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RIVA

texto e ilustração: Marcos Vinicius Cabral


Tenho poucos arrependimentos na vida dos quais não ter tido a oportunidade de ver Rivellino jogar é, sem sombra de dúvidas, uma delas.

Campeão naquele Brasil de 70, onde ele, Jairzinho, Gérson, Tostão e Pelé, maiores camisas 10 de seus clubes à época, estiveram praticando juntos o futebol que é considerado o mais perfeito de todas as vinte uma edições de Copas do Mundo até hoje.

Ninguém ousa discutir isso.

Hoje, no primeiro dia do ano, o craque do Corinthians e do Fluminense completa 74 anos e apenas peço a Deus que conserve por muito tempo os seus dias aqui na Terra.

Ao criador do elástico e um dos maiores 10 do futebol brasileiro de todos os tempos, apenas desejo.

Sim, desejo.

Desejo a Roberto Rivellino o sonho realizado.

O amor humano ao seu próximo e à bola, sua paixão, que nunca morram.

A esperança por dias melhores renovada em dias difíceis.

Para Roberto Rivellino, desejo todas as cores desta vida e a tricolores em especial.

Todas as alegrias que puder sorrir por trás desse bigode.

Todas as músicas que puder emocionar seu coração e transformá-las em lágrimas confirmando que tudo valeu a pena.

Desejo que os seus amigos sejam mais cúmplices e que sua família esteja mais unida ao seu entorno.

Gostaria de lhe desejar tantas coisas em retribuição aos chutes que você deu ou elásticos que aplicou.

Mas nada seria suficiente… então, desejo apenas que você tenha muitos desejos.

Desejos grandes e que eles possam te mover a cada minuto,

ao rumo de seus objetivos no Timão de um navio que vai digressionando por mares revoltos.

Ao Riva, que não puder ver jogar, um feliz aniversário!

ÍDOLO DOVAL

por Elso Venâncio


Aqui no Brasil, Narciso Horácio Doval jogou no Flamengo e no Fluminense. Na Argentina, destacou-se também em dois clubes rivais: San Lorenzo e Huracán.

O gringo tinha alma carioca. O Clarín, principal jornal de Buenos Aires, certa vez abriu a seguinte manchete para falar dele:

“DOVAL É PARA O RIO O QUE PELÉ REPRESENTA PARA O RESTO DO BRASIL”

Com certeza, Doval foi tão ídolo e tão famoso quanto Zico.

O futevôlei, que surgiu em meados dos anos 60 na praia de Copacabana, logo chegaria a Ipanema. Sérgio Noronha, o “Seu Nonô”, vizinho de Doval na Rua Vinicius de Moraes, antiga Montenegro, me disse que nesse esporte Doval exigia que seus jogos valessem dinheiro. E ganhava quase sempre. Hoje, na quadra próxima à barraca do Pepê, na Barra da Tijuca, vários craques como Romário, Djalminha e Edmundo seguem à risca as regras criadas pelo “Diabo Loiro”.

Doval era o Rei de Ipanema e dono absoluto do pedaço que hoje é ocupado por Renato Gaúcho. Tomava café nas padarias do bairro, sempre de graça. Chamava o gerente e falava:

– Cheguei e não tinha ninguém aqui… De repente encheu. Ídolo é atração. Ídolo não paga.

Elba de Pádua Lima, o Tim, foi técnico do atacante na Argentina e responsável por trazê-lo para o futebol carioca. Brilhava na Gávea, por sua raça e talento. Contudo, em 1970, o atacante discutiu com o técnico Yustrich, que queria cortar seus longos cabelos e mudar a sua forma de vestir. Por isso, viu-se obrigado a deixar a Gávea. Acabou sendo emprestado ao Huracán.

Retornou em 1972. Zagallo era o treinador e Doval pôde formar uma dupla histórica com Zico.

Em campo, parecia um leão saído de uma jaula. Mas sabia jogar, tinha técnica e raça incomuns. Sem câmeras de TV – muito menos VAR –, o jogo era bruto. Doval encarava os zagueiros e avisava:

– Vou dar a primeira!

Brigava, xingava os adversários, cavava  faltas para Zico cobrar. No Fluminense, fazia o mesmo para Rivellino. Em 1976, marcou de cabeça, na prorrogação do jogo decisivo com o Vasco, diante de 127.052 pagantes que superlotavam o Maracanã, o gol que deu o bicampeonato carioca à “Máquina Tricolor”.

Doval se naturalizou brasileiro. Nas entrevistas, se autoproclamava:

– Nós, brasileiros,…

George Helal, vice de futebol rubro-negro no início da década de 90, sempre recebia a imprensa após os treinamentos. Sala cheia, de repente alguém bate à porta. O dirigente pede para entrar e surge uma cabeleira loira inclinada, com seus pequenos mas marcantes olhos azuis.

– Entra, Doval!

Ele já tinha parado de jogar, mas continuava indo muito à Gávea .

– No… mas tarde yo hablo.

– Pode falar – retrucou Helal.

– Um cerrajero…

– O quê?

Doval indicou com os dedos algo pequeno. Falava rápido, um portunhol difícil de entender…

– Um chaveiro?

– Si, si, como Zico.

Helal se lembrou que realmente tinha feito um personalizado do “Camisa 10 da Gávea” para presentear torcedores, sócios e conselheiros. Zico já era o “Galinho de Quintino”.

– Mas o que coloco? Zico é o Galinho…

De bate-pronto, o gringo respondeu:

– Doval, O Fenômeno!

A gargalhada foi geral, inclusive por parte do próprio.

A noite de 9 de outubro de 1991, particularmente, ficou marcada. O ex-atacante foi convidado para chefiar a delegação rubro-negra num jogo contra o Estudiantes, em La Plata. A diretoria fez o convite com o objetivo de acalmar os adversários, sobretudo a temível torcida argentina. Além disso, se um time brasileiro vencesse lá, o jogo não terminaria bem. Invariavelmente, as partidas acabavam em briga generalizada.

O ônibus da delegação entrou no estádio e o primeiro a descer foi Doval. Calça e jaqueta jeans, com o habitual sorriso e bom humor, me atendeu falando por uns 10 minutos ou mais:

– Passei a ser profissional do futevôlei, desafiava qualquer um. Tinha voltado a jogar tênis, mas gostava mesmo era da praia e das cariocas, as mais bonitas do mundo.

Falou do tempo de ídolo nas Laranjeiras e que quase vestiu a camisa do Botafogo. Só não jogaria no Vasco. O porquê?

– São Januário é longe da praia – explicava aos risos.

Estava de bem com a vida. Lembrou-se da infância do garoto de classe média em Palermo e disse que só vestiu a camisa da seleção argentina uma única vez:

– Aqui me acham indisciplinado.

No jogo, válido pela Supercopa, os argentinos foram violentíssimos, mas perderam por 2 a 0 – gols de Zinho e Gaúcho. O Flamengo deixou o estádio Jorge Luis Hirschi na madrugada do dia 10, já que a polícia retirou, aos poucos e com total segurança, todos os torcedores presentes.

O retorno ao Rio aconteceu na noite seguinte, com chegada marcada para o dia 12, cedinho, no Galeão. Sem Internet, ficamos sabendo pelos jornalistas, no saguão do aeroporto, da trágica notícia: Doval, aos 47 anos, tinha ido a uma boate na noite anterior e por lá teve uma parada cardíaca fulminante na saída.

Era um sábado de manhã. O táxi que peguei estava ligado na Rádio Globo e reproduzia a sua última entrevista. Seus depoimentos se repetiram por diversas vezes ao longo da programação, durante todo aquele dia.

O taxista virou-se para mim:

– Morreu um ídolo.

– De todos nós… – respondi.

Doval faria aniversário terça que vem, dia 4 de janeiro.

Faria, não. Fará.

Afinal, ídolos são sempre eternos.

E Feliz Ano Novo!

UMA BREVE HISTÓRIA DA PORTUGUESA AGITA FINAL DO ANO

por André Luiz Pereira Nunes


No último dia 17, a Associação Atlética Portuguesa comemorou 97 anos de uma existência repleta de feitos e glórias em sua suntuosa sede, localizada na Ilha do Governador. Na ocasião, foi lançada a obra “Uma breve história da Portuguesa”, idealizada por Paulo Roberto Andel, autor de mais de 20 livros sobre o Fluminense.

A obra, apesar de não ter a intenção de ser uma historiografia, conta com depoimentos, recortes, reportagens e curiosidades sobre a simpática Lusinha Carioca, apelidada de Zebra por aprontar grandes feitos contra os adversários. Uma das vítimas foi o Real Madri, derrotado em pleno Santiago Bernabéu, em 4 de setembro de 1969.

Não por acaso, em 2021, a agremiação promoveu a sua melhor campanha em campeonatos estaduais ao chegar às semi finais da competição. O livro inclusive precisou aguardar o desfecho do certame para poder ser finalizado.

– A Portuguesa realmente merecia esse presente. Fui movido por uma memória afetiva de minha infância e trazer a materialização desse desejo é uma satisfação enorme, atesta Andel.


Entre os depoimentos, talvez um ou outro não esteja realmente em consonância com o tema. Há quem pareça até sequer saber sobre o que está escrevendo, mas o resultado final é extremamente satisfatório. O livro é agradável, envolvente e pode ser sorvido de uma tacada só.

Espera-se que o público adquira esse ótimo exemplar e que iniciativas semelhantes abundem no Rio de Janeiro, pois agremiações como Madureira, Olaria e Bonsucesso têm muita história para ser contada.

Vale relembrar que no início do próximo ano será lançada a historiografia do Andaraí, idealizada pelo escritor e professor Kléber Monteiro e que conta com a nossa humilde colaboração.

MEU AMIGO DORVAL ENTRA NO TÚNEL DA VIDA PARA FICAR SEMPRE NA MEMÓRIA GERAL

por Washington Luiz de Araújo


Recebi a notícia logo pela manhã do amigo, jornalista e cineasta José Carlos Asbeg. O primeiro nome do filho que não tive partiu fisicamente pelo túnel da vida.  Dorval Mengalvio Coutinho Pelé e Pepe seria nome do meu filho.

Minha companheira, Carmola, sempre perguntava “e se fosse mulher?”. “Simples, – respondia eu – Vila Belmiro”. E ela respirava aliviada dizendo: Imagine eu correndo atrás do garoto pela rua: Dorval Mengalvio Coutinho Pelé e Pepe larga esta bola e vem pra casa….

E o Dorval partiu, mas ficou.

Dorval que tive o prazer de ser amigo.

Dorval que ia nos meus aniversários, sempre levando uma camisa do Santos autografada.

Dorval que todo Natal enviava um cartão com sua imagem posando com uma bola num gramado da vida ou da Vila, vestindo o imaculado uniforme branco. Neste ano, acho que não teve condições de envi-alo.

Dorval que não era de beber muito, mas bebia uns copinhos de cerveja.

Dorval muitas vezes calado, observador, mas que falava e muito quando perguntado e quando entendia que o que foi questionado merecia uma boa resposta. Caso contrário, Dorval lacônico.

Dorval cujo nome me acostumei a ouvir quando criança na cabeceira da cama de meu pai e de minha mãe pelo rádio, nos jogos lendários do Santos.

Dorval que me arrepiou todo ao vê-lo presencialmente pela primeira vez e que me arrepiava quando telefonava.

Dorval que era certo encontra-lo nos jogos do Peixe na Vila ou no Pacaembu.

Dorval com quem falei no meio da pandemia por telefone e que me passou uma imagem de quem estava meio de saco cheio de tudo., reclamando de dores, acho que algumas delas na alma.

Dorval que amava o Santos como nenhum outro craque amou.

Dorval que não vi jogar profissionalmente, mas que me embalou os sonhos de criança.

Dorval seria o primeiro nome do filho que não tive, mas foi o primeiro nome do amigo craque de afetividade.

Grande Dorval, você sempre será escalado no time de todos os tempos do Santos Futebol Clube.

Dorval você não se foi neste túnel da vida, pois sempre estará no campo de nossas melhores memórias.

Dorval, um craque de sempre!

Em Tempo: Dorval que foi incumbido de mostrar Santos a um garoto que chegou na Vila do meio para o final da década de 50. Ele fez com que as saudades do menino se arrefecessem, levando-o a uma pensão onde moravam outros craques. Lá o menino começou a se sentir em casa e ver Santos como a sua Bauru. O menino? Edson Arantes do Nascimento, o Pelé.

RETROSPECTIVA 2021

:::::::: por Paulo Cézar Caju :::::::


Aos trancos e barrancos chegamos ao fim de 2021. Somos sobreviventes. Nesses meus 72 anos de vida já perdi amigos por tuberculose, pneumonia, câncer, tiro, gripe, dengue, do coração e por esse maldito Corona. Agora, surgiu essa Influenza. Acho que a máscara e o álcool e gel farão parte de nossa rotina. Já tomei a terceira dose e sigo em frente. Retornei aos estádios, mas isso só me deixou feliz pela chance de ver a torcida reunida novamente, afinal os torcedores são o motor, o coração desse esporte, o mais popular do planeta!

Infelizmente, o vírus que atacou o futebol é muito mais forte que todos esses males citados acima. Claro que fiquei feliz pelo meu Botafogo ter retornado a Primeira Divisão, mas fiquei feliz com aquela pureza do torcedor que não se importa com nada, que não analisa e só quer zoar. Esse é um torcedor verdadeiramente feliz! Não sei escalar o meu próprio time e nenhum jogador fez meus olhos brilharem. O torcedor de verdade talvez seja esse mesmo, o que considera Chay e Navarro em craques. Eu analiso…..e sofro.

Vi tricolores vibrando com a chegada de Felipe Melo ao clube. Eu sofro. Vi morteiros explodindo com a contratação de Paulinho para o Corinthians. Eu sofro. Vi comentaristas, e não foram poucos, pedindo Hulk e David Luiz na seleção. Inclusive, aproveito a ocasião para fazer uma seleção dos malas pesadas que estão comentando por aí! Não vou citar nomes, mas são locutores e comentaristas da ESPN, Fox Sports e SporTV! Eu quase infarto.

Que retrospectiva positiva dá para fazer de 2021 em termos de futebol? A volta da torcida aos estádios e só. Porque essa volta representa a vida voltando ao normal, a Ciência vencendo o inimigo. A torcida se fantasiar de Hulk eu acho mágico porque o futebol vive de xodós, como Obina, Brocador e tantos outros, mas daí a ganhar o status de craque começa a complicar.

A imprensa foi lamentável, há alguns anos vem sendo, porque cria monstros, exalta pernas de pau e usa uma linguagem insuportavelmente acadêmica, como a dos técnicos explicando futebol a seus jogadores. O futebol está um caos. Mas talvez o erro seja meu e precise me inspirar nesses torcedores puros, e sair gritando por aí “Fora escola de treinadores retranqueiros, que jogam para não perder e estão matando o futebol brasileiro”.

No mais, desejo um feliz ano novo a todos os leitores! Nos vemos em 2022!