VITÓRIA DE GUIMARÃES: O FANTÁSTICO ESQUADRÃO DE MARINHO PERES
por André Luiz Pereira Nunes
Romper a hegemonia de Porto e Benfica é tarefa quase impossível no futebol português. Porém, na temporada 1986-87, o Vitória de Guimarães esteve muito perto de quebrar essa tradição. O treinador Marinho Peres, coadjuvado pelo auxiliar Paulo Autuori, foi o responsável pela formação de um dos melhores plantéis já montados na história dessa agremiação.
Logo em seu primeiro ano em Portugal, o técnico implantou um esquema de jogo inspirado nas ideias de Rinus Michels de quem foi jogador no Barcelona. Para quem não sabe, Michels foi o comandante do inesquecível Carrossel Holandês, a seleção holandesa que encantou o mundo com um modelo de jogo revolucionário e inovador na Copa de 1974, na Alemanha. Não por acaso, Marinho Peres, então zagueiro do Santos, esteve como titular na Seleção Brasileira durante todos os jogos daquele mundial, atuando até de forma bem viril quando o Brasil capitulou diante dos holandeses.
No mesmo ano foi contratado pelo Barcelona e participou da implantação do mesmo modelo de “futebol total” apresentado na equipe catalã. Apenas em 1976, regressaria ao Brasil, passando a jogar pelo Internacional. Em 1978, vestiu a camisa do Palmeiras e veio a encerrar a sua prestigiosa carreira no America, o qual passou logo a dirigir. Atualmente vive em Sorocaba e tem passado por graves problemas de saúde.
À sua disposição havia um elenco recheado de jogadores de grande classe, principalmente de brasileiros. Naquele tempo uma grande profusão de atletas tupiniquins abundava no futebol lusitano. No caso do Guimarães, o grande destaque era Paulinho Cascavel, atacante reserva campeão brasileiro, em 1984, pelo Fluminense que tivera uma breve passagem pelo Porto.
Os outros representantes eram o lateral-direito Heitor, ex-Flamengo,Vasco e campeão mundial de juniores pela Seleção Brasileira, em 1983, o meia Ademir Alcântara, ex-Internacional, o zagueiro Nenê, ex-Atlético Paranaense, o atacante Nivaldo, ex-São Bento, e o ponta-esquerda Roldão, artilheiro no futebol paranaense que também atuara no Guarani. Os zairenses N’Dinga, meia, e o atacante N’Zama completavam o esquadrão que praticou um futebol de grande consistência, o qual chegou a se intrometer na luta pelo título máximo do Campeonato Português e que ainda brilharia na Copa da UEFA, após alcançar no ano anterior o quarto lugar no Campeonato Nacional.
Naquela que foi a sua melhor campanha em nível europeu, o Vitória eliminou Sparta de Praga, Atlético de Madrid e o holandês Groningen. Somente os alemães do Borussia M’gladbach, orientados por Jupp Heynckes, conseguiram travar, nas quartas de final, a turma portuguesa. No Campeonato Português, os alvinegros terminaram a competição em terceiro lugar, a 7 pontos do campeão Benfica, e com mais três que o Sporting. A primeira derrota apenas aconteceu na oitava rodada frente aos benfiquistas. João Alves, na altura treinador do Boavista, chegou mesmo a afirmar que o Vitória de Guimarães era candidato ao título. Vale frisar que a equipe ainda contou com a artilharia máxima de Paulinho Cascavel com 22 gols. A única vez na qual o time vimaranense terminou em terceiro fora na temporada 1968/69. Além disso, quatro jogadores foram cedidos à seleção portuguesa, sendo eles Jesus, Costeado, Adão e Nascimento.
Guardo vívidas lembranças dessa época por um motivo bastante particular. Meu saudoso tio, vítima de um infarto há quase três anos, Ronaldo Nunes, era um advogado, empresário e procurador de grande prestígio e competência junto a jogadores e profissionais brasileiros em Portugal. Infelizmente não nos víamos com frequência, mas quando nos encontrávamos, ficava sabendo de seus êxitos em terras lusitanas. Na ocasião era o representante do Guimarães e dos atletas brasileiros supramencionados, além de Marinho Peres, Renê Weber, Jorge Baidek, Caio Júnior, Jorge Andrade, Fernando Pires e Paulo Autuori, cujo filho é casado com uma prima minha. Ainda foi o descobridor e procurador de Alex, o habilidoso meia que fez imenso sucesso na Seleção Brasileira e no futebol internacional.
CARECA, UMA IMENSA VOCAÇÃO PARA O GOL
por Luis Filipe Chateaubriand
O Campeonato Brasileiro de 1978 trouxe uma imensa surpresa ao mundo de nosso futebol, ao se ter o modesto Guarani de Campinas como campeão.
O time do clube do interior paulista tinha grandes jogadores, como Zenon e Renato “Pé Murcho”. Entre eles, sobressaía Antônio de Oliveira Filho, o garoto Careca, no frescor de seus 17 anos.
O centroavante Careca unia técnica plena com incrível audácia.
Tinha habilidade e força com as duas pernas. Assim, tanto preparava com a esquerda para chutar com a direita, como preparava com a direita para chutar com a esquerda.
Veloz, eram constantes as situações em que adiantava a bola para ele mesmo, onde vencia os zagueiros adversários na corrida e chegava à frente sem marcação.
Ótimo no drible, priorizava a utilização do recurso quando estava próximo ao gol, onde o drible implicava condições de assinalar tentos.
Bom cabeceador, era especialista em ir ao encontro da bola, ao invés de esperá-la, para o cabeceio.
Seu chute era sempre colocado – às vezes forte, às vezes sutil.
Quando saiu do Guarani, foi brilhar no São Paulo. Daí, seguiu para o italiano Napoli, onde formou com Diego Armando Maradonna uma das maiores duplas de frente de todos os tempos!
Seguiram-se, também, passagens pelo futebol japonês e pelo Santos.
Na Seleção Brasileira, não teve sorte na Copa do Mundo de 1982, onde foi cortado por contusão. Contudo, nas Copas do Mundo de 1986 e 1990, foi muito bem – especialmente na primeira.
Este redator lembra de uma certa má vontade da Imprensa Carioca com Careca, uma injustiça. Possivelmente, porque o craque era um constante concorrente de Roberto Dinamite nas convocações.
Muitas vezes, escutei coisas do tipo “o Careca só faz pilhas de gols no Guarani porque o Jorge Mendonça, que é o craque de verdade, coloca ele na cara do gol toda hora”. Ou, quando no São Paulo, “o Careca é jogador de clube, não funciona na Seleção”.
Bom, é melhor ouvir isso do que ser surdo…
Careca tinha um lema: “contra zagueiro valentão, deixe-o de bundinha no chão”. Palmas! Como diria El Pibe Don Diego Armando Maradonna, “belíssimo, Antônio!”.
Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!
FASE FINAL DA CHAMPIONS
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
Apesar da desclassificação do Manchester City estou bem feliz com os times que se classificaram na Champions League. Sou fã declarado de Guardiola e gostaria de vê-lo campeão. O gol perdido pelo Sterling poderia ter mudado o rumo da partida, assim como a desclassificação do Atalanta foi por detalhes, isso é o futebol. Ainda acho a Premier League a melhor do mundo e mesmo a França tendo dois times nas semifinais ela ainda está bem abaixo da inglesa e da alemã. Não tenho bola de cristal para cravar quem será o campeão, mas o Bayern tem muito mais time do que seus concorrentes.
Para mim, o Bayern é o maior clube do mundo. Sei que muitas pesquisas têm seus critérios para criar os rankings e, por isso, Real Madrid e Barcelona normalmente lideram por serem os mais ricos, mas o Bayern é uma potência, pois já venceu as principais competições europeias e a história de sua fundação é linda: nasceu, em 1900, após onze jogadores que rescindirem os contratos com sua equipe, o MTV 1879, por não concordarem com as condições de trabalho. Me lembrou o Afonsinho quando criou a Lei do Passe Livre e montou o time Trem da Alegria formado por atletas sem contrato e desempregados. Sem falar que o Bayern sempre teve ex-jogadores em sua diretoria e a Alemanha participou de oito finais de Copa do Mundo e venceu quatro.
A Espanha, com seus dois clubes milionários e badalados, só tem um título. Mas o Lyon tem seus trunfos, um deles é o pé-quente Juninho Pernambucano, que fez história no clube, e hoje é diretor de futebol, e o técnico Rudi Garcia, excelente treinador. Acompanhei de perto o trabalho que fez para levar o Lille a conquistar, em 2010/2011, o campeonato francês e Copa da França. Depois foi para o Olympique de Marseille, mas a diretoria não investiu em contratações. Nunca mais havia ouvido falar dele e fiquei feliz quando soube que estava no Lyon. O RB Lepzig é um time novo. Se a Red Bull continuar investindo certamente estará sempre disputando título e o melhor de tudo é que joga um futebol bonito de se ver. O PSG tem Neymar, o jogador mais técnico de todos da semifinal. Claro que ele pode desequilibrar e torcemos para isso, mas não será uma tarefa fácil.
De qualquer forma, estou feliz, com os semifinalistas porque sou fã do futebol alemão, sempre se reinventando, e tenho um carinho especial pela França pelos anos que morei lá. O Brasileiro continua morno, mas também estou contente por confirmar que Jorge Sampaoli não era nuvem passageira. É um treinador que consegue criar um estilo de jogo em pouquíssimo tempo e faz render jogadores que não estavam bem em seus clubes, como Marrony. Ele faz o básico, treina fundamentos. “E o seu Botafogo, PC?” perguntou o rapaz do quiosque do Leblon durante a minha caminhada. Se eu não estivesse sintonizado no meu “novo normal” talvez o quiosque não estivesse mais de pé, mas respirei fundo e segui em frente assoviando “Samba do Avião”. O que sigo sem engolir, e muito menos entender, são os chavões dos comentaristas, que continuam com “leitura de jogo”, “consistência”, “jogador agudo” e muito mais!
VOZES DA BOLA: ENTREVISTA BOBÔ
Quando ouviu pela primeira vez os versos “Quem não amou a elegância sutil de Bobô?” – um dos refrões da música ‘Reconvexo’, composta por Caetano Veloso em 1989 e interpretada por Maria Bethânia -, Raimundo Nonato Tavares da Silva, quase não acreditou.
O apelido, que ganhara ainda na infância, por conta da irmã bebê, que não conseguia pronunciar seu nome, era eternizado pelo compositor baiano, no mesmo ano em que ele se eternizava como ídolo do Esporte Clube Bahia.
O Raimundinho, como também era chamado quando moleque, correndo atrás da bola nos campos de várzea da cidade de Senhor do Bonfim, pediu para ser ‘beliscado’, sem acreditar na homenagem.
Assim como teve que, ele mesmo se ‘beliscar’ várias vezes, até ver o seu apelido improvável para o nome de um jogador de futebol, ovacionado pela torcida do Tricolor da Bahia.
Mas nem sempre foi assim. Sete anos antes, quando ele atuava pela Catuanse-BA, e o time enfrentou o América-RJ, no Maracanã, em jogo válido pela Taça de Prata de 1982 (segunda divisão nacional), o apelido Bobô foi motivo de chacota.
Na ocasião, o repórter e comentarista Washington Rodrigues, então na ‘Rádio Globo’, não conteve a gargalhada: “O time baiano tem até Bobó”, debochou o radialista, fazendo alusão do prato típico baiano ao craque da camisa 7.
Pobre Apolinho, que tempos depois teria que se ‘beliscar’ ao ter que aplaudir a elegância’ e a qualidade técnica do franzino e habilidoso Bobô.
O filho de Florisvaldo Tavares da Silva, o Seu Flori, e Antonieta, a Dona Tieta, se transformou num dos maiores ídolos da história do Bahia, chegou à Seleção jogando num time do Nordeste, fato raro na história futebolística do país.
Em meio à pandemia de coronavírus, nosso quinto personagem é Bobô, que isolado em sua ‘terrinha’, conversou por telefone com o Museu da Pelada e deu seu depoimento para a série ‘Vozes da Bola’.
Por Marcos Vinicius Cabral
Como foi o seu início de carreira?
Como profissional foi na Catuense-BA, aos 17 anos, e no amador em Senhor do Bonfim, onde nasci, jogando o campeonato intermunicipal. Competição muito importante, quando eu tinha 14 anos. Foi a primeira oportunidade que tive no futebol, e que me levou para jogar por quatro anos na Catuense, de Lagoinhas.
É verdade que você adorava jogar com a camisa 8 e se sentia desconfortável jogando com outros números?
É verdade. Eu sempre gostei de jogar com a camisa 8, mas é claro que isso foi com o passar do tempo. No início mesmo de carreira, no primeiro clube que joguei profissionalmente, eu jogava com a camisa 7, na Catuense. No segundo ano de profissional, na mesma Catuense, aí sim, jogando mais por dentro como meia-direita, escolhi a número 8. De lá pra cá, nos clubes em que passei, sempre pedia para usá-la. Com exceção de um ou outro clube, que já tinha o número definido. Mas a camisa 8 era um número simbólico para mim e até hoje fazem essa referência do número comigo.
Quem foi sua grande inspiração no futebol?
Eu tive dois grandes jogadores como referências no passado: Zico e Careca. O Careca, que jogou no Guarani, e depois no São Paulo, era um meia-direita, grande jogador, qualidade técnica muito grande, eu adorava vê-lo em campo, além de ter sido inspirador. O outro foi o Zico, que é referência para todo mundo, não só como atleta, mas também como cidadão. O Zico passava coisas boas para todos, além de jogar muita bola. Para mim, especialmente, era referência como jogador e com seu comportamento dentro e fora de campo. Esses dois foram minhas maiores referências no futebol.
Quantos gols você fez em toda sua carreira?
Eu acho que fiz quase 300 gols, segundo uma estatística feita por uma pessoa aqui na Bahia. É bom lembrar que comecei a jogar profissionalmente com 17 anos e esses gols são daí pra frente. Nessa estatística, não entram os gols na base, que eu não fiz.
Qual a importância de Evaristo na conquista do Brasileirão prlo Bahia em 1988 e como foi trabalhar com ele?
O Evaristo foi um dos grandes responsáveis pela conquista de 88. Não só do título em si, mas também da montagem da equipe. O Bahia era um time que veio montado de 86, 87 e 88, mas quando o Evaristo chegou em 87, ele mudou a forma de jogar da equipe, mexeu em algumas peças do time e ousou na forma de jogar. Tornou a equipe agressiva e que jogava um futebol veloz, alegre e para frente. O Bahia se prevalecia do conceito de futebol adotado pelo nosso treinador. O Evaristo foi um grande técnico, particularmente, um dos mais importantes do futebol brasileiro. Nós sabemos muito da sua importância naquela conquista e sabemos o quanto não foi fácil assumir o Bahia, no Nordeste, ganhar de todo mundo e se tornar campeão. Foi em um momento difícil, porque pouco se pagava aos treinadores, ainda mais times menores ou do Nordeste, mas ganhamos graças ao grande trabalho dele e da comissão técnica.Tenho um orgulho muito grande de ter convivido com ele, além de ser um amigo.
Em 1988 você estava em grande fase e ganhou o prêmio da Bola de Prata. Foi o melhor ano da sua carreira?
O ano de 88 foi muito importante para mim. Além de ganhar o título de campeão Brasileiro, ganhei a Bola de Prata e fui escolhido pela ABCD (Associação Brasileira de Cronistas Desportivos) como o melhor jogador daquele ano. Isso me levou a ser convocado para a Seleção Brasileira. Não tenho dúvida alguma de que foi um grande ano e vivi um grande momento na carreira. Quando você tem a oportunidade de conquistar um título Brasileiro, jogando por um clube do Nordeste e se destacar, obviamente, a gente tem que estar agradecido também.
Depois você passou por São Paulo, Flamengo, Fluminense, Corinthians e Internacional, antes de voltar ao Bahia e encerrar a carreira. O que não deu certo nesses outros clubes?
Depois do Bahia eu joguei no São Paulo, e lá fiquei dois anos. Tive a felicidade de ser campeão Paulista em 89, mesmo ano em que pelo Bahia, meses antes, havia sido campeão Brasileiro. Estranho, né? Mas são coisas desse calendário maluco do futebol brasileiro. Em 89, por pouco, não conquistei três títulos no mesmo ano, já que me tornaria campeão Brasileiro por dois clubes diferentes: Bahia em fevereiro e São Paulo em dezembro, mas enfrentei o Vasco na decisão de 89, e fomos derrotados por 1 a 0, gol de Sorato, no Morumbi. Com o Flamengo fui campeão da primeira Copa do Brasil, depois, em 90, ganhei a Taça Guanabara com o Fluminense… enfim, tive o privilégio de disputar títulos que eu considero importantes. Mas tive dificuldades em alguns desses clubes em que joguei, em função até das lesões musculares que me acompanharam na carreira. Mas tive carinho por todos eles e o Fluminense, em especial, porque meu pai era torcedor e quando era vivo, me convenceu a ir jogar lá, quando saí do São Paulo. Não me arrependo e gostei muito em ter passado esse período nas Laranjeiras, em um clube maravilhoso. Já no rival, o Flamengo, joguei pouco tempo é verdade, apenas seis meses, mas foi uma fase bem interessante antes de voltar para São Paulo e ir para o Corinthians e depois Internacional. Então, em todos eles eu tive momentos felizes. Depois, voltei para encerrar a carreira no Bahia, porque eu queria que fosse no clube. Estava com 34 anos e em virtude das lesões, cirurgias, acabei precocemente parando.
Por que você, Charles e Zé Carlos passaram a ser convocados para a Seleção Brasileira, mas não tiveram muitas chances com Sebastião Lazaroni?
Eu tive três com (Sebastião) Lazaroni, mas foi um ano difícil, pois naquela época, chegar à Seleção já era muito difícil, sobretudo jogando em um clube do Nordeste. Na verdade, se convocava mais jogadores do Sul e Sudeste, né? Nesse ano, nós fomos um pouco mais ousados e o Bahia foi o melhor time do futebol brasileiro, sagrando-se campeão e a CBF, tinha por obrigação convocar alguns jogadores do nosso time. Eu tive essa chance em algumas oportunidades, e o Charles e Zé Carlos, também. Mas falaram oportunidades maiores naquele ano e acho que nós três poderíamos ter ao menos, jogado uma Copa América. Infelizmente, ele (Sebastião Lazaroni) já havia definido o grupo que iria disputar a competição. Disputei alguns jogos que antecederam a Copa América, em amistosos, contra o Peru, o Paraguai, enfim… mas ele já havia definido o grupo que disputaria a Copa América e desse grupo, 80, 90% ria para a Copa do Mundo da Itália, em 1990.
Caetano Veloso, célebre torcedor tricolor, eternizou a ‘elegância’ de Bobô no futebol, na música ‘Reconvexo’. Como foi virar música do compositor baiano?
Pois é. Isso é uma honra muito grande para mim ser cantado em versos por Caetano Veloso, numa música linda por sinal, a ‘Reconvexo’. Até hoje é um sucesso na voz de Maria Bethânia. Brinco, dizendo que estou imortal por conta dessa música e dessa homenagem que ele fez. Sou muito grato e algumas vezes estive com ele e agradeci por esse momento, essa grande homenagem. É claro que a gente fica orgulhoso com isso, afinal de contas, estou sendo homenageado por Maria Bethânia numa composição de Caetano Veloso. Aproveito essa entrevista para agradecer aos dois, mais uma vez, por eu ser imortal (risos).
O canal SporTV reprisou jogo do Bahia contra o Fluminense, pela semifinal do Campeonato Brasileiro de 1988. Na sua opinião, foi um dos jogos mais difíceis na caminhada ao título do Campeonato Brasileiro?
Foi bacana lembrar de 31 anos atrás, e confesso, não me lembrava muito dos lances, porque foi na íntegra, ou seja, os 90 minutos. Assisti ao jogo e foram jogos difíceis, né? Esses contra o Fluminense foi muito complicado para a gente, mas não acho que tenha sido os mais difícil. Fizemos dois jogos contra o Fluminense no Rio, um no Maracanã, que foi 0 a 0, e poderíamos até ter vencido esse jogo e fomos muito bem, e no segundo, começamos perdendo e viramos. Mas eu acho que o jogo contra o Sport-PE, eu considero o mais difícil pela rivalidade do Nordeste. Foi 1 a 1 lá em Recife e aqui 0 a 0, indo para prorrogação até. Nos classificamos para enfrentar o Fluminense na semifinal nessa prorrogação contra o Sport-PE. O jogo contra o Fluminense foi legal porque teve o maior público da história da Fonte Nova, com 110 mil pagantes.
Queria que falasse um pouco sobre o ‘Dignidade dos Ídolos’. Como foi criado e qual o objetivo do programa?
O ‘Dignidade dos Ídolos’ é um projeto criado pelo presidente do Bahia, Guilherme Bellintani. Na época, ele me convidou e achei espetacular, porque era algo que entendia que tinha que acontecer um dia e espero que os demais clubes copiem Mas, não só fazer uma festa de comemoração de um título importante ou reunir os ex-atletas. A gente sabe que a maioria dos jogadores de futebol, independente de ter passado por grandes clubes, não ganhou dinheiro suficiente para ter uma estabilidade financeira. Os jogadores do passado precisam de apoio e quando o ‘Dignidade dos Ídolos’ foi criado, para nós, ex-jogadores, foi muito bacana. Hoje, esse projeto beneficia seis ex-atletas, como o Zanata, que mora no Rio, o Maílson, que infelizmente está acamado. Atualmente, esses jogadores precisam desse auxílio, que é um salário mensal, e é um reconhecimento do clube pelo trabalho desses ex-atletas. O bacana foi que eles ganharam não só uma placa ou aplausos, mas tiveram de volta a dignidade, já que esses caras destinaram uma boa parte de suas vidas ao clube e construíram uma história bonita. Eu acho que essa reciprocidade é difícil acontecer nos outros clubes, mas no Bahia está acontecendo. Eu, particularmente, tenho muito orgulho, de alguma maneira ter feito parte disso, em reconhecer esses ex-atletas em um debate com o presidente do Esporte Clube Bahia.
Defina Bobô?
Não sei dizer exatamente. Talvez um cara persistente, talvez vitorioso na carreira, onde sou grato ao futebol como falei, pois tive a felicidade de jogar em alguns clubes importantes no Brasil e neles ser campeão. Eu acho, que isso na realidade, acaba de uma maneira dando credibilidade a uma carreira de dezessete anos. Então, poderia definir a pergunta, nas oportunidades que tive na maioria dos clubes, em que aproveitei muito bem. De alguma forma, fui recíproco com essas oportunidades.
Qual o gol mais importante que você fez na carreira?
Eu tive a felicidade de marcar alguns gols importantes pelo Bahia, e, sobretudo no Campeonato Brasileiro. Não só no de 88, mas no meu primeiro ano de clube. Em 86 ganhei uma placa na Fonte Nova, com o gol mais bonito do estádio. Em 87, 88, nos jogos finais, esses gols, óbvio, ajudaram muito o Bahia a ser campeão Brasileiro. Realmente foi um título espetacular.
Como tem enfrentado esses dias de isolamento social devido ao coronavírus?
Esse isolamento tem sido difícil para todo mundo, ou seja, ficar isolado não é bom. Ficar sem poder cumprimentar, conversar, e abraçar as pessoas, não é legal. São mais de quatro meses desse isolamento social, e é claro que, o início foi mais fácil do que tem sido agora, mas está dando para levar. Acho que é a única maneira ainda que temos de superar esse vírus e manter esse isolamento social. Sair, só se for extremamente importante, usar máscara e álcool em gel sempre. Eu tenho feito isso mas na expectativa da gente voltar ao nosso ‘novo normal’.
O Maracanã completou 70 anos recentemente. Quais são as suas primeiras lembranças como jogador no estádio?
O primeiro jogo que eu fiz no Maracanã, foi jogando pelo Bahia, na década de 1980. É um estádio maravilhoso e sempre foi referência no Brasil e no mundo. Todo atleta tinha dois desejos: vestir a camisa da Seleção Brasileira e jogar no Maracanã! Mas todos os jogos que fiz, jogando pelo Bahia, depois São Paulo, Flamengo e Fluminense, são jogos que tenho na lembrança e, sobretudo, quando joguei no Campeonato Carioca, nos Fla-Flus por exemplo, é inesquecível. Tive o privilégio de jogar no estádio, jogar e fazer gol em Fla-Flus, e isso, marca muito, ainda mais sabendo a importância do clássico no futebol brasileiro.
No dia 19 de julho foi comemorado o Dia Nacional do Futebol. O que o futebol representou para o Bobô?
Essa data é especial na vida de quem joga futebol ou já jogou. O futebol representa muito na vida de todos e na minha em especial, porque essa estrutura que eu tenho hoje, como cidadão, eu credito muito ao futebol. Esse 19 de julho, que se comemorou o Dia Nacional do Futebol, representa muito e sou muito agradecido. Sempre faço questão de dizer em entrevistas que o futebol me projetou e o que ele me proporcionou, seja não só estabilidade financeira, que isso eu não tenho, pois continuo trabalhando, mas sobretudo, na condição de fazer com que você conhecesse pessoas, cultura, lugares, jogar nos maiores clubes do futebol brasileiro e cheguei à Seleção. Inclusive, virei ídolo de uma geração, e isso para mim, é motivo de orgulho e agradecimento. Obrigado ao futebol e graças a Deus, por ter me dado o dom de ter jogado futebol e o que ele me proporcionou como cidadão. Agradeço aos clubes por onde joguei e aos ex-companheiros.
VALEU, ZÉ
por Zé Roberto Padilha
No primeiro gol meu, pelo Fluminense, como profissional no Maracanã, ele, ao lado do Gil, foi o primeiro a nos abraçar. E o Jornal dos Sports, felizmente, estava lá para registrar. E minha mãe para cortar e registrar seu amor.
Seu sorriso era de cumplicidade, carinho, amizade construída desde as divisões de base. Todos nós chegamos do interior, eu de Três Rios, ele de Volta Redonda, e demos as mãos, amarramos nossas chuteiras e lutamos juntos muitos anos para permanecer e vencer na capital.
Hoje, Zé Maria, dono desse sorriso angelical, nos deixa. Leva junto pro céu um pouco da nossa história da bola, construída durante os sete anos que passamos naquela universidade da disciplina, do respeito, capaz de formar tanto atletas como cidadãos do bem.
Zé Maria vai se juntar ao Cleber, Toninho Baiano, Silveira, Felix, Ximbica, Cafuringa, Gilson Gênio e ser novamente treinado no céu pelo Pinheiro. Com a supervisão de Roberto e Paulo Alvarenga. E o carinho do Argeu Afonso.
Zé Maria mal deu tempo de retribuir esse abraço. Então, descanse em paz, meu amigo. Dever cumprido com sobras, idas à linha de fundo, cruzamentos precisos e um domínio admirável de bola. Que grande amigo e admirável atleta que nos deixa tantas saudades.
E muita paz e conforto aos seus.