Escolha uma Página

O CARRASCO

por Elso Venâncio, o repórter Elso

Supersticioso, o camisa 10 das Laranjeiras por muito tempo usou as mesmas surradas e históricas chuteiras dos gols marcados frente o Flamengo. Ao entregá-las ao craque, o roupeiro Ximbica dizia:

“Talismãs!”

E nos mostrava com orgulho.

Assis ganhou o apelido de “Carrasco” ao marcar duas vezes, em jogos decisivos, contra o Flamengo. Em 1983, fez o gol do título aos 45 minutos do segundo tempo, após receber passe do meia Delei e tocar cruzado, na saída do goleiro Raul. Um ano depois, de novo ele, cabeceou firme, escorando um cruzamento do lateral Aldo para decidir o bicampeonato carioca. Assim, imortalizou-se como carrasco do rival e ídolo tricolor.

Até os amigos de infância passaram a chamá-lo de “Carrasco”. O Flamengo perdeu o protagonismo, mesmo mantendo a base da sua fantástica geração que conquistou o Mundial Interclubes ao vencer o Liverpool em Tóquio, um time que ganhou também o tricampeonato brasileiro, em 1980, 1982 e 1983.

Assis chegou às Laranjeiras depois de brilhar com a camisa do Atlético Paranaense, semifinalista do Brasileirão de 1983. Mudou-se para o Rio de Janeiro por causa do centroavante Washington, baiano de Valença cinco anos mais jovem que o parceiro e pretendido por diversos clubes. O Furacão avisou que só venderia a dupla, não apenas um. O dirigente tricolor Newton Graúna bateu o martelo:

“Vamos contratar os dois.”

O esquadrão formado conquistou vários títulos. Inclusive, venceu o Real Madrid, em 1985, dando show no tradicional torneio espanhol Teresa Herrera. O time base contava com Paulo Victor, Aldo, Duílio, Ricardo Gomes e Branco; Jandir, Delei e Assis; Romerito, Washington e Tato. No elenco, Ricardo Cruz, Vica, Renato Martins, Renê Weber, Leomir e Paulinho.

No Maracanã, independentemente do adversário, a torcida cantava feliz da vida:

“Recordar é viver: Assis acabou com você!”

Como setorista da Rádio Globo, cobri o Fluminense nessa época. Era um grupo forte, focado, unido e com um punhado de craques. O comentarista João Saldanha chegou a declarar:

“Essa equipe se recusa a perder.”

Os treinos eram em Xerém e o tetra carioca só não foi conquistado devido a um erro da diretoria, que alegou dengue generalizada e não foi a Campos dos Goytacazes enfrentar o Americano, levando um “W.O.”. Tudo o que Eduardo Viana, o presidente da federação, e o vice de futebol cruz-maltino Eurico Miranda queriam, para desbancar os campeões.

Benedito de Assis Silva foi campeão por onde passou. Na sua cidade natal, a capital paulista, ganhou os Estaduais de 1980 e 1981 com o uniforme do São Paulo. Levantou o caneco gaúcho com o Internacional e foi bicampeão paranaense com o Atlético. Chegou à seleção brasileira após o título nacional que o Fluminense conquistou em 1984, contra o Vasco. Inclusive, vestiu a mítica camisa 10 amarelinha. Havia sido convocado pelo técnico Edu Coimbra, irmão de Zico, e disputou um amistoso frente à Inglaterra, no Maracanã.

O jornal ‘O Globo’ ouviu recentemente 100 jornalistas para saber quem foi o maior ídolo da história do Fluminense. O lendário goleiro Castilho ficou em primeiro lugar. Fred veio logo em seguida. Depois, Assis. O meia superou grandes nomes, como Telê Santana, Rivellino e Romerito, dentre outros imortais da galeria tricolor.

Assis e Washington estão eternizados nas Laranjeiras com bustos, ao lado da entrada social. Os dois faleceram em Curitiba. Washington, em 2014, aos 56 anos, vítima de esclerose lateral, uma doença degenerativa. Assis, com problemas renais, nos deixou 43 dias após a morte do amigo, aos 61 anos. Ambos, simplesmente, são ídolos eternos do nosso futebol!

NOVE MENOS MARINHO CHAGAS

por Rubens Lemos

Nasceu metade homem, metade anarquia. Há nove anos anos, completados em junho, o futebol perdia Marinho Chagas, Bruxa, menino grande, gazela de elegância tropicana, lateral-esquerdo subversivo de ordens e táticas.

Convenções estáticas. Salgadeira, Recife, Rio de Janeiro, Copacabana, Princesinhas, Mar, Chacretes, Baixo Gávea, Nova York, Cosmos, tristeza que nada.

Há oito anos , Natal perdeu Marinho. Alguns choraram de verdade, outros de remorso. Outros, como carpideiras profissionais. A esmagadora maioria nem lembra. Dele ou da data.

Os últimos dias de vida de Marinho foram tão cruéis por parte da cidade que o recebia – no auge – para gastar seus milhões, que o destino de meia-armador o enfiou em lançamento até João Pessoa para morrer onde encontrou calor humano.

Um grupo de donos de bancas de revista – santos homens -, convocou Marinho para animar rodas de “bafo”, troca de figurinhas para a Copa do Mundo de 2014.

Deu tão certo que Marinho ensaiou reviver. Crianças iguais a ele o cercavam, brincavam, ouviam suas histórias sobre a Copa do Mundo trinta anos antes, eleito o melhor lateral-esquerdo do mundo na jornada da Alemanha/1974.

Marinho contava dos avanços que encantaram o mundo e já lhe haviam feito sucessor de Nilton Santos, a Enciclopédia do Futebol. Pelo próprio Nilton, no Botafogo precursor da Bruxa.

Foram com Marinho para João Pessoa, Paraíba calorosa, um sábado de manhã. Estava todo faceiro distribuindo assinaturas é alegria. Começou a passar mal. Sangrou da doença(perdi meu pai para ela), do alcoolismo. Hemorragia digestiva que o matou em poucas horas. Última frase: “peçam desculpas às crianças”.

As férias existenciais acabavam. Trouxeram Marinho para ser velado no estádio do ABC. Puseram seu caixão num dos bares, urubulina providência. Dentro daquele paletó de madeira, imagino Marinho puto, querendo sair para o campo nem que fosse para sobrevoar de uma vez por todas.

Prometeram-lhe tudo. Depois de morto, bonança-padrão da terra que, intuitivamente, deixou para ser reconhecido no mundo. Jogou um ano para ser campeão no ABC em dueto delirante com o Rei Banto Alberi.

Jogou e é integrante do melhor Botafogo da História: Manga; Carlos Alberto Torres, Sebastião Leônidas, Nilton Santos(concedida improvisação) e Marinho Chagas; Gerson, Didi e Paulo Cézar Caju; Garrincha, Heleno de Freitas, Jairzinho e Amarildo. São 12, milionário é o passado alvinegro carioca.

Foi ao Fluminense, trocado por outros três craques de seleção brasileira: Rodrigues Beto, Gil e Paulo Cézar Caju, cuja idolatria me retira a isenção. Foi ao Cosmos, de Nova York, constelação de proeminências do gabarito de Pelé, Chinaglia, Beckenbauer, Romerito, Seninho, Carlos Alberto Torres e Neeskens.

Voltou pelo São Paulo. Irreverente e livre, sua palavra-sinônimo, atacando no timaço de Getúlio, Oscar, Dario Pereyra, Renato Pé-Murcho e Zé Sérgio, posto que me recuso, incluir Serginho Chulapa, o obtuso, em tão nobre relação.

Decidiu passear por Bangu, Fortaleza e América de Natal, merchandising móvel do então candidato a deputado federal Flávio Rocha, dono do Grupo Riachuelo. Parou de jogar, sua cidade passou a lhe apedrejar: irresponsável, bêbado, drogado.

Enquanto Natal fustigava Marinho em sua incurável relação madrasta com filhos de destaque, Platini, Beckenbauer, Cruijff, gênios, se entendiam com ele, mandavam-no buscar para saraus durante Copas do Mundo.

Marinho não recebeu uma homenagem oficial em 2014, a amaldiçoada Copa das Arenas irrigadas de sujeira. Não viu nada, partiu antes, pela linha lateral ou em diagonal do tempo. Marinho nem queria festa artificial. Marinho viveu cada dia como se fosse o último. Ele sabia que era somente único.

A VIAGEM E O RETORNO

por Ivan Dantas (Ivaneguinho)

Hoje, ao ouvir minhas músicas prediletas, eu viajei ao passado. Me reencontrei com meus amigos (alguns infelizmente não existem mais). Revi minha INFANTARIA, meu BLACK POWER, meu CENTRAL e meu COLÉGIO DELTA.

Pareciam poucos, porém, agora que não os tenho, vejo como foram importantes na minha vida. Na INFANTARIA, aprendi de tudo um pouco. Principalmente saber que a minha liberdade termina quando a do outro começa. Aprendi a ser disciplinado, respeitar o próximo e amar meus companheiros de farda.

Ah! Meu BLACK POWER! Que saudade! As defesas do Beto Gama, a nossa defesa inexpugnável (Fernando, Nepô, Hélio e Andeda), nosso meio de campo sem defeito (Matias, Luiz Pita e Ivaneguinho) era completo. Nosso ataque, como esquecer? As arrancadas de Paulo da Estação (Burro Preto), os lençóis de Noel, os gols de bicicleta de Odair Rubens e, o mais importante para o nosso time: os decisivos gols do sempre LUIZ PELÉ. Nos deliciamos com gol até de BANANEIRA, feito por ele. Sem contar os três gols de cabeça que ele marcou em questão de quinze minutos, onde o goleiro que pertencia ao Campo Grande abandonou a meta de tanta decepção.

Meu CENTRAL: isto é, ESPORTE CLUBE CENTRAL. Central do Sr. Nascimento, do goleiro Nelinho, do Suque, do Bozano, do artilheiro Bolinha, do Zé Doca, do Dunga, do Jair Buda, do meu primo Hélio. Central da mãe do Zé Doca, da Tia Inácia, da Toninha, do Seu Luiz e do maior de todo: nosso amado PIU PIU.

É difícil não lembrar dos famosos jogos: CENTRAL X OPERÁRIO (do folclórico Seu Jorge). Nossa, que tempo bom! Epa! Quase esqueci do JORGE GUARÁ. Ele decidiu por mim um desses clássicos, marcando dois gols no final da partida. Obrigado, GUARÁ! Naquele dia você lavou minha honra!

Finalmente meu DELTA. Que Colégio! Bicampeão Estudantil da Zona Oeste. Diversos títulos esportivos. Era tudo para mim e meus amigos: Seu Santos (grande massagista), Dilermano, Nildo, Pezão, João Carlos, Alonso, Anu, Duzinho, Zé Luiz, Carlinhos Cg Milho, Valdemir (Maninho), Azael, Rui, Paim, Carlinhos Tutu, Emilson (Nega), Fusquinha, Lírio, Baiano Pou Pou, Valter Charuto, entre outros.

Ali, fiz meu ginásio e meu científico. Com esse grupo aprendi o significado de UNIÃO. Tive um grande General (Prof. Enéas) e uma “senhora” Conselheira (Professora Eliude). Puxa! Como é bom relembrar! Lá tive a minha primeira namorada, o meu primeiro caso de amor e as minhas primeira desilusões (em geral).

Retorno à viagem do tempo e fico triste. Meus olhos encheram-se d’água ao saber que nada será como antes: muito amor, muita paz, e acima de tudo: muita compreensão.

Se um dia DEUS me der o Dom do Milagre, eu trarei de volta minha INFANTARIA, meu BLACK POWER, meu CENTRAL e meu querido DELTA.

BOM CAMARADA

por Rubens Lemos

Mazarópi, meu goleiro de infância no Ex-Maracanã e no futebol de botão do Vasco, reabre o baú das lembranças que mereceriam replay. Mazarópi, de expressão saliente, honrou o apelido, homenagem ao caipira trapalhão dos primórdios do humorismo em preto e branco, da arqueológica Cinédia.

Geraldo Pereira de Matos Filho tornou-se Mazarópi pelas sobrancelhas semelhantes e grossas, pelos olhos grandes e pela expressão acentuada no sorriso triste. Mazarópi era o bom camarada, dizem seus contemporâneos. Sempre amável, carismático. Fã do ator engraçado nem tanto pelas piadas, mas pelo aspecto desengonçado e humilde.

Tímido, o Mazarópi ágil, aéreo, jamais capitalizou seus feitos históricos desproporcionais à estatura mediana. Os fanáticos leitores de papeis velhos, sabem que Mazarópi guardava uma fatia dos seus prêmios por vitória para os reservas e que é dele o imbatível recorde de gols não tomados com 1.861 minutos.

Na decisão da Taça Guanabara de 1976, o Flamengo brincava de esconde-esconde com o adversário. Zico e um regente magriço, com traços de um Ademir da Guia criado ao sol de Copacabana ditavam normas e regras no meio-campo.

Chamava-se Geraldo, 22 anos, a classe reinante em harmonia de Escola de Samba no Maracanã ensandecido com 133.444 fanáticos, fora os sepultados que deixaram suas tumbas para subir as rampas do palco democrático.

O Flamengo cadenciava, o Vasco se defendia às botinadas, mas a burrice do zagueiro Rondinelli, atingindo Roberto Dinamite com uma cotovelada em resposta à provocação, gerou o pênalti que fez 1×0 para a Zebra. Roberto cobrou no canto direito de Cantarelli, conterrâneo e amigo de Mazarópi.

A pressão do Flamengo asfixiava. Mazarópi espalmava chutes quentes da intermediária e à queima-roupa , voava aos pés do atacante Luisinho Tombo, dividia com Zico, cortava cruzamentos perfeitos do lateral-direito Toninho Baiano.

O técnico Carlos Froner, guru de Felipão, pôs em campo um veterano vinícola – Edu Coimbra -, irmão de Zico, que só não foi classificado como gênio pela supremacia do mais novo. Edu driblou três vascaínos e tocou para Geraldo no lado direito.

A cena é bela para quem a revê no youtube. Geraldo, em plena turbulência, passeia como a Pantera Cor de Rosa, alheia e indolente, até chutar forte no ângulo de Mazarópi, que, no jargão dos inesquecíveis Waldir Amaral e Jorge Coury “nada pôde fazer”. O jogo terminou 1×1 e os pênaltis decidiriam.

Abel começou perdendo para o Vasco e chutando em cima de Mazarópi. Esse Abel Braga, referência de técnico nos restos de guerra de hoje era um amarelão em decisões. Júnior, Zé Roberto, Tadeu e Toninho converteram para o Mengo. Gaúcho, Luís Fumanchu e Zé Mário marcaram para o Vasco. A cobrança seguinte definiria o título para o Flamengo.

Remanescentes da charanga de Jaime de Carvalho, morto naquele ano, soltavam marchinhas, o foguetório espocava e os vascaínos adeptos da sensatez, desciam arquibancadas de moral arrasada e bandeiras enroladas.

Afinal, o pênalti seria cobrado pelo semideus Zico, 23 anos de idade, no esplendor da forma e que jamais errara uma cobrança. Zico dividia as honras de melhor do Brasil com Rivelino, embora a camisa 10 da seleção brasileira fosse do canhoto bigodudo e elástico.

Zico tomou distância, fotógrafos acenderam seus flashes, a batida seca e no canto esquerdo saiu sem defeito. Zico nem a imensa maioria no Maracanã não pensavam em Mazarópi, o bom camarada, pulando felino e espalmando para escanteio. Zico veio abaixo e jurou nunca mais cobrar pênaltis. Quebrou a promessa e 1986 apresentou a fatura.

Roberto Dinamite, que só bateria se o impossível acontecesse – o erro de Zico -, chutou certinho e a definição ficou para uma segunda série. Quem se apresentou primeiro foi Geraldo, o irmãozinho moreno do Galinho de Quintino, tão abatido quanto ele. Geraldo e Zico formavam parceria em monólogo.

O caminhar de Geraldo até a maca do pênalti é a travessia inútil do condenado ao cadafalso. Ele segura a bola. Movimento melancólico com as mãos e simplesmente atrasa para Mazarópi, que salta, encaixa, sem rebote e a expõe para a rediviva torcida do Vasco. Geraldo perdeu seu pênalti em solidariedade a Zico e morreria numa prosaica e inexplicável cirurgia de amígdalas, desfalcando as seleções de 1978 e 1982.

O obscuro juvenil Luis Augusto bate e marca para o Vasco o gol do inesperado título da Taça Guanabara de 1976. O narrador o proclama herói e esquece de Mazarópi, bom camarada, autor da defesa que permitiu a reação e da outra, a que selou a derrota do Flamengo.

No ano seguinte, Mazarópi saltou e defendeu o pênalti cobrado pelo jovem Tita, promessa flamenguista, garantindo ao Vasco um título carioca após sete anos de espera. O timaço de 1977 perdeu apenas um jogo e dá gosto repetir:Mazarópi; Orlando, Abel, Geraldo e Marco Antônio; Zé Mário, Zanata e Dirceu; Wilsinho, Roberto Dinamite e Ramón, com Orlando “Titio”Fantoni de técnico.

De prêmio, Mazarópi ganhou a reserva no ano seguinte, com a chegada de Emerson Leão, titularíssimo da seleção brasileira e com o qual o Vasco não conseguiu vencer um turno sequer. Mazarópi seguiu, conformado, para o Coritiba. Foi campeão paranaense e reconhecido.

Mazarópi voltou ao Vasco e era titular até a semana do título sobre o Flamengo em 1982, perdendo a posição para Acácio, um goleiraço, sem que tenha tido culpa de nenhuma derrota.

Sem reclamar, o bom camarada foi para o Náutico, voltou ao Vasco e logo avisado que para ele não havia lugar. Acácio e Roberto Costa, comprado ao Atlético Paranaense, ostentavam cartaz de seleção e o Grêmio o esperava.

Mazarópi assumiu a baliza do Olímpico e está na fotografia do jogo contra o Hamburgo , show de Renato Gaúcho na vitória de 2×1 e na conquista do título mundial. Mazarópi festejava em Tóquio e o Vasco, que o rejeitara, entrava pela janela do Campeonato Nacional do ano seguinte.

Enquetes, debates, artigos, discussões, opiniões de vestais citam Jaguaré, Barbosa, Víctor Gonzalez, Andrada, Acácio, Roberto Costa, Carlos Germano, Hélton, Fernando Prass(brincadeira) e esquecem Mazarópi, minha figurinha número 1. Mazarópi é o bom camarada. Bom Camarada é aquele nascido com o carimbo de que será secundário. Dentro e fora do gramado.

UMA COISA JOGADA COM MÚSICA – CAPÍTULO 14

por Eduardo Lamas Neiva

Animado com a festa dos são-paulinos, Zé Ary parecia um torcedor tricolor e, isso com certeza, fã de Hélio Ziskind. Foi lá no notebook do bar e pôs a versão instrumental do hino do São Paulo (clique aqui e vá à faixa 18,:  http://www.helioziskind.com.br/index.php?mpg=01.00.01&nfo=130&ndi=5&tipo=disco#tit), enquanto o povo presente ao Além da Imaginação dava uma pausa para se espreguiçar, rodar um pouco, ir ao banheiro etc.

Garçom (depois de diminuir um pouco o volume do Hino do São Paulo, que continuava nas caixinhas do notebook, mas agora como som ambiente): – Senhores, li uma vez que o ex-goleiro do Palmeiras Oberdan Cattani disse que Leônidas foi maior do que Pelé.

João Sem Medo: – Dentro de campo, Pelé foi um gênio, o maior que conheci. Na verdade, são quatro os fora de série, muito longe dos outros: Pelé, Garrincha e dois argentinos, Di Stéfano e Maradona. Patrioticamente, eu fico com os meus, claro.  

Idiota da Objetividade: – Leônidas foi o grande craque dos primeiros anos do Pacaembu, inaugurado em 27 de abril de 1940, pelo então presidente Getúlio Vargas.

João Sem Medo: – Getúlio nesta época ainda era aliado da Alemanha de Hitler. Só em 42 finalmente virou a casaca e mandou o Brasil à guerra. Mas esse é outro assunto.

Ceguinho Torcedor: – É, João, hoje o papo aqui é futebol. Falávamos de Leônidas, do Pacaembu…

João Sem Medo: – Foi o período da Segunda Grande Guerra, não houve Copa do Mundo. Cobri o fim da guerra na Europa e não estive no Brasil por um bom período na década de 40. Mas a guerra teve grande influência no futebol brasileiro. Palmeiras e Cruzeiro se chamavam Palestra Itália e tiveram de trocar seus nomes quando o Brasil mudou de lado e deixou o Eixo formado por Alemanha, Itália e Japão para se juntar aos Aliados.

Idiota da Objetividade: – E o primeiro jogo realizado no Pacaembu foi justamente entre o ainda Palestra Itália e o Coritiba. O time paulista venceu por 6 a 2, mas o primeiro gol marcado no estádio foi de Zequinha, da equipe coxa branca. No dia seguinte houve outra partida, Corinthians 4, Atlético Mineiro, 2. Na decisão do torneio, uma semana depois, o Palmeiras, maior vencedor de títulos no estádio, iniciou sua série de conquistas no Pacaembu ao vencer o Corinthians por 2 a 1 e levar a Taça Cidade de São Paulo pra casa.

Ceguinho Torcedor: – Mas o momento épico do estádio nos seus primeiros anos foi a estreia de Leônidas com a camisa do São Paulo.

Sobrenatural de Almeida: – Eu estava lá. Segurei o Diamante Negro naquele dia.

Idiota da Objetividade: – Leônidas fez sua primeira partida pelo São Paulo no empate em 3 a 3 com o Corinthians, no dia 25 de maio de 1942. É até hoje o recorde de público no Pacaembu: 72.018 pessoas pagaram ingresso para assistir àquele jogo. O Diamante Negro não fez gol, mas deu uma assistência…

João Sem Medo e Ceguinho Torcedor: – Assistência não!

Idiota da Objetividade: – Ahn… bem, desculpe. Leônidas não fez gol, mas deu o passe pro primeiro gol do São Paulo, marcado por Lola, que empatou o jogo pela primeira vez naquela histórica tarde.

A execução instrumental do Hino do São Paulo na gravação de Hélio Ziskind se encerrava, enquanto Flauzino e Florêncio subiam ao palco. Assim que terminou o Hino do São Paulo, eles começam uma conversa entre eles, entoam a “Moda da Laranja”, composição da dupla com Ari Machado, o público fica sem entender o motivo de eles tocarem aquela música, mas logo os dois emendam a “Moda do Estádio do Pacaembu”, de Ari Machado, e “aí sim!”, disseram todos, quase em coro.

Florêncio: – Desculpe a música extra, gente. Obrigado.

Flauzino: – Foi a “Moda da Laranja”, antes…

João Sem Medo: – Nada a ver com a Holanda de Cruyff, né?

Flauzino: – Sim, esta composição é de muitos anos antes. O que a gente queria mostrar mesmo era a “Moda do Estádio Pacaembu”, que Ari Machado fez pra inauguração do estádio. Obrigado.

São aplaudidos e deixam o palco.  

Ceguinho Torcedor: – O Pacaembu foi um dos estádios brasileiros na Copa de 50.

João Sem Medo: – A seleção jogou lá contra a Suíça e empatou em 2 a 2.

Sobrenatural de Almeida: – Eu estava lá naquele dia também.

Idiota da Objetividade: – Foi o único tropeço da seleção brasileira antes da final.

João Sem Medo: – Foi o segundo jogo do Brasil naquela Copa.

Idiota da Objetividade: – O único que a seleção brasileira não jogou no Maracanã. No total, a Copa do Mundo de 1950 teve seis jogos realizados no Pacaembu. 

Garçom: – Ah, o estádio do Pacaembu, que sediou tantos shows musicais, tem outras belas homenagens dos artistas da nossa música. Vou pôr aqui no som “Pacaembu”, de Saulo Schwartzmann, Marcio Okayama e Carolina Tomasi, pra vocês ouvirem.

Fim do capítulo 14