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TELÊ E OS PONTAS

por Rubens Lemos


Durante o período de Telê Santana na  seleção brasileira, tempo que inclui duas Copas do Mundo, a função de ponta-direita começou a ser exterminada no Brasil. O humorista Jô Soares, toda segunda-feira em seu programa, berrava como se telefonasse ao técnico: “Bota ponta, Telê!”.  

Durante a preparação, a partir de 1980, a camisa 7 ficou com Tita, do Flamengo, excelente driblador e criativo. Ruim de convivência e sutilmente citado pela boleirada como adepto da trairagem.

Tita, pretensioso, cobiçava a camisa 10 que nasceu colada ao corpo de Zico, seu chefe no Flamengo. Proporcionalmente, Tita queria o impossível como a paz no Oriente Médio. Tita testou Telê e se deu mal. Nunca mais foi convocado por ele quando abriu a boca para amplificar seus desejos.

No lugar de Tita, entrou o neguinho Paulo Isidoro, então no Grêmio. Craque, técnico e veloz, cumpriu bem a tarefa de ponta ajudando na marcação de meio-campo e permitindo ao exuberante Leandro, subir pela lateral-direita, transformando-a em Sambódromo permanente. 

Na estreia contra a União Soviética, em 1982, Telê Santana, de quem a maioria só recorda os méritos, escalou o canhoto Dirceu no lado direito e terminamos o primeiro tempo perdendo de 1×0, frangaço do goleiro Valdir Peres em chute murcho do falecido meia ucraniano Andrey Bal. Viramos graças ao talento de Sócrates e Eder.

Em 1986, Telê cortou o ponta Renato Gaúcho, em sua melhor fase, por conta de uma farra com o lateral Leandro. Renato não foi à Copa e Leandro desistiu alegando solidariedade ao amigo no dia do embarque ao México.

A foto que ilustra a coluna é, segundo o inesquecível jornalista João Saldanha, a razão para a ira de Telê contra os homens de linha de fundo pela direita. Garrincha humilha o futuro técnico da seleção brasileira após uma série de dribles e o deixa prostrado no chão, vencido, vaiado, mortificado.

 Saldanha, cujas mentiras tinham o sabor de fábula (dizia com firmeza que batalhou na Segunda Guerra com o general inglês Montgmomery), garantia que Telê foi escalado para marcar o torto espetacular. Uma missão que se dá a inimigo. O Fluminense precisava do empate para ganhar o campeonato carioca.

O Botafogo partiu para a vitória e enfiou 6×2 no tricolor. Uma das maiores exibições de Mané Garrincha. Naquela tarde de 22 de dezembro de 1957, diante de 125 mil pessoas no Ex-Maracanã, brotava, no inconsciente de Telê Santana, o expurgo a uma alegria que ele transformou em revanche. Segundo João Saldanha.

A RICA TRAJETÓRIA DO CEJAP, DE TRAJANO DE MORAES

por André Luiz Pereira Nunes


Trajano de Moraes é um pequeno município localizado na região serrana do Rio de Janeiro. O seu desbravamento e desenvolvimento se ligam ao interesse dos portugueses, então estabelecidos nas baixadas, que subiram a serra em busca de riquezas. Os veios de ouro inexistiam, mas havia um outro tipo de riqueza: o café. Os colonos lusitanos e a mão-de-obra escrava tornaram a terra produtiva e extraíram grandes fortunas. Em 1881, chegavam os primeiros europeus à região atraídos pelo manancial dos cafezais.

Apesar de nunca ter contado com um time em esfera profissional, a bucólica cidade protagonizou um feito histórico através de um de seus representantes. Fundado a 16 de julho de 1971, o Centro Esportivo José Antônio Peruzzi foi criado por cinco jovens idealistas que almejavam inicialmente uma quadra de esportes. Indagaram então o padre acerca da disponibilidade do terreno onde atualmente se localiza a Casa das Irmãs. Obtendo autorização, utilizaram o espaço durante dois anos até que a paróquia necessitou de seu uso. Não se dando por vencidos, os bravos rapazes angariaram fundos para a construção de uma nova, à qual hoje pertence ao Hotel Trajano de Moraes. Para formalizar a criação da área de lazer, decidiram então fundar um centro esportivo e homenagear o saudoso desportista Juca Peruzzi. Nascia, portanto, o CEJAP, conhecido como Águia da Serra.

Em meados da década de 80 a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro promovia e organizava anualmente, através do extinto Departamento de Futebol do Interior, dirigido por Ildo Nejar, o Campeonato Intermunicipal de Clubes Campeões. Participavam os vencedores dos campeonatos municipais e o campeão do Departamento de Futebol Amador da Capital (antigo Departamento Autônomo). A realização desse certame alternava com a do Campeonato Estadual das Ligas Municipais.

Em 1987, 55 times provenientes de todas as regiões do estado participaram da competição. Aperibeense (Aperibé), Ipiranga e Pureza (São Fidélis), Fluminense e São Joanense (São João da Barra), Aeroporto (Lajes do Muriaé), Barra e Carapebus (Macaé), Outeiro (Campos), Olaria e São José (Cachoeiras de Macacu), América e CEJAP (Trajano de Moraes), Bibarrense e Boa União (Duas Barras), São João e Vila Nova (Casimiro de Abreu), São José (Bom Jardim), Nalim e Mauá (São Gonçalo), Morro Grande e Radar (Araruama), Bacaxá e Sampaio (Saquarema), Cruzeiro (Rio Bonito), São Pedro e Independente (São Pedro da Aldeia), Progresso e América (Cabo Frio), Ubatiba e Dínamo (Maricá), Suruiense e Mageense (Magé), Portuense e Cítrus (Itaboraí), Flamenguinho e Barra (Teresópolis), Paulistano e Icaraí (Niterói), Santa Lúcia (Duque de Caxias), Califórnia e Faestal (Itaguaí), Vasquinho e Éden (São João de Meriti), ADC DSP (Nilópolis), Vila de Cava (Nova Iguaçu), Floriano e Cotiara (Barra Mansa), Beira-Rio (Resende), Verolme e Novo Mundo (Angra dos Reis), Grêmio Olímpico (Mangaratiba) e Chácara (Paraty). O ACET, de Volta Redonda, e o CSN, de Barra Mansa, declinaram da disputa. Na fase final foi composta ainda pelo campeão e vice do último certame, o Nova Esperança, de Duque de Caxias, e o histórico Cambaíba, da usina de mesmo nome, localizada em Campos.


Após superar três fases anteriores, o CEJAP foi eliminado nas semifinais pelo Nova Esperança, ao perder por 3 a 1, em Caxias, e empatar em casa sem abertura de contagem. Curiosamente, o torneio não teria conclusão por conta de uma baixa manobra jurídica impetrada pelo Cambaíba contra o Vila de Cava, ambos disputantes da outra semifinal. No jogo de ida, em Campos, ocorreu um empate em 1 a 1. A partida de volta, programada para o estádio do Aliados, em Nova Iguaçu, acabou não sendo realizada porque os campistas alegaram falta de policiamento. Certos, portanto, de que ganhariam os pontos no tribunal, se negaram a jogar. A briga então se arrastou pelo STJD durante mais de 4 meses com direito a vários recursos, não chegando a lugar algum. A dor de cabeça na época foi tão grande que a Federação deu o certame por encerrado e não mais voltaria a promovê-lo, retornando com a organização do Campeonato de Seleções Municipais.

No entanto, a campanha do CEJAP jamais seria esquecida. Em 19 jogos, houve 14 vitórias, 2 empates e 3 derrotas, sendo que nenhum revés ocorreu em casa. Após um período de inatividade que perdurou por mais de 20 anos, diversos abnegados da cidade, entre os quais Álvaro Ramos, resolveram reativar o clube. O retorno não poderia ser melhor. Logo no ano de estreiia, em 2019, o time se sagrou campeão municipal para a alegria da Família Grená, no Estádio Municipal Francisco Limongi, onde manda suas partidas.

Os planos são inúmeros por parte dos novos dirigentes do CEJAP. Quem sabe, o time consiga alçar novos voos e chegue ao profissionalismo. Mas, no momento, já é extremamente comemorada a volta da Águia da Serra ao caminho das conquistas.

O NEW FOOTBALL É UMA CHATICE SEM FIM

por Mateus Ribeiro


O bom filho a casa torna. E apesar de nunca ter abandonado o Museu da Pelada, aqui estou de volta para tocar a minha corneta sem medo de ser feliz.

Eu andei um pouco afastado do futebol, pois em meio ao caos que o mundo vive, não conseguia sentir o mínimo prazer em ver o esporte bretão. Por mim, o futebol nem voltaria neste ano, mas como querer é poder só na música do José Augusto com a Xuxa, a redonda voltou a apanhar nos gramados brasileiros.

É claro, óbvio e evidente, que eu não conseguiria ficar longe dos jogos e dos noticiários, mesmo sabendo tudo o que eu iria encontrar: aquele festival de termos rebuscados, os malabarismos para se explicar um sistema tático e toda aquela modernidade que apesar da roupa elegante e da fala bonitinha, já torrou a paciência.

Porém, o que mais me irritou nessa volta foi o que já roubava a minha paz antes da pandemia: a banalização da vitória. Tudo se tornou mais importante que os três pontos: a posse de bola, o planejamento, o mapa de calor, a movimentação e todas essas conversas pra boi dormir.  De uns tempos pra cá, tenho a impressão de que o objetivo do jogo não é mais a vitória ou a conquista de títulos, mas sim, o “legado”, a “metodologia” ou quaisquer outros termos pomposos. Os debates esportivos, que eram tão legais, se tornaram a análise de um disco de rock progressivo (com todo respeito aos simpatizantes do estilo).

Enquanto os entendidos modernos fazem malabarismo para defender a invencionice desse “new football”, eu fico com o futebol punk rock, aquele onde a simplicidade manda e a única coisa que de fato vale é a bola na rede.

Toda essa necessidade de transformar algo tão simples e gostoso em uma ciência de difícil compreensão só reforça a tese de que o  futebol moderno é uma chatice que não tem tamanho. A minha sorte é que existe o Museu da Pelada, onde eu posso acompanhar grandes feras e relembrar que futebol é gol, futebol é paixão, futebol é vitória, futebol é memória.

Obrigado pelo espaço e até a próxima!

AS CONSEQUÊNCIAS ANTROPOLÓGICAS DO 7 x 1

por Teixeira Mendes


Culturalmente, o 7 x 1 foi a melhor coisa que aconteceu ao Brasil.

“O brasileiro não está preparado para ser o maior do mundo em coisa nenhuma. Ser o maior do mundo em qualquer coisa, mesmo em cuspe à distância, implica uma grave, pesada e sufocante responsabilidade.”.

(Nelson Rodrigues)

Começo com uma citação amarga, triste, hiperbólica e, ao mesmo tempo, realista. Nelson Rodrigues, o maior cronista da história do futebol brasileiro, foi o primeiro a perceber a relação entre o futebol e a cultura nacional. É dele a tradução do maior dos fatos silenciosos, do silêncio ensurdecedor, do Maracanazo. A hipérbole é a mãe dos gênios, dos Profetas e dos Santos. É um equívoco linguístico que Maria se chame Maria.

Fazendo uma de suas profecias retrospectivas e hiperbólicas, o Anjo Pornográfico traduziu a condição antropológica de nosso povo, a alma do brasileiro comum, via futebol. Recuperando a triste e leprosa recordação de 1950, ele diagnosticou o complexo de vira-latas!  Eis a sentença: 

“Eis a verdade, amigos: — desde 50 que o nosso futebol tem pudor de acreditar em si mesmo. A derrota frente aos uruguaios, na última batalha, ainda faz sofrer, na cara e na alma, qualquer brasileiro. Foi uma humilhação nacional que nada, absolutamente nada, pode curar.”

(…)

Por “complexo de vira-latas” entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. Isto em todos os setores e, sobretudo, no futebol. Dizer que nós nos julgamos “os maiores” é uma cínica inverdade. Em Wembley, por que perdemos? Por que, diante do quadro inglês, louro e sardento, a equipe brasileira ganiu de humildade. Jamais foi tão evidente e, eu diria mesmo, espetacular o nosso vira-latismo. Na já citada vergonha de 50, éramos superiores aos adversários. Além disso, levávamos a vantagem do empate. Pois bem: — e perdemos da maneira mais abjeta. Por um motivo muito simples: — porque Obdulio nos tratou a pontapés, como se vira-latas fôssemos.”

(Nelson Rodrigues) 

A falta de ambição, o sentimento de inferioridade, a resignação diante do mundo é transcendental aos brasileiros. Nosso sujeito transcendental é a imagem de um cão desnutrido, um circo de pulgas em quatro patas – nossa verdade demográfica é a SUIPA! Eis o imperativo: não ouse! E, assim, a privação da ambição, da ousadia e da coragem é um decreto para a maioria dos brasileiros. A consciência universal da norma, me parece inata.

Com o Bicampeonato Mundial em 1958 e 1962, o futebol contrariou a norma. Garrincha e Pelé pareciam ter fundado nos brasileiros uma autoestima sólida, perene, inquebrantável. Pelé era como um Fídias, Garrincha, por sua vez, era como um Antônio Francisco Lisboa. De repente, com as probabilidades negativas de um milagre, na miscigenação do Clássico com o Barroco Mineiro, a dupla de gênios esculpia a imagem do orgulho inabalável. Um Fídias, um Aleijadinho: a alma brasileira estava pronta!

Eis a verdade, amigos: o verdadeiro brasileiro não gosta de futebol. Desde Pelé e Garrincha, o futebol obrigava o brasileiro a ser melhor que os europeus, a ser melhor numa coisa que os americanos nem sonham em ser.

O futebol exigia dos retirantes de Portinari, que tivessem ombros largos para suportar a Glória. O futebol ousou tirar o brasileiro da indigência psicológica. O futebol obrigava o Brasil a ser grande, a ser uma potência, o melhor do mundo em alguma coisa.

Já viram o túmulo do Garrincha? Um indigente tem mais cortesias para os seus restos mortais. Já viram como o Pelé é tratado pela imprensa nacional? Parece que ele fez algum mal ao Brasil. Com o 7 x 1, o brasileiro está livre da responsabilidade de ser o melhor em alguma coisa. Já podemos passear pela SUIPA continental. Já podemos exibir sem pudor, sem medo e sem vergonha, o estandarte pálido de nossa anêmica autoestima, toda a nossa a anorexia psicológica. 

O silêncio ensurdecedor durou oito anos, mas com o peso de oito séculos; o 7 x 1, por outro lado, deve durar pelas próximas sete eternidades. A derrota de 2014 transformou – novamente – o Brasil naquilo que ele é – uma SUIPA continental!

FINAL DO PAULISTA PREMIA FUTEBOL SEM GRAÇA

:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::


Nesse “novo normal” do futebol resolvi ser mais do contra do que sou normalmente. Não tem dado muito certo, mas preciso fazer a minha parte. Se é para ser novo que seja mesmo, então tenho torcido para que novos nomes surjam entre os campeões estaduais. No Paulista, minha reza falhou, mas não é preciso ser definido o campeão paulista para cravarmos que nenhuma boa novidade surgirá a partir disso. Os dois times são fracos e no Brasileiro, se nenhuma contratação for feita, serão apenas mais dois times cumprindo tabela. Venho destacando Vanderlei Luxemburgo e Tiago Nunes há algum tempo, mas corre o risco de não surpreenderem mais.

Na verdade, Luxemburgo está completando 40 anos de carreira e já demonstrou sua qualidade diversas vezes, no próprio Palmeiras, em décadas passadas, no Cruzeiro, Santos e Bragantino, em 90, quando foi campeão paulista. Não acompanhei a carreira de Tiago Nunes, mas dava gosto ver o Athletico Paranaense jogar sob seu comando. Apurei que foi campeão pelo Luverdense, de Mato Grosso, Rio Branco, do Acre, e em diversas categorias de base, ou seja, percorreu o caminho certo. Mas é Luxemburgo quem está apostando mais na garotada, como Gabriel Menino e Patrick. Luxemburgo tem isso de bom, não fica cheio de dedos para lançar jovens talentos, mesmo que para isso seja preciso barrar Bruno Henrique, Lucas Lima e Scarpa. Mas a verdade é que os dois times não apresentaram absolutamente nada de novo, futebol sem graça e gols achados.

Tiago Nunes sempre foi acadêmico em suas declarações e fala do jogo como se fosse um engenheiro explicando uma obra. Luxemburgo não era assim, mas nas últimas entrevistas tem entrado para o time dos explicadinhos e só fala “marcação no primeiro terço do campo”. É Luxa tentando se enquadrar no “novo normal”. Em busca dessas novidades, tenho apostado minhas fichas nos times do interior e, por isso, torci para o Novo Hamburgo contra o Grêmio. Fugir do óbvio é isso! No Paraná, fui vencido e se classificaram Athletico x Coritiba. Em Minas, ainda pode dar Tombense, onde está trabalhando meu amigo Edinho, que fez história na zaga tricolor.

Na Bahia, o Atlético, de Magno Alves, vai disputar com o Bahia, de Roger, para quem torço muito. Roger, mil perdões, mas ser um “novo normal” é cravar no Atlético. Em Pernambuco, minha mandinga funcionou e deu Santa Cruz x Salgueiro, assim como no catarinense, que ficará entre Juventus, Chapecoense, Brusque e Criciúma, com Figueirense e Avaí de fora. Essa vida de se transformar em “novo normal” não é fácil, não. O secador  precisa ser de última geração! E para quem pensava em secar o português, esquece, o Flamengo, malandro, o trocou por um espanhol. Por fim, aproveitando a onda, os comentaristas bem que poderiam aderir novos jargões, deixando de lado “jogador de beirinha”, “atacante agudo” e por aí vai!