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Aniversário do Horta

PRESIDENTE DAS LARANJEIRAS

entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | vídeo: Daniel Planel 

Foi com muita felicidade que recebemos o convite para prestigiar o aniversário de Francisco Horta, um dos maiores dirigentes da história do futebol brasileiro e hoje presidente da Santa Casa da Misericórdia, local da festa. Sem pensar duas vezes, partimos cedo para a instituição no Centro e participamos de uma bela confraternização.


Se hoje os clássicos são marcados, na maioria das vezes, por confusão entre as torcidas, houve um tempo em que a paz reinava nos estádios e o futebol arte prevalecia. Francisco Horta é, sem dúvidas, um dos grandes responsáveis pelos anos gloriosos do futebol carioca. Além de ter montado a lendária Máquina Tricolor na década de 70, o dirigente também ficou famoso por reinventar o troca-troca entre os clubes, incendiando os clássicos.

– Isso nunca mais vai acontecer. As torcidas ficavam misturadas na arquibancada e não tinha uma briga! – lembrou Fernando Bicudo, do Teatro Municipal.

– Sabe por quê? Porque naquela época existia a Geral! – disparou Horta.

O presidente foi recebido sob aplausos pelos convidados e, enquanto caminhava para o Salão Nobre cumprimentando um por um, foi ao delírio quando o o pianista tocou o hino do Fluminense:

– Emocionante! É o meu presente de 84 anos. É um hino que faz parte do meu coração!

Já no fim da festa, Márcio Braga, ex-presidente do Flamengo apareceu de surpresa, e colou ao lado de Horta para relembrar os tempos áureos do futebol carioca. Antes de entrar no assunto, no entanto, o ex-dirigente tricolor deu uma leve cutucada no rubro-negro:


– Ele roubava todas as minhas namoradas! – disparou.

Hoje em dia, Horta vem fazendo uma excelente gestão para recuperar a Santa Casa da Misericórdia, um patrimônio histórico da cidade. Mas para quem conhece o passado do dirigente, trata-se apenas de mais um êxito no seu vitorioso currículo.

– Foi o maior dirigente esportivo de todos os tempos, um dos maiores juízes que tivemos no judiciário brasileiro e é um homem que tem amor no coração e na palavra. Assumiu a Santa Casa em condições precárias e está conseguindo recuperá-la! – disse o desembargador Siro Darlan.

Vida longa ao Horta!

 

UM ÍDOLO É MUITO MAIS QUE CRAQUE

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


A ausência de Lionel Messi e Cristiano Ronaldo na entrega da Bola de Ouro escancara definitivamente a infantilidade dessa geração, um comportamento que a garotada define como Nutella e mimimi. São craques e isso não se discute, mas são mimados ao extremo, vaidosos, personagens de contos de fadas.

Messi já disse que não jogaria mais pela seleção argentina, fez biquinho, mas acabou voltando. Cristiano chorou porque foi expulso. Choram e reclamam por motivos fúteis. Para mim, não são referências.

Se você decide faltar a um evento dessa relevância, que faça como o ator Marlon Brandon, que, em 1973, recusou a estatueta do Oscar e mandou em seu lugar uma ativista indígena para mostrar seu repúdio à forma como os nativos eram tratados nos Estados Unidos. Dessa forma, se constrói um ídolo.


Para mim o ídolo tem que ter atitude, postura, iniciativa. A mesma que Afonsinho teve quando criou a Lei do Passe e trocou de clube por não aceitar cortar o cabelo. Os cabelos grandes, em nossa época, não eram uma modinha, mas uma forma de se manifestar. Que os piercings, brincos e tatuagens de hoje também sejam um grito contra o preconceito.

Na década de 60, conheci a socióloga americana Angela Davis e passamos a usar o futebol como uma ferramenta contra a discriminação racial. Mas em 1996 já existia o tal mimimi e a seleção olímpica, dirigida por Zagallo, também se negou a subir ao pódio para receber o bronze. Lembram-se disso? Pura birra.

Os atletas precisam entender que a derrota dói, mas deve ser encarada com dignidade, não com desleixo e deboche, como fez Ronaldinho Gaúcho, que usou o celular, no pódio, durante a entrega do bronze, em 2008.


Estive com Rogério Bailarino há alguns dias. Ele até hoje lamenta ter se contundido e cortado às vésperas da Copa de 70. Foi buscar na Igreja Messiânica explicação para isso. Dirceu Lopes até hoje chora por não ter ido ao México, assim como Ado, do Bangu, lamenta o gol de pênalti perdido na final do Brasileiro. Me culpo até hoje por um gol perdido contra a Holanda, assim como Zico deve sofrer até hoje pela falta de um Copa em seu currículo.

Hoje a derrota é banalizada. Não que a dor precise ser eternizada. Mas Felipão, por exemplo, continua se achando o último biscoito do pacote mesmo após o 10×1 (sete da Alemanha e três da Holanda). Vamos ver agora com mais essa desclassificação.

Os discursos mudaram. Hoje o futebol está infestado de palestrantes, do veterano Tite ao jovem Barbieri, que ficou tentando nos convencer até o último minuto que esse time sem molho do Flamengo é bom.


O melhor dessa bagunça toda é quando o “professor” se vê em maus lençóis e precisa furar um bloqueio, mudar o rumo do jogo. Ele olha para o banco e vê um Pedrinho, do Corinthians. Por sinal, esse garoto no banco é o retrato do futebol covarde praticado hoje. “Aquece, Pedrinho!”. Talvez ele não pratique boxe como Sassá e Felipe Melo, mas quando a porca torce o rabo, graças aos céus, é a arte do menino magrelo e bom de bola que ainda prevalece. 

MAIS UMA GUERRA – COMO OUTRAS TANTAS – VENCIDA

por Marcos Vinicius Cabral


Certamente na última segunda-feira (24), às 15h30 (horário de Brasília), os olhos do mundo estiveram voltados para a cerimônia do prêmio “Fifa The Best”, em Londres, que escolheu o melhor jogador do mundo na temporada 2017-2018.

No Royal Festive Hall – palco sagrado em que poucos pisaram -, com alguns metros de comprimento por alguns outros de largura, jogadores se digladiaram uns com os outros na busca pelo tão sonhado voto, e posteriormente, o tão cobiçado troféu de melhor jogador do mundo.

Não foi apenas uma simples votação de quem jogou mais bola e sim uma batalha campestre, em que o poder bélico de cada indicado foi colocado em prática à serviço da pátria de chuteiras.

Vale frisar que não foi um treino tático visando algum jogo importante e tampouco uma partida de 90 minutos: foi uma guerra!

Menos para um: Luka Modrić, de 32 anos e capitão da equipe croata no vice-campeonato na Copa do Mundo da Rússia!

– Obrigado aos meus fãs do mundo inteiro pelo apoio. Fico feliz pelo apoio que me deram desde sempre. Gostaria de agradecer aqueles que votaram por mim. Gostaria de mencionar o meu ídolo do futebol, capitão da Croácia na Copa de 1998, em nossa primeira participação, quando ganhamos o terceiro lugar. Aquele time mostrou que poderíamos conquistar coisas grandes e, por sorte… Tivemos a sorte de ser a mesma coisa para as próxima gerações. E mostramos que o sonho pode ser realidade! – disse Modric.

Nascido em um pequeno vilarejo chamado Modrici (plural de Modric, na língua croata), o pequeno Luka e seus familiares não tiveram opção quando em 1990, o país vivia em guerra por sua independência.

Quando houve então a secessão da Iugoslávia, a população sérvia – contrária ao movimento separatista – se juntou ao Exército iugoslavo para tomar o país.

A coisa estava tensa!


E ficou mais ainda, quando no final de 1991, o avô da estrela do Real Madrid – que coincidentemente se chamava Luka – passeava pelas colinas com seu gado quando párias de origens sérvias o sequestraram e em seguida o fuzilaram.

O mundo do pequeno Modrić desabou e aos 6 anos viu seu pai ser obrigado a servir ao Exército croata, sua família constantemente recebia ameaças de morte dos sérvios e a região onde moravam estava toda cercada por minas terrestres.

O terror físico e psicológico acabou obrigando-os a mudar para um hotel e com outras tantas famílias, se refugiando na cidade de Zadar.

Mesmo em meio ao território hostil de bombas, mortes e perseguições, havia no dono da camisa 10 da Croácia o sonho de ser jogador de futebol.

Contudo, na fase mais difícil da vida, fez do estacionamento do hotel um campo de futebol e ao som das explosões de granadas e morteiros, conviveu por um longo tempo com o perigo real e imediato.

E mesmo assim, ainda criança, deixou de driblar os veículos estacionados no concreto rachado daquele lugar e ingressou nas categorias de base do NK Zadar, clube local.

A dor existia dentro do pequeno Luka e sob forte pressão com os constantes ataques e a iminente marcação cerrada dos sérvios, soube se desmarcar, extraindo boas lições e cicatrizando aos poucos as feridas da alma.

Aos 12 anos, teve a chance de fazer parte do Hadjuk Split – seu clube de coração -, mas seu corpo franzino foi o responsável pelo não aproveitamento.


Com a persistência de um soldado de guerra, se profissionalizou aos 15 anos no Dínamo Zagreb e logo em seguida foi emprestado ao Zrinjski Mostar da Bósnia-Herzegóvina.

Entre idas e vindas, chegou à terra da Família Real em 2008, jogando pelo Tottenham, onde ganhou projeção internacional.

Atualmente joga no Real Madrid e disputou sua segunda Copa do Mundo – ficou em 22° lugar com a Croácia em gramados alemães em 2006 – e neste Mundial, apesar de não ter conquistado o título, fez os croatas se orgulharem de ter nele seu camisa 10, o equilíbrio da equipe muito bem treinada por Zlatko Dalic.

Portanto, venceu com 29,05%, o português Cristiano Ronaldo, que ficou com 19,08% e o egípcio Mohamed Salah, com 11,23%.

Se para os votantes (são técnicos e capitães das seleções, que não podem votar em jogadores de seu próprio país) essa eleição foi uma difícil missão, para Luka Modrić foi apenas mais uma guerra como as outras tantas que enfrentou desde 1985, quando veio ao mundo.

A CRUCIFICAÇÃO E RESSURREIÇÃO DO GOLEIRO NEGRO

por Paulo Escobar


Em meio a duzentas mil pessoas daquele Brasil e Uruguai de 50 vem um silêncio que ensurdece e se transforma num final de choro, para aquelas pessoas que ali se encontravam. E o silêncio não terminou alguns dias depois, mas continuou por décadas na vida do silenciado Barbosa, que pagou o maior preço de todos. 

Barbosa Goleiro Negro, e porque a importância do negro no título? Pois além dos pesos que teve que carregar, um deles foi o de ter sido goleiro Negro no Brasil. O peso foi tanto que numa das conversas com Mirandinha, aquele da perna quebrada, comenta que quem descobriu ele como atacante foi o pai dele, pois o mesmo queria ser goleiro. Mas um dos conselhos do pai a Mirandinha foi de que Goleiro Negro no Brasil era sofrimento a exemplo do Barbosa.

Barbosa foi lembrado como o culpado da perda do título daquela final de 50, mas poucos lembram dele como o grande goleiro que ele foi. Quase ninguém comenta que foi aquele que fechava o gol no “expresso da vitória” do Vasco da Gama em tempos da inexistência dos treinadores de goleiros ou equipamentos de proteção que amorteciam quedas, ou do não uso de luvas.


Como goleiro sofreu fraturas algumas vezes ao se enfrentar aos atacantes. No primeiro ano de Vasco foram costelas, braço, dedos e assim Barbosa viveu de uma carreira árdua e sem todo o aparato que se vive no futebol de hoje. 

Naquele fatídico domingo de julho o que Barbosa teve que enfrentar foi o começo da cruz que viria a carregar, as palavras que viria ouvir e o peso que se amplifica ainda mais num país carregado de racismo e que deseja ardentemente ainda hoje a derrota dos negros. O gol que o levou a ser enxergado como criminoso e que lhe custou o preço do martírio apagou a história do grande goleiro e humilde pessoa que Barbosa foi.

O que ele jamais imaginou antes daquele domingo, que mais parecia sexta-feira santa, era que se dirigia a sua crucificação e que o momento de alegria que ele esperava não se concretizou. Sempre penso o que será que Barbosa que se passou na sua cabeça, e como aquele homem de olhar humilde e sereno enfrentou essa culpa que lhe foi imputada. Numa das poucas entrevistas que anos atrás assisti na TV Cultura me lembro de ter chorado, num misto de tristeza e raiva, tristeza pela cruz que ele não escolheu carregar e raiva por ter sido crucificado.


Poucos foram os goleiros negros que tiveram na Seleção depois de Barbosa, poucos foram os que tiveram lugar de destaque mesmo sendo bons goleiros muitas vezes. Muitos carregaram o peso de serem comparados com Barbosa, não pelo grande goleiro que ele foi, mas pelo erro imputado a ele. 

O futebol brasileiro tem uma divida com Barbosa, e penso que no Maracanã era o lugar que uma estátua deveria de ser feita a ele, como herói que teve que carregar o peso de uma culpa até sua morte, para nos lembrarmos o quão injusto fomos com ele. E como continuamos crucificando Barbosa no desprezo aos goleiros ou técnicos brasileiros por serem negros, mesmo num país de maioria negra. Vide Jefferson, que vem sendo colocado no ostracismo aos poucos ou a perseguição que Aranha sofreu em tantos estádios.

Barbosa foi crucificado num domingo de julho de 50, mas acredito que ele ressuscita quando um goleiro vence no futebol brasileiro que ainda depois de décadas continua dando mais oportunidades e prestígio a goleiros brancos.