AS COPAS QUE FIZ COM PELÉ
por Elso Venâncio

Durante a cobertura de três Copas do Mundo, tive a chance – e a honra – de estar próximo do maior jogador de futebol que o planeta já viu. Em 1990, na Itália; nos Estados Unidos, em 1994; e no Mundial seguinte, em 1998, Copa disputada na França. Pelé convivia com a imprensa brasileira por ser o principal comentarista da Globo. E posso afirmar: nunca vi um brasileiro ser tão idolatrado no exterior.
Naqueles três Mundiais, a Rádio Globo ficou posicionada na tribuna de imprensa ao lado das tevês. Os olhos dos jornalistas do mundo inteiro se fixavam sempre em Pelé. Não como ser humano, mas como uma entidade. Eu observava a educação e o carinho do “Rei do Futebol” para com todos. Sempre com um sorriso sincero no rosto, distribuía autógrafos e posava para fotos. Ninguém é rei por acaso!
No intervalo dos jogos do Brasil eu pegava o gravador e caminhava em sua direção. Ele sintetizava, em menos de um minuto, o que tinha visto no primeiro tempo. José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, foi quem teve a ideia e levou a Roberto Marinho, um rubro-negro apaixonado por futebol, a sugestão de tê-lo como comentarista da emissora. Mandou muito bem!
Nosso amigo em comum, Paulo Cezar Caju me contou dois fatos ocorridos durante a Copa de 1970. No jogo contra a Inglaterra, o mais difícil da competição, na entrada em campo, com os times lado a lado, Pelé observou que alguns jogadores brasileiros, sobretudo os mais jovens, olhavam os britânicos com admiração. Ora, eles eram os atuais campeões do mundo, venceram o Mundial que realizaram quatro anos antes, como anfitriões; eram atletas que foram para o México de navio – levando, inclusive, água e a alimentação. Pelé berrou para os brasileiros, cientes de que os rivais não compreenderiam o nosso idioma:
– Vocês estão vendo esses branquelos de merda? Vamos ganhar! Nós é que jogamos bola!!!
Foi um silêncio geral…
Nessa mesma Copa, antes de um treino, Pelé, Tostão e Gerson colocaram o zagueiro reserva Fontana na roda. Cada um dava um toque e, tonto, correndo de um lado pra outro, Fontana não conseguia de jeito nenhum alcançar a redonda. Até que resolveu entrar numa com Pelé, dizendo que ele escalava a seleção.
Vale lembrar que todos já o chamavam de Rei. Ninguém falava Pelé. João Havelange, Zagallo e até o chefe da delegação, o brigadeiro Gerônimo Bastos, um baixinho invocado e temido, sempre com respeito se referiam ao nosso craque maior chamando-o de “Rei”. E não era para menos: ele já era tetracampeão do mundo – duas vezes com a seleção (1958 e 1962) e outras duas com o seu Santos (1962-1963).
À noite, Pelé solicitou uma reunião com a presença de todos: atletas, presidente da CBD (A CBF daquele tempo), dirigentes, comissão técnica – e, não esqueçam, era época de ditadura, ou seja, vários deles eram militares. Ao pegar no microfone, avisou:
– Eu não tô aqui pra brincar. Não aceito certas coisas. Esse cidadão…
Fontana nunca mais abriu a boca no México.
12 de julho de 1998, Stade de France, em Saint-Denis. Antes da decisão da Copa – disputada pela anfitriã França contra o atual campeão, o Brasil –, a FIFA estendeu um tapete vermelho na tribuna do estádio e convidou as maiores personalidades do mundo. Uma verdadeira constelação estava presente, acredito que mais de 50 celebridades de primeira grandeza. Nomes como Al Pacino, Alain Delon, Arnold Schwarzenegger, Elizabeth Taylor, Denzel Washington, enfim, só fera. Além dos campeões mundiais vivos de todos os países. No que chegou Pelé todos se levantaram, buscando um melhor ângulo para admirar o melhor jogador de todos os tempos. Nisso, automática e instintivamente, todos começaram a aplaudi-lo. Cena emocionante que vi de perto. Belíssima reverência ao nosso grande ídolo.
Mestre Armando Nogueira certa vez escreveu:
“Edson Arantes do Nascimento, se não tivesse nascido gente, teria nascido bola.”
Hoje dedico essas linhas ao Eterno Pelé, que aos 81 anos vem jogando a principal partida da sua vida, lutando contra graves problemas de saúde. Muita força, Rei Pelé! Estamos todos na torcida por mais um gol de placa seu!
LIÇÕES TARDIAS DE UMA COPA DO MUNDO
por Zé Roberto Padilha

Fomos eliminados na última Copa do Mundo, na Rússia, em 2018, pela Bélgica. Como sempre, muitos jornalistas, torcedores, nem lembro, mas estava no bolo dos inconformados, o país não poupou o técnico Tite. Muito menos o Neymar.
Mas logo para a Bélgica?
Bem, revendo, hoje, os melhores lances da partida, entendemos melhor porque perdemos. E não foi para qualquer seleção.
Sabe quem era o goleiro deles? Courtois, do Real Madrid. Fez contra o Brasil o que fez contra o Liverpool.
Quem fez o segundo gol deles, já que o primeiro foi contra, de Fernandinho? Kevin DeBruyne, campeão inglês pelo Manchester City e um dos mais completos jogadores do time de Guardiola.
E quem era o centroavante? Lukaku. Campeão Mundial de Clubes pelo Chelsea.
Não é pouca coisa. Se estão voando hoje, medalhas no peito, titulos mundiais, imaginem há quatro anos?
Apenas outra lição dos que vivem, como todos nós, a procurar erros nas derrotas sem enxergar os méritos dos vencedores.
A outra Copa do Mundo está próxima.
Quem sabe não aprendemos mais esta lição que o futebol nos concedeu?
O CRAQUE DO BRASIL EM 2015
por Luis Filipe Chateaubriand

Quando jogava pelo Corinthians, em 2015, Renato Augusto exibiu um jogo de se admirar.
Uma característica de seu jogo eram os passes precisos – bola bem tratada, chegando ao companheiro de clube de forma limpa, plástica, eficaz.
Outra característica de seu jogo era a capacidade de jogar de uma intermediária à outra, com grande sagacidade e espírito competitivo.
Não bastasse isso, seu jogo também era feito de gols, que não eram em profusão, mas eram decisivos, bom chutador de média distância que era.
Essas características fizeram de Renato Augusto o craque de 2015!
FUTEBOL, UMA INDÚSTRIA MILIONÁRIA?
por Idel Halfen

O futebol é uma indústria milionária!
Quantas vezes já lemos ou ouvimos essa frase, a qual se reforça em nossa mente ao tomarmos ciência dos salários e bens adquiridos por alguns jogadores.
Não há como negar que as cifras que ganham as manchetes geram grande impacto, até porque para a maioria das pessoas que acompanha o futebol tais valores soam como algo inatingível e longe das respectivas realidades.
Mas será mesmo uma indústria milionária?
Se formos simplesmente olhar as receitas dos principais clubes poderemos responder afirmativamente ao questionamento, no entanto, se compará-las com algumas empresas, veremos que a discussão pode tomar outro rumo.
Visando buscar uma parametrização no que tange à relação de consumo das marcas por cliente, assim como é no futebol, onde, em tese, cada torcedor tem um único time, utilizaremos como balizador o setor de telefonia móvel, no qual quase toda a população é cliente, no mínimo, de uma operadora. Claro que não se trata de uma comparação perfeita, porém, entre as que analisamos em termos de recorrência e acesso às cifras do consumo é a que nos pareceu mais coerente. Não sabemos, por exemplo, quanto uma pessoa consumiu ao longo do ano de cada marca de biscoito, mesmo porque, o produto muitas vezes é consumido por toda a família.
Em nosso exercício, conforme pode ser visto no quadro a seguir, comparamos o clube de maior receita recorrente no Brasil com duas operadoras de telefonia móvel que aqui atuam.
Constatamos assim que a Vivo tem uma quantidade de assinantes que é quase o dobro do que o clube possui de torcedores, porém o faturamento em 2021 foi 2.765% maior. Comparado com a Oi, a torcida do vice-campeão carioca é 0,10% menor do que a base de clientes da operadora, a qual faturou no mesmo período 626,5% a mais.
Reiteramos que a comparação tem falhas, visto haver casos de um mesmo cliente ter mais de uma linha, assim como pode estar na relação de torcedores pessoas que mal saibam dizer as cores do time. O que se pretende com o exercício é mostrar os montantes envolvidos, tanto que nem fazemos menção ao EBITDA ou a outro indicador econômico-financeiro.
Nessa linha, vale inclusive observar que número de seguidores nas redes sociais não apresenta correlação com as receitas, vide no quadro o número de seguidores do instagram do clube (13,4 milhões) e o da operadora líder (apenas 602 mil).

Para testar a hipótese se o comportamento detectado seria algo exclusivo do Brasil, realizamos a mesma análise comparando o Real Madrid, clube que foi líder em dez das quinze edições do estudo feito pela Deloitte acerca dos clubes que mais faturam no mundo e a Vodafone na Espanha. Escolhemos essa empresa pelo fato de ela ter o número de assinantes – 13,6 milhões – similar ao de torcedores do time de Madrid – 13,3 milhões -, valendo salientar que o clube tem características de uma organização multinacional, vide a quantidade de seguidores, 117,5 milhões, que é quase o triplo da população espanhola.
Mesmo diante de tanta pujança, o Real Madrid teve as receitas recorrentes na temporada 2020-21 na ordem de 640 milhões de euros, enquanto a operadora de telecom faturou 3,788 bi em 2021 (491% a mais).
Claro que são valores significativos e que podem evoluir ainda mais, o Real Madrid, por exemplo, cresceu 116% em 13 anos – expurgamos o período da pandemia por razões óbvias. Mas será que ele pode chegar ao nível dos grandes players de outras indústrias?
Não creio!
O futebol mexe com paixão, o que por si só tem a capacidade de incentivar atos de consumo por impulso, por outro lado, essa mesma paixão impõe pressões por resultados esportivos de curto prazo, que prejudicam eventuais tentativas de se gerir os clubes como se administra uma corporação, onde responsabilidade financeira, projetos que não visem simplesmente o imediatismo, compliance e planejamento estratégico, entre outros, são fatores indispensáveis.
DI STÉFANO: O COMEÇO DA LENDA DO REAL MADRID
por Péris Ribeiro

Parece que foi ontem. Mas, é sempre bom lembrar, tudo isso aconteceu há quase 70 anos. Mais precisamente, em meados de 1953. Justo no instante, em que transpunha os portões do Estádio Chamartín um homem determinado. Forte, boa estatura, cabelos em desalinho começando a rarear, aquele argentino de fisionomia circunspecta sabia bem a dura missão que o esperava.
Quando explodiu, com 20 anos de idade, na lendária La Maquina do River Plate argentino – um timaço dos Anos 1940, cinco vezes campeão no espaço de tempo de seis temporadas -, era comum a apaixonada torcida rivense chamá-lo “La Saeta Rubia”. Uma alusão, óbvia, à cabeleira loira, encimada por um vistoso topete gomalinado, e ao seu futebol veloz e habilidoso, com raro faro de gol.
Porém, agora, eis que o momento a ser vivido era bem outro. E o craque feito, que acabara de chegar da sensação colombiana, o Millionarios de Bogotá, tetracampeão nacional, era visto como o “Messias” com que o presidente Santiago Bernabéu tanto sonhara. Alguém que chegara para escrever, enfim, o destino de um clube praticamente sem história. Ou com pouca, bem pouca coisa para contar – ou do que se orgulhar.
Na verdade, de concreto mesmo até então, o que o Real Madrid possuía era um bicampeonato espanhol para exibir. Isso, há mais de 20 anos – e com o clube chegando, discretamente, aos 41 anos de existência. Só que, bem pior, era no quesito popularidade, pois o Real não tinha uma apreciável legião de admiradores. Longe disso, já que via, pelo menos, quatro ou cinco clubes à sua frente. Dentre eles, o futuro arqui-inimigo Barcelona, o determinado Atletico de Bilbao – recordista de títulos da Copa da Espanha – e o incômodo vizinho Atletico de Madrid.
Pois foi com esse cenário nada animador, que Alfredo Di Stéfano, tão logo assinou contrato na secretaria do clube, decidiu caminhar pelo gramado do Estádio Chamartín. Lá, queria conhecer, de cara, os novos companheiros. E também faria questão de trocar algumas palavras, e um significativo aperto de mão, com Francisco “Paco” Gento – justamente quem se transformaria, no decorrer da próxima década, no seu mais constante parceiro de ataque. Os dois, responsáveis por vários títulos de campeão do Real Madrid, nas mais diversas competições que disputariam dentro da Espanha e mundo afora.
Porém, se havia um fato desconcertante, que chamava deveras a atenção, era que, mesmo com todo aquele clima adverso, bem pouca gente procurasse sentir de perto os bastidores do clube presidido por Don Santiago Bernabéu. E, certamente por isso, é que quase ninguém percebeu – ou, sequer, desconfiou – que o ambiente do dia-a-dia no Chamartín era um intenso renovar-se. E tudo ainda iria bem além. O que faltava, pelo menos por ora, era um sinal positivo. Que chamasse a atenção. E ele veio no momento preciso, na agitada fase da pré-temporada de 1953 – 54.
Justamente pelo fato de, na decisão do tradicional Torneio Teresa Herrera – realizado anualmente, na cidade de La Coruña -, o Real enfiar sonoros 8 a 1 no Toulouse, da França, sagrando-se campeão com uma atuação das mais convincentes. Mas, isso ainda não era tudo. Simplesmente porque, iluminado, Di Stéfano, resolveu roubar a festa só para si. Super motivado, e protagonizando lances de raro efeito, o novo camisa 9 madridista também se deu ao luxo de marcar cinco belos gols, enlouquecendo de vez a apavorada defesa do jovem time francês – recém sagrado campeão da II Divisão, e promovido automaticamente à I Divisão do seu país.
Retornando quase em seguida a Madrid, e recebendo, depois de bom tempo, rasgados elogios de uma imprensa que se mostrara até então reticente, eis que os blancos acabaram fazendo a sua estreia, duas semanas depois, no sempre atraente Campeonato Espanhol. Só que, o que parecia indisfarçável àquela altura, era a aura de otimismo que emanava de um ressuscitado Real Madrid. Um time que recebera alguns bons reforços, é bem verdade, mas que parecia muito mais motivado, e cada vez mais confiante em campo, graças ao “fator Di Stéfano”. Ele, sim, um demolidor de tabus.
– Era mais que necessário, que o nosso time começasse a vencer. Só a vitória traz a verdadeira confiança. E com os jogadores acreditando mais em si mesmos, nada agora passa a ser impossível. Nem mesmo o título – diria, alguns dias depois, um objetivo e lacônico Di Stéfano, aos jornalistas presentes ao Chamartín.
E foi, decididamente, graças às diabruras daquele Di Stéfano irresistível, que o Real voltou a se sagrar campeão nacional, pondo fim a uma provação que já durava duas décadas em gramados espanhóis. E ainda houve um delicioso prêmio extra: a invencibilidade contra o então bicampeão Barcelona. Um verdadeiro tira-teima, decidido com duas vitórias marcantes: 2 a 1, em Madrid; e 2 a 0, fora de casa. As duas, saboreadas tão intensamente, que pareciam haver valido por um novo título.
No entanto, para completar uma temporada que fora de ouro, eis que a torcida madridista teria uma outra alegria toda especial, ao ver o mais idolatrado dos seus ídolos no topo da glória. É que, escolhido por unanimidade, Alfredo Di Stéfano se consagraria como o Maior Jogador do Campeonato – do qual seria, por sinal, o principal artilheiro, com 27 gols. Pronto! Foi o suficiente para que, durante mais de um mês, a cidade de Madrid se incendiasse em uma festa de enormes proporções.
Na verdade, tudo aquilo que acontecia ali, era um desabafo e tanto! Que valia por um sofrimento intenso, que durara cerca de 20 anos. Nada menos de duas longas décadas, longe da emoção de levantar uma taça importante que fosse. ”Real! Real Madrid campeão! Real! Real Madrid campeão!” Esse era o cântico ensurdecedor, mas irresistivelmente convidativo, que ecoava pelas praças e ruas da vibrante e imponente Madrid.
E dizer que o que se via ali, era só o começo de uma bela, inesquecível história…