E TELÊ SANTANA ERRA DE NOVO
por Luis Filipe Chateaubriand
Leão; Josimar, Leandro, Edinho e Branco; Alemão, Júnior e Silas; Renato, Careca e Muller.
Timaço, não é mesmo? Podia ter sido a Seleção Brasileira titular na Copa do Mundo de 1986.
Zico, que não tinha condições de jogar o tempo inteiro porque teve o joelho arrebentado por um açougueiro no ano anterior, poderia ser usado no segundo tempo dos jogos.
Mas Telê Santana, o que tinha o mérito de apreciar o futebol bem jogado, mas tinha o demérito da excessiva teimosia, escalou o time errado, assim como fez em 1982.
Em 1986, ao contrário de 1982, convocou Leão, o melhor goleiro do Brasil, disparado! Mas o deixou na reserva. Grande desperdício!
Teimosamente, quis escalar Leandro de lateral direito, quando, sabidamente, este não tinha mais condições físicas de atuar na posição, deveria ser zagueiro central. Este foi um dos principais motivos do craque ter desistido de ir à Copa.
Poderia ter aproveitado a base ofensiva do São Paulo, disparado o melhor time do país de então, botando Silas, Muller e Careca para atuarem juntos, mas preteriu Silas, para escalar Elzo, um volante brucutu, extremamente limitado.
Por fim, sequer levou Renato à Copa, exatamente em uma época em que o gaúcho estava “voando”, em excelente fase. Em compensação, deixou Sócrates – gênio, mas em péssimas condições físicas – se arrastar entre os titulares.
De quebra, o arrasador ataque vascaíno, composto por Mauricinho, Roberto Dinamite e Romário, não teve um mínimo representante na Copa do México.
Ah, Telê: sua obsessão pelo futebol arte era admirável! Mas por que você era tão teimoso?
TEMPLO MAIOR DO FUTEBOL BRASILEIRO
por André Luiz Pereira Nunes
Em 16 de junho de 1950, era inaugurado o maior estádio do mundo. Nomeado Mário Filho, um então notório membro da imprensa carioca, tinha capacidade para 200.000 espectadores, número na época equivalente a 10% da população da cidade do Rio de Janeiro.
Após visitas do presidente da Fifa, Jules Rimet, em 1938, o Brasil seria escolhido em 1946 para sediar a Copa de 1949. Contudo, em virtude dos rescaldos da Segunda Guerra Mundial, a competição acabou adiada para o ano posterior.
A obra, a qual levou dois anos para ser concluída, teve um custo aproximado de 250 milhões de cruzeiros. A primeira partida foi entre a seleção carioca e a de São Paulo. O gol de estreia foi marcado por Didi, o Folha Seca, para os cariocas, mas os paulistas levaram a melhor e venceram por 3 a 1. Uma semana depois, o Brasil bateu o México por 4 a 0, já na estreia do Mundial de 1950.
A ideia de construir o novo estádio no terreno do antigo Derby Club partiu do prefeito do Rio de Janeiro, Mendes de Moraes. A escolha, entretanto, foi bastante contestada pelo então vereador Carlos Lacerda, futuramente deputado federal e governador do antigo estado da Guanabara, que desejava a construção em Jacarepaguá. Porém, na época, o Jornal dos Sports, comandado pelo jornalista Mário Filho, publicou diversos conteúdos de apoio à construção do estádio na Tijuca. O tablóide também realizou uma pesquisa popular que ratificou a preferência popular pela mesma região.
Ao longo das décadas, o Maracanã passou por diversas mudanças para se adaptar à modernidade com o intuito de sediar grandes competições internacionais. O fato culminou na drástica diminuição da capacidade, atendendo atualmente a 80 mil pessoas, menos da metade da máxima anterior. Mas, infelizmente nem sempre as obras trouxeram melhorias. Lamenta-se profundamente o fim das arquibancadas e da geral que conferiam um saudoso aspecto popular e democrático. Além disso, o espaço que compreende o estádio de atletismo Célio de Barros foi bastante danificado e até hoje não foi reformado. Absurdamente chegaram a cogitar a sua total destruição para que se tornasse um estacionamento. Os moradores do bairro também ressentem do desaparecimento do antigo parquinho que atendia às crianças da comunidade. Permanecem, no entanto, de pé o Colégio Municipal Friedenresch e o Parque Aquático Júlio Delamare, os quais também ficaram a perigo por conta de exigências descabidas para a Copa do Mundo. Vale ressaltar que o Maraca também é um ponto turístico da cidade e do país e o seu entorno é bastante utilizado diariamente para a prática de passeios e exercícios.
Além de duas Copas, o ‘Maraca’ recebeu uma série de partidas emblemáticas e inesquecíveis, competições importantes como os Mundiais de Clubes de 1963 e 2000, além de grandiosos shows musicais e eventos, os quais incluiu até mesmo a chegada de Papai Noel de helicóptero. Ainda celebrou as conquistas do Brasil nas Copas América de 1989 e 2019 e foi palco dos Jogos Pan-Americanos de 2007 e das Olimpíadas de 2016.
O momento mais dramático do Maracanã ocorreu realmente na final da Copa de 1950. O Brasil era favorito a conquistar a taça de campeão mundial de futebol. Um mês depois da inauguração do maior estádio do mundo, no dia 16 de julho, o Maracanã vivenciou um dos dias mais amargos da sua história. A final entre Brasil e Uruguai fez os 199.854 torcedores presentes se calarem completamente. O maior público do estádio da história silenciou ao ver o Brasil ser derrotado pelos visitantes por 2 a 1. O episódio ficou conhecido como Maracanazo. Em espanhol, o sufixo “azo” é usado para significar algo grandioso.
O estádio é chamado popularmente de Maracanã por ter sido construído ao lado do rio homônimo. No Brasil, é prática costumeira entre torcedores nomear um campo com o mesmo nome do bairro ou da região na qual se encontra. Atualmente o Maraca não renega o seu papel de protagonista, abrigando um dos hospitais de campanha que atendem aos infectados pelo novo coronavírus.
MEUS IMPROVÁVEIS 71 ANOS
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
O improvável aconteceu. Hoje, terça-feira, 16 de junho de 2020, chego aos 71 anos de idade, lúcido, saudável e com uma vontade incontrolável de calçar minhas chuteiras e retornar aos gramados. De preferência ao Maracanã, que também aniversaria hoje. Mas digo no velho Maraca, no contagiante, arrepiante e eletrizante Maraca, o dos bandeirões, das charangas e da Geral transbordando de torcedores fantasiados. Minha estreia como torcedor não poderia ter sido melhor, final do estadual de 62, Botafogo 3 a 0 no Flamengo, que jogava pelo empate. Fogão bicampeão, com show de Garrincha. Meu pai adotivo, Marinho, era o treinador do Botafogo e eu estava no Setor 4, com meu irmão Fred.
Como poderia imaginar que cinco anos depois, em 67, aos 17 anos, eu estaria no mesmo estádio marcando três gols contra o América e ajudando o Botafogo a conquistar mais um título, na minha estreia como profissional, no Maracanã. Com o dinheiro de meu primeiro contrato consegui tirar minha mãe, Sebastiana Lima, de um barraco onde nasci e ela ainda morava. Não conheci meu pai, nem por foto. Na verdade, não tenho qualquer registro fotográfico de minha infância. Sei que meu pai era mestre de obras e morreu de cirrose hepática. Minha mãe era doméstica e consegui convencê-la que aceitasse minha adoção pela família de Fred, meu amigo de futebol de salão, no Flamengo. Devo muito a minha mãe, ao Fred e aos meus pais adotivos, Milta Rodrigues dos Santos e Marinho Rodrigues, o Meiúca. Eles me ensinaram a ter disciplina e a valorizar a estrutura familiar.
E assim cresci e fui vitorioso em minha carreira. Cada vitória, o Leblon explodia em festa! Foi no Maracanã que conquistei o Torneio de Verão, pelo Flamengo, contra o Santos, de Pelé, e o Benfica, de Eusébio e Coluna. E foi em uma festa, no Maracanã, que fui recebido pela torcida tricolor em meu retorno ao Brasil: Flu 1 x 0 Bayern. E também foi no Maraca, que participei de um dos momentos mais lindos de sua história, a vitória de 4×1 sobre a Argentina. Era uma seleção brasileira formada apenas por jogadores cariocas, praticamente todos do Botafogo e Félix, do Fluminense, Brito e Nado, do Vasco. A torcida delirou com o olé nos minutos finais e Nelson Rodrigues escreveu que o Botafogo era a pátria em calções e chuteiras. E por que iniciei o texto dizendo que chegar aos 71 anos era improvável? Porque minha vida foi muito intensa e não segurei a onda ao me imaginar longe dos estádios e da bola.
Desde menino fazia minhas próprias bolas de meia. Enrolava papel de jornal e colocava dentro das meias-calça que minha mãe jogava fora, após usá-las para esticar o cabelo de minha irmã. Depois de ficar bem consistente, dava um nó na ponta e, pronto, a bola estava feita. Era uma relação de amor de anos e a forma encontrada para amenizar essa nova fase da vida foi o álcool e a cocaína, dobradinha mortífera. Após um mês cheirando sem parar, achei que aquele fosse meu último dia. Liguei para uma amiga, Maria da Penha, que chegou rápido e me levou para um hospital, na Barra. Fiquei três dias internado e me perguntei por que estava querendo arruinar toda uma história de conquistas e glórias. E a tal estrutura familiar ensinada pelos saudosos Marinho, Esmeralda e Milta? Hoje são quase 20 anos limpo, pulmão de aço, doido para colocar novamente os argentinos na roda, dar um balãozinho, uma caneta, um drible de pescoço, provocar a galera da Geral, me sentir vivo, cada vez mais vivo.
OBRIGADO, MARINHO
por Ricardo Beliel
Eu soube agora que o ex-jogador Marinho faleceu em Minas Gerais. Marinho foi um jogador brilhante e chegou a ser convocado para a seleção brasileira. Teve uma infância difícil, criado pela mãe enfermeira:
”Ela era trabalhadeira. Enfermeira do Hospital Militar. Mas tinha dias que tinha de lavar defunto. Contava isso pra gente em casa.” (Declaração publicada no Jornal O Estado de Minas).
Com seis irmãos e muitas dificuldades, vagou pelas ruas de Belo Horizonte até ser convidado a treinar no Atlético Mineiro. Com o time do Bangu, chegou à final do Campeonato Brasileiro, mas foram vice-campeões.
No auge da carreira, da fama e de uma efêmera estabilidade financeira, vivenciou seu pior drama quando encontrou seu querido filho, ainda criança, afogado na piscina de casa.
“Meu chão desapareceu. Não sabia mais o que ia fazer. Meu filho tinha morrido, ali, pertinho de mim e eu não fiz nada. Foi na minha frente. Não tinha vontade de fazer mais nada. Eu acabei saindo de casa e fiquei morando no meu carro, uma Mercedes-Benz, por 10 dias. Bebia muito. Eu virei, praticamente, um mendigo. Perambulava pelas ruas de Bangu e Realengo. Dormi diversas vezes debaixo de viadutos”. (Declaração publicado no Jornal O Estado de Minas).
Me lembro dele como um cara alegre, boa praça e grande jogador. Minha homenagem a ele publicando aqui uma capa que fiz da revista Placar no melhor momento de sua vida.
A PAIXÃO PELO FUTEBOL E SUAS INFIDELIDADES
por Paulo Roberto Melo
Mês de junho. Mês dos namorados. Li por esses dias que com a quarentena, havia caído o número de casos extraconjugais, afinal, a obrigação do isolamento forçou as pessoas a ficarem em casa e consequentemente (ao menos fisicamente) serem mais fiéis. Portanto, esta é a ocasião perfeita, para ser posta à prova a paixão dos casais.
Paixão, amor, fidelidade e… futebol! Lembrei de imediato do meu pai, vascaíno ferrenho, que só tinha olhos para os jogadores do Vasco. Todos os outros jogadores de todos os outros times eram no máximo suportados, tolerados. Alguns, mediante qualquer estrago feito ao Vasco, em forma de gol ou declaração diminuindo o clube de São Januário, eram colocados em uma lista negra de ódio e dos piores desejos que um torcedor pode ter.
Ao longo de quarenta anos acompanhando futebol junto com meu pai, houve dois casos em que ele teve que mudar de opinião.
O primeiro aconteceu com o Tita. Jogador da base do Flamengo, o craque, junto com o Esquadrão do final dos anos 70 e início dos 80, maltratou o Vasco. Tita fez o gol de cabeça dando o tricampeonato carioca ao Flamengo em 79, contra o Vasco. Além disso, mostrava em campo uma técnica e uma superioridade que para o meu pai eram imperdoáveis. Algumas vezes o ouvi dizer: “Queria ser jogador de futebol por um dia! O Tita ia ver!”
Pois bem, o Tita saiu do Flamengo. De 1983 até 1986 jogou em Porto Alegre defendendo Grêmio e Internacional. Em 1987 chegou ao Vasco e coube a ele o golaço que deu o título carioca daquele ano, sobre o Flamengo. Meu pai?! Ai de quem abrisse a boca para falar mal do Tita! “Cracaço!” “Eu tenho a certeza de que ele está mais feliz agora no Vasco!”
O segundo caso foi com o Romário. Cria do Vasco, artilheiro implacável e debochado com os outros times, o Baixinho desfilava, pra deleite do meu pai, sua irreverência e seu futebol. Fez dois gols na final da Taça Guanabara de 1986 contra o Flamengo e foi colocado no altar destinado aos ídolos.
Em 1988, depois das Olimpíadas de Seul, Romário deixou o Vasco. Menos mal, que foi jogar na Holanda e depois na Espanha. Mas, em 1995, tendo ganhado a Copa de 94 e sido eleito o melhor jogador do mundo, veio para o… Flamengo. Pronto! Perdeu o lugar no altar e até o seu sorriso foi motivo de ódio para o meu pai.
Mas, como cantou Renato Russo: “Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas feitas pelo coração?”
Quis o destino, os deuses do futebol ou uma escapada da concentração, que Romário saísse do Flamengo e fosse acolhido pelo seu clube de origem, o Vasco! Confesso que cheguei a pensar que dessa vez meu pai se manteria irredutível e não perdoaria aquela vil traição. Mas, logo pela manhã, depois da concretização da volta do Baixinho, meu pai me mostrou um jornal com uma foto enorme do Romário. “Olha o sorrisinho maroto dele!” E lá foi o Gênio da Grande Área ser entronizado de novo…
Esses dois casos ilustram de forma categórica o que um dia meu pai me disse: “Os jogadores terminam a carreira. O clube continua!” Pura e simples verdade. Neste momento, parece que escuto sua voz falando isso.
Ao escrever este texto, lembrei-me de outras “infidelidades futebolísticas”. No próprio Vasco, com Edmundo que jogou no Fla e no Flu. Edilson, do Palmeiras ao Corínthians. O corintiano Neto, jogando por São Paulo e Palmeiras, além do próprio Corínthians. Geraldão, que defendeu a dupla Grenal, além do já citado Tita. Reinaldo, ídolo do Galo, que chegou a jogar no Cruzeiro. E tantos outros, que partiram nossos corações apaixonados pelo futebol.
Na verdade, tanto para o amor quanto para o futebol, continua valendo o verso de Vinicius de Moraes no Soneto da Fidelidade: “Eu possa me dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama. Mas que seja infinito enquanto dure.”