TENDE PIEDADE DE NÓS
por Eliezer Cunha
Encerra-se finalmente o jogo, Vasco x Palmeiras em São Januário pelo Brasileirão de clubes 2019. Deixa-me corrigir, digo partida. Não posso classificar o que acabo de assistir e que me fez sair da inércia do aconchego do meu leito, para dissertar esta resenha, como jogo, não me permito.
Por parte do Palmeiras fica evidente o desinteresse pelo título disputado, mais ainda, demostra desprestígio pelo adversário da partida, isso, quando um time, talvez o único, a ter possibilidade de ultrapassar o time principal e líder do campeonato, favorito para conquistar o maior campeonato nacional, traz para a disputa praticamente seu time reserva. Audacioso seu técnico, paciente sua torcida e irrelevante o título disputado. Revirando minha memória não identifico nada de útil que possa ter ocorrido nesta partida. A pelota mais uma vez se depositou em segundo plano e o que se viu foi um bando de jogadores arremessando a bola para onde o nariz apontava. Infelizmente o que podemos assistir em 90 minutos foi: gol contra, enxurradas de cartões distribuídos, excessos de interrupções por reclamações e faltas, um juiz em campo desnorteado, nenhum esquema tático, atuação desnecessária do VAR, fundamentos básicos do futebol esquecidos, passes errados, escanteios mal batidos e qualidade do gramado a dar inveja a qualquer campo de várzea.
Por outro lado ainda ter que assistir uma equipe de jornalistas (Narrador e comentaristas) fazendo o possível para trazer normalidade e emoção à partida (comum nesta emissora). Cadê a verdadeira opinião desvinculada? Cadê a consideração com o telespectador? Cadê o compromisso com a profissão? Outra ocasião um jogador perdeu um gol e a justificativa de um dos comentaristas foi que a bola enganou o jogador… Desliguei no ato a TV.
Para alguns torcedores mais jovens estas minhas considerações podem não possuir sentido ou lógica, agora, para quem ia ao Maracanã mais cedo na década de 70 / 80, a fim de conquistar um lugar no espaço mais alto da Geral “ferro da geral” (Estrutura tubular que envolve a geral, entre o espaço da geral e as cadeiras), assistir as equipes de Zico e Roberto Dinamite sabe como dói hoje ter que assistir alguns atletas correndo atrás daquilo que para eles é apenas e somente um objeto esférico.
E continuamos a implorar agora mais que nunca: Jesus tende piedade de nós e do futebol carioca.
QUANDO A PREGUIÇA E A ACOMODAÇÃO FALAM MAIS ALTO
por Luis Filipe Chateaubriand
Ao longo dos anos 1990 e primeira metade dos anos 2000, Vanderlei Luxemburgo era o melhor técnico de futebol no Brasil, disparado!
Inteligente, estudioso, ousado, taticamente atualizado e ótimo gestor de grupo, era campeão por onde passava, fazendo que os times que dirigia produzissem muito além do que se poderia imaginar.
Contudo, em 2005 se transferiu ao Real Madrid.
A estadia em terras espanholas não foi feliz, nosso prodígio levou “baile tático” lá fora, provando que era excelente ao nível Brasil, mas aquém do ideal em nível global.
Ora de voltar e se reciclar, certo? Errado.
Voltar, voltou. Se reciclar… ficou devendo.
Desde que voltou da experiência europeia, Luxemburgo preferiu se acomodar, ao invés de evoluir.
Preguiçosamente, começou a dirigir seus times de forma burocrática e pouco inventiva.
Que desperdício de talento!
Agora mesmo, no Vasco da Gama, vem fazendo um trabalho medíocre: se sabe motivar o grupo, sabendo tirar de jogadores limitados o seu melhor, não se vê nenhuma inovação tática, nenhuma ousadia maior, nenhum lampejo de jogo pensado, como outrora acontecia em seus trabalhos.
De alguém que se destacava por brilhantes trabalhos táticos, ver-se como simples motivador de grupo, é pouco demais.
O Luxemburgo desta década é parda eminência do Luxemburgo de 15 anos atrás.
Pior de tudo, tornou-se corporativista: para defender o conjunto dos técnicos brasileiros, a imensa maioria deles sofríveis, começou a atacar Jorge Sampaoli. A dizer besteiras como o que Sampaoli faz no Santos não é nada demais, que o time santista é ofensivo porque está no DNA do clube e, sacrossanta de todas as cretinices que se fala em nosso futebol, nada de essencial mudou no esporte nos últimos tempos.
Pombas, pofexô, respeite sua própria inteligência: o futebol mudou, sim, e Vossa Excelência sabe muito bem disso!
Só não quer admitir porque não se atualizou e, assim, não acompanhou as mudanças.
Nada define melhor a situação do que as tradicionais adjetivações de Mauro Cezar Pereira: pífio, patético e ridículo!
Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebol há 40 anos e é autor da obra “O Calendário dos 256 Principais Clubes do Futebol Brasileiro”. Email: luisfilipechateaubriand@gmail.com.
ALEGRIA DE SER RUBRO-NEGRO
por Leandro Ginane
Há pelo menos vinte anos frequento as arquibancadas do Maracanã. Desde moleque, sempre vi a torcida do Flamengo eufórica nos momentos de títulos e vitórias, mas também bastante decepcionada na maior parte desses últimos anos, mas não me refiro aqui a perda de campeonatos, eliminações vexaminosas ou coisas do tipo. Não, nada disso. É algo mais profundo que até bem pouco tempo não conseguiria explicar se tentasse escrever um texto com esse fim.
O fato é que sempre notei um saudosismo profundo no torcedor flamenguista, que só agora entendo ter pouco a ver com os resultados e conquistas do clube. Um sentimento que se instalou nos corações rubro-negros no final da década de oitenta, com a despedida do Zico e de toda uma geração criada no Flamengo.
A partir daquele momento a Nação parece ter começado a viver um luto que se arrastaria por quase trinta anos, e nesse período, a cada ex-jogador daquele time inesquecível que reaparecia na Gávea para assumir como técnico ou algum outro cargo, enchia os corações rubro-negros de esperança, como se fosse possível voltar no tempo pela mística de um jogador do passado. Foram inúmeras as vezes que isso aconteceu, e como num ciclo que teimava em se repetir, o torcedor deixava a euforia ocupar momentaneamente o lugar da saudade, que logo recuperava seu espaço no peito da Nação. Essa sempre foi a tônica nas últimas três décadas da Maior Torcida do Brasil.
Já adulto, me perguntava quando esse luto terminaria. Imaginava que com a conquista de um grande título a nação voltaria a sorrir. Ele veio em dois mil e nove, com o hexa campeonato brasileiro, mas a saudade teimava em voltar. Até bem pouco tempo não tinha encontrado a resposta do porquê isto acontecia e só agora pude perceber, antes mesmo da confirmação do heptacampeonato brasileiro e do bi da libertadores. Escrevo essas linhas no dia de São Judas Tadeus, dia também do aniversário de oito anos do meu filho e quando ainda faltam dez rodadas para o fim do Brasileirão.
Neste momento em que estou bastante impactado com o ambiente que se formou em volta do Flamengo, redescubro a força desse clube, principalmente entre as crianças, que tem a oportunidade de viver esse momento de uma forma bem mais intensa que nós. Sendo pai de um casal, um menino de oito e uma menina de quatro, tenho a possibilidade de vivenciar isso de perto. Fica fácil notar que o mais importante para eles não é a posição de liderança do campeonato brasileiro, tão pouco a sonhada presença na final da libertadores. Para eles, o mais importante são as comemorações dos jogadores, as muitas festas que são convidados e que tem o Flamengo como tema, a bagunça no Maracanã com seus amigos, os cânticos da torcida e tudo o mais que envolve as cores rubro-negras.
Esse ambiente que se formou novamente depois de tantos anos só é possível por um único motivo: a forma como o time joga. Alegre, pra frente, encurralando seus adversários e incansável na busca pelo gol, não importa quantos faça. O desejo de balançar as redes é o mesmo para marcar o primeiro ou o quinto gol, como na semifinal da Libertadores contra o Grêmio no Maracanã, em um jogo histórico.
Ao ver essas reações, me recordo que foi exatamente isso que aconteceu comigo e com uma geração inteira de crianças que viveram o time da década de oitenta. Me lembro bem da minha festa de oito anos com o tema Flamengo, emoldurada em foto onde eu e meu irmão posamos uniformizados lado a lado em cima de cadeiras de palha. Eu tentava imitar o Zico e o Leandro jogando bola. Meu pai frequentava todos os jogos e chegava em casa cheio de novidades. Agora, quando mergulho nessas memórias afetivas e percebo como tudo era mágico para um menino de oito anos, noto que o luto tem suas raízes na perda desse ambiente que foi consequência do fim daquele time. A fantasia deu lugar a tristeza, que chegou e permaneceu por muito tempo, até que um time liderado por um brilhante técnico português, resgatou tudo o que significa ser Flamengo e eu pude enfim enxergar de onde vinha tanta saudade e frustração.
Meu pai agora é um senhor de setenta anos e nossos contatos passaram a ser mais frequentes. O Flamengo, claro, é um dos principais assuntos. Estou vivendo junto aos meus filhos cada momento proporcionado pelo Mais Querido, quando noto que aquele saudosismo que parecia interminável chegou ao fim. O Flamengo novamente joga como nos meus mais profundos e singelos sonhos infantis, meu filho tenta imitar o Gérson, craque do meio campo, meu pai evita comparações, mas volta e meia vê semelhanças entre dois times tão distantes e compara nosso artilheiro com Nunes. É um time para se orgulhar, onde jogadores e torcedores são um só.
Outro dia no Maracanã, percebi que aquele grito que parecia adormecido nas arquibancadas, curiosamente voltou com a mesma força do passado: Quero cantar ao mundo inteiro a alegria de ser rubro-negro!
‘FUTEBOL CARDS’, MARCO NO USO DE IMAGENS DE ATLETAS PELAS MÍDIAS
por André Felipe de Lima
“Futebol Cards” e “Álbum da Copa de 82”, lançamentos inesquecíveis do chiclete Ping-Pong, da Kibon, entre 1979 e 1982. Minha geração colecionou. Eu, inclusive. Era chiclete que não acabava mais — jogávamos todos fora —, porém muitos cartões com a foto e as informações mais inusitadas dos jogadores nos deixavam enlouquecidos. Mal dormíamos pensado neles. O Orlando Lelé, por exemplo, jogava pelo Vasco, em 1979. Consegui os dois cartões dele. Lembro-me bem disso. Ele curtia Gal Costa, Elis Regina, Chico Buarque e a atriz Ilka Soares. Não abria mão de feijoada. Nosso querido Paulo Cezar Caju estava no Botafogo. Gostava de boa música, praia e de bater papo com amigos. Era fã do Pelé e adorava colecionar camisas e carros esportes. Cada card destes caras disputávamos no tapa durante os intervalos da escola. Não completei o “Futebol Cards”, como o advogado paulista Daniel Aparecido Ranzatto ou mesmo o colecionador Manoel de Mello Júnior, que o amigo Sergio Pugliese, do nosso Museu da Pelada, entrevistou recentemente. Mello Júnior é um camarada incansável que, além de ter as coleções completas, perambula por cada canto do Brasil e do mundo atrás dos autógrafos dos craques daquela época. Conseguiu os do Guina (Vasco) e do Pintinho (Fluminense), na Espanha. Simplesmente do cacete.
Nossa incansável investigação peladeira na busca de tudo que nos ajuda a incondicionalmente amar o futebol chegou a alguns dados sobre as origens das duas coleções. Informações importantíssimas perdidas no tempo. Vamos lá:
A Kibon lançou a coleção “Futebol Cards” em fevereiro de 1979. A festa de lançamento aconteceu em um jantar realizado no Buffet Colonial de São Paulo. Vários jogadores que constaram da lista dos cartões estiveram presentes, informaram o Jornal do Brasil e a Folha de S.Paulo.
Eis a informação sensacional: como noticiou a Folha, a “Futebol Cards” foi a primeira promoção que pediu, previamente, autorização aos atletas para uso de suas imagens e feitos, mediante contratos firmados com sindicatos e associações de jogadores. Considero essa informação um marco no uso de imagens de atletas pelas mídias.
O diretor de marketing da Kibon na época do lançamento da coleção “Futebol Cards” era o Fernando Kfouri. Tornou-se, em janeiro de 1980, vice-presidente da empresa, na qual ingressou em 1962. Informação confirmada pelo Jornal do Brasil.
Quanto ao álbum de figurinhas da “Copa de 82 Ping-Pong”, a edição dele foi organizada pela Editora Omni. O time por trás do álbum era assim escalado: publisher: Franklin Vassão; diretor editorial: José Nicácio Itagyba de Oliveira; texto e pesquisa: Carlos Maranhão (então editor e repórter especial da Placar); direção de arte: Sidney Pinto Ribeiro; diagramação e supervisão gráfica: Elenílson Campos. A criação, execução e supervisão couberam à agência de publicidade Young & Rubicam Brasil. O publicitário responsável pela propaganda para TV do álbum da Copa de 82 foi Geraldo Rodrigues Neto, na época integrante da equipe da agência Adag.
Tentamos bater um papo com todos, mas só conseguimos localizar Carlos Maranhão, um dos mais expressivos nomes da reportagem esportiva do país, que tanto admiro desde priscas eras quando comprava a revista Placar toda semana. O águia Sergio Pugliese conversou com ele em São Paulo e se deliciou com a emoção de Maranhão ao recordar o álbum de 1982, que guarda a sete chaves, como se fosse uma comenda futebolística. Não poderia ser diferente. Faria o mesmo no lugar dele, talvez o colocasse em um cofre de banco.
Quem sentiu o prazer de (esbaforido, obviamente) abrir um envelope do “Futebol Cards” ou um pacote de figurinhas do álbum da Copa de 82 sabe a emoção que sentíamos ao se deparar com o rosto dos craques do passado estampado naquele pedaço de papel, que, para nós, valia mais que qualquer nota ou mesmo ouro.
Ah, caramba, como era difícil o card do Roberto Dinamite.
FUTEBOL É PARA SIMPLIFICAR
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Há um mês venho alertando para a força dos astros e eles seguem disparando raios certeiros na turma da retranca. Dessa vez, a vítima foi Fábio Carille, mais um queridinho da imprensa. A mesma imprensa engessada que diz que tal time está ocupando um terço do campo, que o jogador ataca a bola, que um time amassa o outro, que fala bochecha da rede, orelha da bola, ligação direta e voltagem do jogo. Se o futebol está chato, os comentaristas conseguem piorar.
Futebol é para simplificar, exatamente o que Jorge Jesus vem fazendo com esse time do Flamengo, liderado por Gerson e Everton Ribeiro, dois ótimos meias. Duvido que um técnico com perfil retranqueiro fizesse isso, escalasse dois meias. Por isso, o time joga solto. O Grêmio, exaltado por tantos, joga com três cães de guarda na entrada na área, mas só consegue jogar bem quando está no sufoco e precisa tirar um deles.
O futebol precisa fluir e Jorge Sampaoli, que a imprensa vivia dizendo que era fogo de palha, e, por incrível que pareça, ainda é contestado, montou um time leve, com um baixinho no comando da festa. E que golaço contra o meu destroçado Botafogo!
O Soteldo não passaria na peneira de vários clubes. Só de vê-lo muitos o dispensariam. Os especialistas também já contestaram o time santista por ter contratado muitos jogadores baixos. Ou seja, ouve-se muita bobagem.
Viva os astros, viva o futebol ofensivo!!! Zé Ricardo perdeu no Inter, Roger e seu Bahia quase mataram Abelão do coração, Diniz segue acertando o São Paulo, Ceni continua bem e Adilson Batista, gosto dele, voltou ao mercado pelo Ceará e perdeu, como diz um amigo meu, para o VARmeiras, Kkkkk!!!!
No mais, consegui convencer meu amigo Haroldinho, canhoto habilidoso do Clube dos Trinta, a ir comigo no Fluminense x Vasco. Desculpa, Haroldinho, Kkkkk, que jogo ruim!!! Teve um zagueiro do Fluminense, com uma chance clara de gol, que chutou de tornozelo. Lamentável! Bem ao contrário de Vitinho, que fez um golaço! Pena ele ser vagalume, aquele jogador que volta e meia some do jogo, porque ele chuta bem com as duas pernas, algo raro no futebol atual. Pode ir mais longe.
Volto para a casa de Metrô, ainda impressionado com a incompetência dos vascaínos e tricolores. Um rapaz sentado na vaga reservada aos idosos não me oferece o lugar. Vivemos a época da truculência e da falta de civilidade, os dobermans viraram ídolos, o carrinho certeiro é mais comemorado que o gol.
Mas respeito é bom e eu gosto. Se nunca abaixei a cabeça para nada não seria agora, aos 70 anos, que me curvaria. Então, toquei no ombro do jovem e pedi que se levantasse. Um gaiato gritou para o cara de pau: “Chegou agora e já quer sentar na janela!”. Quando ele levantou-se o aplauso foi geral. Constrangido, mudou de vagão. E eu que nunca gostei de um banco sentei-me feliz da vida saboreando a vitória das boas maneiras sobre os botinudos.