Escolha uma Página

O CRAQUE DO BRASIL EM 1978

por Luis Filipe Chateaubriand


Em 1978, o maior jogador do futebol brasileiro foi Zenon, do Guarani de Campinas. O craque bugrino teve uma temporada espetacular, sendo o principal artífice do título de campeão brasileiro conquistado pelo clube do interior paulista – é bem verdade que muito bem assessorado por grandes jogadores como Careca, Renato Pé Murcho e Zé Carlos.

Jogador extremamente técnico, Zenon pensava o jogo como poucos, antevendo as jogadas que poderia executar perante o posicionamento dos jogadores adversários. Batia faltas com perfeição. Era um passador de bola e lançador extremamente qualificado.

Todas essas virtudes estavam bastante exacerbadas naquele Campeonato Brasileiro de 1978.

Um dos momentos altos do brilho de Zenon foi na vitória do Guarani de 3 x 0 sobre o Internacional, em pleno Beira Rio. Em dado momento, Zenon está com a bola, na intermediária, próximo ao meio de campo. Vendo Careca marcado, resolve fazer o lançamento… para ele próprio. Joga a bola na frente, corre quando os marcadores adversários não esperavam, chega na frente deles e, de frente para o goleiro, toca para o gol. Brilhante!

Os dois gols que fez na semi final contra o Vasco da Gama, no Maracanã – uma vitória bugrina de 2 x 1 – também são dignos de registro. Um deles, um “tirambaço” de fora da área. O outro, uma falta batida com enorme categoria. Só restou ao goleiro Mazaropi fazer golpe de vista, torcendo para que a bola saísse e, para azar dele, não saiu.

No primeiro jogo da final, contra o Palmeiras, junto com o experiente Zé Carlos e o novato Careca, tratou de enervar o adversário, que precisava vencer o jogo em casa. Conseguiu e, na expulsão do goleiro Leão, converteu o pênalti que garantiu a vitória de 1 x 0 como visitante.

No segundo jogo da final, suspenso, não jogou. Mas já tinha cumprido o seu papel, o de ser o condutor de um time que encantou o Brasil e, merecidamente, promoveu uma inesquecível festa no interior.

Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!

JOGUINHO FEIO

:::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::


“Que joguinho feio” talvez tenha sido a frase que mais ouvi durante a transmissão da final da Libertadores da América. Não do locutor da tevê, claro, mas de pessoas me ligando de cinco em cinco minutos. Sei que pode soar como bairrismo criticar uma decisão entre times paulistas, no Maracanã, mas sou obrigado a concordar: que joguinho feio! Na verdade, feio é pouco, a partida foi medonha! É o retrato do futebol na América Latina, nível baixíssimo. É inadmissível que Santos e Palmeiras sejam os melhores times do Brasil. Cuca até fez milagre com um Santos endividado, mergulhado em uma crise financeira gravíssima, mas o Palmeiras gastou uma fortuna para montar um elenco milionário que venceu, mas não convenceu.

O torcedor não está nem aí e tem mais é que comemorar, mas o português Abel Ferreira adotou uma postura covarde, típica dos retranqueiros brasileiros. O Palmeiras é um time sem novidades, que não nos surpreende, como são praticamente todos os times que disputam o Brasileirão. A crise técnica é preocupante e agora virou moda dizer que “fulano mordeu o adversário” ao citar uma marcação mais firme. A última grande novidade do futebol brasileiro continua sendo a passagem avassaladora de Jorge Jesus, que apostou todas as suas fichas em um futebol ofensivo e animou a galera. Nenhum treinador brasileiro, da nova geração, despontou e continuamos colocando em prática ideias ultrapassadas, praticando esse “joguinho feio”.

Estava no Maracanã acompanhado de alguns campeões do mundo e a falta de educação dos torcedores também foi outro ponto negativo: em pé nas cadeiras, cantando durante o hino nacional e sem máscaras. Cuca, após expulsão patética, juntou-se a eles e dali assistiu o lateral Pará falhar no gol do Palmeiras. O futebol da beirinha, posicional e que ataca a bola agoniza. “Que joguinho feio”, o torcedor está certíssimo. Ainda bem que não teve prorrogação, pois do contrário eu teria que ser deselegante e sair de fininho. Me despedi de Jairzinho e Brito e me deu uma saudade que vocês não fazem ideia…

LANÇAMENTO FESTIVO DA CAMISA RETRÔ DO MANUFATURA EM VILA ISABEL

por André Luiz Pereira Nunes


Na última quinta-feira (28) ocorreu na loja Botão FC, no Shopping Boulevard Rio, antigo Iguatemi, em Vila Isabel, o lançamento da camisa retrô do Manufatura Nacional de Porcelana Futebol Clube. A Otaner Roupas, igualmente responsável por comercializar a indumentária do America, está de parabéns pela ótima iniciativa de reviver essas antigas paixões.

Durante a apresentação, estive com Pedro Henrique Gomes (PH), da Deriva dos Livros Errantes, estrelando uma live, na qual discorremos sobre o rico histórico do mencionado grêmio industriário alvinegro, uma das maiores glórias do futebol amador da capital, que tantos títulos conquistou ao longo da sua pródiga e longa trajetória nos certames promovidos pela Federação Atlética Suburbana, Federação Metropolitana de Futebol e Departamento Autônomo. Também lançamos, no mencionado encontro, uma fanzine sobre a agremiação, de nossa autoria, intitulada “Os Manufaturenses da Cardim”, que pode ser adquirida junta ou separadamente da camisa.

A transmissão, ocorrida pelo Instagram, contou com a qualificada audiência de Edu Coimbra, irmão de Zico, e maior ídolo do America. Ele ficou extremamente feliz de relembrar episódios da sua juventude, quando também frequentou o antigo estádio Klabim, em Pilares, que posteriormente deu lugar ao Norte Shopping. A atração contou com um convidado especial: o ex-atleta manufaturense Clay Viana, hoje responsável pela divulgação da história do clube na internet e promotor dos encontros dos ex-jogadores. Ele ressaltou o glorioso passado do time, citando inúmeros craques revelados, entre os quais, o atacante Rogério, ídolo do Botafogo e da Seleção Brasileira de 1970.


É importante frisar que constam na camisa a menção acerca do bicampeonato suburbano, em 1940/41, e os 80 anos que decorrem dessa importante conquista. A equipe, fundada em 1932, inicialmente disputava apenas amistosos, excursões, desafios e torneios sem menor importância, até que decidiu, em 1939, se filiar aos quadros da Federação Atlética Suburbana, a qual reunia as maiores expressões futebolísticas do quadro amador da cidade como Mackenzie, Modesto, Mavílis, Engenho de Dentro, Del Castilho, Oposição, Magno e Ríver. Não demoraria para que o Manufatura logo conquistasse o seu espaço ao se sagrar campeão do Torneio Início derrotando justamente o Mackenzie na decisão.

A Otaner, ao realizar esse importante empreendimento, contou com a nossa consultoria, para que tudo saísse perfeito e dentro do planejado. Vale frisar que a empresa já havia feito o lançamento da camisa retrô do Andaraí Atlético Clube, também facilmente encontrada através das suas redes sociais ou na loja Botão FC, localizada no Shopping Boulevard Rio, o antigo Iguatemi.

A julgar pela excelentes repercussão e acolhida por parte do público aficionado, que vem prestigiando a reedição de camisas de times extintos, logo teremos novidades. Por ora, Confiança Atlético Clube, de Vila Isabel, e Byron Football Club, de Niterói, estão cotados para serem a bola da vez.

DE CHICO BUARQUE PARA ABEL FERREIRA, DEMASIADOS HUMANOS

por Marcelo Mendez


“Foi bonita a festa, pá

Fiquei contente

E inda guardo, renitente

Um velho cravo para mim”

Enquanto o Brasil vivia sufocado por uma ditadura militar em 1975, Portugal fazia a sua Revolução dos Cravos e esta emocionou profundamente Chico Buarque. Disso nasceu a música “Tanto Mar” cujo verso está citado acima. Pois…

A música fala de ausência, da vontade de se estar em uma festa que para os Brasileiros daquele momento de 1975 era inimaginável. No futebol sábado, a música de Chico Buarque volta a ser protagonista a partir do momento que Abel Ferreira senta para dar uma entrevista histórica na coletiva de imprensa do título do Palmeiras na Libertadores de América:

– Quando eu cheguei, passei a viver na Academia, era a minha família. É verdade que sou melhor treinador e muito mais valorizado, mas sou o pior pai, sou o pior filho, sou o pior tio, sou o pior marido. Deixei minha família lá. Conquistei muito aqui, mas vocês não sabem a quantidade de vezes que, ao deitar no meu travesseiro, eu chorei sozinho de saudades.

O futebol é uma máquina de moer reputações, trajetórias, histórias e lembranças. O título que é épico hoje, não serve para reconfortar o ávido e mal acostumado torcedor que tem uma sanha voraz por títulos e conquistas amanhã. É compreensível sim, eu sei, afinal de contas torcemos para isso, para que nosso clube vença sempre, porém, todavia, se o futebol é o esporte que mais se aproxima da vida real, sabemos com isso que na vida não vencemos todas. Ao contrário; Perdemos muito mais do que ganhamos e nosso discernimento nos ensina a lidar e aprender com essas derrotas. E no futebol, agora temos um técnico português que ousa nos ensinar isso.

Abel Ferreira é o tipo de gente que não tem vergonha em se abrir em sentimentos, que expõe a melhor e maior faceta humana que rege o futebol. É o tipo de técnico que após uma derrota retumbante para o River Plate, vai a público e diz “Marcelo Galhardo é um técnico melhor do que eu. Hoje foi isso e eu vou aprender a partir disso que aconteceu.” Ele é um técnico que faz questão de lembrar o trabalho de Vanderlei Luxemburgo na formação dessa equipe que acaba de conquistar a América, dando ao maior treinador da história do Palmeiras, um valor que os Verdes esquecem de dar.

Abel Ferreira é Humano. Demasiado, humano.

Ele é o Homem que em três meses mudou o jeito do Palmeiras pensar futebol, que ganhou os corações dos exigentes torcedores Palmeirenses, que mostra desempenho em cima de falácia, que trabalha incessantemente para dar ao Clube o maior título de sua história, mas não faz tudo isso de maneira mecânica. Abel explode o coração.

– Vocês viram no final, eu não chorei pouco, eu chorei muito, e saí do campo pra ninguém ver o quanto eu estava chorando. É muito difícil, eu sou uma pessoa de família, adoro as minhas filhas e a minha esposa, e atravessei o Atlântico por acreditar numa coisa antes dela acontecer. Contra todas as previsões eu vou descobrir, vou me desafiar, vou para um clube que tenho a certeza que pode me proporcionar títulos. Sou melhor treinador? Sou. Sou muito melhor treinador do que era há três meses. Mas, como disse, sou pior filho, pior pai, pior marido, pior irmão, pior tio. Infelizmente, há sempre algo que temos que sacrificar em prol da nossa profissão.

Abel Ferreira molhou sua faixa de campeão da América com as lágrimas que fazem falta pro futebol. Que tornam tudo isso mais humano e que precisa ser sempre lembrado por nós que trabalhamos com essa coisa alucinada que é o futebol. Eu te daria um abraço, professor. Chico Buarque te diria que “Sei que há léguas a nos separar/Tanto mar, tanto mar/Sei também quanto é preciso, pá/Navegar, navegar “. Então segue navegando, professor.

O mundial que o Palmeiras tem pela frente é outra história, outra realidade e isso será tratado na hora adequada. Por aqui fica o recado de Chico, mandado por esse cronista, para Abel Ferreira:

“Lá faz primavera pá

Cá estou doente

Manda urgentemente algum cheirinho

De alecrim”

Que esse aroma de alecrim o aproxime dos corações que lhe estão para além-mar, Professor Abel. Fica bem.

Enéas “Mike Tyson”

O MAQUEIRO E A BENGALA

entrevista e texto: Sergio Pugliese | fotos e vídeo: Daniel Planel

O Maracanã dos velhos tempos era abarrotado de personagens, era com o se você mergulhasse em um livro de contos e fábulas. Havia o torcedor que cobria o corpo inteiro com pó de arroz, Dona Dulce Rosalina, que comandava a galera vascaína, o sósia do Obama, o carinha que vivia rezando com um galho de arruda acomodado na orelha, o alvinegro Russão, o Mr. M, o árbitro Armando Marques cheio de caras e bocas, o comentarista Mário Vianna gritando “errooooou!!!”, o locutor da Suderj anunciando as escalações, o velhinho das embaixadas, enfim, o Maracanã era uma espécie de ilha da fantasia, um mundo encantado que amenizava nossas dores e coloria nossas emoções.

Mike Tyson, o maqueiro fortão, era mais uma dessas tantas figuras que ilustravam nossas tardes/noites e guardamos na memória até hoje. O cara era um guarda-roupas e virou atração turística porque passou 20 anos entrando e saindo de campo carregando gênios, como Zico e Maradona, e grandalhões, como Júnior Baiano e Manguito. Quando sentia que a contusão era mais grave, nem esperava por Geraldo, seu grande parceiro de trabalho, entrava correndo em campo, colocava o atleta no ombro e voltava correndo com ele. A galera endoidava! Certa vez, tropeçou, caiu e a Geral pegou no seu pé…”negão, tá na hora de se aposentar!”. Quando o locutor Januário de Oliveira anunciava “tá lá um corpo estendido no chão, vem aí o primeiro carreto da noite”, ele entrava em ação, era seu estrelato.

Vascaíno, o primeiro jogador a carregar foi Zico. Ficaram muito amigos. Malhava como um louco e nas horas vagas atuava como segurança de boates, clubes e para a família do Galinho de Quintino. Nos finais de semana de folga, para condicionar-se fisicamente, corria de Brás de Pina, subúrbio carioca, até a Praia de Copacabana. Na chegada triunfal, o filho acenava, orgulhoso, da areia. Durante o trajeto, muita gente o reconhecia e pedia autógrafos.

O “negão da maca” fez história no Maraca, foi um de seus reis, como Romário, Túlio, Renato Gaúcho e Papai Joel. Claro, que tanto peso lhe rendeu problemas graves na coluna, mas o glaucoma, que o deixou cego, é o que mais o aflige. Aos 80 anos, está frágil e saudoso da grama verde, de sua padiola e do respeitável público daquele circo chamado Maracanã.

Em nossa despedida, tentou levantar-se do sofá, mas não conseguiu nem com o apoio de uma velha bengala. Segurei firme em seu pulso e ofereci apoio ao maior reboquista da história do Maracanã. “Quem diria, hein”, comentou. Quem diria. Rimos e caminhamos lentamente até a porta amparados por um abraço e por doces lembranças.