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CAMISA DO OURO PRETO

por Tazio de Carvalho


Me chamo Tazio de Carvalho e sou filho do Augusto Brandão de Carvalho. Durante muitos anos meu pai foi conhecido nas areais de Copacabana como Gugu ou Brandão. Atuou no Ouro Preto, um dos times mais tradicionais da época de futebol de praia nos anos 50. Mais tarde ele jogou pelo Radar, outro time famoso de Copa. 

Pelo Radar, conheci alguns dos amigos dele: Tininho, Cesar Humberto, Paulo Amaral, Sansão, todos do Lido (local de encontro).

Meu pai, meus tios e os amigos dele sempre comentavam a técnica apurada que ele tinha, jogava com as duas pernas e era habilidoso. Meio campista clássico, Camisa 8. 

Guardo há mais de 50 anos a camisa que ele vestiu e honrou, pois o Ouro Preto era temido por outros times. Gostavam de brigas. Tininho (jogador), o Paulo Amaral e o Sansão eram os seguranças. Estes viviam brigando. Assim contavam eles.


Guardo até hoje em casa algumas fotos ou notícias da época. Também tenho uma camisa com mais de 60 anos do time TAP 2 (Turma das Antigas do Posto 2), cujo o símbolo é uma garrafa de Pitu (cachaça). O time também era conhecido como  “Tomamos Pinga Toda”. São relíquias que guardo para o resto da vida.

No poster do Ouro Preto, o meu pai é o primeiro ao lado esquerdo do Goleiro. Nesta foto, Tininho está em cima (segundo) e o Humberto no meio agachado.

Desde já agradeço a oportunidade de mostrar esta bela camisa. 

Muito obrigado!

PUNIÇÃO PELO DESRESPEITO

por Marcos Eduardo Neves


O árbitro francês não puniu Neymar pela lambreta. Nem pelo cabelo ridículo. Puniu pelo desrespeito. Não ao zagueiro que levou o drible. E sim a ele próprio.

Como bem escreveu em seu blog o ex-árbitro Péricles Bassols, a autoridade máxima em campo deve ter percebido nas quatro linhas algo que vai além ao que os espectadores veem. Provavelmente alertou o atacante brasileiro quanto ao que suas atitudes poderiam vir a acarretar.

Óbvio que Neymar recebe muita pancada o jogo todo. Cabe ao árbitro punir os infratores. Assim como cabe a ele conduzir a partida para que ela termine bem. Acredito que o “conselho” que deu a Neymar se encaixe mais por aí.

O fato é que foi graças a esse cartão que Neymar chamou a atenção neste fim de semana. Não foi pela lambreta mal executada. Foi graças à atitude desrespeitosa que ele gerou toda essa mídia novamente em torno do seu nome. E, assim, fez o mundo conhecer seu novo penteado, essa crina estilo “Priscilla, A Rainha do Deserto”. Parabéns, meninão Peter Pan que se recusa a crescer. Você continua o mesmo.

O FUTEBOL VOLTOU PARA CASA

por Serginho 5Bocas


Faço parte, com muita honra, de uma geração de nascidos e crescidos numa época de ouro do futebol brasileiro. Cresci ouvindo os mais velhos falando maravilhas das equipes vencedoras das Copas do Mundo de 58, de 62 e principalmente da seleção de 70, aquela que foi espetacular, por apresentar beleza e eficiência numa rara e talvez única combinação perfeita de futebol arte, comandada tecnicamente pelo Rei do futebol.

 Vale destacar nesta introdução, que houve uma importante influência do húngaro Bela Gutman na forma de jogar do esquadrão brasileiro de 1958, que fora comandado pelo seu ex-auxiliar técnico no São Paulo, Vicente Feola, já que juntos venceram o campeonato paulista de 1957, quando introduziu o 4-2-4 no Brasil, que era um esquema altamente ofensivo e que ajudou os brasileiros a abrirem contagem nos títulos mundiais e deu fim em nosso famigerado complexo de “vira-latas”, salve Bela Gutman!

Depois, fui testemunha ocular da mágica seleção de 1982, comandada pelo mestre Telê Santana, que se orientava pela exaustão nos fundamentos e na busca da perfeição técnica dos craques em busca da coletividade e que traduzia com os pés o verdadeiro sentido do futebol arte. Para se ter uma ideia de como aquela banda tocava, Sócrates, que fora capitão daquela turma, dizia que era um tesão jogar com aqueles caras, para todo lado que ele olhava, tinha uma fera para trocar passes e criar coisa boa, muito boa, deixaram saudades com suas cinco partidas de enciclopédia no verão espanhol.

Depois deste breve período de fantasia, o futebol brasileiro começou a passar por uma série de transformações que não fizeram bem para os torcedores, clubes, jogadores e para a nossa própria seleção. Mesmo vencendo dois mundiais (1994 e 2002), não éramos mais os “outliers”, o ponto fora da curva, agora vencíamos de forma diferente do habitual, com muito mais transpiração do que inspiração, parecendo muito com os outros vencedores que a gente tanto desdenhava e que agora, por ironia do destino é nosso “benchmark”.

Passamos a ouvir que esse negócio de futebol arte é utopia da cabeça de um monte de velhos saudosistas. Que jogar com um cabeça-de-área ou volante mais técnico era suicídio, que fazer 1.000 gols na carreira é coisa da época que se amarrava cachorro com linguiça, que dribles eram provocações desnecessárias e a pior de todas, que gol era um detalhe, putz! Tudo passa! O tempo é o melhor remédio, apesar da turma de pessimistas de plantão que adora exaltar o fim do mundo, o futebol nunca deixou de dar algum ar da sua graça isoladamente e foi dando mesmo que a conta gotas. 

Maradona genial e a efêmera Dinamáquina marcaram na Copa de 86, Roger Milla comandou uma revolução alegre com a seleção de camarões na Copa de 1990, o São Paulo de Telê recuperou a auto estima do mestre e do nosso futebol de tão belo e vencedor que foi, o Palmeiras de 1996 que apesar de sua passagem fugaz de tão breve que foi, deu show no paulistão daquele ano, fazendo tantos gols com tanta frequência e apetite que lembrou o Santos de Pelé. Romário e Bebeto na Copa de 1994 foi como uma colherzinha de leite num copo de café de tão ralinho, mas bão demais e Ronaldo Fenômeno em 1998 atropelando os holandeses e em 2002, feito uma ave fênix renascendo das cinzas, nos davam bons sinais de vida inteligente. Ronaldinho Gaúcho, o bruxo, brincou de gastar a bola e de se divertir sem deixar de ser vencedor, sobrava na turma, mas ainda faltava alguma coisa e aos poucos o futebol, com a valentia de alguns raros representantes, foram colocando os pingos nos “is”. 

Romário fez 1.000 gols ou quase disso, não importa, mostrando que fazer muitos gols não dependia da época, mas sim da capacidade rara de colocar a bola para dentro da rede amiúde. Messi com seus dribles e mudanças inesperadas de rotas em alta velocidade, foram nos anestesiando e mostrando que o drible pode ser lindo, objetivo sem ser desnecessário. 


Mas aí veio a cereja do bolo, o Barcelona com o sistema Pep de Guardiola que em 2011 fez uma verdadeira ruptura daquilo que estávamos acostumados a pensar que era futebol. Enterrou as ideias preconizadas de futebol de resultados, propaladas aos quatro cantos do mundo por gente como Bearzot, Billardo, Parreira, Ayme Jacquet, Felipão, Marcelo Lipi e o grande mestre de todos os retranqueiros, o bem arrumado e midiático, mais conhecido como “the special one”, o português José Mourinho, em suma, o ex-jogador espanhol quebrou tudo e fez chover, desmascarando a farsa montada ao longo dos anos por vários campeões mundiais.

Guardiola fez um enorme bem ao futebol. Trouxe de volta a vitória com qualidade, com arte, com posse de bola e beleza. Nos mostrou um meio de campo sem trogloditas, com apenas um cabeça-de-área(Busquet) e 2 baixinhos habilidosos e geniais (Xavi e Iniesta) e um ataque com 3 jogadores que tinha até “pontas” e Messi, arruinando as defesas com suas jogadas e gols extraterrestres, quanta heresia! A marcação foi para o campo do adversário de forma sufocante até a bola ser deles de novo, a zaga saia jogando de pé em pé sem chutão ou ligações diretas com o ataque, o meio pensando o jogo e muitos gols, sim, os gols voltaram a ter importância, que maravilha!

Era o “tik tak” espanhol de Pepe Guardiola e ele fez questão de explicar que na sua origem, havia sementes selecionadas da Holanda de Cruyff e da seleção brasileira de 1982, um espanto para os pessimistas.

O Barcelona fez o mundo repensar o jeito certo de jogar futebol e a Europa quase toda mudou. Quem assiste aos jogos da “Champions League”atualmente, observa que é mandatório jogar do jeito que o Barça jogava.

E o que o Brasil fez para acompanhar este movimento? Nada. Continuamos a jogar nossa bolinha que já vinha murchinha faz tempo. Lento, cheio de brucutus no meio de campo, com jogadores grandões e com seus treinadores com discurso pronto, enfadonho e desalentador, se afastando cada vez mais do futebol de primeiro mundo. Para se ter uma ideia é comum ver nas transmissões da tv do nosso futebol, zagueiros e torcedores vibrando com um carrinho que joga a bola e o jogador pela linha de fundo até o alambrado e deixa pra lá de imundo o calção do marcador, quer mais pobreza do que isso?


Até que o português Jorge Jesus desembarcou por aqui e fez uma revolução sem precedentes. Antes de tudo quero lembrar que fiz críticas a ele quando escalou o Rafinha no meio de campo contra o Emelec e o manteve na partida quando tudo indicava que o melhor seria substitui-lo. Desnecessário e teimoso, mas tenho que reconhecer que o cara abalou a Gávea e o futebol brasileiro, depois deste episódio.

Jorge Jesus não inventou nada do que está nos apresentando, pois como já disse, este jogo intenso, de velocidade, de toque e posse de bola, de marcação no campo de defesa do adversário e de fome de gols, ele aprendeu com a turma de Cruyff e de Guardiola, mas pelo jeito o aluno é dos bons, só faltava os insumos, que possivelmente o Benfica nunca pode fornece-lo.

Jorge Jesus encontrou sua cara metade no Flamengo e está em lua de mel com a torcida. Possivelmente nunca teve nas mãos um elenco com tanta qualidade técnica, altruísmo e sangue nos olhos. O Flamengo em menos de seis meses, mudou da água para o vinho e vai fazer o futebol brasileiro repensar o seu modo de jogar, o cara balançou as estruturas, seus números comprovam. 

Os seus críticos mais amargos irão dizer que ele não é essa “coca-cola” toda e que só conseguiu essas proezas porque recebeu nas mãos um elenco recheado de ótimos jogadores, mas como explicar o jogo feio de seus antecessores e até mesmo de seus pares no campeonato em curso, que com raríssimas exceções, não conseguem mostrar a predileção do português pelo futebol intenso, ofensivo e com “fome” de gols, isso ele não recebeu de ninguém. 

O DNA do Flamengo é de atacar, sua torcida magnética não aguenta retrancas, mesmo que traga títulos. Jorge Jesus foi muito feliz em encontrar este ambiente favorável e soube como ninguém implantar suas ideias e conceitos.  

No brasileiro de 2019 ele venceu e bateu vários recordes históricos de performance, na libertadores da américa que ele conquistou contra o River Plate nos presenteou com outra vertente. O Flamengo teve sérias dificuldades contra um time que marca como se fosse a última partida do mundo. Galhardo deve ter rezado e decorado a cartilha de Simeone do Atlético de Madrid, pois fez seus jogadores se multiplicarem, parecem brotar da grama ou que são 15, 16 jogadores contra os 11 do adversário. Esta filosofia quase anulou o ataque fortíssimo do Flamengo, foi por pouco, para ser mais exato por 6 ou 7 minutos. Somente a persistência, o sangue nos olhos e a qualidade dos atacantes do Flamengo poderiam reverter aquela situação angustiante e o fizeram, da forma mais dramática possível, quase enfartando uma legião de torcedores.


Contra o Liverpool, na final do mundial, foi outro capítulo marcante de sua bela história, pois encontrou pela frente, um time de muita qualidade, força e acostumado a jogos decisivos. Foram eles que contra o Barcelona de Messi na semifinal da “Champions league” do último ano, reverteram uma situação que parecia sem solução, viraram um 3×0 sem a presença de Salah e Firmino, muito parecido com a forma que o Flamengo se comportou e venceu o jogo contra o River Plate.

O placar final foi a vitória do Liverpool por 1×0, que não foi surpresa para ninguém. Surpresa mesmo foi o Flamengo ter chance de vencer o jogo sem ter que prostituir sua forma de jogar, fruto das ideias do português Jorge Jesus que introduziu em apenas 6 meses no clube, uma mentalidade vencedora e ofensiva. 

Encarar um time milionário, campeão europeu, recheado de estrelas internacionais, treinado há anos pelo mesmo treinador e estando em final de temporada quando o desgaste dos jogadores é muito grande, não é coisa para amadores. Vale lembrar que foi a reedição da final de 1981, quando eles só tinham ingleses e escoceses em campo, mas já se achavam, pois na versão conhecida agora e pra lá de “interessante” dos ingleses, eles estavam bêbados e sem tesão para jogar. Quem tem dinheiro, também conta história, mas toca o enterro.

Ao término da partida, concluiu-se que qualquer um poderia ter vencido apesar da ligeira vantagem dos ingleses em chances reais de gols e que o bicho papão não era tão feio. A magnética cantou muito a paródia da bela canção de Kiko Zambianki, tentando empurrar seu time, mas faltou gol para vencer, simples assim, pois posse de bola sozinha não ganha jogo.

De Bela Gutman a Jorge Jesus muita coisa mudou, mas não a essência de quem aprecia o bom futebol e tem coragem, pois isto é intrínseco as pessoas inteligentes e de bom gosto, seja lá de qual segmento profissional elas estejam inseridas, o legal desta historia toda é que finalmente o futebol voltou para casa dos brasileiros pelas mãos de um português.

Salve Jesus!

Um forte abraço

Serginho 5Bocas

Galdino

NA BATIDA DO BOM FUTEBOL

Já no ritmo do Carnaval, a equipe do Museu foi até a quadra do Salgueiro entrevistar um personagem maravilhoso do futebol: Galdino. Baixinho enjoado e ensaboado, com passagens por Vasco, Botafogo, Ferroviária e seleção pré-olimpica em 71, o ponta-esquerda é o atual presidente da bateria da velha guarda do Acadêmicos do Salgueiro, onde já desfila há mais de 40 anos.

Criado em uma família de salgueirenses, a fera desfilou pela primeira vez em 73, ao lado de ninguém menos que Jairzinho. No ano seguinte, entrou para a bateria da escola e ali começava uma paixão que promete durar até os últimos dias de sua vida!

Praticamente em casa, Galdino nos recebeu sem camisa e com um belo chapéu da “Bateria Furiosa”, ao lado de Orelha e Uchôa, responsáveis pela manutenção dos instrumentos.

– Sem as mãos deles, a escola não vai para a avenida! – disparou!

Durante a longa resenha, Galdino apresentou fotos dos tempos de jogador e relembrou cada momento nos gramados. Para quem não se lembra, o ponta deu seus primeiros passos na escolinha do treinador Neca, do Botafogo, e foi lançado nos profissionais com apenas 16 anos por Zagallo!

Após uma excelente passagem pelo alvinegro, Galdino foi negociado com o Vasco em 74 e não demorou a cair nas graças da torcida. No meio do vascaíno Sergio Pugliese e do botaguense Guilherme Careca, o craque foi colocado em uma sinuca de bico: torce para Botafogo ou Vasco?

– Minha vida toda foi no Botafogo, desde o dente de leite até os profissionais! Não vou mentir, meu pai era vascaíno e me levava aos jogos do Vasco, mas a última vez que fui torcer o jogo terminou 4×0 para o Botafogo naquela decisão.

No Vasco, foi companheiro dos valentões Moisés e Miguel e seguia à risca as recomendações da dupla de zaga. Geralmente, o pedido era para enfrentar os zagueiros rivais sem medo e o ensaboado ponta fazia fila!

– Se eu não fosse para cima dos rivais, eu ia apanhar nos vestiários! – revelou.

Com a amarelinha, Galdino foi campeão pré-olímpico na Colômbia, vencendo o Peru na final por 1 a 0. Além dele, a equipe contava com Nielsen, Aloísio, Abel Braga, Wagner e Celso, Rubens Galaxe e Marquinhos, Ângelo, Enéas e Zico.

Voltando ao assunto Carnaval, relembramos o famoso Bloco das Piranhas e Galdino entregou Moisés. Idealizador da festa, o zagueirão não deixava a folia começar enquanto não terminasse a sua caprichada maquiagem!

– Ele nos deixava esperando duas ou três horas! Só saia de viúva, vinha todo de preto! Ele era terrível! Depois do bloco, todos iam para a quadra do Império Serrano, que fervia aos sábados!

Com outra entrevista marcada, precisamos ir embora, mas, do jeito que a resenha estava boa, seria capaz de render mais umas cinco horas! Que personagem bacana!

Assista ao vídeo e confira a resenha completa!

BUIÃO FEZ DA BOLA DE FUTEBOL UM ÔNIBUS. E FICOU RICO

por André Felipe de Lima


Os colegas caçoavam do menino João Bosco dos Santos por ele ser baixinho e um pouco gordinho. Logo passaram a chamá-lo de Bujão.

O técnico do time da garotada, o Juca Sapateiro, gostava de mandar publicar no jornal de Vespasiano, cidade mineira onde nasceu o garoto João Bosco, as proezas e as escalações do seu time, inclusive com os apelidos de cada menino. Todo mundo tinha um. Ninguém ficava impune.

Em uma daquelas resenhas do Juca Sapateiro, saiu “Buião” em vez de “Bujão”. Dali em diante João Bosco seria “Buião” para sempre.

O menino gordinho, mas muito bom de bola, nasceu no dia 31 de janeiro de 1946. Desde pequeno, com apenas sete anos (apesar do sobrepeso), se insinuava um ponta-direita veloz. Aos 10, estava no Vespasiano e, aos 16, no Independente, na segunda divisão do campeonato mineiro. Trabalhava como garçom em Vespasiano, mas mantinha a esperança de, um dia, jogar futebol à vera. O sonho não estava tão distante. Havia olheiros do Atlético Mineiro e do Cruzeiro assediando pai de Buião.

Ao completar 18 anos, em 1964, o arisco ponta foi levado pelo treinador Afonso Bandejão para Atlético Mineiro, que confirmara a contratação com o pai de Buião, antes do rival Cruzeiro. A estreia aconteceu no jogo contra o Paraense, de Pará de Minas. E não é que o garoto Buião fez o gol da vitória?

Torcida entusiasmada e cartolas felizes, uma fórmula que rendeu, no dia seguinte ao primeiro jogo, um contrato de dois anos com o Galo. E Bandejão, que, como zagueiro, também defendera o Atlético por mais de uma década, conseguiu ser contrato como técnico do Atlético.

Buião mal sabia, mas já era ídolo da torcida. Deixara de ser apenas um dos 15 filhos de uma humilde família para brilhar no futebol. Mais tarde, com o sucesso na posição, chamariam Buião de “o novo Garrincha”. Mesmo com a exagerada comparação, ele foi, com inteira justiça, relacionado entre os 44 pré-selecionáveis para Copa do Mundo de 1966.

Como o futebol de Minas pagava pouco, Buião – mesmo reconhecendo o carinho dos atleticanos e querendo permanecer em Belo Horizonte – transferiu-se para o Corinthians em 1968, permanecendo no clube até 1970.

Muitos o queriam. Buião era cobiçadíssimo, de Norte a Sul. São Paulo e Flamengo eram os mais fortes adversários do Timão no páreo pelo Buião. O Tricolor paulista, por exemplo, ofereceu três jogadores por empréstimo: Benê – craque, mas já em fim de carreira —, Carlos Alberto e Fábio. Mas foi no Corinthians em que ele ficou e onde ganhou, de cara, muito dinheiro.

A ida de Buião para o Corinthians foi uma das maiores transações da época no futebol brasileiro. Algo na casa dos 400 milhões de cruzeiros. Somente ele, que tinha apenas 20 anos e fama de melhor ponta-direita de Minas, teve direito a 15% de luvas. “Pra começar, fiz um contrato inédito, de três anos. Como era proibido, assinei dois contratos: um de dois anos e outro de um.”

Como todo mineiro que se preze, Buião chegou ao Parque São Jorge vestindo um terno de casimira escura e uma camisa social, sem gravata. O Sol naquela tarde de sábado estava forte. O craque tirou o paletó e sentou-se à beira do gramado para assistir ao jogo do Timão contra a Ferroviária, de Araraquara. Concedeu entrevistas, autografou à vontade e foi paparicado por jornalistas, carolas e torcedores. Tornara-se ídolo de véspera.

Buião tinha fé de que traria alegrias para a torcida tanto quanto Paulo Borges, o titular da ponta-direita: “Não perco missa e minha madrinha, Nossa Senhora da Aparecida, haverá de me ajudar. Já pensaram se, na noite de minha estreia, o Corinthians vence o Santos?”.

Chegara para tirar a vaga de Paulo Borges – ídolo incontestável, sobretudo por ter sido o principal ator da epopeica vitória de 2 a 0 sobre o Santos, que pôs fim a um jejum de longos e tenebrosos onze anos (e 22 partidas) sem vitória sobre o rival.

E foi naquele jogo que Buião estreou no Corinthians, com ele na ponta e Paulo Borges sendo deslocado para meia-direita. Pé-quente, esse Buião…

O dinheiro das luvas que recebera do Corinthians, Buião deu ao pai, José Sérvulo, o Barão, para comprar algumas kombis e montar uma frota de transporte escolar. O previdente Buião já pensava no futuro longe do futebol.

Enquanto ainda tinha lenha para queimar nos gramados, Buião disputava a ponta-direita do Timão com Paulo Borges.

Acreditava que seria facilmente o titular. Principalmente após ouvir de Wadih Helu, então presidente do clube, que não contrataria Paulo Borges, pois estava emprestado pelo Bangu e teria de voltar ao Rio de Janeiro.


Mas a pressão da torcida para que Paulo Borges assinasse em definitivo com o Timão foi grande, sobretudo após a vitória contra o Santos. Além da ascensão de Paulo Borges, outros fatos foram decisivos para que Buião perdesse espaço no time.

Após o craque mineiro estrear bem em 1968, o técnico Dino Sani o deixou na reserva no jogo seguinte. Protestou publicamente, especialmente durante entrevistas, e acabou sendo pouco utilizado nos jogos seguintes àquele contra o Santos. Para piorar, discutiu duas vezes com Rivellino, durante os treinos. Em um dos bate-bocas, por pouco não houve briga corporal.

A situação complicara no Corinthians, com Buião tendo o passe emprestado à Ferroviária, de Araraquara, em 1970. Uma curta temporada de apenas quatro meses, que só serviu para desestimulá-lo ainda mais.

Buião regressou ao Corinthians, que já não tinha mais Paulo Borges, mas tinha o jovem Vaguinho (Wagno de Freitas) despontando na ponta-direita. Buião acabaria deixando o Parque São Jorge e seguindo para a Gávea, em 1971. No Flamengo, ficou por empréstimo durante um ano, alternando grandes atuações com outras sofríveis.

O Flamengo se interessou em mantê-lo, mas o Corinthians pediu os mesmos 400 mil cruzeiros que pagara ao Atlético Mineiro quatro anos antes. Os cartolas rubro-negros desistiram de Buião, que voltou ao Parque São Jorge, imaginando uma nova fase, de gols e estabilidade. Nada deu certo para ele.

A segunda passagem pelo Corinthians foi menos auspiciosa que a anterior e, em 1972, acabou emprestado ao Atlético Paranaense, levado por Almir de Almeida, que ainda acreditava em seu futebol. Buião não voltaria mais ao Corinthians, que defendeu em 57 partidas , marcando apenas dois gols.

“Eu me acomodei. Se tivesse pegado firme, estaria lá até hoje, como o Vaguinho, que chegou depois. Mas não dava, eu não tinha ânimo. O banco era duro demais para quem tinha 22 anos e estava em plena forma. Cada vez que eu me lembrava da minha saída do Atlético, eu chorava. Mas a culpa foi minha, eu não lutei como devia pra sair daquela situação de reserva.”

No Rubro-Negro da Baixada, Buião foi apontado o grande destaque do campeonato paranaense de 1975. No ano seguinte, deixou o clube com o qual jamais conquistou títulos; o que não lhe impediu de manter grande empatia com a torcida e tornar-se ídolo, um dos maiores nos anos de 1970.

Se a torcida o idolatrava, não se pode dizer o mesmo do então presidente do Atlético Paranaense, Anísio Khouri, que ofereceu ao Buião menos do que recebia como salário para permanecer no clube. Buião por pouco não aceitou, não fosse uma proposta do já extinto Colorado. O duro foi ter de pagar ao Atlético 60 mil cruzeiros de rescisão contratual, pois Buião era o dono do próprio passe ao deixar o Corinthians.

Depois do Furacão da Baixada, outros clubes passaram pela vida de Buião, ou vice-versa: Grêmio, Rio Negro (Manaus), Sampaio Corrêa (Maranhão)  e Noroeste (Bauru). Sem sucesso.

Nem o Timão, nem o Mengão, tampouco o Atlético Paranaense lhe deram um título. O único troféu que Buião levantou foi pelo Colorado, mesmo assim dividindo o campeonato paranaense de 1980 com o Cascavel.

Mas pode-se dizer que Buião é um dos maiores ídolos da história do Colorado. O começo no clube, em 1977, foi pedreira. Por pouco, não foi dispensado. Só seria reconhecido no ano seguinte, quando o escolheram o melhor ponteiro do futebol paranaense, feito que repetiria em 1979.

No ano seguinte, o Coritiba o queria no time. Pedido do treinador do Coxa, Mario Juliato, ao presidente do Coritiba, Amauri dos Santos. Mas as negociações não avançaram.

Quando encerrou sua carreira, em abril de 1982, no próprio Colorado, que inesperadamente o dispensou, Buião, sem clube que o quisesse, retornou a Vespasiano.

Em abril do ano seguinte, cartolas do Atlético Mineiro e do Colorado, talvez por remorso, decidiram homenageá-lo com placas e um jogo entre os dois clubes, no Mineirão, que contou com um público de mais de 50 mil pessoas. Do meia Marinho, ídolo do Colorado como ele, recebeu uma placa; de Éder, também ídolo do Galo e seu conterrâneo, recebeu outra.

Foi tudo inesperado. Buião chegara ao estádio apenas para assistir ao jogo, mas os dirigentes dos dois clubes o obrigaram a entrar em campo e a vestir as duas camisas para a merecida homenagem ao grande ídolo que foi no passado. Buião foi um dos melhores ponteiros que Minas Gerais e Paraná já viram jogar.

FAMÍLIA ACIMA DE TUDO

Desde os tempos em que viajava o Brasil por conta da carreira de jogador de futebol, Buião fazia sempre o possível para ficar perto da numerosa família, em Vespasiano, onde, após pendurar as chuteiras, dedicou-se apenas à sua empresa. Até como motorista de sua própria frota ele trabalhou.

Tinha a convicção que vida de jogador de futebol é curta e sucesso nela é efêmero. Ganhar dinheiro com o futebol era até possível, mas investir bem depois de deixar a bola é que representa o grande desafio.

Muitos, mesmo com idade avançada para um atleta, ainda insistem. Buião sempre definiu a postura como falta de consciência do ridículo, como declarou, em 1980, ao repórter Jorge Eduardo , de “O Estado de S. Paulo”:

“Quando o profissional deixa de servir, em qualquer circunstância, aí sim, chegou a hora; e se ele insiste no erro, passa a ser motivo de chacota e humilhações. E eu não quero que isso aconteça comigo.”


O pai e dois irmãos (dos 15 filhos de “seu” Barão) sempre trabalharam com ele na Viação Buião. Além do ex-ponta, dois de seus irmãos também foram jogadores de futebol: um, defendeu o Valeriodoce de Itabira (MG) e o Goiânia; enquanto o outro não passou de juvenil do Atlético Mineiro.

A esposa, a paranaense Maria Aparecida Barros dos Santos, com quem Buião se casou em 1974, trabalhava como trocadora no ônibus em que o ex-jogador dirigia. Formada em Engenharia Química, ela deixou o emprego público no Paraná para acompanhar o marido no novo empreendimento. Infelizmente, Maria faleceu. Com ela, Buião teve três filhos.

Buião, que montou seu negócio durante os 18 anos de carreira, tem hoje dezenas de ônibus e a Viação Buião é concessionária do transporte coletivo de Vespasiano.

Mas o futebol permanece na vida do ex-craque. Quando lhe sobra um tempo, assiste aos treinos no centro de treinamento do Atlético Mineiro e arrisca uma pegada de treinador. Dirigiu o Valença, clube amador da sua cidade, mas sem compromisso formal. 

Buião achou que política era tão fácil quanto jogar futebol. Arriscou-se nas eleições de 1998, mas não conseguiu eleger-se a deputado estadual por Minas Gerais.

Foi melhor mesmo permanecer cuidando do empreendimento e curtindo as lembranças de que um dia ele, o craque Buião, foi ídolo do futebol brasileiro comparado até mesmo com Garrincha.