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MASOQUISMO

por Rubens Lemos


Jogo e treino de seleção brasileira – de qualquer categoria – são atividades decisivas para o currículo de qualquer masoquista juramentado. É assistir, se irritar, chamar palavrão, desligar e ligar de novo a televisão para ver nulidades sem recurso e passeando lerdas pelo gramado.

Em especial o Brasil de Tite, conseguiu construir uma ponte imaginária entre defesa e ataque. A bola só sai de um setor até o outro na base do chutão e na canelada. É que mataram deixando em decúbito dorsal o meio-campo, área nobre de uma peleja, onde pontificaram craques e monstros sagrados.

É masoquismo olhar para Casemiro, pobrezinho, o camisa 5 atual e lembrar Clodoaldo de 1970 ou Paulo Roberto Falcão, dominando a bola do alto até o chão no biquinho da chuteira, sem fazer força, a bola querendo ficar e os craques desejando o fluir do ataque.

A gente olha para a camisa 8 de Arthur e é uma tremenda sacanagem com: Zizinho, Didi, Jair Rosa Pinto, Gerson, Sócrates, Geovani, Adílio, Silas, Paulo Isidoro, Mendonça, Pita, Jorge Mendonça e Jair, do Internacional tricampeão com Falcão.

Arthur foi escolhido após pesquisas científicas. Em busca da mediocridade imbatível, estudaram, colheram dados físicos e traços de personalidade até que o bicho deu em Arthur.

Arthur é a negação dos talentosos natos. Erra o passe a 1 metro de distância do companheiro e é figura proeminente do recurso mais em voga no Sul do país: o carrinho, pela frente ou por trás, para derrubar com dor o adversário de categoria superior.

Philippe Coutinho, mais para chatinho, sujeito emergente que ficou irritadinho, todo fresquinho, não-me-toques, é um abuso à história de Rivelino, Jairzinho, Paulo César Caju, Ademir da Guia, Dirceu Lopes, Zico, Alex, Djalminha, Ronaldinho Gaúcho, Rivaldo, enfim, um atentado ao bom senso e um reforço a quem sofre por convicção e navega nas agonias mais nefandas.


Bem, chegamos ao ataque. Se vocês me dão licença estou rindo alto e sem conseguir chegar ao teclado do computador. Só de pensar que caindo pela direita está Roberto Firmino, o alagoano casado com uma linda loiraça, prova do amor Real $. Roberto Firmino percorrendo caminhos que já foram de Mané Garrincha.

Imaginemos o diálogo fictício:

Mané: É fácil, garoto, parte pra cima “dos” homem e é “só” driblar um a um.

Firmino: Mas seu Mané, não dá para alguém me ajudar não a fazer o dois toques?

Mané(moleque): Quem? (apontando para Casemiro), aquele gordinho é o maior grosso, um passe dele desemprega atacante. Faz o seguinte, pra te ajudar. Corre em linha reta, sem marcação, corta para o meio e bate para o gol, aproveita que está sem goleiro…

Compenetrado diante do alto grau de dificuldade, Firmino, aos tropeços na bola, consegue chegar à marca do pênalti e chuta de joanete, longe da trave nua. Garrincha desiste e volta para a nuvem que ocupa nos céus de Pau Grande (RJ).

É a vez de Neymar, ou “Júnior”. Com cara de quem está querendo urinar ou levou um beliscão, o camisa 10 vai pedalando sobre a bola desde a intermediária, xingando beques que só ele vê.

Chega na área, levanta a bola e solta o voleio. Berra, esperneia, chora, grita “Eu sou melhor que Pelé, eu sou melhor que ele”. Surgem dois gigantes enfermeiros. Aplicam sedativos no rapaz que vai apagando não sem antes suplicar: “Eu quero a camisa 1000, a 10000, a 1 milhão. Eu sou o melhor. O melhor do mundo.“ Ri agora um sorriso abobalhado, patético, de fim de carreira.

A EXCEÇÃO FOI MESMO O LEANDRO

por Zé Roberto Padilha


O calcanhar dos que ocupam a lateral direita, tal como o de Aquiles, tem se mostrado o ponto fraco dos que atuam no futebol brasileiro e mundial. Tão frágil tem se portado seus ocupantes em relação ao resto do time, que Djalma Santos foi eleito o melhor lateral da Copa do Mundo, disputada na Suécia, jogando apenas a partida final. Fico a imaginar a ruindade dos que defenderam seu país, em 1958, atuando naquela posição e perderam a indicação por quem entrou em campo apenas uma vez.

Tão incapaz nosso futebol de revelar um craque por ali que nossos Fagner, com todo respeito, tem cantado melhor do que tem jogado. Fagner, do Corinthians, é triste lembrar, foi nosso titular na última Copa do Mundo. E o Fagner, cantor, que fez 70 anos, encantou outra vez um Viva Rio lotado de fãs. E o tiro de misericórdia na fragilidade da posição acaba de ser dado pelo Tite ao convocar, para os amistosos da seleção, em total desespero, Marcinho, do Botafogo.

Assisto, como todos vocês, filhos, netos que votam no Cartola, quem anda se destacando no atual Campeonato Brasileiro. Muriel, Gerson, Gabigol, Michael, o canhotinho diferente do Atlético Paranaense, tudo bem. Suas atuações saltam aos olhos e todos apostam neles. Mas que jogo foi este do Marcinho que seduziu o Tite que nem meu filho botafoguense, o Guilherme, assistiu? Pelo contrário, já ouvi ecos de “Fora, Marcinho!” aqui em casa e no Engenhão, tão previsíveis tem sido suas exibições.

Carlos Alberto Torres, que era zagueiro, ocupou aquela posição no México porque João Saldanha, em 1969, inovou ao convocar “suas feras”. Pouco importava em que posição atuassem, chamou os melhores e disse que “craques não sentam num banco de reservas”. E se os melhores vestiam a 10, escalou um ataque com os do Santos (Pelé), Cruzeiro (Tostão), Corinthians (Rivelino) e os dois do Botafogo (Gérson e Jairzinho). Era o sistema tático que tinha que se adaptar à genialidade, não o talento se curvar ao 4-3-3 ou 4-2-2.

Deu tão certo que nunca mais tivemos uma seleção tão boa quanto aquela. O capitão até que se saiu bem, deu o tiro de misericórdia na Itália, levantou a taça mas não foi o destaque da posição na competição.

Depois veio o Cafu, que correu muito por aquele setor, fez da lateral direita uma pista de atletismo com barreiras humanas que superava com sua disposição carregando a bola nos pés. Teve seus méritos, bem como Daniel Alves, que veio a seguir mas não resiste quando lhe oferecem uma camisa 10. Que lhe conceda mais liberdade e menos responsabilidade de marcar por aquele setor. A exceção nesta história toda foi mesmo o Leandro.

Ninguém dominou as atribuições ofensivas e defensivas daquele setor como ele. Em 415 jogos pelo Flamengo, onde marcou 14 gols, demonstrou saber marcar com eficiência e atacar com extrema categoria. Convocado por Telê Santana para disputar duas Copas do Mundo, no seu auge, em 1986, foi conhecer a noite mineira com Renato Gaúcho. E chegou tarde à concentração. E o calcanhar direito, seu forte, que deveria lhe ajudar a pular o muro da concentração, falhou e ficou do lado de fora da Toca da Raposa. E ambos foram cortados da seleção.

Com Edson na lateral direita, um outro Fagner tão fiel às suas limitações, não passamos das quartas de final eliminados pela França. A história, implacável, diz que Aquiles, e quem mais fosse vestir a camisa 2, seriam banhados e protegidos pela Deusa Tétis nas água do rio Etige. E apenas o calcanhar direito, e os ocupantes da lateral direita, ficariam do lado de fora.

Agora, só nos resta marcar um amistoso contra a Grécia. E banhar a cabeça do Tite que também esqueceram do lado de fora.

NARRANDO O GOL DO INIMIGO


Charge: Eklisleno Ximenes

Final dos anos 50. De férias em Ubá, sua terra natal, Ari Barroso é apresentado a um jovem locutor esportivo de uma cidade vizinha, do qual falavam maravilhas.

Ari, com a experiência de tantos anos, logo se impressionou com a postura e a voz do locutor, que parecia realmente ser muito bom. Resolveu, então, testá-lo,  visando um possível aproveitamento na Rádio Tupi, na qual era uma das estrelas da narração esportiva.

Dias depois, o recebe no Rio, na sede da emissora. Querendo ver a desenvoltura da jovem promessa, pede que ele narre, de improviso, três lances de um hipotético jogo de futebol.

Enquanto o locutor ficou dentro da cabine, Ari permaneceu do lado de fora, fazendo sinais de positivo ou negativo através da divisória de vidros, muito comum nas emissoras de rádio. 

Assim, o narrador descreveu o primeiro lance, de um fictício jogo entre Flamengo x Botafogo:

Avança o Flamengo com o ponteiro Joel pela direita… É barrado por Nilton Santos. 

A enciclopédia do futebol toca com elegância para Didi no meio de campo…

Didi passa a bola entre as pernas de Moacyr e toca para Garrincha na ponta…  

Mané ginga para um lado e pro outro, finta Jordan, invade pela direita, passa por  Jadir e cruza para a área…  Quarentinha emenda de primeira:

 GOOOOOOOOL do Botafogo!   Qua…ren… ti… nha!

Botafogo, um! Flamengo, zero!

Ari faz sinal de positivo, e sem muita euforia manda narrar o segundo lance. E o narrador continua, agora mais vibrante ainda:

Desce novamente o Botafogo para o ataque… 

Zagalo recebe pela esquerda e toca pra Didi… O Príncipe Etíope se livra da marcação e lança para Paulo Valentim. O avante alvinegro passa por Pavão e abre para Garrincha…

O demônio da pernas tortas passa espetacularmente por Jordan… Dequinha vem na cobertura e também é fintado…

Garrincha cruza… Quarentinha entra de bicicleta:

GOOOOOOOOL do Botafogo:    Qua…ren…ti…nha!

Botafogo,  dois! … Flamengo,  zero!   

A torcida Botafoguense delira. Show de bola no Maracanã! 

E, empolgado, começou logo a narrar o terceiro lance: 

Ataca o Botafogo novamente com Garrincha…

Neste instante, Ari Barroso, furibundo, invade a cabine e interrompe o teste:

–  Meu filho! Afinal de contas, você veio aqui para fazer teste ou para me gozar? 

– Vai radiar jogo do “arranca  tôco”,  lá na sua cidade! 

O promissor locutor, que não sabia da paixão do homem da gaita pelo Flamengo, acabou reprovado no teste.

O ALEMÃO BOM DE BOLA

por Luis Filipe Chateaubriand


Quando penso em um jogador de futebol alemão que jogava demais, penso em Karl Heinz Rummenigge.

Uma característica de seu futebol era a altíssima técnica. Executava todos os fundamentos do futebol com perfeição. Isso, sempre, com absoluta inteligência. 

Outra característica do craque era a frieza impressionante. Nos momentos mais difíceis, conseguia manter-se forte, confiante, altivo. 

Outra característica era a força física, o que fazia do craque alguém que costumava levar vantagem nas divididas contra jogadores adversários. 

Fez uma grande carreira, seja no Bayern de Munique, seja na Internazionale de Milão, seja, ainda, na Seleção Alemã. 

Lembro, claramente, da final Argentina x Alemanha, na Copa do Mundo de 1986, no México. Machucado e longe das melhores condições físicas, Rummenigge está na reserva. Mas, como a Argentina ganha de 2 x 0, acaba indo para o jogo. Joga tanto que o time se transfigura e empata o jogo em 2 x 2 (depois, Maradona faria a diferença para a Argentina, mas essa é outra estória). 

Também é inesquecível a semifinal da Copa do Mundo de 1982, na Espanha. Rummenigge, também fora das melhores condições físicas, está na reserva. O primeiro tempo da prorrogação termina França 3 x 1 Alemanha. Rummenigge vai para o jogo. Em 15 minutos, faz um gol, dá passe para outro e azucrina a defesa francesa. O jogo fica 3 x 3, vai para os pênaltis e, no pênalti decisivo, Rummenigge converte e coloca a Alemanha na final. 

Ainda na Copa do Mundo da Espanha de 1982, jogam Espanha x Alemanha. No final do jogo Rummenigge entra, faz uma jogada genial e manda uma bola por cobertura que… bate caprichosamente no travessão. 

Sérgio Noronha, o Seu Nonô, resume tudo: “Muitos se perguntam se um grande craque de um clube ou seleção em más condições físicas deve ir para os jogos, para que seja utilizado nem que seja em pequena parte destes. Está aí a resposta”.

A resposta é esta: mesmo “baleados”, craques com Karl Heinz Rummenigge fazem o futebol ser mais colorido!

Luis Filipe Chateaubriand acompanha o futebolhá 40anos e é autor da obra “O Calendário dos 256 Principais Clubes do Futebol Brasileiro”. Email:luisfilipechateaubriand@gmail.com.

ARÃO

por Marcos Vinicius Cabral


“Arão era o Patinho Feio e hoje é um ídolo”, disse o treinador rubro-negro Jorge Jesus após a apoteótica exibição do volante e da equipe na vitória por 3 a 1 contra o Atlético-MG, em pleno Maracanã, na última quinta-feira.

Perseguições, vaias, questionamentos e uma vontade grande de mudar o quadro de sua história.

Tanta vontade de mudar que mesmo estando numa grande vitrine como é o Flamengo, nunca se arriscou a bater faltas em uma partida sequer, desde sua chegada em 2016.

Porém, vem treinando no CT Ninho do Urubu, com aproveitamento convincente.

Bem-humorado, desconversa quando alguém o elogia: “Isso aí a gente deixa pra surpresa. Deixa quieto, a gente vai trabalhando quietinho. Se tiver oportunidade, vou tentar bater ali, mas deixa quieto”, afirmou sacudindo a vasta cabeleira que se tornou sua marca registrada.

E não será surpresa mesmo que numa bola dessas da vida em uma partida, ele bata e converta.

Poderia ser contra o Grêmio ou talvez contra o River ou Boca…vai saber!

O futebol tem muito disso e com Willian Arão não seria diferente.

Titular mas com ressalvas por quase todos os treinadores que trabalharam no Flamengo, ele usou a camisa 5 sem muito brilho desde quando saiu brigado do Botafogo.

Nascido em São Paulo, no terceiro mês do ano – o mesmo em que Zico, Uri Geller e Leandro deram seus primeiros choros em vida – o predestinado Bola de Prata do Campeonato Brasileiro de 2016 vem sendo um trunfo para o esquema de Jorge Jesus.

Cresceu no momento certo junto com a chegada do português e, vestindo a 5, pode fazer história.

Já vestiu a faixa de Campeão Carioca neste ano, pode vestir em dezembro a de Brasileiro e se vencer a Libertadores, pode – e por que não? – reencarnar o futebol produtivo do paraibano Leovegildo Lins Gama Júnior, na reedição da final contra o Liverpool 38 anos depois.

E com esse peso às costas, tem a responsabilidade de vestir um número que no panteão do futebol mundial diz muita coisa.

Sim, estamos lembrando de Zidane e Falcão também.

Tecnicamente ele não chega perto desses figurões da bola, mas com sua intensidade e vontade de superar seus limites, pode ir mais além do que qualquer cético ousaria apostar.

Arão pode surpreender os que nele não confiavam mas pode também – e deve para o bem do futebol – mostrar que nem todo camisa 5 tem apenas a obrigação de marcar.

Arão é uma espécie em extinção no atual cenário do futebol.