O CRAQUE DO BRASIL EM 2004
por Luis Filipe Chateaubriand
Em 2004, o campeão brasileiro foi o Santos.
Dá-lhe, Peixão!
No comando das ações, o meia Ricardinho, não à toa apelidado de “o patrão da bola”.
Com efeito, todas as ações do time da Vila Belmiro – sejam defensivas, sejam ofensivas – passavam por Ricardinho.
Jogador cerebral, sabia conduzir a bola para um lado, para lançá-la para o lado oposto, desnorteando a marcação adversária.
Lançamentos de 30, 40, 50 metros eram feitos com precisão impressionante.
Quando a bola estava com o adversário, orientava o posicionamento do time, com o intuito de retomá-la.
Chutava bem em gol, batia faltas.
Enfim, um jogador que fazia a diferença para os clubes que defendeu, particularmente em 2004 estava inspirado, jogando com Diego e Robinho, se sobressaiu ainda em relação a estes.
E, assim, o “patrão da bola” comandou a esta, a bola, e ao time rumo ao título!
Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada
MARINHO, A BRUXA
por Elso Venâncio
Francisco das Chagas Marinho nasceu em Natal, passou pelo ABC e Náutico até chegar, aos 20 anos de idade, ao Botafogo. No ano de 1972.
Agnaldo Timóteo fazia uma turnê pelo Nordeste. Fã de futebol, resolveu ir ao Estádio dos Aflitos e se impressionou com Marinho. Botafoguense fanático, ligou de imediato para o clube fazendo uma exigência:
– Comprem Marinho! Vi esse garoto louro em campo, é um cracaço. Comprem Marinho!!!
O jogador foi apresentado em General Severiano e, no fim de semana, já estreou pelo Glorioso. Simplesmente, contra o Santos de Pelé.
Beto Gamarra, zagueiro do GPSO (Grupo de Pelada Seis de Outubro*), me contou: na véspera desse confronto faltou um para completar os times na areia da Praia de Botafogo. Alguém gritou para um cara que estava no calçadão:
– Ei, paraíba, quer entrar?
Sem pensar duas vezes, Marinho foi para a areia. Sequer tirou o tênis e, no primeiro toque na bola, deu um voleio do meio-campo que estufou as redes. Incrível! Praia boquiaberta. Esse era Marinho Chagas.
Na estreia, irreverente, habilidoso e ofensivo, Marinho deu um chapéu em Pelé, para surpresa de um Maracanã lotado. Na época, independentemente de seus clubes, torcedores de todas as bandeiras iam com gosto ao estádio só para ter o prazer de ver o Santos. Pelé, por sua vez, não gostou do afronte. Aos gritos, pediu respeito:
– Galego, me respeita!
Nesse jogo, Edu marcou para os paulistas e Marinho, de falta, chutando de longe, empatou. Pelé mais uma vez não aprovou:
– O que é isso? Tá pensando que é quem?
Marinho xingou o Rei de tudo quanto era nome. Houve quase uma briga generalizada.
O lateral se destacava pelo chute forte e pela quantidade de gols que marcava. Atacava sempre. Era mais um ponta, um armador, e logo se tornou ídolo da torcida alvinegra, chegando à Seleção. Na Copa de 1974, na Alemanha, inclusive, foi considerado pela FIFA o melhor lateral-esquerdo do mundo. Na disputa do terceiro lugar, contra a Polônia, após a surpreendente derrota para o ‘Carrossel Holandês’ de Johan Cruijff, Marinho avançou e, nas suas costas, Lato marcou. O comentarista João Saldanha não perdoou:
– É a ‘Avenida Marinho’…
No vestiário, pilha de nervos à flor da pele, o goleiro Leão parte para cima do lateral. Após tensa discussão, a turma do ‘deixa disso’ se juntou para separá-los.
Em 1977 o Fluminense, com sua inesquecível Máquina Tricolor, era a grande atração do país. O tri carioca era questão de tempo. Francisco Horta – “Vencer ou Vencer” – decide contratar Marinho de qualquer jeito, a qualquer custo. Se o Campeonato Brasileiro fosse por pontos corridos, o time das Laranjeiras teria sido, nos anos anteriores, bicampeão – e com rodadas de antecedência. Contudo, foi surpreendido nas semifinais de 1975 e 1976, respectivamente, pelo Internacional e pelo Corinthians.
Para ter Marinho, Horta oferece Paulo Cezar Caju, Gil e Rodrigues Neto. Vieram, de contrapeso, Wendel e Miranda. Mas na verdade o que houve foi um três por um. O dirigente mandou para o Botafogo três jogadores de Seleção: Gil, titular no Mundial do ano seguinte; Rodrigues Neto, outro craque que vestiu a ‘amarelinha’; e um gênio da bola que estava no auge: Paulo Cezar. Resumindo: Horta contratou Marinho mas desmontou a Máquina, que saiu dos trilhos. O Fluminense deixou de ser tricampeão carioca única e exclusivamente devido à obsessão de seu presidente por Marinho.
Depois que deixou o tricolor, Marinho ainda brilhou no Cosmos, de Nova York, ao lado do Pelé, Beckenbauer e Romerito. Também vestiu a camisa do São Paulo Futebol Clube.
Há cerca de três anos, fui de férias a Natal e resolvi ir à tal Praia da Redinha que Marinho tanto falava. De frente para o mar, pergunto em um quiosque onde ficava a casa em que ele nasceu e morou. Disseram que a 200 metros dali, apontaram-me o local.
Bato na porta, sou bem atendido, me convidam a entrar e o irmão dele, curiosamente, se apresenta como Bomba. Ele lembra Marinho, exceto pela proeminente barriga. Diz que era difícil para ‘A Bruxa’ viver com fama e dinheiro em cidades grandes.
Pergunto o porquê de seu apelido ‘bombástico’.
– Você não sabe? Eu que ensinei Marinho a soltar a bomba. Desde o início, no Riachuelo. Eu era um peladeiro limitado, mas tinha um canhão na perna e passei isso a ele. A maneira de bater forte e fazer gols.
Para muita gente, Marinho foi o melhor lateral-esquerdo do futebol depois de Nilton Santos. E tinha um foguete na perna. Curiosamente, em razão dos ensinamentos que teve do irmão de sangue.
*Essa pelada, sempre às tardes nos sábados, completou 48 anos de fundação. Era em Botafogo e há 10 anos está na Sede da ASBAC, na Praça Onze, Cidade Nova. Passa de pai para filho. Marinho, quando parou de jogar, sempre esteve presente. Não jogava porque o joelho já não mais lhe permitia, mas participava apitando os jogos e, claro, continuava ao fim junto com a galera na resenha.
SISTEMA VICIADO
:::::::: por Paulo Cézar Caju :::::::
Não há mistério, o treinador para fazer um bom trabalho, deixar o time arrumado, precisa de tempo. Não existe milagre. O que aconteceu entre o português Jorge Jesus e o Flamengo é raríssimo e, por isso, volta e meia a torcida rubro-negra grita seu nome na arquibancada. Será que acontecerá tudo igualzinho, caso um dia ele volte? Bem difícil. Os “professores” brasileiros não conseguem evoluir porque estão acomodados nessa dança das cadeiras, nessa insuportável panelinha, nesse mercado totalmente viciado. Vejam o exemplo de Marcelo Cabo, demitido do Vasco em um dia e contratado pelo Goiás no outro. Ele vai mesmo sabendo que não terá tempo de trabalhar da forma correta, tanto que já foi demitido.
Mas aí entram em cena as multas rescisórias e aquela dinheirama que já sabemos. Tem treinador que já se aposentou há tempos e continua recebendo essas boladas. E é bom lembrar, não tenho esses números, mas dificilmente um técnico, mesmo da Segunda Divisão, ganhe menos do que 80, 100 mil reais. O rodadíssimo Enderson Moreira vem dando certo porque alguns clubes terão que subir, independentemente da forma que joguem. No jogo do Inter, notando que a câmera estava filmando, o auxiliar do Diego Aguirre simulou alguma estratégia na prancheta e poucos prestaram atenção. Reparem, os jogadores normalmente olham para o lado oposto.
Lisca Doido, Claudinei Oliveira e vários outros estacionaram na Segunda Divisão e nem sei se fazem questão de sair dali. Um ocupa o lugar do outro o tempo todo. Vejam o Mancini, agora, no Grêmio. Passou por Corinthians, foi para o América Mineiro e aceitou a oferta para salvar o Grêmio. Foi. Sabe que pode dar certo ou não. Não é um milagreiro, mas vai. Corre o risco de cair para a Segundona, isso se não pedir o boné antes. Não existe qualquer filosofia de trabalho, comprometimento, não existe absolutamente nada, basta assistirem os jogos e testemunharem a falta de fundamentos nos jogadores. Mas será que alguém se importa com isso?
Com futebol de péssima qualidade, os jogadores ainda fazem cera, simulam, os torcedores invadem o campo e quebram tudo. E no início da pandemia muita gente dizia que voltaríamos pessoas melhores. O futebol está provando o contrário. Nesse fim de semana tentei dar uma nova chance para os comentaristas, mas ouvi que o lance era tecnológico porque o jogador entrou por dentro. Também falaram que o Internacional não tem consistência, que o atacante fuzilou na bochecha da rede e que o time tem camisa pesada! Daqui a pouco vão ter que entrar no programa “Quilos Mortais”! Kkkkk
ESTÁTUA
por Rubens Lemos
Estão fazendo campanha para construir uma estátua de Roberto Dinamite no Estádio São Januário. É uma homenagem justa. Embora Roberto Dinamite seja para o Vasco o monumento humano e magnânimo. Roberto Dinamite é a razão de ser do Vasco, o ídolo de sorriso triste, aquele cara legal que você falta ao trabalho, desfaz a agenda de passeio com a família, apenas para vê-lo e ouvi-lo.
Roberto Dinamite, o principal emblema do Vasco, maior artilheiro da história dos campeonatos brasileiros (1971/2021), autor de gols decisivos, quase perfeito na cobrança de faltas e de pênaltis, quixotesco nos primeiros anos da Era Zico, quando lutava, sozinho, nos clássicos contra o Flamengo que levavam 100, 150 mil ao Maracanã para assistir ao rubro-negro sinfônico fazer sofrer e penar nas jogadas imprevisíveis do cabeludo de semblante algo melancólico.
O amor de Roberto Dinamite pelo Vasco foi eternizado em janeiro de 1980. O Barcelona havia comprado seu passe no ano anterior. Roberto havia brigado com o treinador, que não gostava do seu estilo de arrancadas fulminantes e chutes de sniper, e então o desespero tomou conta de todos nós vascaínos: o Flamengo anunciou a compra de Roberto e a Rádio Globo fez uma montagem de um gol em tabelinha dele com Zico, tremenda covardia.
Zico e Roberto Dinamite teriam formado num clube a eficiente dupla que jamais perdeu atuando pela seleção brasileira em 26 jogos, de 1976 a 1982. Juntos, marcaram 34 gols, sendo 18 de Zico e 16 de Roberto. Chegariam aos 100, se Telê Santana, o endeusado, o infalível, o técnico sensacional e siderúrgico teimoso, não nutrisse uma gratuita antipatia a Roberto, que pode ser posta na conta do que nos custou o Mundial de 1982 na Espanha. Zico e Roberto Dinamite, municiados por Sócrates, Falcão, Éder, Leandro e Júnior, teriam detonado a Azzurra, conforme aconteceu quatro anos antes, só com Roberto, sem Zico, na disputa pelo terceiro lugar na Copa/1978.
Então, o Flamengo sacudiu o Brasil anunciando uma linha atacante com Tita, Zico, Roberto Dinamite e Júlio César, o bailarino ponta-esquerda de dribles entortadores. A reação vascaína foi imediata e em pânico. Os torcedores não aceitavam ver seu mito de vermelho e preto.
Ótimo negociante, o presidente Antônio Soares Calçada lembrou que o Barcelona devia ao Vasco 700 mil dólares. Mandou o ainda desconhecido Eurico Miranda dizer que a dívida estava perdoada desde que Roberto voltasse à sua casa. Os espanhóis nem pensaram: aceitaram antes da segunda frase de Eurico.
Roberto voltou contra o Corinthians e marcou os cinco gols da vitória por 5×2 do Vasco no Maracanã tomado por 107.474 corações ensandecidos a cada bola balançando as redes do goleiro Jairo. Roberto estava no Vasco, o que significava o reencontro e a derrota sobre o Flamengo, que foi buscar o esforçado Nunes e acabou campeão brasileiro.
Nos 5×2, vibrei de ficar rouco. Meu saudoso tio-avô Derval Marinho, que detestava futebol, morreu me chateando: “Como vai Roberto Traque de Chumbo?”. Eu repetia: “É Dinamite, é Dinamite, é Dinamite’.
Seleção brasileira em Natal, meu pai comentava para a Rádio Cabugi AM(hoje Jovem Pan News) e um estúdio foi montado no luxuoso Hotel Ducal, hoje estorvo inútil no centro de Natal. Meu pai tomou-me pelo braço e me levou à cobertura onde Roberto Dinamite e o capitão Oscar conversaram.
Sinto a geleira no corpo e no espírito. Eu, um moleque, diante daquele que me justificava o amor ao futebol. Roberto Dinamite me deu um autógrafo. No caderno da escola levado por mim àquele universo mágico. Educadíssimo, conversou meia dúzia de abobrinhas enquanto eu travava no “é, é,é”.
Estupidez de Eurico Miranda, Roberto Dinamite chegou a ser expulso da Tribuna de Honra com o filho em 2002. Reagiu boquiaberto como os apunhalados pela covardia. Foi feio, deselegante, imperdoável.
Seguiu em frente. Antes, ganhou Campeonatos Cariocas (1977/1982/87/88) em cima da máquina de Zico e jogou até os 39 anos. Ele e Zico (vestido de Vasco, no troco do destino ao episódio de 1980). Roberto Dinamite está imortalizado, seja no concreto carrancudo de uma estátua, seja no amor que o fez símbolo icônico do Vasco que não existe mais.
MIRANDINHA, O OBSTINADO
por Luis Filipe Chateaubriand
Francisco Ernandi Lima da Silva, mais conhecido como Mirandinha, começou a carreira no Ferroviário, do Ceará.
Depois de perambular pelo futebol do interior de São Paulo, chegou ao Botafogo carioca, em 1980.
Não era um jogador dotado de exímia técnica, mas era muito lutador, dir-se-ia mesmo obstinado.
Isso o levava a fazer muitos gols.
Era ágil, rápido, vivaz, pronto para aproveitar os vacilos dos defensores adversários.
Sua facilidade para fazer gols o levou, em 1987, quando atuava no Palmeiras, à Seleção Brasileira, onde jogou até 1989.
E, exatamente nessa época, se transferiu do Palmeiras para o Newcastle, sendo o primeiro jogador brasileiro a atuar no futebol inglês.
Mirandinha foi um pioneiro.
É por isso que é certo: pensou gol, pensou Mirandinha.
Luis Filipe Chateaubriand é Museu da Pelada