COPA SÃO PAULO PREMIA SEUS MELHORES FINALISTAS
por André Luiz Pereira Nunes
Santos busca o quarto título da Copinha
Foi feita justiça. A presente edição da Copa São Paulo de Juniores será decidida pelos melhores times da competição: Palmeiras e Santos. A final premia os esforços de duas equipes que não mediram esforços para alcançar o título. Também retrata o que todos já sabem. Existe, de fato, uma disparidade abissal entre a qualidade do futebol paulista e a do resto do país. A base é o verdadeiro pilar. Sem esse investimento, não existe trabalho de médio nem de longo prazo. O futebol já deixou de ser uma brincadeira há muito tempo. É uma indústria centrada na venda e compra de jogadores.
Em se tratando de Rio de Janeiro apenas o Flamengo poderia ter tido vida mais longa no certame. Mas a sua diretoria resolveu, de maneira incompreensível e incompetente, dispensar os melhores atletas no meio da competição. Resultado: o rubro-negro acabou eliminado, em seguida, pelo “poderoso” Oeste, de Itápolis.
O Vasco até ensaiou uma boa performance. Contudo, não teve condições de superar o São Paulo, caindo nas oitavas. Os outros, com exceção do Resende, não merecem sequer uma citação de nota de rodapé.
Endrick, do Palmeiras, é a principal revelação do torneio
O torneio contou com alguns bons jogos, nenhuma maravilha, é claro, mas já se é possível sonhar com uma nova safra de jogadores talentosos como Endrick, do Palmeiras. Aliás, o Verdão investiu pesado no torneio, ao contrário do Flamengo, pois visa uma conquista inédita. Já o Santos possui um trabalho sedimentado e extremamente competente no que tange às categorias de base. Oito anos depois do bicampeonato, em 2014, o Peixe volta a uma final de Copa São Paulo, a sexta de sua história. Será a chance do quarto título (84/2013-2014). Ainda foi vice em 1982 e 2010.
Como sempre, a imprensa já projeta em Endrick, destaque absoluto da competição, um futuro promissor, inclusive vestindo a camisa da Seleção Brasileira. Tal disparate não deveria ser sequer ventilado, haja vista que se trata de um atleta ainda muito jovem. Também se esperava muito, em 1988, do meia-atacante Mil, do Nacional (SP), vencedor e craque daquela edição. Infelizmente foi mais uma jóia preciosa que se perdeu no sumidouro de talentos que abunda nesse Brasil do desperdício.
GABRIELLE, QUE NOSSA PRIMEIRA VEZ SEJA INESQUECÍVEL
por Marcos Vinicius Cabral
Minha relação com o futebol sempre envolveu a necessidade de ter um filho para dividir com ele as emoções de ir a um estádio cheio para ver o Flamengo jogar, sentir o batimento cardíaco acelerar devido à ansiedade de não se atrasar para o início dos 90 minutos, suar frio tentando o plano B para fugir dos engarrafamentos e não bastasse tamanho sofrimento, tentar ainda na adrenalina desse roteiro de filme de aventura à lá Steven Spielberg, encontrar o flanelinha para estacionar o carro.
Fã confesso de Roberto Dinamite, não vivi isso com meu pai, vascaíno, que morreu na tarde de terça-feira (18), em São Gonçalo, mas pude a bordo do Chevette SL ano 78, primeiro táxi que ele trabalhou em Niterói, ir duas únicas vezes a um estádio de futebol: na primeira, ao Maracanã, aos 13 anos, quando Brasil e Paraguai se enfrentaram pelas eliminatórias da Copa do Mundo de 1986 e empataram em 1 a 1, gols de Sócrates, que só teve o trabalho de escorar um desvio de Casagrande em um córner cobrado por Éder, e Romerito, ídolo do Fluminense, que marcou um golaço em um sem pulo indefensável para Carlos, arqueiro brasileiro.
A outra, em uma tarde de domingo ensolarado no Estádio Caio Martins, em Niterói, novamente um outro empate de 1 a 1, entre Flamengo e Americano, partida válida pela 5ª rodada da Taça Guanabara de 86.
Mas se minha adolescência, na saudosa década dos anos de 1980, era obrigado a conviver com duas irmãs rivais que não serviam de companhia para minhas idas ao velho Maracanã – Flávia continua tricolor convencida e Suelen permanece vascaína resignada – faltou alguém para compartilhar essas emoções que seriam páginas da vida em capítulos especiais escritos pelas mãos do destino.
O maior erro do destino, se podemos assim dizer, foi ter me dado amigos que torciam para os rivais Botafogo, Fluminense e Vasco, enquanto os meus amigos flamenguistas, não queriam um guri metido a besta com eles.
O tempo passou e convivi com essa vontade de ir aos jogos do Flamengo acesa dentro de mim. Trabalhei, me casei, me formei e busquei, ao lado da minha adorável Raquel, minha mulher há 20 anos, tentar ‘engravidar’ de um filho para que eu pudesse ter a companhia dele nas minhas idas ao Maracanã.
Imaginem, nós dois subindo a rampa, mãos dadas, cantando o hino do clube, vestidos com o manto sagrado e ver as bandeiras tremulando e batendo em nosso rosto como brisas suaves que nos refrescariam pelo sentimento de vitória?
Era isso na minha imaginação!
Depois da difícil escolha tomada em tentar ser pai como quem escolhe em que lado bater a penalidade máxima em uma decisão de campeonato, o próximo passo era mostrar o filhão, meu parceiro, meu companheiro e meu amigo para o mundo, como um troféu nessa complicada partida que foi, sem dúvida nenhuma, a mais árdua de todas já disputadas.
Mas toda vitória requer esforço e muito suor. A cada volta no ponteiro do relógio ou a passagem de grão em grão da areia na ampulheta do tempo, os dias iam passando, passando, passando, e pasmem, o meu filho, que se chamaria Gabriel, não vinha.
Entretanto, o lado torcedor rugia feito fera ferida e em 1999, veio o título no gol de Rodrigo Mendes em cobrança de falta de longa distância que desviou na barreira e venceu Carlos Germano. Em seguida, no ano de 2000, Reinaldo e Tuta fizeram a alegria da torcida rubro-negra e nos deram o bicampeonato. Já no gol famoso de Petkovic, aos 43 minutos da etapa final, em 2001, o mais emocionante nesse tricampeonato em cima do Vasco, comemorei ainda esperando a chegada de Gabriel.
O tempo foi passando…
Cinco anos depois, na Copa do Brasil de 2006, sob o comando de Ney Franco, o lateral-esquerdo Juan decretava a vitória do Flamengo mais uma vez contra o Vasco e Raquel, feliz da vida, grávida de dois meses. Naquela noite, dormi sonhando com ele.
Dito e feito.
O sentimento era de euforia vendo a barriga dela crescer, crescendo e crescida, processo que acabou fazendo com que a ficha estivesse próxima, muito mais próxima de cair do que eu imaginava.
A emoção que eu sentia, lógico, na sua devida proporção, foi igual aos 508 gols que Zico, nosso inesquecível camisa 10, marcou diante da massa rubro-negra espalhada pelo Brasil, parecida com as 876 vezes em que Júnior, nosso Maestro, entrou em campo, equivalente ao amor e a dedicação que Leandro, flamenguista no ato e de fato, fez pelo Flamengo em 12 anos como profissional.
Eu era emoção, alegria, felicidade, tantos sentimentos dentro de um só coração, este, nas cores vermelha e preta.
“Ah, moleque, se prepara que iremos muito ao Maracanã e nos domingos pela manhã você vai para o campo comigo ver papai jogar bola. E pintar os quadros e desenhar, isso eu faço questão de te ensinar e vai se tornar um Charles Schulz, e inventar histórias maravilhosas como o americano fazia com o Snoopy”, acreditava.
Mas o bálsamo com a gravidez se tornou um furação quando descobri na ultrassonografia que era menina, sim, menina, o filho que eu tanto desejava.
Digeri, me confortei, aceitei as brincadeiras sem noção de muitos amigos mais sem noção ainda e comecei a conviver com a realidade de que seria pai de uma menina.
Vejam vocês, esperei 33 anos para ser pai e Deus, na sua onipotência, onisciência e onipresença, me dá uma filha.
Ah, meu Deus, o senhor é surpreendente!
Portanto, neste domingo (23), tudo o que eu havia planejado, idealizado, pensado em fazer, foi desfeito e refeito por Deus, e a Gabrielle, minha filha, que completa 15 anos de vida, é sem dúvidas, o meu bem mais precioso.
Hoje, essa criaturinha que eu amo de paixão, merece ouvir de mim, seu pai, o quanto ela é importante na minha vida e principalmente o quanto és importante para Deus.
Foi Ele quem a criou, acalmou o meu coração e me fez enxergar na minha insensatez e egoísmo barato, que o erro em querer ser pai de um menino, depois de 15 anos passados, é a certeza de que a minha filha é a melhor filha do mundo.
Meu anjo, que sua vida seja repleta de realizações e desejos realizados. Que você continue sendo essa menina doce, pura, amiga, estudiosa, inteligente, brincalhona, pata no Uno – jogo de cartas com regras especiais criado em 1971 nos EUA – e que possa assistir a um jogo do Flamengo comigo.
E sobre ir ao Maracanã, quem sabe, a gente não possa transformar essa parceria de pai e filha em uma tarde inesquecível, em que dois torcedores apaixonados por um clube vão juntos pela primeira vez, dividir a emoção de pisarem em um estádio de futebol.
O ÍBIS VOLTOU
por Paulo-Roberto Andel
Uma da manhã, madrugada de sábado para domingo, aquela insônia de doer e o controle remoto à mão. Nenhum filme interessante, nenhum show legal, o jornal 24 horas com as mesmas notícias da primeira hora (repetidas 23 vezes).
O destino determina procurar o primeiro jogo de futebol que apareça na seleção de canais. Subitamente ele se apresenta: Náutico versus Íbis, abertura do Pernambucano 2022. É reprise mas vale: se você não viu nada e se nada chegou do jogo à sua tela do smartphone, é um jogo novinho em folha.
Cheguei atrasado e o Náutico já vencia por 2 a 0, com dois bonitos gols de fora da área no castigado gramado do belo Estádio dos Aflitos. Interessante é que o jogo era divertido de se ver, mesmo com a limitação técnica dos dois times: ambos procuravam o ataque e tocando a bola, sem chutões nem ligações diretas. Mas olhando as camisas dos times e sabendo que elas são familiares, achei que tinha algo estranho, diferente, que eu não sabia explicar direito, até que a ficha caiu: qual tinha sido o último jogo que eu tinha visto do Íbis?
Nenhum. Mas como assim?
É fácil entender: o rubro-negro de Paulista estava voltando à primeira divisão pernambucana depois de 22 anos. Ou seja, o Íbis nunca tinha sido transmitido pela TV no século XXI até este jogo.
Gosto de jogos com a presença de times de menor investimento. Gosto da sensação de localidade, de raiz. É claro que o futebol bem jogado, de alto nível técnico (e cada vez mais raro no Brasil), é maravilhoso, só que para muitos apaixonados pelo esporte o enredo vai muito além das quatro linhas. O próprio Íbis é uma prova material desse conceito: de volta à primeira divisão de seu estado, o que lhe importa é se manter nela custe o que for. O Pássaro Negro não está em busca de títulos, mas da sua sobrevivência como “pior time do mundo”, só que na elite pernambucana. É bonito saber que a luta deles tem 80 anos.
E o jogo? Divertido no segundo tempo, até que perto do fim o garoto Júlio faz um golaço para o Náutico e decreta os 3 a 0 finais da partida. Mesmo assim, o Íbis teve duas oportunidades de gol desperdiçadas. E continuou tentando tocar a bola, mesmo sem qualquer esperança de um empate.
Quando a partida terminou, o Estádio dos Aflitos me lembrou dos jogos que vão começar daqui a pouco pelo Cariocão e Paulistão. E bateu a saudade de Moça Bonita, Ítalo Del Cima e Bariri, os velhos e queridos alçapões que sempre atrapalhavam o Big Four carioca mais os amados America e Bangu. A gente sabe que o melhor futebol está na Champions, mas quem viveu esses estádios que falei e outros sabe da importância disso. Importância que nutre um torcedor insone em plena madrugada de sábado para domingo. Ou lembrar de seu goleiro Félix, de seu time de botões cristal, de seus amigos da escola.
À beira do campo, Helio dos Anjos grita para consolidar a vitória do Náutico. Quem se lembra de que ele foi goleiro do Flamengo? Eram tempos de Raul e Cantarele, de Catinha e Zandonaide, de Mendonça, de Abel, de tanta gente que passou tão rápido mas deixou saudade.
O mascote do Íbis, um pássaro bem grande, aparece cabisbaixo atrás do gol no fim do jogo. No meio de campo, torcedores do Náutico celebraram o adversário: “Vocês subiram o Íbis. Agora façam um gol no Santa Cruz!”. A derrota dói, mas para quem estava há mais de duas décadas na segunda divisão, entrar em campo pela série A é uma vitória. E quem nunca é protagonista pode ter seu lugar ao sol como figurante. Quantas e quantas vezes a gente já se divertiu com o Íbis sem que ele vencesse um jogo ou marcasse um gol? De alguma forma ele sempre faz falta.
Duas e meia da manhã, daqui a pouco tem Avaí versus Figueirense. Já estou contando as horas para ver o Fluminense contra o Bangu na Ilha do Governador. Só me falta um radinho e três colegas de arquibancada que eu já tive, mas um dia eu chego lá.
O Íbis voltou porque o futebol é muito mais do que um jogo.
PS: o destaque negativo nos Aflitos foi um idiota que se gabava de não ter se vacinado ao entrar. O xilindró lhe deu a resposta merecida.
Acervo do Vitor
GUARDADOS DE UM PAI ZELOSO
Através do excelente trabalho da Chris Lee, da Manufatura, a equipe do Museu restaurou o acervo do ex-volante Vitor, campeão mundial pelo Flamengo em 81 e com passagens por Atlético Mineiro, Vasco, Botafogo-RJ, Fluminense e Campo Grande! Confira o momento da entrega!
ESTRELAS NÃO MAIS SOLITÁRIAS
por Marcos Eduardo Neves
Dizem que não há amor incondicional. Dizem que não há nada além da vida na Terra. Ignorantes os que só acreditam que só há uma vida, a daqui, e apostam tudo nela. As obras de Deus são perfeitas e não há quem possa lutar contra elas.
A morte de Elza Soares no mesmo dia em que seu grande amor se foi, embora 39 anos depois, prova isso. Elza foi talvez a maior cantora desse país, junto com Elis Regina. Elza, porém, foi mais internacional do que Elis. Internacional como seu grande amor, Mané Garrincha.
Quem leu “Vendedor de Sonhos”, biografia que escrevi sobre Roberto Medina, sabe que quando os dois se encontraram pela primeira vez, na loja Rei da Voz, de Abraham Medina, no centro da cidade do Rio de Janeiro, bateu aquele negócio que Paulo Ricardo, do RPM, chamava de “Olhar 43”. E muitos de nós tachamos de “amor à primeira vista”.
Garrincha já era Garrincha, campeão do mundo e as vésperas do bi que seria conquistado no Chile. Inclusive, diante da presença de Elza. Essa mesma Elza foi para Santiago já sendo Elza Soares, grande nome surgido durante um show de calouros do programa de auditório de Ary Barroso – uma espécie de Chacrinha, o Faustão daquele tempo.
O tesão pelos dois bateu forte. Entendo isso, pois o que tenho hoje pela minha gata dá uma ideia do que é o se querer sem segundas intenções – grana ou status, por exemplo –, mas apenas a vontade de fazer como Cazuza: O mundo inteiro acordar e a gente “dormir”. Dormir! rsrsrs
Os dois se apaixonaram e ficaram juntos por 20 anos. Passaram por poucas e boas – aliás, por muitas e nem tão boas assim. Mas no primeiro ano separados, 1983, Garrincha, entregue ao alcoolismo, como bem retratou Ruy Castro em “Estrela Solitária”, sucumbiu e desfaleceu. Aos 49 anos de idade, no feriado carioca de 20 de janeiro de 1983. Data de São Sebastião e Dia de Oxóssi – escolha você a religião e ligue os pontos.
Ele se foi aos 49. Ela, 39 anos depois. Dez de diferença. Dez, nota 10, como berrava Carlos Imperial nos desfiles de escola de samba.
O amor nota 10 dos dois fez Garrincha se separar da antiga esposa. Na época, Elza foi achincalhada de todas as formas. Prova de que estavam mesmo à frente de seu tempo. Hoje alguém se separar é algo trivial. Não deu certo, separa. Traiu, separa. Desgastou, separa. Viraram amigos, separa. O cara não presta, separa.
Naquele tempo, não. Casamento era tratado de forma séria. Por mais infelizes que um ou mesmo os dois estivessem. O problema é que a relação Elza e Garrincha aconteceu quando um, no caso ele, começava a declinar. E ela, o contrário: despontava, irradiava, brilhava cada vez mais.
Elza teve inúmeros namorados depois da morte dele. Alguns, décadas e décadas mais jovem do que ela. Contudo, a dona da mais potente voz do Brasil jamais esqueceu seu Mané. A ternura, o carinho, o afeto, o amor de verdade perdurou – digo mais, inflamou, aumentou. E ela se despediu do grande palco da vida justamente no dia em que, seguramente, de alguma forma, lembrou-se que se completava mais um ano longe dele.
O amor da dupla era tipo o que vimos na ficção “Titanic”, filme vencedor de inúmeros troféus do Oscar. Quem não se esquece de Leonardo di Caprio tentando, em meio ao mar gelado, salvar sua diva até não aguentar mais e afundar. Sua mãozinha caía se despedindo junto ao corpo, deixando para o todo e sempre a lembrança de tudo que de forma tão intensa viveram lado a lado.
Nesta semana, as mãos de Elza e de Garrincha voltaram a se atar. Para a eternidade, acredito eu e todos que confiam na realidade de um amor verdadeiro. Pois Elza foi de Garrincha namorada, mãe, filha, amiga, esposa, amante, tudo que um casal que se ama é. E devia morrer de saudades. Com certeza, morreu com saudades. Para viver agora pela eternidade, sem preconceitos ou julgamentos, ao lado de quem jamais se esqueceu.