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TIRA A CAMISINHA, TIRA TREINADOR!

por Zé Roberto Padilha


São tantos os profissionais à disposição de uma Comissão Técnica, e tantos computadores em busca de novos dados sobre uma partida de futebol, que precisam preencher os quinze minutos do Show do Intervalo, que começaram a tomar conta dos passes certos e errados das equipes.

E este número se tornou, na análise dos Casagrandes, tão importante quanto a posse de bola. E se mostrou completamente inútil para definir o vencedor de uma partida.

Mas se alguém tinha dúvidas sobre sua inutilidade sobre o resultado final, somada a irritação de assistir aquela troca de passes sem sentido entre os zagueiros, que viram para as laterais, e estes devolvem e ficam ali praticando sexo seguro sem ousar um drible ou uma penetração em direção ao gol, o anúncio de qual o time foi o mais eficiente neste quesito coloca um ponto final nesta questão.

Foi o Fluminense que alcançou o melhor índice de passe certos nas três das quatro competições que disputou este ano.

No Campeonato Carioca, chegou em quarto, atrás de Flamengo, Vasco e do Bangu. Na Copa do Brasil foi eliminado cedo e no Campeonato Brasileiro chegou em 14º lugar.

Muito flerte de longe, muito namoro pela intermediária, mas pegar a bola e convidá-la para afogar o Ganso e seduzir o Nenê a alcançar o fundos das redes que é bom…

Que Odair Hellmann chegue e retire logo a camisinha deste time. E ouse alcançar um prazer melhor na vida de cada torcedor tricolor. Como eu.

VASCO

por Rubens Lemos


Ser vascaíno é desfrutar do privilégio da ansiedade. O Vasco é sedutor. Seja pela história, pela torcida, pelos timaços, pelas conquistas, pelas derrotas roubadas contra o Flamengo. O Vasco é tão fascinante que seu maior ídolo sorri triste. Roberto Dinamite exibe uma face de Quixote. Disparava petardos de granadeiro.

O Vasco é o time de quem ama sofrido, quem é apaixonado crônico ou vibra em jogo de segunda divisão. Eis o Vasco que superlotou o Maracanã Falsificado com 67 mil pessoas e estragou uma festa empatando com a rebaixada Chapecoense. O Vasco é o improvável, é o imprevisível, é o sentimento e o sofrimento.

Quando foi rebaixado duas vezes, o Vasco ostentava um time menos patético do que o atual. Quem salvou a raça cruzmaltina agora foi Vanderlei Luxemburgo. Ele mostrou o que um técnico é capaz de fazer com uma caricatura de equipe. Foi pinçando, pinçando, burilando, esmerando, até juntar 11 menos ruins para enfrentar uma batalha de anúncio perdido.

Os novos vascaínos, coitados, sofrem a falta de ídolos. Pikachu é esdrúxulo até no nome. O goleiro Sidão é para futebol de botão. Ribamar é um lastimar. Rossi é raça pura. Jamais jogaria nos escretes dos anos 1980 e 90.

Para que me faça compreender, é preciso dizer que vi jogar em 1987: Acácio; Paulo Roberto, Donato, Fernando e Mazinho; Dunga, Geovani (foto) e Tita; Mauricinho, Roberto Dinamite e Romário.


Vi também em 1993, Carlos Germano; Pimentel, Torres, Jorge Luís e Cássio; Leandro, Luisinho, Geovani e Carlos Alberto Dias; Valdir e Bismarck. Esse foi o time bicampeão. O do Tri alinhava Carlos Germano; Pimentel, Ricardo Rocha (um dos melhores zagueiros do mundo), Torres e Cássio; Leandro, Luisinho, Yan e Cafuné, apelido de Denner, a mistura de Garrincha com Pelé; Valdir e Jardel.

Denner morreu sufocado pelo cinto de segurança e a torcida do Flamengo ultrapassou a torpeza no clássico seguinte: “Ô Vascaíno por que estás tão triste? Mas o que foi que te aconteceu, foi o Denner que bateu no carro, quebrou o pescoço e depois morreu”.

Desde esse dia de 1994, perdi o respeito que não havia pelos flamenguistas. Eles são diferentes. São inconsequentes. Agora há pouco tempo, morreram os garotos da Gávea e o Vasco demonstrou irrestrita solidariedade. Pode ser a diferença. A média do caráter vascaíno é íntegra.

O Vasco venceu os últimos títulos de respeito em 2000. Ganhou a Mercosul e o Brasileiro. Romário, Juninho Paulista e Euller jogaram demais. E acabou. Os times do Vasco pareciam Itaperunas disfarçados, sem referências, tanto que Romário jogou até os 41 anos e com bola para titular da seleção brasileira.

Terminando em 12º lugar, o Vasco festejou. Precisa de um time de verdade no próximo ano, senão corre risco, deve expurgar a mentalidade tacanha, pequena, distante de suas tradições. Pensar grande e trazer dois ou três jogadores razoáveis, embora jogadores razoáveis sejam exceção no Brasil.

Olhaí de novo Pikachu com pose de Geovani. Não tira uma lasca. O Vasco continua na Série A. Para quem sofreu o que a massa passou, é mesmo para rogar aos céus. E agradecer a Luxemburgo. Ser Vasco emociona. Comove. Instiga. Basta escrever que a gente chora.

ERA UMA VEZ LÉO BOLINHA OU LÉO CANHOTO

por Jonas Santana


(Foto: Alex Ribeiro)

Mais veloz que ele, só Pedro Preto!!! Era assim que falavam de Léo, mais precisamente Léo Bolinha, que embora fosse um pouco mais “encorpado” para os padrões da posição (jogar de lateral era só para quem fosse magrinho e corresse muito) era na faixa lateral do gramado que ele desfilava sua velocidade e seu cardápio de dribles inusitados (fruto dos anos de futebol de salão desde criancinha), no qual era muito admirado pelos amantes do verdadeiro futebol daquelas paragens e adjacências.

Não havia, no meio dos craques de fim de semana que aportavam àquele relvado, quem ainda não tivesse sido agraciado com um drible, fosse uma “sainha ou caneta” como chamam alguns, um “chapéu ou lençol” ou ainda uma “lambreta” (não era a motoneta, mas um drible). E era no “estádio” localizado no fundo do conjunto habitacional, nos estádios de cidades do interior e raras vezes no estádio oficial da cidade, sempre aos domingos, que aquele time exibia toda a maestria do futebol-arte, o futebol vistoso, de encher os olhos dos torcedores que se aglomeravam para se deleitar no esporte bretão.

Dizem que seu futebol era uma mistura de Nilton Santos (lateral do Botafogo apelidado de “Enciclopédia do Futebol”) com Mário Sérgio (célebre e inteligente ponta que desfilou seu talento no Grêmio, São Paulo, entreoutros) e, em virtude de tal habilidade, Léo era muitas vezes escalado na ponta esquerda, deixando os adversários desesperados com a arte do Léo Bolinha ou Leo Canhoto, como gostava de ser chamado.  

Cada um, desde Raimundo Quiabo (o goleiro) até o” exímio” centroavante Nêrroda tinha sua particularidade, seu caso inusitado, o que transformava aquele time em algo folclórico e uma atração onde quer que se apresentasse. Além disso tudo ainda havia a torcida. Esta era fiel e barulhenta, capaz de aumentar os feitos da equipe a cada jogo. Era verdadeiramente o décimo segundo jogador. 

E era neste clima que aquele time desfilava vitórias embalando as fantasias dos torcedores (ainda vamos ver esse time no profissional, diziam alguns!) que, muitas vezes decepcionados com os times de coração vislumbravam naquela equipe a projeção das suas esperanças e sonhos. E além dos torcedores havia os atletas que, ao vestir os uniformes e calçarem as chuteiras se transformavam em Pelés, Didis, Gérsons, Tostões, Zózimos, Quarentinhas e tantos outros insignes representantes do esporte bretão brasileiro que outrora havia sido guindado à condição de “melhor do mundo”.

E era nessa onda que Léo também surfava e, como sói acontecer a todos os craques daquele esquadrão, ele foi protagonista de um evento pra lá de imprevisível além de inusitado.

Num desses jogos em que o talento é exigido ao extremo e as forças vão se exaurindo como uma batalha épica entre dois exércitos de heróis o nosso craque estava como que inspirado ao extremo. Desde canetas (azuis ou não) a lençóis e chapéus e até “carretilhas” executadas com mestria, era o dia do Léo Canhoto. De nada adiantou trocar o lateral adversário por outro jogador, bem mais encorpado e com fôlego de triatleta. Léo nem tomou conhecimento dele e aplicou-lhe dois dribles que o deixaram estatelado no chão, sendo alvo de risada de ambas as torcidas, que a esta altura nem pensavam em resultado, mas no show que se realizava naquele campinho, agora içado à condição de estádio, dada a importância que tomou aquela pugna.

Pois bem, nosso craque avança pela lateral e ao adiantar a pelota, veio como um bólido o adversário e apôs fora de jogo pela linha de fundo, caracterizando o escanteio. E lá vai Léo para a cobrança do tiro de fundo.  

Com carinho paternal coloca a bola na esquina do campo e corre para ela elegantemente, alçando-a sobre a grande área, na esperança de encontrar um dos seus companheiros. E a bola vai, vai, vai e…. caprichosamente encontra a trave e, devido à força empregada sobe como se quisesse alcançar as estrelas ou beijar a lua.  E nosso craque corre para área numa velocidade quase supersónica e…. Inacreditável !!! A bola desce em direção a Léo que, incontinenti, executa um cabeceio, praticamente um petardo em direção ao gol, onde a redonda descansa mansamente nos fundos da rede, para desespero do goleiro rival.

E a torcida extasiada aclama o nome do jogador que escreveu sua história com mais uma jogada digna de narração:” — Corre para a bola Léo, levanta a pelota em direção à área onde aguardam a sua descida os jogadores. Na traaave!!!!!!! Foi na trave e subiu a bola, desceu, cabeceou Léo e é gooollllll!!!! Mais uma façanha desse time dos sonhos minha gente, é gol!!!

E mais um jogo, mais uma vitória, mais um domingo. Até o próximo jogo, o próximo grito de gol.

 

Jonas Santana Filho é gestor esportivo, escritor, funcionário público, professor e apaixonado por futebol.

 

       

A ALEGRIA DE SER CRUZEIRENSE

por Matheus Rocha


(Foto: Instagram @camaleaoart)

A alegria do cruzeirense se foi. A enorme dor de ser rebaixado para a Serie B do Campeonato Brasileiro não foi suportada por Salomé aos seus 86 anos de vida. Na derrota derradeira contra o Palmeiras, Dona Salomé saiu de ambulância do Mineirão direto para o hospital. A dor no peito não durou 48 horas e Deus a buscou, pois ela não merecia assistir ao Cruzeiro igualar a maior derrocada do seu rival. Em seus 86 anos de vida, jamais viu o Cruzeiro jogar uma partida sequer da Série B do Campeonato Brasileiro.

Salomé era figura ímpar nos jogos do Cruzeiro no Mineirão, deixou de assistir somente 4 jogos – conforme ela mesma contava – desde a inauguração do gigante da Pampulha em 1965. O seu amor a traiu depois de décadas acompanhando suas vitórias e também derrotas. Mas essa derrota foi grande demais para aquela senhora de sangue azul. Puro sangue azul.

O ano de 2019 parece não acabar. O golpe de 08 de dezembro de 2019 foi só o fechamento de uma sequência de erros, mandos e desmandos, dentro e fora do campo. Enquanto isso, Salomé continuava lá, com sua fé, com sua alegria. A alegria que a mantinha viva e feliz e que conseguiram, como em um truque de mágica, fazer desaparecer.

Agora só nos resta pedir para Santa Salomé do manto azul celeste que proteja nosso Cruzeiro, que ilumine nosso calvário e reerga esse nosso gigante para chegarmos mais forte ao centenário em 2021.

Há exatos 3 anos e 1 mês, eu escrevia sobre a Salomé: https://www.museudapelada.com/resenha/salome

NOEL ROSA, SAMBA COMO TESTEMUNHA E VASCO NO CORAÇÃO

por André Felipe de Lima


Quando o craque José Monteiro, talvez o maior da história do Andarahy e tão elogiado por Mario Filho no livro “O negro no futebol brasileiro”, morreu em 1919, o menino Noel Rosa, nascido em Vila Isabel, bairro vizinho ao do charmoso clube alviverde, era apenas um menino de nove anos. Certamente ouvia o pai e muitos outros falarem das bravuras do Monteiro. Sem dúvida, Noel Rosa cresceu com uma quedinha pelo Andarahy, um clube que encarava sem temor os adversários endinheirados da zonal sul. Falo de Fluminense, Botafogo e Flamengo, além do tijucano América, o então mais forte e rico da zona norte. O Vasco viria somente na década seguinte. Não deu tempo do Monteiro enfrentar aquele timaço com feras vindas do Bangu, e a lista era recheada delas. Havia Bolão, Itália e, sobretudo, Fausto dos Santos, que cresceu bem pertinho do Noel Rosa, na Aldeia Campista, um pedaço de chão que cobre parte da Tijuca e de Vila Isabel.

Não há, contudo, registros se os dois se conheceram ainda adolescentes. Mas é bem possível, afinal Noel Rosa e Fausto eram assíduos frequentadores de rodas de samba em Vila Isabel e dos empolgantes botequins nas concorridas esquinas do Boulevard 28 de Setembro e adjacências. Esbarrarem-se neles era pule de dez. Tornaram-se amigos, de fato.

Noel Rosa, no começo dos anos de 1930, já se revelava como um dos principais nomes do samba na cidade. Fausto simplesmente era o “Maravilha negra”, melhor jogador do país e único a se salvar do “naufrágio” da seleção brasileira na primeira edição de uma Copa do Mundo, em 1930, no Uruguai.

“Noel Rosa gosta de passear na chuva sem qualquer agasalho e chapéu. É torcedor de futebol, assistindo os jogos noturnos e preferindo, como jogador, Fausto.”

Essa simples nota jornalística perdida em uma página de uma edição da revista Carioca, de 1936, pode ser (acredite) o registro mais assertivo de que Noel Rosa gostava de futebol e era vascaíno de — recorrendo à tradicionalíssima expressão portuguesa — quatro costados. A aparentemente inexpressiva nota pode ter dito muito mais do que se imagina sobre o que poderia acontecer com Noel Rosa no ano seguinte.

Tanto ele quanto Fausto tiveram destinos idênticos. As trajetórias, idem. Além de crescerem na mesma região, ambos amavam o samba. Enquanto um, o Fausto — diziam —, era um “pé de valsa” e bamba de bola inconteste, falavam de Noel que no violão e nas linhas musicais, entre pandeiros e surdos, era um sem igual. Mas os dois eram amigos, o que, lamentavelmente, poucos (ou praticamente nenhum) registros podem confirmar. Mas os indícios nos induzem a crer que eram parceiros nas etílicas rodas de samba da Vila, e sempre abraçados a muitas mulheres. Mas apenas uma parecia ser a companheira de ambos: a lua, a mais genuína “dama da noite”. Os três eram indefectíveis notívagos. Portanto o ocaso das duas legendas culturais daquela década só poderia ser mesmo traduzido por noites enluaradas e românticas sob o fundo musical do samba. A tuberculose acometeu os dois vascaínos. Noel morreria em maio de 1937. Fausto, no ano seguinte.

O Vasco foi — ao menos uma vez — cantado por Noel Rosa. O curioso é que o jogador citado na letra do samba “Quem dá mais?” não foi o amigo Fausto e sim o Russinho, o artilheiro das madeixas louras e olhos claros que começou a carreira (olhe ele aí de novo…) no Andarahy:

“Ninguém dá mais de um conto de réis?/ O Vasco paga o lote na batata/ E em vez de barata/ Oferece ao Russinho uma mulata.”

A “barata” citada no samba era um carro Chrysler que Russinho ganhou após vencer um concurso de jogador mais popular do país promovido pelos cigarros Veado.

Será que depois dessa despretensiosa crônica há ainda alguma dúvida da paixão de Noel Rosa pelo Vasco? O rubro-negro e também genial sambista Wilson Baptista, rival eterno do velho “Queixinho”, que o diga. O “Clássico dos milhões” entre ambos parece mesmo eternizado.