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O PAU CANTOU

por Rubens Lemos

Os anos 1970 foram os melhores da história do futebol potiguar com o Estádio Castelão novinho, cheirando a tinta, gramado espetacular e craques divididos entre ABC e América. Há 45 anos, o clássico entrou na mídia nacional por vias tortas na maior briga registrada em gramados potiguares.

Era decisão de 1977, ABC favorito, começou a cair no campeonato e, ao chegar a 18 de setembro, o América havia assumido a liderança técnica e psicológica, jogando pelo empate para reconquistar o título que perdera em 1976 em outra tentativa fracassada de ser tricampeão, o que só ocorreria cinco anos depois.

O ABC tentava o bicampeonato, começou bem e sucumbiu a um jovem que entrava no segundo tempo para matar o alvinegro em gols e passes de craque: Marinho Apolônio, 22 anos, ex-Sport(PE), para mim, o melhor do Estádio de Lagoa Nova.

Um campeonato estranho o de 1977. O América começou dando as cartas no primeiro turno e chegou à final podendo perder duas vezes para o ABC. E perdeu, a primeira peleja por 2×1, dois gols do meia Zé Carlos Olímpico, integrante do escrete brasileiro nos tenebrosos Jogos de Munique, em 1972 e a segunda, ABC 2×0, duas porradas em cobranças de falta de Baltasar, campeão improvável do primeiro turno.

No segundo turno, o ABC inverteu a história e estava pronto para ganhar o caneco direto. Até que Alberi, o camisa 10 do América, odiado temporariamente pela Frasqueira, roubou uma bola do igualmente craque Danilo Menezes, o camisa 10 do ABC, cruzou na categoria para Marinho Apolônio matar o goleiro Hélio Show: 1×0 e o América se recuperava. Ganhou o segundo turno e o terceiro, venceu com o ABC jogando pelo empate em chute violento do centroavante Aloísio Guerreiro.

O ABC trouxe do Londrina um centroavante chamado Anderson, já falecido, que fazia cinco gols em timeco e não marcava nenhum no América. Apelido infame: Sarampo, doença que aflige os pequenos.

A temperatura fora de campo esquentava e surgia o boato de que o ABC não deixaria o América comemorar o título. “A volta olímpica, eles não vão dar”, determinava Danilo Menezes na granja do presidente José Nilson de Sá, onde o ABC concentrou.

Matreiro, Danilo Menezes percebeu que o time estava entregue, arrasado e anêmico, sem poder de recuperação. O ABC errou ao entregar o comando técnico ao ídolo Maranhão, volante e experiente com juvenis. O América tinha o experimentado gaúcho Laerte Dória.

No dia 18, os dois times chegaram cedo, sentaram no espaço ecumênico das cadeiras cativas, bancos iguais aos de igreja, situados no setor intermediário do Castelão. O plano: se até 30 minutos do segundo tempo, o ABC não marcasse, Anderson teria alguma serventia: agredir o esquentado volante Zeca, do América. Ocorre que Zeca foi avisado por um traíra do ABC ainda nas cadeiras numeradas.

O jogo seguiu o script anunciado. O ABC pressionando, o América bem postado na defesa e poucos lances de perigo. Aos 29 minutos do segundo tempo, Anderson recebe a ordem de encenar seu teatrinho.

Zeca percebe e corre, Anderson, expulso, sai procurando iscas no América. Estoura a pancadaria e o símbolo do episódio: o zagueiro Pradera, camisa 3 do ABC, faixa-preta de Karatê, bateu em quem viu pela frente. Até PMs tiveram trabalho para segurá-lo.

A torcida do ABC grita para Pradera surrar Alberi e ele corre para atacar o Negão, que percebe e, no reflexo, acerta-lhe uma pernada no rosto. Pradera, depois de levar borrachadas da polícia, persegue Alberi até o vestiário. Não consegue tirá-lo do esconderijo.

O episódio, deprimente, colocou o Rio Grande do Norte pela primeira vez no programa Fantástico, da Rede Globo. Brigaram quase todos. O juiz paulista Faville Neto expulsou os 22.

Até o sacrossanto goleiro reserva Erivan, do ABC, que ajudou o ponta Ronaldinho do América, gritando de dor com o ombro deslocado, prestou socorro e levou um murro. Do próprio Ronaldinho.

O América foi o campeão justo de 1977. Mas não teve volta olímpica. Ou “Vollta”, como previu o malandro uruguaio Danilo Menezes. Ah! Os brigões dos dois times– menos Pradera – dividiram mesa farta de cerveja, madrugada adentro no Clube Assen, na Avenida Prudente de Morais, no Tirol. Amigos íntimos.

Ficha

América 0x0 ABC – Castelão – Público:22.873 pagantes. Árbitro: Faville Neto(SP). Expulsos: todos. América: Cícero; Ivã Silva, Joel Natalino Santana, Argeu e Olímpio; Zeca, Rogério(Garcia) e Alberi; Ronaldinho, Aloísio Guerreiro e Soares(Ivanildo Arara). ABC: Hélio Show; Orlando, Pradera, Domício e Vuca; Baltasar, Danilo Menezes e Paulo César Cajá(Zezinho Pelé); Maranhão Barbudo(Noé Silva), Anderson e Noé Macunaíma.

O GÊNIO ILUMINADO

por Péris Ribeiro

Os campeões mundiais Bellini e Didi – eleito o Maior Jogador da Copa de 1958 -, também eram o fino da elegância fora dos gramados. Ei-los em uma noite de homenagens no hall do Maracanã

Ganhou ares de pesadelo – e pesadelo com a força do mais arrebatador tango portenho -, a maior desdita vivida por Messi. O ano? 2014! E logo em uma final de Copa do Mundo, perdida para uma Alemanha determinada, em pleno Estádio do Maracanã, na cidade do Rio de Janeiro.

É incrível, mas ainda me lembro bem do seu choro, de sua imensa frustração. E da dura e sofrida realidade, da impossibilidade ante o insuperável. Ante o impossível.

Porém, há de ter doído bem mais, a constatação real de que ainda não seria daquela vez. Nem a jogada genial, nem o gol decisivo. Muito menos, o sorriso refletido na taça. Na subida ao pódio, o sufoco de novo contido.

Quando, em que dia, afinal, ele poderá rasgar o peito e gritar: “Argentina! Argentina, campeã do mundo!”?

Como os Deuses do Futebol sabem ser matreiros, e tantas vezes cruéis, há muita gente por aí ostentando façanhas de dar inveja. Uma gente, frise-se, capaz de exibir bem pouco mais que um mínimo de talento que seja com a bola nos pés.

Em compensação, existem certos gênios predestinados. Aqueles para quem a sorte nunca deixou de sorrir. Como Didi, o Príncipe Etíope. Alguém com um dom mágico, capaz de obter o que poucos, bem poucos, puderam na vida. Ainda mais, no sinuoso universo do Futebol.

Basta dizer que, festejado em 1962, em Santiago do Chile, como bicampeão mundial, Didi já havia conseguido uma glória particular, toda sua, alguns anos atrás. É que, lá na Suécia, fora consagrado o Maior Jogador da Copa de 1958 – justamente a primeira de todas, na qual o Brasil saiu com as honras de grande campeão.

Aliás, refletindo com serenidade e rigor sobre o tema, não é pouca coisa ser considerado o Maior Jogador de uma Copa do Mundo. Em absoluto! Muito menos, em uma Copa que tem Pelé e Garrincha em campo. E convém lembrar que também havia, nos gramados escandinavos, talentos luminares como os franceses Kopa e Fontaine, o tcheco Masopoust, o húngaro Bozsic e os alemães Rahn e Fritz Walter. Ou o sueco Skoglund, o argentino Labruna, o galês John Charles. E ainda havia um goleiro do porte do russo Lev Yashin, já celebrado o “Aranha Negra”.

Pois ainda assim, e mesmo com todo o tipo de honraria por aí já recebida, nem no ato da heroica conquista em estádios do Chile, Mestre Didi faria por menos. É que, nos atapetados gramados andinos, o elegante e cerebral inventor da “Folha Seca” iria imprimir, pela última vez, a sua marca genial. Particularmente, porque só a ele, e a mais dez ilustres jogadores, seria concedida a honra de um Bi em Campeonatos Mundiais. No caso, oito brasileiros – com ele, Didi, nove – e dois italianos.

– Tenho consciência, que fiz por onde chegar a algum lugar. Sei bem disso. Mas sei também que Deus foi bom demais, dando-me além. Quantos fazem por merecer, e nada conseguem? – disse-me Didi certa vez, em um ameno final de tarde. O sol morno e agradável – era início de primavera -, como testemunha privilegiada.

Será Messi, tal qual gigantes da estatura de um Zizinho, o Mestre Ziza e um Puskas, o Major Galopante, um desses definitivos – e imerecidos – desafortunados na história das Copas?

QUE SAUDADES DOS PELADEIROS

por Zé Roberto Padilha

Tudo bem que com tantos desfalques e diante um futebol coletivo impecável, como o do Palmeiras, só restava ao Botafogo ir buscar recursos na sua história.

De preferência, através dos pontas inesquecíveis que teve e realizaram misérias coletivas. Como Rogério, Zequinha, Paulo César Lima e Jairzinho.

E, nesta noite, fria e chuvosa, com meu filho alvinegro sofrendo em Rio das Ostras, coisas da Tia Vera, poderia estar em terceiro lugar, se ouvisse o pai, agradeci a ele pelo seu time ressuscitar dois autênticos peladeiros: Junior Santos e Jefinho.

No bom sentido, claro. Do improviso, da coragem, do nosso futebol raiz, de várzea, que permitia ousadias indivíduais até que a “maldita” Laranja Mecânica tornou coletiva.

Tomei a liberdade de escrever no intervalo e com o Palmeiras vencendo por 2×1. Independente do resultado final, torci muito para que os dois peladeiros arrebentassem no segundo tempo.

Isso tudo porque os dois me deram saudades, de lembrar Maurício e ter saudades do futebol-arte!

FINAL ESVAZIADA

:::::::: por Paulo Cézar Caju ::::::::

Neste fim de semana, o São Paulo enfrentou o Independiente del Valle (EQU) pela final da Copa Sul-Americana e, antes de falar do jogo em si, tenho algumas considerações. Já estive dentro de campo e posso afirmar com todas as letras que é decepcionante para um jogador entrar em campo com o estádio vazio, ainda mais em uma decisão. Final é final e até na várzea a galera se mobiliza para assistir à pelada, mesmo que não torça para nenhum dos dois times. O problema é que a Conmebol quer ser a UEFA e implantou nos últimos anos uma final decidida em jogo único e em um lugar aleatório.

Se fosse na minha época, com certeza eu colocaria a boca no trombone e seria o primeiro a criticar tal decisão. Até porque, quem proporciona o espetáculo, no mundo inteiro, são os jogadores, certo? Acontece que os craques de hoje em dia não dão mais nenhuma opinião e só acatam as decisões dos dirigentes, que sempre visam o lucro.

Se não bastasse a logística em si para viajar, os torcedores precisam desembolsar uma grana para acompanhar o time e o resultado foi o fiasco que vocês viram: 15 mil pessoas em um estádio com capacidade para 57 mil. Sabe qual é o pior? Mesmo os torcedores que não viajaram, tiveram dificuldade para assistir em casa, porque o jogo só foi transmitido pela Conmebol TV. Ou seja, parece que fazem de tudo para distanciar o torcedor do time e estão conseguindo.

Sobre o duelo, vi muita gente falando que o Del Valle surpreendeu o São Paulo, que foi uma zebra, mas na minha última coluna já havia alertado sobre a qualidade do time equatoriano. Aliás, elogio a evolução deles faz tempo, com um toque de bola de pé em pé e um futebol coletivo. Merecidíssimo!

Partindo para o futebol europeu, Haaland segue deitando e rolando no futebol inglês, e marcou três contra o United. Se o norueguês já era uma promessa, agora trabalhando com Guardiola tem tudo para virar o jogador que todos imaginam, em um time que joga coletivo e sempre visando o gol! Para se ter noção, enquanto Messi e Cristiano Ronaldo ainda não tinham nem 100 gols antes dos 23 anos, o atacante do City já tem 173! Vai longe!!

Pérolas da Semana:

“Para acionar os alas (ala da escola de samba? Dos compositores? Da velha guarda? Kkkk), o volante pitbull dá uma cravada na segunda bola do X1 e eleva o patamar da consistência por dentro, proporcionando intensidade e e leitura de jogo”.

“Antes de dar um tapa na orelha da bola e penetrar na linha de cinco, com três zagueiros, o jogador de beirinha faz a ligação direta no último terço do campo”.

CASCA DE BANANA

por Claudio Lovato Filho

Quem joga casca de banana quer ver tombo.
Quer rir do infortúnio alheio, a queda.
Quem joga casca de banana quer sabotar.
Quer atrapalhar a caminhada do outro, seja concorrente ou apenas desafeto.
Quem joga casca de banana quer ridicularizar.
Quer ver a vítima em situação de cômico constrangimento, desconcerto.
Quem joga casca de banana quer humilhar.
É o ignorante, o profundamente ignorante, tentando aplicar no agredido o carimbo de “inferior”, de “irracional”, de “sem valor”.
Quem joga casca de banana quer matar.
É, matar.
Quer matar a dignidade do outro.
Quer matar a autoconfiança do outro.
A honradez do outro.
Quer calar (matar) a voz do outro.
É covarde, é cafajeste, é canalha.
É cruel, é mau, tem doença que se trata com medicamentos e/ou com cadeia (ou talvez só nascendo de novo).
Quem joga casca de banana é, portanto, assassino.
De um jeito ou de outro.
Com ou sem metáfora.
São escrotos, excrescências, pústulas – dos quais, ao que tudo indica, o mundo nunca vai se ver livre.
E é por isso que a luta nunca vai acabar.
Não pode acabar.
Por isso será sempre preciso lutar, com vigilância, rigor e inteligência.
Lutar.