O VENDEDOR DE LIMÕES QUE AJUDOU NA CONSTRUÇÃO DO “FENÔMENO”
por Marcos Vinicius Cabral
O pôr do sol era mágico e revitalizante para os frequentadores da Feira da Cacuia, forte comércio popular na Ilha do Governador, Zona Norte do Rio de Janeiro.
Entre milhares de barracas, a de seu João Pé (apelido de José Ferreira Nunes 1949-1994) e do ajudante Boca chamava a atenção dos frequentadores: o perspicaz Clayton Divina Nunes, aos 9 anos de idade vendia limões com grande desenvoltura.
– Eu ficava feliz aos domingos em levantar às 4h da manhã da cama para às 5h sair com meu pai de São Gonçalo, chegar às 7h na feira para vender limões e ajudar minha mãe nas despesas de casa – diz aos 42 anos o auxiliar administrativo do HEAT (Hospital Estadual Alberto Torres), no Colubandê.
E completa:
– Meu pai foi tudo na minha vida. Até hoje, eu e meus irmãos, sentimos sua falta – conta visivelmente emocionado ao Museu da Pelada.
Se em casa era responsável, na rua era um irresponsável moleque bom de bola e que encantava a todos com a habilidade, rapidez e quantidade de gols marcados nos tradicionais golzinhos de praia, disputados no chão áspero e cheios de pedras na Rua Silvio Vale no Gradim.
O sangue estancado com a dor nos dedos do pés machucados pelas topadas que dava nas peladas de rua não lhe impediria de ir em 1987 com o ponta-direita Marcelo e o ponta-esquerda Wallace Sol tentar a sorte no Batalhão da Polícia Militar em Neves, onde funcionava a escolinha do Vasco da Gama, comandada por seu Tião.
– Treinamos juntos e depois seguimos destinos diferentes. Ele se profissionalizou, atuou em grandes clubes e eu segui a carreira militar – conta Wallace Marins da Silva de 43 anos.
Dois anos depois, em 1989, levado pelo irmão mais velho Anderson, que era lateral-esquerdo juvenil do São Cristóvão de Futebol e Regatas chegaria para ser testado no mirim do clube.
Treinou bem e com a camisa 8 às costas, virou Catê (não por mera coincidência mas por ser muito parecido fisicamente e futebolisticamente com o ex- atacante são paulino falecido em 2011) e passou num teste com mais de 80 meninos jogando de meia-direita.
– Era um garoto de 12 anos que driblava as dificuldades se deslocando de São Gonçalo para São Cristóvão quase que diariamente, sendo sempre um dos primeiros a chegar ao clube e mesmo após o término das atividades, permanecia, pois “fominha”, era necessário ser retirado ou expulso – elogia Flávio Vieira Moraes de 51 anos, seu primeiro treinador.
No São Cri Cri, ficou de 89 a 93, sendo bicampeão da Copa Mané Garrincha (1991/1992), eleito o craque da competição jogando ao lado de um certo Ronaldo, artilheiro da competição, com quem formou dupla até 1993.
– O nosso time era muito bom e dei muitos passes para “Mônica” fazer gols – conta às gargalhadas ao explicar que por ser dentuço o Ronaldo era chamado pelo famoso personagem do cartunista Maurício de Souza.
E confidencia:
– Conversávamos muito sobre um dia a gente se enfrentar no Maracanã. Eu pelo Fluminense e ele pelo Flamengo – lembra.
Casados pela bola no irregular gramado de Figueira de Melo em 1989, formando assim um par perfeito até o divórcio em 1993, quando entraram em litígio com o clube.
Enquanto “Mônica” passaria a se chamar Ronaldo no Cruzeiro e viraria “Fenômeno” anos mais tarde, Catê seria Clayton “Grilo” no Grêmio até a aposentadoria em 2005, em decorrência de problemas no joelho.
– Devo muito ao Eduardo, por ter me levado para o Grêmio. Queria pode dizer um muito obrigado e que foi o maior lateral-esquerdo que vi jogar – diz do ídolo tricolor que hoje trabalha nas categorias de base do Friburguense.
Nômade no futebol profissional e amador, ganhou títulos expressivos no Avante, Ponte Preta e no Estrela Azul, sempre se destacando e sendo respeitado na cidade de 128 anos de existência.
Escreveu seu nome na história gonçalense como um dos Gigantes com G maiúsculo no futebol de várzea e carrega até hoje a alcunha de ter sido o primeiro parceiro do “Fenômeno”.
Nada mal, convenhamos, mas ser “Fenômeno” é manter o COT (Centro de Oportunidade ao Talento), projeto social fundado em 2006 e que sobrevive às custas da venda de camisas e doações.
– O intuito sempre foi tirar as crianças das ruas e mostrar o caminho a ser seguido. E o COT é esse caminho – diz esperançoso.
Atualmente, o COT conta com 150 crianças e adolescentes que saídos das ruas buscam nos treinos aos sábados das 7h às 11h no Campo do Cruzeiro, situado na Avenida Porto da Pedra s/n° – Porto Novo, São Gonçalo, uma oportunidade para mudar de vida.
Mais informações pelo Whatsapp: (021) 97034-2076 e na página no Facebook.
DESMISTIFICANDO TELÊ SANTANA
por Luis Filipe Chateaubriand
Não cabe aqui questionar a excelência do trabalho de Telê Santana como grande treinador que foi. Isso é líquido, cristalino e inquestionável. Sempre foi um técnico que buscou imprimir em seus times a marca do futebol bem jogado, técnico, artístico.
Alguns imaginam que isso começou quando assumiu o cargo de técnico da Seleção Brasileira, em 1980. Falso. Seu trabalho anterior no Palmeiras, por exemplo, mostra que armou um time que “jogava por música”, mesmo com jogadores de técnica não lá muito desenvolvida. Seu Palmeiras de 1979, especialmente no Campeonato Paulista, foi um time de futebol bastante apreciável, embora tenha sido eliminado nas semifinais pelo rival Corinthians, que seria o campeão.
Contudo, alguns resolveram alçar Telê à condição de mito. Aí, parece ser um pouco demais.
Vejamos alguns vícios do treinador Telê Santana em relação à Seleção Brasileira que disputou a Copa do Mundo de 1982, decantada em prosa e verso como a melhor do pós 1970:
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Telê, desde que assumiu a Seleção até a Copa, nunca convocou Emerson Leão, o melhor goleiro do país. Preferia jogar, na zaga, com o técnico, porém lento, Luisinho, ao invés do dinâmico Edinho. Tendo Roberto Dinamite à disposição, preferia escalar Serginho Chulapa. Não via que Dirceu era um ponta com função tática muito mais útil que Éder. Não percebia que Batista poderia dar mais solidez ao sistema defensivo. Teimosia pura.
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Telê se negou a enxergar que o Flamengo de 1981 era um time incrível – seja tecnicamente, seja taticamente, seja em termos de conjunto – e, assim, perdeu a oportunidade de fazer essa espetacular equipe seu time base para 1982. Não o fez porque isso seria “encher a bola” de Cláudio Coutinho, que armou aquele brilhante escrete. Vaidade pura.
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Telê não convocou o craque, o gênio, o espetacular Reinaldo para a Copa porque este mantinha relacionamentos de amizade com homossexuais e tinha visão política distinta da dele. Preconceito puro.
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Telê, diante da negativa de Tita em continuar na Seleção jogando de ponta direita, o excluiu definitivamente das convocações, ao invés de, através da conversa, tentar convencê-lo a atuar daquele lado do campo, brilhante que era. O lado direito do time ficou torto. Inflexibilidade pura.
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Telê, não dispondo de Tita, treinou meses Paulo Isidoro na ponta direita… para depois praticamente não utilizá-lo em toda a Copa. Incoerência pura.
Em função destes fatos, se está dizendo que Telê era mau técnico? De forma alguma. Mas havia falhas notáveis em seu trabalho, como, por exemplo, levar pouco em consideração concepções táticas ao armar seus times. Alguns dizem que o “barato” dele era botar os melhores em campo e que eles treinassem coletivos e se entendessem. Não era bem assim, mas que a concepção tática ficava em segundo plano, parece ser real.
Transformar um profissional com méritos, mas também com deficiências, em mito, parece não ser apropriado. É hora de desmitificar.
Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há 40 anos e é autor da obra “O Calendário dos 256 Principais Clubes do Futebol Brasileiro”. Email: luisfilipechateaubriand@gmail.com.
COMPETIR É IMPORTANTE
por Idel Halfen
A desproporcional concentração de renda nas mãos de alguns clubes no futebol brasileiro tem tudo para redundar em uma gradativa perda na atratividade da modalidade. A citada “concentração” teve início na distribuição das receitas relativas ao direito de se transmitir os jogos quando, baseado em pesquisas sobre o tamanho das torcidas, alguns clubes começaram a receber muito mais do que outros, o que por sua vez tende a amplificar o desequilíbrio em função das maiores receitas com patrocínios e prêmios oriundas de prováveis melhores desempenhos.
Diante desse quadro não é nenhum absurdo considerar que muitos dos fãs do futebol direcionarão sua atenção para modalidades onde os “escolhidos” para receberem sua torcida tenham maiores chances de triunfo.
Isso não significa que deixarão de torcer por seus clubes, apenas não serão mais tão assíduos, o que se reflete no menor consumo de produtos, audiência e presença no estádio. Sendo que não pode ser descartado um cenário no longo prazo em que toda a cadeia sofra os efeitos do “esvaziamento” de atenção, o que inclui as emissoras que transmitem os jogos e os próprios clubes com maiores receitas, visto que um ambiente sem emoção é um dos maiores ofensores da atratividade no esporte.
Não é incomum, muito pelo contrário, ver pessoas preferindo assistir a um jogo de uma equipe estrangeira, mesmo que de outras modalidades, do que seu time.
Aqui fica mais uma vez evidente um dos maiores erros que se comete em marketing: o não mapeamento da concorrência.
Exemplificando, é possível preferir um refrigerante a outro, porém o consumo efetivo ser de água ou de qualquer outro tipo de bebida, isso sem entrar no mérito de distribuição, precificação e divulgação dos produtos em questão. O mesmo ocorre no futebol, o sujeito continuará preferindo sempre seu time a qualquer outro, porém as chances de assistir a jogos internacionais e/ou de outras modalidades são bem maiores do que outrora, até porque o escolhido naquele momento tem mais chances de vitórias e, consequentemente, será capaz de atrair sua atenção/emoção. Isso sem contar que no dia seguinte não encontrará com torcedores da equipe adversária para incomodá-lo em caso de derrota.
Não creio que nessa altura haja ainda espaço e tempo para se discutir sobre os critérios, ou mesmo sobre a fidedignidade das pesquisas. Eu sempre os questionei – que se registre -, mas mesmo que estejam corretos sob algum prisma, eles certamente não contemplam uma visão de longo prazo, tampouco estratégica. Portanto, urge que sejam tomadas medidas para que as rivalidades sadias sejam restabelecidas e a indústria do futebol no Brasil não venha a ser dilapidada por interesses egoístas e míopes.
Assim como preconizava o Barão de Coubertin com a frase “o importante é competir”, podemos analogamente afirmar que “competir é importante”, o que, aliás, pode ser atestado pelo sucesso das principais ligas norte-americanas.
QUEM É GRANDE?
por Idel Halfen
Uma tese do jornalista Rodrigo Capelo causou enorme polêmica junto aos torcedores dos clubes de futebol. O ponto central de sua afirmativa era a de que o futebol brasileiro tem atualmente no máximo cinco clubes grandes, baseando essa segmentação na capacidade competitiva das equipes, a qual, por sua vez, é influenciada pelo faturamento dos clubes.
Antes de prosseguir com o debate, convém esclarecer que considero o jornalista em questão como um dos mais, se não o mais preparado do setor, sendo um dos poucos que estuda, pesquisa e que não fica preso a paradigmas ou preocupados em ter espaço na mídia popular, na maioria das vezes sensacionalista e ignorante acerca de temas ligados à gestão.
Esse reconhecimento não significa que eu esteja de acordo com sua tese, aliás, nesse caso sou radicalmente contrário, devendo ficar claro que a minha contestação não tem relação com o fato de o meu clube ter ficado de fora da relação dos “grandes”, mesmo tendo se sagrado duas vezes campeão brasileiro nos últimos 9 anos. A propósito neste período apenas quatro clubes conquistaram o citado título.
O que questiono é a definição do que é ser grande, visto existirem milhares de atributos de avaliação em qualquer segmento. Um sujeito grande pode ter essa qualificação em função da altura, do peso, do caráter e de uma série de características que assim o adjetivem. Uma empresa tem essa avaliação devido ao faturamento, número de colaboradores, abrangência regional, etc., contudo, todos esses indicadores necessitam de alguma parametrização. Exemplificando, um cachorro da raça dog alemão é enorme até ser comparado com um elefante.
Entendo a alusão feita à competitividade, mas se seguirmos nessa linha poderemos concluir que não há nenhum time grande no Brasil, pois nenhum deles tem tido projeção reconhecida em campeonatos intercontinentais.
Já a variável “faturamento” é coerente, sem dúvida, mas de que adianta faturar se o dinheiro não for bem aplicado? Avaliar o EBTIDA, o nível de endividamento e demais indicadores também ajudariam a entender esse mercado, mas não isoladamente.
Outro fator importante é o tamanho da torcida, desde que, é claro, as pesquisas a respeito utilizem metodologias e amostragens confiáveis.
Como podemos ver, existe uma infinidade de possibilidades e critérios a serem adotados, valendo salientar que o próprio Capelo deixou claro que sua tese era fruto dos critérios que ele considerava pertinentes, ou seja, não se considerou o “dono da verdade” em sua conclusão.
Todavia, penso que em vista dessa gama de variáveis seria necessária a elaboração de uma modelagem que permitisse ponderar cada um dos indicadores e ainda assim surgiriam questionamentos, isso sem falar no tempo que levaria para se testar os modelos.
Algo bastante complexo para se aplicar numa discussão que, no meu modo de ver, é pouco pragmática.
Dessa forma, minha sugestão é que não se despenda energia tentando segmentar instituições fortemente atreladas à paixão e que os resultados esportivos se encarreguem de proporcionar as devidas classificações aos clubes.
Para concluir, reforço a fala do Capelo acerca do perigo que corre a indústria do futebol com a crescente concentração de receitas, essa sim, digna de preocupação e carente de estudos que mostrem os indubitáveis grandes riscos envolvidos.
NÃO SUPORTO COVARDES
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Ainda estou me refazendo do susto de ontem, do efeito devastador do temporal que me obrigou a atravessar o Jardim Botânico com água no peito. Eu e centenas de pessoas se viraram como puderam para chegar em casa, enfrentaram água suja, fios desencapados, bueiros abertos e o risco de serem eletrocutadas.
Por falar nisso, não ouvi mais ninguém falar do acordo entre o Flamengo e os familiares das vítimas do CT. Não merecemos esse desleixo. Para piorar, o clube acaba de assinar um novo contrato milionário, junto com o Fluminense, pelo Maracanã. Quer dizer que o estádio é mais importante do que as vítimas? Somos um povo destemido, que não se acovarda. Por isso, não suporto os covardes.
É inevitável não trazer essa comparação para o futebol, afinal resolvi enfrentar a força da chuva logo após assistir Corinthians x Santos, uma aula de covardia de Carille. E depois ainda me questionam quando elogio Sampaoli e seu futebol ofensivo. Ontem, mesmo após fazer o gol, o jovem time de Rodrigol, Pituca & Cia continuou em busca do segundo para evitar os pênaltis enquanto a turma de Carille estava nas cordas, acuada, contando os segundos para a partida encerrar. Por favor, não chamem isso de estratégia, mas de futebol de quinta categoria. Pobre dos jogadores, como Pedrinho, que pegaram Carille como treinador.
Técnicos assim são cemitérios de talentos. Ainda bem que Cuca também superou seu temporal particular e voltou ao mercado. E eliminado Felipão o que é melhor ainda! Esses técnicos poderiam se juntar e lançar um manual chamado “Vença sendo Covarde”.
O Palmeiras é outro caso de cemitério de bons jogadores. Certamente Dudu renderia bem mais na mão de outro professor. O Bruno Henrique vinha fazendo gols, mas foi recuado porque em time de Felipão fazer mais de um gol é pecado. O meio-campo não é valorizado. O zagueiro bica para frente, um cabeçudo faz o gol e depois inicia-se a aula de covardia.
Por falar em covardia por que o valentão Felipe Melo não foi selecionado para bater pênalti? Vou torcer muito para o São Paulo porque o Cuca coloca o time para jogar, aposta na garotada. Carille vencendo continuaremos na mesmice, no retrocesso.
Já viram o Fortaleza, de Rogério Ceni jogar? Então, vejam! Tomara que ele continue seguindo a filosofia do futebol ofensivo e bom de se ver. Atacantes rápidos, que lembram os velhos pontas! Contra o Vitória, pela Copa do Nordeste, fez quatro, mas podiam ser dez!
Viram Barcelona x Atlético de Madrid? Simeone segue o manual dos covardes, mas a dupla Suarez e Messi são os palhaços que o circo do futebol precisa. Necessitamos cada vez mais de malabaristas, entortadores, magos e artistas. Nosso dia a dia já é muito turbulento para assistirmos espetáculos dirigidos por maestros que não deixam sua orquestra tocar.