BOAS DOSES DE AZNAVOUR

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Fiquei sabendo da morte de Charles Aznavour quando estava no carro com o parceiro Oberdan em uma estrada de Curitiba. Para a garotada saber, Oberdan foi um excelente zagueiro de Coritiba, Santos e Grêmio. Por coincidência ouvíamos Frank Sinatra, Tony Bennett e falávamos sobre as boas coisas da vida. E a canção de Aznavour é uma delas.

Éramos amigos. O conheci em uma das muitas festas que ia quando jogava na terceira divisão francesa, no Aix en Provence. Ele adorava futebol e era amigo de Daniel Stern, fundador do Paris Saint-Germain.

Sempre considerei o futebol uma arte, assim como o cinema, a música, o teatro e a pintura. Por isso abomino os botinudos que viraram estrelas em nosso futebol atual. Estou triste, muito triste. Mas, graças aos céus, a arte é eternizada e poderei continuar ouvindo “La Bohème”.

A diva Angela Maria também viverá para sempre em nossos corações. Assim como o futebol, o rádio também teve sua época de ouro, com torcidas rivais e tudo. Angela Maria, Marlene e Emilinha Borba eram como times, tinham fã-clube e brigavam ano a ano pelo título de Rainha do Rádio.

As novas gerações, fascinadas pelas redes sociais, talvez não consigam dimensionar o poder de alcance do rádio, o inseparável companheiro do torcedor, o porta-voz das principais notícias e a garantia de boa música, como a de Tito Madi, que também nos deixou recentemente.

Nessa época, os jogadores circulavam pela cidade e trocavam ideias com a torcida, no Beco das Garrafas, por exemplo. O Beco era uma travessa sem saída, na Rua Duvivier, em Copacabana, que reunia vários bares. Ali, a boa música fervilhava, como nos campos o bom futebol atraía multidões, nos teatros, cinemas, palcos em geral, tudo era uma festa. Sempre me pergunto onde foi parar toda essa inspiração e poesia.


Uma vez, no Noites Cariocas, na Urca, um torcedor se aproximou de mim e perguntou porque em determinados momentos da partida eu colocava as mãos na cintura e parava de correr no jogo ocorrido no Maraca horas antes. “Porque o Dario não conseguia dominar uma bola”, respondi. Rimos juntos.

Nesse dia, a Geral me xingou de preguiçoso, mascarado e outros nomes impublicáveis. Tínhamos uma relação de amor e ódio. Mas a Geral era justa e no primeiro lençol que dava me transformava em rei novamente. Também costumavam me abordar na praia e nos restaurantes.

Hoje dificilmente você encontra um jogador dando bobeira por aí. Ligo a tevê e vejo o Mano tentando explicar a eliminação do Cruzeiro da Libertadores. Como se explicam….os botinudos não conseguem enxergar aquela entrada do Dedé no goleiro como jogo perigoso. A expulsão também foi justa. Para os adeptos do futebol força vale tudo!!!!

O pior é que a escola gaúcha ainda tem chance de ganhar uma Libertadores e isso me tira do sério. Olha que eles acabam se perpetuando no poder e isso não é nada bom. Na seleção, ainda insistem nessa tecla, nesse modelo feio, pragmático, de jogar bola. O meu Botafogo foi eliminado nos pênaltis pelo Bahia. O problema é que os retranqueiros que dominam o futebol atual não sabem jogar ofensivamente, só sabem destruir.


Hoje os centroavantes não marcam gols, marcam adversários. Hoje o futebol funciona como um corredor polonês: para conseguir seu objetivo vai ter que ultrapassar um batalhão de soldados. Futebol é xadrez, não boxe. E ainda me pedem paciência. Esgotou-se faz tempo.

O nosso futebol está tão esquizofrênico que a maior atração do Brasileiro é o Lisca Doido, um gaúcho dançarino, KKKKK. Realmente estou precisando de boas doses de Aznavour para me acalmar. Então, desligo a tevê, ligo o som e viajo aos áureos tempos no embalo de “La Bohème”.

Mirandinha

O ARTILHEIRO DA SUPERAÇão

entrevista: Paulo Escobar e Sergio Pugliese | texto: Paulo Escobar | fotos e vídeo: Daniel Planel, Johnyy Jamaica e Ruth Bessa

Parecia que as coisas não estavam se dando nesse dia frio, até Sérgio marcou um gol aos 45 do segundo tempo. Foi assim, na agonia dos acréscimos, que a equipe do Museu da Pelada conseguiu como que por um milagre esta resenha maravilhosa com Mirandinha.


A descida rumo a Santos, cheia de aventuras pelo caminho, além das boas conversas e risadas nos levou a esta grande figura do futebol brasileiro. O que dizer deste que foi sem dúvida um atacante rápido e raçudo, que dentro de campo deixava tudo de si. Ao chegar no local da resenha, encontramos Mirandinha sentado na porta de casa esperando por nós, e com um sorriso e um abraço em cada um dos que estávamos ali aconteceu este bate papo bacana e de muito aprendizado.

A marca daquele dia trágico na sua carreira, quando numa divida com o zagueiro Baldini aconteceu uma das cenas que talvez seja uma das mais fortes do futebol brasileiro, ainda é visível. Mirandinha, que saiu com a perna quebrada desse lance, ainda tem aquela mesma humildade do dia em que Baldini foi ao seu quarto lhe pedir desculpas, e o atacante disse que o culpado foi ele e não Baldini, pois ele ia em todas as bolas e nunca era de tirar o pé.

Nesta resenha a equipe do Museu da Pelada juntou a galera do Rio e de Sampa num formato descontraído e livre, no qual o entrevistado se sente à vontade para contar sobre sua carreira, a descoberta do pai que o incentiva a jogar no ataque, a volta por cima depois da contusão e sua carreira goleadora. Mirandinha é o tipo de jogador que está em extinção nos dias atuais. Era considerado um dos atacantes mais rápidos e de uma explosão de velocidade misturada à sua raça, que atormentava a vida dos zagueiros.


Sem palavras para descrever o encontro com esta lenda, que também jogou a Copa de 74, naquele fatídico dia do Brasil e Holanda. Gostaríamos de agradecer mais uma vez ao Mirandinha e deixar o registro que, além da extinção deste tipo de atacante no futebol brasileiro, possui uma humildade características de muitos dos ídolos do passado e tão ausente nos ídolos do presente.

Muito obrigado, craque Mirandinha, por nos brindar histórias e aprendizados, e nos aquecer com sua receptividade e humildade naquela tarde fria de Santos.

 

Arnaldinho

varandão da saudade

entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | fotos: Marcelo Tabach | vídeo e edição: Daniel Planel

 

A ansiedade pelo encontro com a fera nos fez chegar uma hora antes do horário combinado. Ansiedade desperta o apetite, então o time do Museu da Pelada aproveitou o tempo livre, abrigou-se numa pensão próxima e devorou os deliciosos PFs. Foi rapidinho e pontualmente estávamos em frente ao número 7 da Rua Lucinda Barbosa, onde seus três irmãos e uma irmã já o aguardavam. Desde o primeiro suspiro do Museu da Pelada sonhávamos em fazer uma resenha caprichada com esse craque, por isso quando aquele carro estacionou e Zico, o gênio rubro-negro, desceu e colocou os pés na rua onde deu seus primeiros passos no futebol eu, Pugliese, Tabach, Márcio, Alf, Rafinha e Toninho nos entreolhamos orgulhosos como se falássemos “conseguimos”. A vontade era de socar o ar, repetir seu gesto que encantou milhares de torcedores ao longo de sua brilhante carreira.

– Fala, rapaziada! – nos cumprimentou.

No portão da casa, Eduzinho Coimbra, outra lenda da bola, Nando, Tonico e Zezé o recepcionaram e nos convidaram para sentarmos na aconchegante varanda da casa. Parecia que o relógio girava ao contrário. As distantes lembranças surgiam junto aos sorrisos no rosto.

– Era aqui que a gente se reunia depois dos jogos, né? O saudoso Antunes gostava de me cornetar aqui. Sorte que o Edu me defendia! – recordou Zico.

Zezé, a única mulher, não escondia o orgulho dos irmãos. Durante todo o papo, manteve no colo um retrato do Atlético Clube Lucinda, time que surgiu antes do tradicional Juventude. Por ser mais velha, era ela a encarregada pela mãe de acompanhar e tomar conta dos irmãos nas peladas. Extremamente habilidoso e veloz, o mirrado Eduzinho despertava a ira dos marcadores em Quintino, que apelavam para a violência vez ou outra. Em uma dessas confusões, foi salvo pela irmã:

– Teve uma vez que eu quebrei a bandeira da torcida na cabeça do juiz. Começou uma briga e eu fui defender o Eduzinho que tinha apanhado.

O irmão Tonico, o mais alto de todos, garantiu que era o responsável por dar a forra nos adversários.

– Eu avisava antes que se dessem porrada nos meus irmãos eu ia revidar lá atrás! – lembrou o zagueirão, para gargalhada geral.

Desde pequenos, Zico e Eduzinho demonstravam um tratamento à bola muito diferente dos demais colegas. Mais velho, Edu despontou primeiro, no América-RJ, e sempre contou com a admiração do Galinho, que garantiu ter se espelhado no irmão. De acordo com Zico, a extinção dos campos de pelada do Rio de Janeiro é extremamente prejudicial para o futebol profissional.

– Joguei muita bola aqui na Rua Lucinda Barbosa e na Franco Vaz, que era mais retinha. Nunca abri mão de jogar aqui. A pelada é importante para a formação dos jogadores, pois ela exige a superação da diversidade do campo, buracos, calçadas, poste… Não teria feito vários gols que fiz no campo se não tivesse jogado as peladas – ressaltou.

O Juventude era o time de pelada em que os irmãos jogavam e maltratavam os adversários com lindas jogadas. Por conta disso, as partidas reuniam diversos curiosos, que não se cansavam de admirar o verdadeiro futebol-arte proporcionado por Tonico, Antunes, Zico, Eduzinho e Nando. O último, aliás, fez questão de vestir a tradicional camisa vermelha do Juventude durante a resenha.

Vale lembrar que, embora não tenha feito o mesmo sucesso que os fenômenos Zico e Eduzinho, Nando surgiu no Fluminense, passou por Madureira, América-RJ, Ceará e Belenenses, de Portugal, antes de ter a carreira prejudicada por conta do regime militar, história contada em seu livro “Futebol e Ditadura: Nando, o jogador anistiado”.

O curioso é que por muito pouco nenhum dos irmãos se tornou jogador. É que seu Zeca preferia que os filhos focassem nos estudos.

– Nosso pai não queria que nenhum filho dele fosse jogador. Dizia que era coisa de vagabundo. Quando começamos a fazer sucesso, ele passou a dizer que todos eram vagabundos menos a gente – revelou Eduzinho.

Se antes da fama os talentosos meninos já movimentavam o bairro, imagina depois do sucesso? Em um determinado momento da resenha, Nando lembrou uma história que só quem estava na Rua Franco Vaz consegue acreditar. Logo assim que começou a fazer sucesso no Flamengo, Zico armou um churrasco em Quintino com os companheiros de clube e João Nogueira. Eduzinho, por sua vez, convocou os amigos do América-RJ para participarem da festa.

– Depois de muita cerveja e samba, PC Caju deu a ideia de armarmos uma pelada na rua. Pegamos os calções do Juventude, distribuímos e foi uma coisa doida. O primeiro carro que passou na rua tomou um susto! Em poucos minutos tinha uma porrada de gente assistindo e a pelada comendo solta. Um monte de craque descalço fazendo miséria com a bola, no meio-fio, na calçada… – lembrou Nando.

Durante a resenha, Sergio Pugliese lembrou ainda da provocação de César Maluco, Luisinho e Caio Cambalhota, os artilheiros da família Lemos que garantiram ter mais gol que qualquer outra família no Maracanã. De bate-pronto, como nos velhos tempos, Zico emendou:

– Quantos gols eles têm? Se bobear, eu sozinho fiz mais que eles todos! Eu fiz 335! Não é pouca coisa, não! – comentou para mais gargalhada de todos.

– A nossa família está no Guinness Book! Ninguém fez mais gols que a gente! – reforçou Edu.

Ao ser perguntada sobre qual era a sensação de reunir todos os irmãos naquela varanda novamente, Zezé não conteve a emoção:

– Tivemos uma vida muito feliz e bem vivida! A gente vê o fruto do ambiente familiar que a gente teve. Meus pais gostavam muito de ficar nessa varanda. Se minha mãe ainda estivesse aqui, ela estaria muito orgulhosa da vida que nós levamos.


No fim da resenha, o fotógrafo Marcelo Tabach convidou os irmãos para a tradicional, mas sempre surpreendente, sessão de fotos. Descendo a Rua Lucinda Barbosa, os irmãos continuavam o papo e Zico, agora ídolo de uma nação, conduzia a bola como nos tempos de menino. Tudo registrado pelas lentes fotógrafo!

   

A POLÍTICA PODE SERVIR AO MARKETING

por Idel Halfen


Em época de eleições tem sido bastante comum ver pessoas se digladiarem em defesa de seu candidato, fato que vem piorando com a crescente inclusão digital, onde as redes sociais que aproximaram tantas pessoas agora as afastam.

O mais grave de tudo é que a grande maioria dos envolvidos nesses processos beligerantes tem como motivação única defender sua opinião e não o que seria estruturalmente melhor para seu país, estado ou município, até porque, para alcançar tal estágio de discernimento seria necessário possuir um conhecimento mais profundo sobre política e economia e não se deixar levar por meros “achismos” e notícias, muitos das quais falsas ou descontextualizadas.

E já que falamos em eleições, vamos explorar aqui o case de um time de futebol que, através do seu engajamento político, conseguiu se posicionar e conquistar um lugar único na mente dos potenciais consumidores, os quais não são necessariamente seus torcedores, mas todos aqueles que dedicam uma parte do seu tempo ou dinheiro para ter algum tipo de contato e/ou experiência com o time. Aliás, o tempo que estamos dedicando a essa leitura é um exemplo de consumo, o qual pode se tornar ainda maior se buscarmos mais informações, assistirmos algum de seus jogos ou mesmo comprarmos algum artigo com sua marca.

O clube em referência é o Rayo Vallecano, que se localiza em um bairro operário de Madrid chamado Vallecas. Sua fundação se deu no período da pré-guerra civil espanhola, quando as ideias anarquistas e socialistas eram bandeiras levantadas pela classe operária, as quais serviram como ponto de formação dos movimentos sindicais.

Sendo a maior parte de seus torcedores oriundo dessa região, foi natural a associação aos movimentos de esquerda.

Nesse cenário o clube cresceu com um forte apelo social, o que fez com que o esporte fosse visto como uma ferramenta educacional e que iniciativas pautadas por sua visão política fossem implantadas ao longo de sua existência. 


O Rayo foi o primeiro clube espanhol a ter uma mulher como presidente e, graças a um movimento liderado por sua torcida, reverteu a contratação do jogador Roman Zoluya que supostamente mantinha estreita relação com grupos neozistas.

Sua camisa traz uma faixa diagonal vermelha como forma de homenagear o River Plate, clube argentino que em 1952 lhe doou uniformes. Se sua gratidão é um fator a ser louvado, as ações que adotam no uniforme não ficam atrás, tendo já alterado a cor dessa faixa diagonal para  rosa como forma de se manifestar pela conscientização do câncer de mama e para as do arco-íris em protesto contra a homofobia.

Deve ficar claro que, independentemente da ideologia, o que se valoriza aqui é o conceito, ou seja, a maneira como o clube conseguiu, em um ambiente de aparente isonomia, se diferenciar dos demais sem que para isso tivesse um time vencedor, ídolos ou qualquer outro atributo esportivo valorizado pelo mercado – aqui se incluem torcedores e patrocinadores.

É muito provável que esse “posicionamento de marketing” tenha surgido de forma involuntária, até porque o lema da torcida é “Contra el racismo, la represión y el fútbol negocio”, o que nos faz crer que o marketing não seja muito trabalhado. 


Todavia, não há dúvida de que o apelo do clube é atrativo, tanto assim que  houve a abertura de uma filial nos EUA em 2015, o Rayo OKC, projeto que recebeu muitos protestos dos torcedores e durou apenas uma temporada.

Ainda assim, a lição que se tira é que a definição de um posicionamento para marcas é fundamental para se obter destaque em qualquer mercado, sendo recomendável que esse seja desenvolvido de forma cientifica, pois o acaso não nos fornece muitas histórias de sucesso.

Por fim, desejo a todos que votem com a consciência de que inimigos não são os que pensam diferente do que pensamos, mas sim aqueles que não pensam nas necessidades da nação.