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O DIA EM QUE DEIXEI DE SER TRICOLOR

por Zé Roberto Padilha


O telefone tocou das Laranjeiras. Quando isso acontece lá em casa, e não foram poucas às vezes, quem atende é o coração. De minha parte. E ele engole a razão, que vem da patroa, dos filhos e de quem mais tenha juízo.

Daqueles que sabem que não pagamos nossas contas com sonhos e idealismo. Mas com dinheiro.

Do outro lado da linha, Edinho, que assumia os profissionais do Fluminense, convidou-me para reassumir o juniores e ser seu auxiliar técnico nas finais contra o Vasco, pelo título do estadual carioca de 1993.

Após trabalhar em Xerém, nas divisões de base entre 1987 e 1991, voltara a Três Rios para ajudar na formação profissional das nossas equipes amadoras: o América FC e o Entrerriense FC.

Com a ajuda do supervisor tricolor, Paulo Alvarenga, estrutruramos os dois clubes, o Fluminense nos emprestou oito jogadores e ambos disputaram a primeira divisão em 1992. Algo inimaginável nos dias de hoje.

Mesmo assim, após uma derrota, fui demitido quando treinava o América. Depois disso, trabalhei na Distribuidora Brahma, com carteira assinada e sem depender de resultados para ter direito à estabilidade. E quando as contas se equilibraram, minha paixão falou mais alto e fui para uma nova aventura no futebol.

Parti debaixo de ressalvas coletivas. Nossos parentes sabem mais desse mundo sórdido do que nós, jogadores, treinadores, que somos reféns dessa cachaça. E das ressacas que nos provocam.

Ao mesmo tempo que disputava os dois jogos decisivos contra o Vasco, Edinho anunciava a imprensa que recebera uma proposta irrecusável do Marítimo, de Portugal, e que indicara meu nome para substituí-lo.

Todos os jornais estamparam minha foto como seu sucessor e o presidente do clube, Arnaldo Santiago, nem se manisfetara a respeito.

Tinha um Fiat Uno, mas na semana decisiva, conhecendo de onde buscam “valores” para ocupar o cargo, pedi emprestado o Santana zerado da minha irmã, que era o top de linha. Chegando com ele, não fiz feio diante do carro importado do Super Ézio.

O Vasco foi campeão e Edinho se despediu do clube e bateu nas minhas costas no vestiário:

– Agora é com você, amigo!

Sem ser anunciado oficialmente, perguntei ao supervisor dos profissionais, Roberto Alvarenga:

– O que faço?

Roberto disse: vem cedo dar o treino normalmente. Alguém precisa estar aqui. Fui pro hotel e nem dormi pensando na minha possível estreia no domingo, contra o Palmeiras, pelo Torneio Rio São Paulo.

Todos que nos antecederam no cargo, como Gilson Gênio, Rubens Galaxe, Sebastião Rocha, Gama, tiveram essa interinidade. Ocuparam a cadeira enquanto um Dorival Junior, Cuca, Celso Roth… vocês sabem!.


Cheguei cedinho ao clube e uma leva de jornalistas passou por mim. “Oi, Zé!” Tinha algo errado. Não era eu, caso contrário me cercariam. Ximbica, o roupeiro amigo, oito anos de clube como a gente, me chamou no canto do vestiário para nos consolar.

– O Nelsinho Rosa é muito amigo do Presidente! – disse.

– Mas por que não o anunciou? Deixou no ar meu nome, meus sonhos…

Enfim, fiz a viagem de volta mais triste da minha vid, mas ela era só aperitivo. Quando cheguei, Paulo Alvarenga ligou do Flu.

– Já soube, não é?

Eu respondi:

– Sim, mas ainda temos chances, afinal sou o treinador do juniores!

Ele retrucou:

– Não é mais. Nelsinho indicou o filho para treinar o junior. Você foi demitido!

Sabe aquele dia que você olha do alto da ponte e agradece o privilégio de ter tido os pais, tios, professores e avós que tive, nos ensinando o valor da vida?

Do Paulo Matheus, nosso psicólogo, que diz que precisamos ser os protagonistas da nossa própria história?

Pois é. A vida continuou. Foi apenas um dia em que deixei de ser tricolor por causa de uma gestão covarde, incapaz de assumir suas preferências à luz do dia. E que não estava à altura de dirigir nosso clube como eu estava preparado, naquela ocasião, para dirigir o Fluminense.

Era apenas uma gestão. O clube, e eu, somos maiores do que ela. E sobrevivemos.

O CRAQUE DO BRASIL EM 1997

por Luis Filipe Chateaubriand


Em 1997, o melhor jogador do Brasil foi Edmundo.

Edmundo que fazia gol atrás de gol.

Edmundo que driblava como gente grande.

Edmundo que passava a bola com perfeição.

Edmundo que fazia tabelas e triangulações geniais.

Edmundo que executava lançamentos com maestria.

Edmundo que liderava o time do Vasco da Gama com soberba capacidade.

Pensando bem, Edmundo não foi o melhor jogador do Brasil de 1997.

Edmundo foi o melhor jogador do mundo de 1997.

E estamos conversados!

Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!

UM MENINO E UMA VIDA DE 107 ANOS

por Marcelo Mendez


Na minha vida de menino, teve uma vez que saí do Morumbi triste depois de uma partida insólita em que o Palmeiras não venceu a Inter de Limeira. Chorei, mas não tive dúvida:

Eu sou Palmeirense. Sempre com P maiúsculo.

Sou porque foi na miséria ludopédica plena que esse amor se consolidou. Amor de Trapo e Farrapo, minha bandeira de guerra, meu pé de briga na terra, meu direito de ser gente, como cantou Paulo Vanzolini. O Palmeiras é isso na minha vida:

“Meu direito de ser gente”.

Pelo Palmeiras eu vivi tudo; eu ri, chorei, xinguei, amei, odiei… Vivi a plenitude da existência e entendi que isso faz parte não só do esporte, mas da vida. Por isso, mais do que qualquer outro vivente do mundo, eu sei o gosto bom de ser Palmeirense.

Sei pelo paradoxo disso tudo, do contrário que pode acontecer, ou seja; sei por que não preciso de nada… de mais nada além da paixão, para me sentir feliz pelo meu verde.

Sei, porque o Palmeiras é muito mais do que um clube de futebol para mim.

Sei por entender há muito tempo que o Palmeiras é um pouco de tudo que há no futebol e na vida. O Palmeiras é um drama, como na Cavaleria Rusticana, o Palmeiras é um sonho como num filme de Akira Kurosawa, o Palmeiras é uma tragédia como Carmen de Bizet, o Palmeiras é lindo como a Nona Sinfonia de Beethoven, como a peça Jesus Alegria Dos Homens de Bach, é triste como o fim do primeiro namoro. É pleno como a fúria de uma paixão.


Hoje, no dia do aniversário do Palmeiras, com tudo que vem acontecendo nesse ano, fiquei a pensar nisso tudo que vivemos, nessa nossa relação, na coisa de não ser mais menino, mas aí cheguei à conclusão de que não, nunca vai rolar de eu deixar de ver o Palmeiras com os olhos de menino. É impossível.

Nada na vida do homem de seus 49 anos, escritor, jornalista, fã do Lou Reed, do Truffaut e do João do Vale, estará dissociado do menino Palmeirense dos anos 70. Tudo que faço, tudo que sinto, tudo que eu sou, vem do menino. O jeito latino, a malandragem do bem, o gosto pela poesia, a incessante disposição na busca por encanto, o Palmeiras…

Tudo é o menino.

Tudo é festa. Afinal são 107 anos. No teu aniversário Palmeiras, mais do que parabéns eu te agradeço por tudo que vivemos juntos, por tudo que vamos seguir vivendo.

Muito obrigado por cada um dos seus 107 anos, Palmeiras!

Palmeiras…

A SELEÇÃO PAROU NO TEMPO?

por Paulo-Roberto Andel


Nas últimas semanas, por diversos motivos a Seleção Brasileira tem sido referência nos meios de comunicação. Não tem a ver propriamente com a medalha de ouro nas Olimpíadas de Tóquio, nossa conquista mais recente, mas sim com cenas maravilhosas de muito tempo atrás.

Seja para celebrar os aniversários de Pelé e Zagallo, para comemorar os aniversários das conquistas das cinco Copas do Mundo, documentários maravilhosos de Ernesto Rodrigues no SporTV ou outros motivos, o fato é que a Seleção tem aparecido bem na TV fechada, internet etc.

Ao mesmo tempo em que se pode esbaldar com cenas maravilhosas, gols inesquecíveis – no caso de 1970, até mesmo os gols que não aconteceram – e passes fantásticos, hoje a melhor imagem da Seleção Brasileira é uma lembrança distante. Sim, para muitos de nós aquele futebol maravilhoso está muito vivo à mente, mas 1970 tem mais de meio século, 1962 prestes a completar 60 anos e 1958 já tendo passado disso.

É importante respeitar e muito as grandes conquistas de 1994 e 2002, últimos momentos que o nosso futebol deu lampejos do que já foi um dia, mas quando se fala em uma constelação de craques, temos 1958-62-70 em vista. É inevitável.

Estamos a caminho dos 20 anos sem Copas. Quando isso aconteceu a partir de 1970, em 1990 o Brasil fracassou no Mundial da Itália, mas tinha jogadores que faziam pensar, dentro e fora da Seleção: Romário, Bebeto, Renato Gaúcho, Careca, Neto e ainda viriam à frente Djalminha, Edmundo, Marcelinho, Dener, Jorginho, Aldair, Branco, Leonardo, Mozer, Ricardo Gomes, Taffarel, Zetti, tantos nomes. E agora? O que realmente temos agora além da estrela solitaríssima de Neymar? Líder nas eliminatórias, o Brasil não empolga nem mostra nomes capazes de cativar os torcedores.

Enquanto por aqui vivemos um futebol anêmico, verdadeiro faquir do talento, numa sucessão de jogos brutos, feiosos e que não dizem o que é o verdadeiro Brasil em campo, não consigo parar de pensar numa fala do brilhante documentário “Maracana”, de Sebastián Bednarik e Andrés Varela. Feita com cenas belíssimas da trajetória uruguaia na Copa de 1950, a produção aborda uma perspectiva diferente do lugar comum que temos de tragédia nacional. No fim, o narrador em off conta a chegada dos jogadores uruguaios a Montevidéu, e nas cenas finais com o povo louvando os jogadores, algo como “a vitória do Uruguai fez o país parar no tempo, sendo seu último grande feito esportivo”.

Vejo as lindas cenas do passado do nosso futebol e temo que tenhamos parado no tempo, sem perceber.

@pauloandel

FILLOL, SIMPLESMENTE O MELHOR

por Luis Filipe Chateaubriand


O argentino Ubaldo Matildo Fillol é o melhor goleiro que este articulista viu em ação na vida. Campeão do Mundo com a Seleção Argentina, contribuiu de forma soberba para o título de seu país.

Na Argentina, jogou no River Plate e no Racing.

Em terras estrangeiras, jogou no Brasil, no Flamengo, e na Espanha, no Atlético de Madrid.

Sua principal virtude era a colocação.

Não precisava sair pulando para defender as bolas, pais estava normalmente bem-posicionado – como se tivesse um ímã na mão, que atraísse a bola.

 No entanto, quando se fazia necessário dar pulos para fazer a defesa, era capaz de saltos acrobáticos, dir-se-ia mesmo inacreditáveis.

Uma verdadeira muralha para atacantes adversários.

Ainda por cima, sabia jogar adiantado, como se fosse um líbero, o que dava a vantagem para os times que defendia de articular novos ataques mais rapidamente e com melhores possibilidades de êxito.

Quando alguém falar para você em goleiraço, pense em Fillol!

Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada!