SÓ ME RESTA PEDIR DESCULPAS
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Escrevo essas mal traçadas linhas para pedir desculpas ao Maracanã e aos torcedores. É o que me resta. Meus gritos não são ouvidos e jamais serão. Estádio e torcedor aceitam tudo, menos esse descaso há que vêm sendo submetido há anos. O Maracanã passou por um lipoaspiração mal sucedida e cirurgias plásticas que o deformaram de vez.
O “maior estádio do mundo” queria envelhecer com dignidade, tomado por rugas e as marcas do tempo, registros de sua história. O Maracanã e sua inseparável torcida trazem cicatrizes que jamais serão apagadas pelos cirurgiões. A dor faz parte do espetáculo. Já choraram juntos em 50, mas estremeceram os pilares de felicidade com o gol de Romário contra o Uruguai. Maracanã e torcida, um depende do outro.
Os torcedores também foram transformados ao longo dos anos. Hoje, são brancos, belos e ricos. Duvido que saibam desfraldar uma bandeira gigante e tocar um repique. Duvido que o grito de gol saia das entranhas da garganta e que abracem o suadão do lado.
Me perdoe por isso, Dulce Rosalina, Rução, Tarzan, Tia Ruth e o homem do pó de arroz. Todos já choraram. Nenhum deles se importa em sair do estádio com o coração em frangalhos, mas não barre nenhum deles, suplico. Me perdoe, Jayme de Carvalho e sua charanga, me perdoe rapaziada fantasiada da Geral. Como fui xingado por vocês, mas como amo vocês! Bastava eu colocar a mão na cintura, desistir da jogada, para a galera cair de pau, me xingar de tudo.
Xinguem-me, voltem e afaste de mim esse pesadelo!!! Renasçam!!! Me perdoe, Mário Filho, João Saldanha, Nelson Rodrigues e Ruy Castro. Ah, Maraca querido, imagino sua dor e peço perdão porque sei que nenhum dirigente o fará. Eles afastaram você de seu melhor amigo, o torcedor.
Vocês são o maior símbolo de união e parceria do futebol. Quantas decisões você presenciou, abarrotado, explodindo. Excelente anfitrião, era da filosofia do sempre cabe mais um. Hoje acham 50 mil muito, Kkkkk!!!
Mas, Maraca e torcedores, cá entre nós, essa decisão da Taça Guanabara merecia a atenção de vocês? Era melhor não ter visto mesmo, né? Até o gol do título foi sem querer, Kkkk!!! Adoraria abraçá-los, ser um polvo gigante para carregá-los no colo porque vocês já me deram muitas alegrias. Tristezas também, afinal essa mistura de sentimentos é o que resulta nessa nossa paixão ensandecida.
Me perdoe, porque o perdão é o que me resta. A violência e o descaso com vocês chegou ao extremo, as grandes estrelas barradas no baile enquanto os egoístas brigavam por um lado. Sou do tempo em que quem tinha lado era disco, A e B.
Muita raiva por isso tudo e minha forma de extravasar é pedir desculpas, gritar o mais alto que eu conseguir. Ou, então, imitar a os geraldinos que no auge de sua ira, carregada de pureza, arremessavam seus radinhos de pilha no gramado.
O FUTEBOL NO ESTÁDIO, NA TV E MEIOS ESCRITOS NÃO É PARA POBRES
por Paulo Escobar
Corote Molotov
O futebol de décadas pra cá no que diz respeito para quem é feito me incomoda profundamente. E me incomoda muito mais por conta de onde vejo a sociedade. Há 19 anos trabalhando e lutando com a população de rua é dali que enxergo as coisas, lá também vivemos e respiramos o futebol, onde temos um time de várzea com moradores de rua, o Corote Molotov (fazendo propaganda temos uma página no Facebook).
Não é novidade que a partir do momento que entramos na era dos lucros extremos, o futebol tem se tornado a cada dia mais inacessível às pessoas mais pobres. E por todos os meios se torna um produto que pode ser presenciado apenas por alguns.
Nos estádios há tempos se encarece mais o acesso, os ingressos, dependendo do jogo, você amigo pobre não terá como presenciar mesmo, valores absurdos e se o time está indo bem costumam ficar mais caros. Quando o time está mal os ingressos se barateiam, aí se recorre ao povão para levar o incentivo deles quando se faz necessário, em tempos de boas campanha se encarece de novo e o público de teatro que volta ao “espetáculo”.
Poucos times pensam em setores populares nos estádios, e na construção das malditas arenas (que vieram padronizar e tirar as particularidades de cada estádio) os setores populares foram demolidos e não foram restaurados, mas sim extintos. Temos uma população de maioria pobre, em um país de sucessivos maus governos e que a cada dia que passa aumentam pobres, mas os dirigentes e entidades parecem fingir demência diante de tais realidades.
Há uma criminalização dos pobres e suas torcidas nos estádios, engrossando assim que lugar do pobre é fora das arenas. Quando há brigas são os primeiros alvos a exemplo das organizadas que são sempre os motivos de desconfiança nas confusões. Essa generalização é conveniente para encarecer e querer mostrar que o público do ingresso caro é o “civilizado” e o público do ingresso popular são os “bárbaros”. Essa falsa generalização também joga a serviço da exclusão.
E não só estádios são os que excluem, os meios de comunicação na sua versão televisiva e escrita também. Na parte televisiva, a TV fechada e os Premiere são inacessíveis a muita gente, e às vezes é somente lá que você consegue acompanhar seus times.
Os programas esportivos muitas vezes ficam centralizados somente naquele tatiquês chato e que se faz de uma maneira que poucos entendem. Somente aos chamados “intelectuais” do futebol, não se dosa ou não se tem preocupação se aquilo que tá sendo dito é acessível a quem assiste, pois o problema sempre vai ser atribuído àqueles que não entendem e não àqueles que não fazem traduzíveis.
Ou então muitos programas da TV aberta e fechada que são verdadeiras chatices, quando não se tem pauta se recorre a verdadeira idiotização, isso quando não se utilizam horas para falar dos times ricos e os times com menos recursos ocupam menos tempo.
As crônicas esportivas muitas vezes partem de uma visão longínqua da realidade da população, com uma linguagem insuportável e distante do dia a dia do povo pobre que vive e sofre o futebol. Quem escreve tem a preocupação se o Seu João ou Dona Maria vão entender o que é escrito? Há uma preocupação de nós críticos a este futebol que exclui os mais pobres, se é acessível aquilo que escrevemos a estas pessoas que são milhões ou escrevemos para nosso gueto também?
Nos ditos meios alternativos muitas vezes usam um linguajar acadêmico, que usam falas de forma estranha para a maior parte da população, pensamos se essas nossas ideias mesmo críticas são acessíveis? Nos fazemos traduzir às pessoas que não tiveram os mesmos acessos que muitos destes “intelectuais da Bola”? Muitos não têm nem a preocupação de pelos menos explicar aquilo que falam, mais parecem fazer programas para sua bolha de amigos e não para o restante da população.
Na várzea a colocação de grama sintética em muitos campos tem encarecido os valores de muitos times mais pobres, campos de R$ 1500 por mês para alguns times jogarem aqui em São Paulo mostram a exclusão chegando na várzea também. Além de caro é um risco para a saúde o sintético, já que em tempos de calor, as temperaturas se elevam mais ainda, a borracha esquenta e torna insuportável o jogo, mas como só se pensa no lucro e na exclusão de quem não tem dinheiro, isso pouco importa.
Então meu amigo pobre, a cada dia que passa o futebol é menos pensado para você, dirigentes e entidades não te querem dentro dos estádios. Na televisão você também não está nos planos, e nos meios escritos mesmo aqueles que criticamos muitas vezes não nos tornamos próximos na linguagem e nossos pensamentos muitas vezes são para nossas bolhas, isso também é um meio de te excluir dos meios escritos.
A cabeça costuma pensar onde os pés pisam, e isso mostra muitas vezes onde estão os pés daqueles que pensam, organizam e articulam o futebol.
Walfrido
O ESPANADOR DA LUA
entrevista: Sergio Pugliese | fotos e vídeo: Daniel Planel
Titular absoluto do time de botão de Sergio Pugliese, nosso capitão, Walfrido recebeu a equipe do Museu da Pelada em São Januário, sua segunda casa, e relembrou um pouco da história que construiu com a bola nos pés.
Conhecido como “espanador da lua” por sua impulsão bem acima da média, que resultou em inúmeros gols de cabeça, o goleador visitou a sala de troféus na Colina e ao cruzar a porta disparou:
– Isso aqui vai até o fundo do mundo! É muita história!
No meio de tanta história, não demoramos a encontrar a taça do Campeonato Carioca de 1970, tão significativa para Walfrido. Após 12 anos de jejum, o Vasco vencia o Botafogo por 2 a 1 e conquistava o torneio.
Se Gilson Nunes abriu o placar com um gol de falta, Walfrido tratou de ampliar a vantagem em um lance que ficara eternizado com a narração do saudoso Waldir Amaral:
– Outra vez o Vasco pela direita, vai levando Buglê, (…) executa o centro para Walfrido, aqui o Espanador da Lua… é goooll!!
O Botafogo ainda descontou no fim da partida, mas não foi o suficiente para tirar o título de São Januário.
Embora tenha sido uma grande pedra no sapato para os marcadores, havia quem cornetava a fera e reclamava das pernas compridas dele, assim como o seu jeito desajeitado. Conforme pesquisa do parceiro André Felipe de Lima, Walfrido, sem papas na língua, respondia na lata:
– Pois são estes pernões que estão aproximando o Vasco de um título que deve ser dele. Estes pernões farão os golzinhos na hora certa! – promessa cumprida!
Após a visita à sala de troféus, nos instalamos nas arquibancadas de São Januário e um filme parecia passar pela cabeça de Walfrido ao avistar o gramado do estádio onde fizera história. Por ali, vasculhamos o acervo do craque, com fotos e matérias bem guardadas por Solange, sua esposa, e relembramos sua trajetória que começou em 1964, sob incentivo do pai, no amador Arraial EC, de Recife.
Com a faixa de campeão do Carioca de 1970 no peito, o artilheiro manteve a postura até os 45 minutos do segundo tempo da resenha. Não se conteve, no entanto, ao ser homenageado pela diretoria do clube com uma camisa do Vasco personalizada.
– Vocês são fodas!!
No fim, ainda sobrou tempo para Walfrido revisitar a grande área e revelar o truque para ser tão letal nas bolas aéreas.
Dê o play e confira a resenha com o Espanador da Lua!
AMÉRICA-RJ 1974
por Marcelo Mendez
Havia um charme intrínseco no Rio de Janeiro dos anos 70.
No que pese o chumbo da ditadura militar em sua fase mais tenebrosa, a contracultura oferecia afrescos como o Pier de Ipanema, lotado de todos os surfistas do mundo, peladas de praia com dezenas de jogadores de cada lado, hippies experimentando todas as ondas do mundo, as dunas da Gal, os coletivos de Poesia como o Nuvem Cigana, os 40 graus da Cidade mais linda do mundo.
No futebol, tudo era mágico.
O concreto do Maraca começava a ver seus grandes times sendo formados. O de hoje, aqui em Esquadrões do Futebol Brasileiro, foi formado para ser campeão da charmosíssima Taça Guanabara em 1974. Vamos para a Tijuca, caros; Hoje é dia de celebrar um timaço:
O América de 1974.
UM PRÍNCIPE COMO TÉCNICO
O Campeonato Carioca daquele ano era bom.
Além dos grandes, times como Olaria, Madureira, Bonsucesso, tinham boas equipes e começaram a Taça Guanabara muito bem. Por outro lado, vinha o Diabo, com seu time bem formado e um príncipe no banco.
Danilo Alvim…
Lendário, Monstruoso, Gigantesco, Cracasso de bola do Expresso da Vitória do Vasco da Gama, como técnico, responsável pelo único título da história do futebol Boliviano. O Príncipe Danilo, como era chamado, chegou no América para trabalhar naquele ano formando uma equipe de sonhos.
Com auxilio do Sul do Brasil, trouxe jogadores como Alex, Bráulio, menino de ouro do Inter, aliado ao matador Luisinho, ao rápido e técnico Flecha, ao cerebral Ivo, vindo também do sul. Dois laterais firmes, como Orlando Lelé e Álvaro e a zaga forte com Alex e Geraldo, e o bom goleiro Rogério. Pronto.
Era o equilíbrio perfeito para um time que voou na Guanabara. O América só perdeu uma partida, para o Flamengo, teve mais um empate contra o Botafogo e depois jantou todo mundo. Meteu 4×1 no Vasco, Passeou em cima do Fluminense, Bonsucesso, São Cristovão, deu baile de bola em todo mundo e se credenciou para a final. O adversário, o Fluminense.
Era a hora da glória…
DIA DE PINTAR O MARACA DE VERMELHO!
No dia 22 de setembro de 1974, 98 mil pessoas foram até o Maracanã para ver a final entre América x Fluminense.
Na arquibancada, botafoguenses, flamenguistas e vascaínos se juntaram aos torcedores do América para empurrar o Diabo pra cima do Flu e deu muito certo; Aos 12 do primeiro tempo, numa batida de falta seca, no canto do goleiro Felix, Orlando Lelé faz 1×0 em favor do América e esse placar se manteve até o final.
Com o Maracanã em festa, o América volta a comemorar um título, como havia feito em 1960 e coloca para história aquela geração talentosa que formou um time que jamais será esquecido por seus apaixonados torcedores:
Rogério; Orlando, Alex, Geraldo e Álvaro; Ivo e Bráulio; Flecha, Luisinho, Edu (Renato) e Gilson Nunes, jogadores do técnico Danilo Alvim, são os homenageados dessa coluna hoje.
Esquadrões do Futebol Brasileiro tem a honra de tê-los por aqui, Americanos.
O CÚMULO DA IRRESPONSABILIDADE
Luis Filipe Chateaubriand
Devido a uma situação absolutamente prosaica, o futebol carioca passou, ontem, por uma das maiores vergonhas de sua história.
Tanto Vasco da Gama como Fluminense queriam disputar o clássico decisivo da Taça Guanabara com suas torcidas acomodadas no setor sul do Maracanã.
Como não houve acordo entre os clubes, uma medida judicial determinou que a decisão acontecesse sem público, com portões fechados.
O jogo assim começou, mas outra medida judicial determinou a abertura dos portões – prejudicando o Fluminense, pois só havia torcedores vascaínos no entorno do estádio.
O Vasco da Gama argumentava para que sua torcida ficasse no setor sul, que isso era uma tradição desde 1950.
O Fluminense argumentava para que sua torcida ficasse no setor sul, que o acordo com o consórcio que administra o Maracanã previa isso.
Como sempre, faltou diálogo para resolver o impasse.
Era fácil resolver o dilema: o Vasco da Gama, mandante do jogo, comunicaria ao Fluminense sua intenção de ter a sua torcida no setor sul. Com a negativa do Fluminense, decidiria ou por acomodar sua torcida no setor norte, ou por realizar o jogo no Estádio Nílton Santos ou em São Januário.
Se houvesse, portanto, diálogo entre as partes, a situação patética não se sucederia. Mas, ao optarem por muito barulho por nada, dirigentes irresponsáveis e inflexíveis criaram um papelão poucas vezes visto no futebol brasileiro.
É pena, pois a sensação que se passa é que futebol não é ambiente para gente séria, o que é ofensivo a todos nós que amamos este esporte fascinante.
Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há 40 anos e é autor da obra “O Calendário dos 256 Principais Clubes do Futebol Brasileiro”. Email: luisfilipechateaubriand@gmail.com.