FRED EXPLICA
por Marcos Eduardo Neves

O nome de Fred é Frederico. E, sim, Fred é rico. Nem digo patrimonialmente, mas rico de espírito. Rico de fãs. Rico de felicidade pessoal. E nacional. Sua felicidade é a mesma dos milhares de tricolores que hoje misturaram orgulho e tristeza para ovacioná-lo de pé no Maracanã.
Fred é um dos principais ídolos do futebol brasileiro. Talvez, o maior do Fluminense. Há tempos se discute quem é o grande nome das Laranjeiras. Castilho? Rivellino? Assis e Washington? Ouso dizer que é Fred.
Sua identificação com o clube foi imediata. Paixão e amor à primeira visita. Mal chegou de volta ao Brasil, após passagem pela França, e se deu tanto, doou-se tanto, que eternizou seu nome em um dos maiores clubes do país, o Fluminense.
Um Fluminense que hoje sorri e chora ao mesmo tempo. De alegria, mas não tristeza. Porém, com um oceano de saudades.
Quis o destino que Fred se despedisse tendo o clube um sucessor à altura. Estrangeiro que nem Romerito, astro da conquista do Brasileiro de 1984; argentino tal qual Darío Conca, protagonista do título de 2010; seu sucessor é Germán Cano – por sinal, quem abriu o placar e deu o passe para o segundo, nos 2×1 contra o Ceará. No entanto, Cano vai ter que colocar muito pó-de-arroz nas chuteiras para fazer a torcida não se lembrar volta e meia de Fred.
Cano está só começando sua trajetória de sucesso. Ao passo que Romerito saiu do clube querendo “mi dinero”– nossa, como foi feio aquilo. Já Conca, coitado, preferiu retornar ao Brasil direto para o rival Flamengo: traição imperdoável. Fred, não. Mesmo tendo saído, sempre teve as portas abertas.
O centroavante que hoje se aposenta passou por duas vezes pelo Tricolor carioca. No começo, fez fama no América Mineiro, tendo marcado 45 gols em 51 jogos, um assombro. Na temporada seguinte, sua estrela luziu no Cruzeiro: 53 tentos em, pasme, 71 partidas.
Mineiro de Teófilo Otoni, Fred nasceu em 3 de outubro, tal qual meu filho, que é tricolor muito por causa dele. Meu filho é de 2000. Fred, de 1983 – ano em que a saga da verdadeira máquina tricolor, aquela que alcançou o tricampeonato carioca e, junto a isso, o Brasileirão, se iniciou.
No Lyon, Fred assinalara 41 gols em 119 jogos. Até que, de volta à pátria amada, em 2009 encontrou seu grande amor – profissional, diga-se. No Rio, ajudou o Flu a de forma heroica escapar do rebaixamento, quando nem o mais otimista dos torcedores acreditava. Diante do próprio Cruzeiro, jogo perdido por 2×0 e queda praticamente consumada, marcou dois e o time virou o jogo, começando uma arrancada das mais notórias da História do futebol. Líder do “time de guerreiros”, uma pena o capitão Fred não ter erguido a Copa Sul-Americana do mesmo ano. Seria um prêmio. Mas a consagração viria no ano seguinte.
Do fundo do poço ao ápice, em 2010 Fred se tornou, enfim, campeão do país. E dois anos depois, novamente levantou o troféu, sendo também o artilheiro da competição. Em 2013, ganhou a Copa das Confederações detonando a poderosa Espanha, campeã da última Copa, em um dia épico do Maracanã. Depois se arrasou no Mundial disputado no Brasil, é verdade. Passou por uma verdadeira provação, uma espécie de calvário. Chegou a ser chamado de “poste”, ao passo que uns achincalhavam, dizendo que ele “não Fred nem cheira”.
Ah, idiotas da objetividade, havia ainda muito aroma no ar. A pecha do 7 a 1, que dizimou o moral de muitos convocados por Felipão em 2014, não atingiu Fred. Hulk só há pouco conseguiu afastar a urucubaca, exorcizando aquele fantasma. O que David Luiz, por exemplo, luta, até agora em vão, para conseguir.
Fred sempre se sobressaiu, jamais se abateu, continuou sendo Fred. Um Fred que já havia disputado uma Copa, em 2006, e mesmo jogando míseros minutos, deixou sua marca. Aliás, marcas não lhe faltam. E marcar – no caso, gols – jamais também lhe faltou. Como vimos em seu penúltimo jogo.
Entre 2009 e 2016 foram 172 gols em 288 jogos pelo Flu. No Galo Mineiro, vazou por 42 vezes os goleiros nas 83 vezes em que vestiu o uniforme alvinegro. Retornou ao Cruzeiro, mas para talvez perceber que Minas apenas lhe gerou, contudo quem fez dele um cidadão foi mesmo o Rio de Janeiro – mais precisamente, o Fluminense. Apesar de fazer 25 gols em 69 partidas pelo time celeste, voltou para as Laranjeiras e deixou mais 27, em 94 partidas. Ou seja, contando com hoje, foram 382 jogos e 199 gols. Média maravilhosa de um jogador acima da média. Um dos maiores nomes do esporte nacional em todos os tempos.
Pela seleção Fred deixou 18 bolas na rede em 39 apresentações. Mas pergunta se ele trocaria a idolatria alcançada junto aos tricolores por um caneco mundial com a amarelinha. Claro que não. Sempre que Fred aparecer no Maraca, no clube ou em qualquer evento ligado aos tricolores, tanto ele como sua família hão de se orgulhar pelo legado que Frederico Chaves Guedes deixou. Um legado que não terminou hoje, apenas começou. Para o todo e sempre. Fred explica.
F-R-E-D. Quatro letras que emocionaram o país neste sábado. Mais do que cidadão carioca, Fred é unanimidade nacional. Ídolo de verdade. Merece livro, filme, documentário, tudo. Só não merece ser esquecido. Nem vai. Pois Fred não é Pelé mas é eterno. Assim como seus gols, seu empenho, dedicação e sua alma, ele já é História. Com H maiúsculo. De um homem com H igual. Alguém que honra o seu trabalho e assume com galhardia sua condição de ídolo.
Parabéns pela linda festa, Fred. E, saiba, você não se despediu do futebol. Na natureza tudo se transforma, então, acredite, como seu sobrenome aponta, você tem as Chaves e as portas abertas para uma nova etapa que está apenas começando. E o melhor: já inicia já no topo. De onde, por sinal, na verdade você jamais saiu.
O PONTO FINAL
por Mauro Ferreira

Fugiu uma lágrima, Fred. Fugiu, artilheiro. Bem que você tentou esconder a emoção, cumprir a promessa e não chorar. Pra quê? Como? Quem emociona, precisa antes se emocionar. Da cara amarrada ao sorriso largo e à lágrima solitária escorrendo pelo rosto, tudo passou pela bola, pela magia e pela poesia do futebol.
E não há poesia no futebol sem o gol. Talvez por isso, de todos os esportes com bola, seja o que menos vezes arranque da torcida um grito de êxtase durante a disputa. E você escreveu muitas poesias ao longo dos anos. Emocional, precisava arrancar emoções. Pra isso, pouco importou a forma. Deitado ou voando, de cabeça ou de bico, o que valia era a poesia do gol. A poesia do grito explosivo de um gol. Bem como aquele tal 199.
Pois é, não poderia ter o gol 200. Precisava haver a sua marca, o seu “9”. Por duas vezes no Fluminense, ambas com o “9” tatuado nas costas. Os Deuses do futebol sabem o que fazem e colaram dois “noves” na sua marca. 199 gols com a camisa do Fluminense é o presente final. Como diria o ex-presidente tricolor Manuel Schwartz, “Deus escreve certo por linhas certas porque Deus jamais vai escrever torto ou errado”.
E, ao contrário do que você pensa, Deus incumbiu, sim, Nelson Rodrigues de escrever o roteiro final de sua carreira. Pediu ao seu fiel escritor tricolor que lhe entregasse sua obra mais poética e emotiva: o gol 199, o gol dos noves, o gol do nove mais nove de todos os times que habitaram as Laranjeiras.
Fred, uma lágrima fugiu. E tantas outras – tantas – fugiram junto. Você, ainda bem, não cumpriu a promessa de não chorar. E só há um motivo:
O Fluminense te pegou.
ACORDA, PEDRINHO! SUA HORA CHEGOU
por Marcos Eduardo Neves

Provável titular da seleção na Copa de 2026, o talentosíssimo e mais que eficiente Pedro teve uma noite de gala nesta última quarta-feira, no Maracanã. Que hat-trick, que nada: iluminado, fez logo quatro gols, em plenas oitavas de Libertadores. Ainda participou de dois dos outros três, na imponente goleada de 7 a 1 sobre o Tolima. Uma semana após o Dia de São Pedro, o centroavante do Flamengo pescou almas e mais almas a seu favor como titular, o que tantos já sonhavam faz tempo, porém havia um certo Bruno Henrique, inquestionável até na questionalidade, nublando-lhe a vista do campo.
Bruno Henrique, ao que parece, ficará um ano ausente. Ao que tudo indica – e que me desculpem Marinho, Vitinho, Lázaro e até você, Cebolinha, que mal chegou, perdão pela sinceridade, mas tudo aponta para que o massacre de ontem consolide Pedro como um dos onze soldados da linha de frente em jogos decisivos.
Pedro Guilherme Abreu dos Santos é queixudo. Por isso, o apelido ‘Queixada’. Tal qual chamavam Ademir, craque do Vasco no melhor Cruzmaltino de todos os tempos, o Expresso da Vitória.
Assim como Ademir Queixada, Pedro é artilheiro nato. Assim como Ademir, pode ser também artilheiro de uma Copa. Queixada foi no Mundial de 1950. Pedro, por que não, pode cravar seu nome no cenário mundial daqui a quatro anos. Parafraseando Cazuza, para Pedro o tempo não para. O dele voa. Bem alto.
Aos 25 anos, Pedro vive um grande momento. Deve estar acordado até agora… Impossível dormir! Libertadores é a nossa Champions e Pedro é dela o artilheiro, com sete gols, mesmo número que os palmeirenses Rafael Navarro e Rony. Mesmo tendo poucas chances. Um aproveitamento, diria, divino.
Além dos gols, ontem Pedro deu de calcanhar, por elevação, chutou raspando, cedeu assistências. Fez o diabo, mas saiu glorificado. Em 2016, quando se profissionalizou, aos 19 anos, certa vez se excitou ao fazer cinco – sim, 5! – pelo Fluminense, clube do qual foi ídolo e hoje causa revolta ou ojeriza entre os pó-de-arroz. Chegou a dizer, no calor do momento:
– O Fred é um ídolo da torcida. Me espelho muito nele. Procuro sempre melhorar olhando para ele e para o Ibrahimovic.
Contudo, fez cinco nos 10 a 0 sobre o Capivariano, de São Paulo, pela primeira fase da Copa São Paulo de Juniores. Não era partida de vida ou morte, muito menos na principal competição continental. Inclusive, na coletiva concedida após aquele feito, o púbere artilheiro afirmou que já havia marcado quatro gols numa oportunidade, mas nunca cinco. Só que estes quatro de ontem, convenhamos, não tem comparação.
Se com Fred, uma de suas referências, ele tinha o sonho de jogar, hoje joga com outro super-herói. Por sinal, o que mais viu de tão perto, ali do banco: Gabigol. Que, por sinal, deixou o dele e fez bela partida ontem também. Participou de vários gols.
Mas, Pedro, faz seu nome, que o de Gabigol já está feito. Você pode vir a ser o Gabigol deste ano, acredite. Sei que você acredita muito em você, nós também.Quem sabe assim, Pedro, você se aliviará da decepção de não ter sido liberado pelo próprio clube para brilhar nos últimos Jogos Olímpicos.
Na época, pareceu maldade contigo. Hoje, sinto que você estudou bastante num colégio interno. Compreendeu o professor, e agora está maduro, pronto, para assegurar de vez seu nome no clube mais amado do Brasil.
Acorda, Pedrinho! Sua hora chegou.
A LENDA DA FOLHA-SECA
por Péris Ribeiro

Em um belo dia de certezas, quando pedi-lhe uma definição que me soasse especial sobre o seu misterioso chute - bem mais famoso, por sinal, por criarem em torno dele toda uma aura de sedução e glamour -, Mestre Didi apenas fitou-me bem nos olhos. Para relatar-me em seguida, compassando suavemente as palavras:
- Era como se fosse uma folha de outono, sabe? Descaindo ao sabor do vento. Desgarrada; destino incerto ...
Ante tal definição - um tanto poética, outro quê com acentuado tom filosofal -, o que pude fazer foi viajar no tempo. E, só então, consegui reciclar aquela época. A época, e a própria história. E, mais um pouco: como a lenda, de repente se iniciou.
Hoje, há bem pouca gente que se lembre. Mas, tudo começou em um Fluminense x América, pelo Campeonato Carioca de 1955. Numa disputa de bola com Ivan - centro-médio clássico, mas viril no combate direto. E campeão do Torneio Rio-São Paulo, dois anos depois, como jogador do próprio Fluminense -, Didi acabou levando a pior. Saldo do lance: tornozelo direito avariado.
Como consequência, o nosso Didi acabou por se ver obrigado a curtir o estaleiro por um bom tempo. Tempo exato, no entanto, para que, entre o tratamento na enfermaria das Laranjeiras e a volta progressiva aos treinos, acabasse por descobrir uma maneira diferente no ato de chutar a bola. Um jeito que não sacrificasse a sua recuperação, numa região ainda magoada pelo bico da chuteira do centro-médio americano.
Observador engenhoso, que gostava de estudar os fatos até nos mínimos detalhes, o que Didi sacou logo é que poderia estar realmente criando um chute diferente. Na verdade, um estilo revolucionário de bater na bola. Ainda mais, porque tal chute era executado com a parte externa do pé direito - em torno da chamada linha dos três dedos. Mas o que o deixava empolgado de verdade, era o trajeto que havia conseguido conceber, tão logo detonava o chute.
É que a bola, como que encantada, desandava a descrever curvas e rotações diferentes em pleno ar. Para, logo em seguida, desenhar uma semi-parábola, descaindo com força, incerta e cheia de graxa, num dos ângulos do gol, bem junto às traves. Tudo isso para desespero de Castilho, Veludo, Adalberto e Jairo - justo a fina-flor, em termos de goleiros, lá no Fluminense. E que se revezavam, treino após treino, na ingrata tarefa de testar aquela típica invenção made in Didi.
Finalmente, já tida como pronta e acabada, eis que a grande novidade acabou por ser testada oficialmente diante do pobre Julião, jovem goleiro do Bonsucesso. Um crioulo imenso, que ora fechava o gol; noutro dia, era capaz de papar os frangos mais inacreditáveis. Homéricos mesmo. E que naquela tarde, no estadinho da rua Teixeira de Castro, pensava, a cada chute de Didi, estar vendo coisas do outro mundo. Ou, no mínimo, “que andava variando da cabeça”, debaixo de um sol de mais de 40 graus que latejava em sua moleira. Ainda mais naquele caldeirão de fogo, que atendia por Zona da Leopoldina do Rio de Janeiro.
Um pouco mais de tempo passado, e eis que lá estava a estranha novidade a ganhar notoriedade de vez. Até mesmo, como arma mortal. Só que acabou por visar o seu passaporte, rumo ao sucesso internacional, em duas vias distintas. Em 1957, quando garantiu a ida do Brasil à Copa do Mundo da Suécia, no 1 a 0 diante do Peru, em um Maracanã superlotado. E em 1958, já em gramados escandinavos, quando provocou o desempate em 2 a 1, na eletrizante semifinal diante da França - que vencemos por 5 a 2.
Quatro dias depois, com o Brasil campeão do mundo pela primeira vez, e com o próprio Didi, majestoso, consagrado com todas as honras como o inspirado maestro do nosso time e o Maior Jogador daquela Copa inesquecível, era da vertiginosa Folha -Seca que ele voltaria a falar com imenso carinho.
E, talvez em pleno transe da grande festa, até se lembrasse em detalhes de como tudo havia começado.
Por exemplo: daquele Fluminense x América, e do tornozelo direito avariado na disputa de bola com Ivan; do espanto do pobre Julião, a ver coisas do outro mundo, no acanhado estadinho da rua Teixeira de Castro, a cada Folha - Seca que descaía no seu gol; e, finalmente, de Abbes, goleiro da França, quatro dias antes. A testar, sem sucesso, o poder de fogo de um chute que questionaria a física e a lógica, na intricada geometria do futebol.
O FUTEBOL, FRED, TAMBÉM É UM MOINHO
por Zé Roberto Padilha

Ainda é cedo, Fred, mal começastes a conhecer a vida , já anuncias a hora da partida, sem saber mesmo o rumo que irás tomar…
Presta atenção meu ídolo, embora saibas que está resolvido, jogo marcado, ingressos vendidos, em pouco tempo não serás mais o que és
Ouça-‘me bem, Frederico, presta atenção, o futebol é um Moinho, em pouco tempo vai triturar seus feitos, tão decisivos, vai reduzir sua idolatria a pó.
Presta atenção, Don Fredon, lembra do Conca, Deco, Deley, Thiago Neves, Denilson, o Rei Zulú, Samarone, tão importantes quanto esquecidos?
Ouça-me bem, artilheiro, de cada torcedor herdará só o ostracismo, quando notares estará à beira da solidão, imerecida, pelos gols que marcastes com teus pés.
Moral da História: em um país sem memória, um atleta só se defende jogando.
* Cartola, nosso mestre e tricolor, há de perdoar ter mudado os versos do seu hino. A causa é nobre.O futebol também é um Moinho .