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O SALVADOR DA PÁTRIA

por Sergio Pugliese


O temporal desabou sem aviso prévio e encurralou Roberto Carlos no terreno onde plantava árvores frutíferas. Em minutos, poças se formaram, barreiras caíram e o lamaçal cobriu os principais acessos à área. A única saída para alcançar a estradinha principal era arriscar-se numa pirambeira, escalar um muro, abrir trilhas com a enxada, proteger-se dos raios, ultrapassar duas cercas de arame farpado e uma muralha de bananeiras. Homem do campo experiente, superou os obstáculos. Na pista, avistou um, dois, três, quatro carros entrando num sítio vizinho. Porto seguro, imaginou! Sem preocupar-se com possíveis cães de guarda, invadiu o local. Trôpego e guiado pelos gritos “é feito de açúcar?”, “futebol é para macho!” e “quantos faltam?”, Roberto Carlos acreditou ser miragem aqueles vultos tocando bola num campo totalmente encharcado e ainda sob chuva intensa.

— Estava fraco, podia ser fruto de minha imaginação — recordou, na divertida resenha, pré-pelada, da rapaziada do Águias FIR (Fraternidade, Igualdade e Respeito), no Sítio do Rogério, em Vargem Grande.

João do Muquiço não foi, mas chegaram o parceirão Preguiça; Caê, da Banda Brasil; Guerreiro, segundo-tenente do Corpo de Bombeiros; Seu Acácio, de 71 anos; Dudu; Jacaré; Ronaldo Fernandes, presidente da Unido das Vargens; Baiano; César; Valdir; Roni; Mazinho; Tchola; Claudio; Elias; Badu; Lobo e Junior. O ortopedista Paulo Amaral aproximou-se da rodinha e não acreditou que a história de Roberto Carlos estava sendo contada novamente. São anos e anos ouvindo a mesma ladainha. Mas é bom demais! O ouvidor de nossa equipe, Reyes de Sá Viana do Castelo, explicou que precisava de mais detalhes.

— Continua, Roberto Carlos! — incentivou Mirunga, artilheiro das multidões.

— Pega uma enxada ali, Serginho, vamos deixar a história mais real — sugeriu Rogério Appelt, o dono do sítio, da bola e da pelada, ao lado de Paulista, o fiel escudeiro.

— Reconstituição fica mais caro — avisou Roberto Carlos.

Mas ele foi em frente e, segurando uma enxada e um ancinho, relembrou seus primeiros momentos no sítio invadido, na verdade o Sítio do Waldyr, em Vargem Grande. Saudoso Waldyr! Após esfregar os olhos e constatar que o grupo de marmanjos ensopados não era miragem, caminhou em busca de uma marquise. Numa varanda coberta, apoiou a enxada e a foice, e viu alguns atletas tirarem par ou impar e outros pagarem a mensalidade. Os raios maltratavam as árvores e assustariam qualquer ser humano normal. Mas peladeiro não é normal.

— Na divisão dos times, notaram que faltava um — contou Roberto Carlos.

E, automaticamente, todos os pescoços voltaram-se para ele, um desconhecido! Mesmo totalmente enlameado e abatido, ninguém perguntou se precisava de ajuda, mas em qual posição jogava.

— Lateral direito — respondi.

E jogou! Até hoje, 15 anos depois, Roberto Carlos faz parte da rapaziada. A pelada começou há 30 anos, no Iate Clube Guanabara, na Ilha; de lá, foi para o Sítio do Waldyr; depois, para o Tio Patinhas; e, agora, está no Sítio do Rogério, quarta, à tarde. Os amigos pulam de galho em galho, mas não se desgrudam e arrastam as histórias com eles. Os causos, lendas ou não, ajudam a temperar o churrasco do Bira, a adoçar o refresco de goiaba do Serginho, a afinar o cavaco do Márcio e a manter viva e jovem a memória do Águias FIR.

Texto publicado originalmente na coluna A Pelada Como Ela É, do Jornal O Globo, em 26 de fevereiro de 2014.

TRICAMPEÃO, TRICOLOR, TRILEGAL!

por Mateus Ribeiro


O Grêmio conquistou a Copa Libertadores da América pela terceira vez. Um feito gigantesco, construído por um time sólido, focado, e comandado por uma pessoa que já era um monstro, e que agora se tornou uma lenda: Renato Portaluppi, também conhecido como Renato Gaúcho, como queiram.

Todos sabemos que o Imortal foi, é, e sempre será um dos times mais copeiros do Brasil. A mais nova conquista continental reforça essa teoria, e credencia o Tricolor como um dos únicos tricampeões da Libertadores, ao lado de São Paulo e Santos. Vale ressaltar, que ao lado do Santos, o Grêmio é o único brasileiro a conquistar a América em solo argentino.

O tricampeonato já seria digno de toda e qualquer honra, mas existe algo a ser louvado: as apostas de Renato e da diretoria. A começar pela própria contratação de Renato, que não estava entre os mais cotados no mercado, mas que sempre possui uma identificação gigantesca com o Grêmio. Indo na contramão da nova onda, Renato debochou na cara de toda essa geração “estudiosa”, que tenta transformar o futebol em um cálculo da Nasa. É óbvio, claro e evidente que Renato estuda (e muito) futebol. O ponto central reside no fato dele não precisar ficar de cinco em cinco minutos falando nas entrevistas como se fosse um físico nuclear. Com seu jeito falastrão, foi comendo pelas beiradas, e dando ao Tricolor dos Pampas um padrão tático de dar inveja.


Sobre as contratações, nomes como Bruno Cortês, Léo Moura, Edílson, Cícero, Fernandinho e Jael (O Cruel) estavam longe de ser primeiras opções nas listas de transferências de outros clubes no início do ano. O Grêmio resolveu investir. Deu muito certo. Como esquecer as atuações do critiado Edílson nas semifinais? Como apagar da memória o gol no primeiro jogo da final, na improvável assistência de Jael para Cícero?

Posso afirmar, com toda a certeza, que a conquista do Grêmio é uma vitoria do futebol brasileiro. Renato e seus (ótimos) jogadores mostraram para o Brasil todo que não é necessário gastar rios de dinheiro em jogador supervalorizado, ou que é necessário ser contaminado pelo vírus Guardiola. “Basta apenas” se focar e jogar futebol. E o Gêmio fez isso melhor do que qualquer outro adversário que encontrou no meio do caminho.

Desde Marcelo Grohe até Barrios, todos os jogadores cumpriram muito bem seus papéis. Desde os milagres de Grohe até o golaço de Luan na final, tudo foi perfeito nessa campanha.

O Grêmio é um campeão legítimo, gigante e digno de todas as honras.

Parabéns a todos os torcedores, que deram show, do primeiro até o último minuto. Parabéns para todos os jogadores, desde os consagrados, como Geromel e Luan, até os mais desacreditados, casos dos citados Cícero, Jael, Cortês, Léo Moura, Edílson, Fernandinho e Cícero, que tornaram esse sonho possível.


E o que dizer de Renato? O ÚNICO BRASILEIRO a conquistar a Copa Libertadores como jogador e treinador. Se Renato já merecia um busto, agora merece uma estátua. Você pode o chamar de marrento, fanfarrão, arrogante, usar o termo que desejar. Mas DEVE o respeitar. Tal qual o Tricolor, você também é um imortal agora, Renato.

Comemore, torcedor gremista. Que seja a pé, de carro, de avião. Vá até onde for, venha o que vier, mas esteja com o Grêmio, onde ele estiver.

Hoje, está no topo da América. Que daqui algumas semanas, esteja no topo do planeta. E aí sim, depois que o conquistarem, vocês podem acabar com o planeta.

Parabéns, Grêmio, por mais um capítulo em sua gigantesca historia!

Essa é a homenagem do Museu da Pelada para todos vocês!

POSIÇÃO INGRATA

por Mauro Ferreira


Que posiçãozinha da peste essa de goleiro. Convivi com muitos, fui um deles, mesmo que em peladas pouco concorridas. E, mesmo em peladinhas de rua, sei o que acontece quando você é o responsável pela derrota de seu time. O mundo em volta cai; todos os olhos, até aquele único do pirata caolho, viram-se em silenciosa acusação. Enquanto isso, a memória, essa senhora de personalidade ambígua, esquece todas aquelas outras vezes em que distribuiu adjetivos elogiosos para santas defesas impossíveis. Aliás, a igreja católica jamais irá canonizar goleiros. Fosse assim, Gordon Banks, Iachin, Marcos, Grohe, Mazurckiewisck, Fillol e outros tantos teriam sido santificados.

Goleiros não curam doenças, não apaziguam dores, não diminuem sofrimentos, não salvam vidas. Enfim, não fazem milagres. Jamais serão santos. E muito menos serão paredes, ou qualquer anteparo capaz de evitar que os gols aconteçam. Goleiros não serão muralhas. Mas o Muralha é goleiro, é atleta de futebol, é gente. Só não deveria permitir a transformação do apelido em nome de referência. Muralha – e nenhum outro goleiro – será uma muralha.


Alex Roberto, o Muralha, poderia ser só Alex. Não levaria nas costas a responsabilidade imensa do apelido. É um grande goleiro, foi convocado, por muitas vezes eleito o melhor em campo. Hoje, o peso do apelido, aliado ao peso das críticas, dos xingamentos da torcida e da pecha de frangueiro, diminuiu sua velocidade, seus reflexos, sua autoestima e extinguiu sua liderança entre os jogadores.

Mas há conserto. Basta treinar, jogar e conviver com um divã durante um tempo. Precisa deixar de se achar uma muralha, precisa abandonar o apelido e ser o Alex. Assim. Só Alex. Sem penteados moicanos, sóbrio, atento, rápido e, principalmente, ciente de que irá sofrer gols e irá falhar. E, para esse conserto dar certo, é necessário que jogue. Jogue o próximo jogo, o próximo, o próximo e o próximo. Sua cidadela, saiba ele, será transposta. Afinal, o Alex não é muralha. Jamais será. Mas é, sim, um ótimo goleiro.

MALDITO PARABÉNS

por Rodrigo Ancillotti


“Um, dois, três, quatro, (…), vinte, vinte e um… Parabéns pra você, nessa data querida…”

Acho que todo botafoguense um pouco mais “rodado” (por volta dos 40 anos, que é meu caso) já se revoltou ouvindo essa “linda cantiga” nos estádios Brasil afora! Desde um clássico no Maracanã até os rincões mais inóspitos, nosso Glorioso e sua torcida eram recebidos assim para não esquecermos nunca: vivíamos a maldita fila!

Não tenho ideia de quando alguém se tocou e cantou a pedra. Acredito que lá pelo final dos anos 70, talvez lá por 1978, quando completamos a primeira década de seca absoluta. Muito menos qual foi a primeira torcida adversária a nos zoar cantando esse “Parabéns pra Você” miserável que aumentava a cada temporada e que parecia nunca ter fim.


Mas temos que dar o braço a torcer: que achado!! Afinal, até o botafoguense mais zen saía do sério! O que argumentar? Desde 1968, ironicamente depois daquele timaçoaçoaço que todo torcedor, do mais jovem ao mais cascudo, sabe recitar: Cao, Moreira, Zé Carlos, Leônidas e Waltencir; Carlos Roberto e Gérson; Rogério, Roberto, Jairzinho e Paulo Cézar, Zagallo no comando. Um time que foi BIBI (Taça GB e Carioca) em 1967 e 1968, campeão da Taça Brasil de 1968 e base da melhor seleção brasileira de todos os tempos.

Mas que depois dele… NADA!!

Um raro turno de Estadual aqui e ali, boas campanhas tanto no Brasileirão quanto em Libertadores, e até o recorde brasileiro de invencibilidade entre 1977 e 1978 (52 partidas invicto), mas título que é bom…

Ao contrário: só pancadas!! A perda da sede de General Severiano, o exílio em Marechal Hermes, penúria crescente, presidentes incompetentes (o que dizer de Charles Borer, meu Deus?)… Até o “Nós gostamos de vo6”, uma das nossas poucas alegrias nesse tenebroso inverno, vimos acabar em 1981!! E a contagem só ia crescendo!! Onze, doze, treze, quatorze…

Nesse meio, a Gloriosa Torcida acreditando de teimosa, indo da esperança de um Don Sebastião que não chegava nunca para nos conduzir de volta às glórias à perplexidade-sarcasmo de um Barão de Itararé achando que “daonde menos se esperava é que não saía nada mesmo”!! E tendo que aturar ouvir esse “Parabéns pra você” dos infernos até de torcidas dos quilates de Olarias, Mesquitas e Novas Cidades da vida!!


E era assim que nos sentíamos em janeiro de 1989. Ao contrário de um ano antes, quando vimos “seo” Emil Pinheiro, nosso vice-de-futebol-mecenas-financiador-bicheiro-de-plantão, montar mais um timaço que não chegaria a lugar nenhum (quanto custaria hoje contratar, de uma tacada só, jogadores da categoria de Mauro Galvão, Paulinho Criciúma, Marinho e Cláudio Adão??), a única chegada era de mais um técnico: Valdir Espinosa, pela primeira vez no Rio de Janeiro.

E quando menos se esperava… finalmente a “festa de aniversário” chegou ao fim!! Tema para uma próxima oportunidade!! Saudações Alvinegras!!

 

 

ESPIONAGEM INDUSTRIAL

por Idel Halfen


Às vésperas da decisão da Copa Libertadores da América 2017 surgiu a notícia de que uma das equipes, o Grêmio, estava se utilizando de um drone para espionar os adversários, fato que causou certa comoção no meio esportivo. Aliás, uma semana antes a seleção de futebol de Honduras levantou a mesma suspeita em relação a da Austrália.

Vale ter em mente que a obtenção de dados secretos não se constitui uma ação criminosa e sim a forma como é feita essa captação. A falta de embasamento jurídico não permite que esse artigo tenha uma avaliação sobre esse caso, porém, é necessário ressaltar que a espionagem é muito mais comum do que se pode imaginar e acontece das mais variadas formas.

No varejo, por exemplo, é bastante usual encontrar encartes promocionais de diferentes redes com produtos coincidentes, o que é até normal já que esses costumam ter maior atratividade, no entanto, em muitas das vezes a divergência de preço equivale a R$ 0,01, isso mesmo, um centavo, o que não parece ser mero acaso. 

As desconfianças sobre o vazamento acabam recaindo mais fortemente sobre o próprio fornecedor ou sobre as gráficas que imprimem os encartes, o que não significa que o “espião” esteja restrito a esse universo. Na verdade, até as salas ao lado ou mesmo um integrante do próprio departamento pode ser o responsável pela “delação”.

Claro que nesse caso o estrago não é tão grande assim, contudo, existem situações em que só restam os tribunais como destino.

Para ilustrar o assunto, alguns episódios serão citados, ressalvando, como foi escrito acima, que a incidência de casos é bem significativa, apesar de poucas virem à tona.
No início desse século, a Procter & Gamble contratou uma empresa para espionar a Unilever nos EUA e foi descoberta após um dos detetives contratados ser flagrado revirando o lixo da concorrente. Nesse caso, o acordo para o pagamento de uma indenização de US$ 10 milhões evitou que o processo seguisse na Justiça.

Outro acontecimento emblemático se deu no mercado de brinquedos, onde a Mattel espionava a MGA através de pessoas que, com crachás falsificados, entravam nas instalações da concorrente para fotografar os produtos que seriam lançados. Com isso a Mattel, por ter uma estrutura maior, conseguia produzir e colocar mais rapidamente no mercado tais produtos, o que fazia parecer que ela que era copiada. Após ter sido descoberta, a empresa foi processada e condenada a pagar US$ 300 milhões.


Há ainda as ocorrências em que os próprios colaboradores passam as informações confidenciais para a concorrência, como aconteceu quando um funcionário da Gillette enviou um projeto para a Bic, que reagiu devolvendo o material com uma declaração de que não é adepta desse tipo de prática.

Os três exemplos citados não dão margem a dúvidas quanto ao desvio de conduta por parte dos envolvidos, entretanto é importante que não se confunda “espionagem industrial” com “inteligência competitiva” sobre a qual escrevi um artigo – http://halfen-mktsport.blogspot.com.br/2011/11/inteligencia-competitiva.html. Ou seja, buscar informações sobre os movimentos da concorrência ou adversários é uma prática usual e perfeitamente aceita pelo mercado, a forma como essas são obtidas é que dão ao evento o cunho legal ou não da operação.

Voltando ao suposto drone, a surpresa do ato advém do uso da tecnologia, visto não ser inédita a utilização de “espiões” para a busca de referências. Devendo ainda ficar claro que tão importante quanto as informações é o uso que se dará a elas, alertando que na mão inversa pode haver um trabalho de contra espionagem para bloquear os acessos ou mesmo disponibilizar dados errados.