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O PORTUGUÊS QUE NÓS AMAMOS E SONHO VERDE NA NOITE EM AVELLANEDA

por Marcelo Mendez


“Sinto o canto da noite na boca do vento…”

Sonho Meu, de Dona Ivone Lara, não existia nas mentes e corações Palmeirenses antes do apito inicial da partida do Palmeiras contra o River Plate, mas ecoou forte em Avellaneda após o término de uma das maiores partidas da história do clube em Libertadores da América.

Ontem o que se viu foi um passeio, uma amassada com um 3×0 impiedoso do time de Parque Antártica em cima do nariz em pé do favoritismo portenho na primeira partida da semifinal da competição. Muitas coisas poderiam explicar tudo que houve, o que construiu essa vantagem.

Tem a opção de não ter um volantão à brasileira, parado na frente da defesa dando chutão e rifando bola o tempo todo. A coragem de montar um meio campo de meninos como Patrick, Menino e Danilo. A postura de um time que jogou de acordo com a grandeza de seus 106 anos sem ficar com medo do jogo e encarando de igual o River Plate. A crônica poderia discorrer calmamente sobre qualquer um desses tópicos, mas eles seriam apenas recortes. Porque o principal de tudo está no banco de reservas.

Abel Ferreira é o nome do homem.

Ele chegou há dois meses cheio de desconfiança, num Clube esfacelado, sem muita perspectiva de nada e mudou completamente o panorama das coisas no Palmeiras. Identificou as necessidades, as possibilidades de trabalho, juntou sua equipe, chamou os jogadores e disse “Eu trabalho assim”. E assim mostrou o que ia ser feito, de maneira franca, direta, ganhando a confiança dos jogadores e por isso a ideia foi comprada.

Qualquer treinador Brasileiro, na situação que o Palmeiras estava ontem, trancaria seu time, ficaria quieto lá atrás, bundamolemente dando a bola para o River Plate jogar, mas não o Abel; Ele propôs aos seus comandados jogar o futebol, atacar o River Plate, amassar um time que há seis anos manda no continente e fazer valer a premissa de que o alviverde é um clube grande demais para ter medo. Lógico que ainda temos a partida da volta semana que vem, mas fica a lição.

Em detrimento ao medo, o futebol. Dessa forma, o Sonho que é meu, será de todos nós

PAOLO ROSSI, FORJADO PARA VENCER

por Serginho 5Bocas


Paolo Rossi foi no mínimo diferente, digamos que um jogador abençoado ou então me diga se você já viu um jogador ser convocado para uma Copa do Mundo vindo de grandes atuações na segunda divisão de seu País? Ele foi. Bearzort apostou nele durante toda a sua carreira e sempre o levou para a Copa do Mundo, contrariando a tudo e a todos. 

Começou a carreira cedo e muito cedo, perdeu os seus meniscos, a proteção dos joelhos. O atraso da medicina daquela época fez com que os médicos não lhe curassem totalmente e pior: vaticinassem que a sua carreira não passaria dos 28 anos. Ele se arrastou pelos gramados até os 31, mas em alto nível foi bem próximo ao que os doutores do bisturi previram, infelizmente.

Um cara que jogou poucos jogos e que fez poucos gols, que ficou afastado do futebol por 2 anos por problemas com a máfia da loteria italiana e que por conta de lesões nos joelhos encerrou sua carreira precocemente, fez o que fez. Temos que respeitar, certo?

Paolo não teve durante a carreira muitos títulos, nem muitas artilharias que pudessem justificar o seu tamanho, mas teve a suprema glória de ser artilheiro, campeão e melhor jogador de uma Copa do Mundo em 1982. Aliás, em Copas do Mundo foram 9 gols, é muita coisa. Devo destacar que seu jogo não era gracioso, como os brasileiros gostam de ver (ou gostavam), mas era poderoso, e apesar de poucos recursos, econômico, era preciso e decisivo no maior palco da terra.

Paolo ainda teve, a glória eterna de vencer um time mítico, como uma ave fênix que ressurge das cinzas, time que ele mesmo chamava de “marcianos”, por jogarem de memória e que segundo ele, poderiam jogar de olhos vendados. Mas nada disso o intimidou e ele fez a sua parte, com louvor.

Há os que se impressionem com as bolas de ouro que a FIFA distribui de forma infame e política e os que reconhecem o valor de cada tipo de jogador com o seu próprio jogo. Quando lembro do bambino, não tenho lembranças dele como um grande craque, feito os que que eu vi naquela época e em todas as épocas, lembro de um cara talhado e forjado para vencer as mais duras batalhas, um cara de um toque só, do oportunismo, da colocação, mas sem medo e com uma confiança estratosférica e nesse campo meu amigo, ninguém segura, ou alguém será capaz de me mostrar um DVD dos melhores lances da carreira dele, que ultrapassem dez minutos de exibição?

A Copa do Mundo é madrasta não é a mamãe, ela é um jogo bruto, um mata-mata brutal, não dá tempo de respirar, não é garantia de glória para os melhores, mas para os mais fortes ou talvez adaptáveis, numa visão análoga ao que diria Darwin. A dona Copa reservou um lugar de honra em seu camarote para Paolo Rossi e ele não se fez de rogado e lá, onde muitos sucumbiram, ele carimbou seu nome na eternidade, se tornando ao lado de Vieri e de Roberto Baggio, um dos três maiores artilheiros italianos em Copas do Mundo de todos os tempos.

A Itália possui quatro títulos mundiais, mas nenhum deles se compara ao vencido e liderado pelas atuações marcantes do “Pablito” em 1982. Paolo Rossi, para os italianos é visto como um herói, um David que derrubou um Golias, são marcas indeléveis de um título para lá de improvável, do jeito que os italianos mais gostam de saborear, com muita transpiração e pouca inspiração.

Rossi ficará para sempre numa galeria onde já habitam gente do porte de Klose, Gerd Muller, Fontaine, Kocsis, Klinsmann, Lineker, entre outros grandes artilheiros que não perdiam tempo jogando bola, precisavam fazer gols.

FECHA AS PERNAS, CORAÇÃO

por Valdir Appel


Sérgio, Major, Valdir, Jorge Luiz, Paulo Dias e Oldair; Nado, Paulo Mata, Adilson, Almir e Bené. (ultimo Torneio início, campeonato carioca de 1967)

Almir, extraordinário jogador, notabilizado como um craque raçudo, tinha um espírito brigão – que lhe ceifou a vida numa briga de bar.

Adilson, apesar de franzino e magro, herdou do irmão a mesma disposição para encarar os adversários.

Tinha uma habilidade incrível, e seus dribles sutis eram um deleite para os torcedores vascaínos.

Garrincha era capaz de dar a mão para levantar um lateral caído aos seus pés, para driblá-lo novamente. Adilson driblava o oponente para frente e voltava-lhe a mesma bola entre as canetas com sutileza rara e precisão milimétrica que paralisavam o adversário.

Denílson, do Fluminense, era a vítima preferida do Caveirinha, como os colegas costumavam chamar Adilson. Havia um prazer quase mórbido do meia vascaíno em atrair o tricolor para enfiar-lhe a bola por entre as pernas. 

Num destes clássicos Vasco versus Fluminense, Denílson não suportou a humilhação da paralisia e o desconforto do vai-e-vem da bola por entre as pernas acrescido do alerta: “Fecha as pernas coração!” (que Adilson soprou nos seus ouvidos), e partiu para a porrada. 

Apesar da diferença descomunal de físicos, Adilson encarou o rival, envolvendo os demais jogadores numa das maiores brigas campais já presenciadas no Maracanã, que culminou com a expulsão de 17 jogadores, interrompendo o jogo aos 35 minutos do segundo tempo.

(Maracanã, 19 de novembro de 1967)

OTIMISMO EM 2021?

::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::


Sei que o correto é iniciar o ano transbordando de otimismo. E tenho me esforçado para isso, mas foi duro demais ver a Praia de Copacabana completamente vazia nesse réveillon. Torço para que os prefeitos eleitos cumpram suas promessas e para que essa vacina chegue logo. No caso dos cariocas, eles precisam de duas injeções, a primeira, esperada pelo mundo todo, e que enxotará esse vírus maldito de nossas vidas, e a segunda, de ânimo, pois a Cidade Maravilhosa está entregue às baratas.

Sinceramente, acredito na vacina e em um Rio de Janeiro mais feliz. Isso, se deixarmos o futebol de lado, afinal existe a seríssima possibilidade de Vasco e Botafogo caírem para a Segunda Divisão, o que seria catastrófico, humilhante, inaceitável. E como tem coisas que só acontecessem com o Botafogo vi pela classificação da Segundona que o CSA, de Rodrigo Pimpão, e o Juventude, de Bochecha, dois ex-alvinegros, podem subir. E ainda sou obrigado a ouvir gracinhas de amigos dizendo que isso é praga e que essa dupla não poderia ter sido dispensada do clube. Só faltava essa!

Como o Cruzeiro não deve subir imagina-se uma Segunda Divisão bem complicada nesse ano. Esse foi o destino de, por exemplo, América e Portuguesa, de São Paulo. Ou profissionalizam-se ou somem do mapa. Sobre a Libertadores, posso estar enganado, mas está com toda a pinta que será vencida por Boca ou River mais uma vez. Gosto muito do trabalho de Marcelo Gallardo, do River, para mim um dos melhores treinadores do mundo, assim como Guardiola, eleito o melhor do século. A escola de Guardiola é uma luz no fim do túnel, afinal ele preza por um futebol ofensivo, de toque de bola, bonito de se ver. E no Brasil conta-se nos dedos os treinadores que apostam nessa filosofia.

Aqui a cartilha seguida é a do jogo feio, mas garanto o meu emprego. Ou seja, em 2021 a vacina chegará, o corona desaparecerá do mapa, mas o vírus da retranca continuará promovendo o distanciamento social dos torcedores do estádio. Sem falar do bando de almofadinhas inventando um linguajar insuportável nas nossas caras e afastando o telespectador do futebol. Chega!

UM SHOPPING CHAMADO ANDARAHY (E AMERICA, VASCO, PORTUGUESA…)

por Paulo-Roberto Andel


Rio de Janeiro, janeiro de 2021. 

Na esquina das ruas Teodoro da Silva com Barão de São Francisco, no bairro de Vila Isabel (a conferir, ou Andaraí melhor dizendo), fica o Shopping Boulevard, uma referência comercial da região. Como qualquer shopping center, possui grandes lojas, cinemas, praças de alimentação e outros equipamentos. Agências bancárias também. 

Recebe famílias, crianças, casais, gente de várias localidades da cidade. 

Caminhando em seus corredores, talvez a única grande expressão que remeta ao futebol seja sua tradicional loja de botões, que promove campeonatos diariamente. 

Nestes tempos de pandemia, tudo é mais lento, vazio e silencioso. 

Transitando pelo Boulevard, é possível que seus frequentadores mais jovens sequer desconfiem que caminham sobre parte importante da memória do futebol brasileiro. Talvez nem os mais idosos se lembrem. Não há nada ali que identifique o caso. 

Para os que têm entre cinquenta e setenta anos de idade, pode passar a lembrança de que ali existiu o Estádio Wolney Braune, do América, vendido justamente para a construção do shopping. Mas o que poucos sabem é que bem antes do America, ali viveu uma grande praça do futebol do Rio. 

Foi a casa do Andarahy, o mesmo de Dondon, imortalizado na música de Nei Lopes. Dos tempos em que a maravilhosa Vila Isabel não puxava o bairro do Andaraí para si, melhor dizendo, que a especulação imobiliária não entortava as coisas. Naquele logradouro, o clube alviverde ergueu sua sede e estádio, que serviu para muitas partidas do Campeonato Carioca em seus primórdios. Além de mandar seus jogos, o Andarahy regulamente cedia suas instalações para partidas de outras equipes, em especial as da zona norte da cidade, tais como o próprio America e o Vasco, antes da imponente inauguração do Estádio de São Januário no ano de 1927. 

O Andarahy não resistiu ao futebol profissional. Jogou o Campeonato Carioca de 1913 a 1937. Depois disso, numa situação ruidosa, a querida Portuguesa – que hoje é um símbolo da Ilha do Governador, mas não nasceu lá – arrendou as instalações do clube e permaneceu na casa por duas décadas. Depois, com a saída – também ruidosa – da Lusa, o America adquiriu o patrimônio no ano de 1961, inaugurando o Estádio Wolney Braune – uma referência rubra – em 1996, permanecendo lá até 1993, quando foi concretizada a venda para a construção do shopping. Em 1973, o que havia sobrado do Andarahy na região desapareceu de vez. Felizmente o clube já foi registrado em livros e em breve ganhará um outro, do escritor Kleber Monteiro.


Não há uma vírgula visível dessa história para as milhares de pessoas que frequentam o shopping diariamente, ou um pouco menos nestes tempos de pandemia. Muita gente sequer desconfia que antigamente a rua lateral não se chamava Barão de São Francisco e sim Prefeito Serzedelo Corrêa. Que ali por muitos e muitos anos pulsou uma parte importante do futebol carioca, que envolveu vitórias, derrotas, dramas, nomes e, por isso mesmo, faz parte da história, uma história bela e que precisa ser resgatada o quanto antes.

O Shopping Boulevard fica bem em cima de um lindo capítulo do começo e firmamento do futebol carioca mas, justiça seja feita, está longe de ser o único cemitério involuntário da memória. Quando o bom e velho football se espalhou pelo então Distrito Federal, campos e mais campos de todos os tipos surgiram pela cidade, assim como times que muita gente nunca ouviu falar. São muitas histórias deste esporte apaixonante que precisam ser contadas. 

Cem anos passam rápido demais. Falando nisso, e dos queridos times sobreviventes e centenários do Rio, o que podemos esperar? O que vai acontecer para que consigam sobreviver 200 anos? 

@pauloandel