JOGOS INESQUECÍVEIS – FLAMENGO 1 X 0 VASCO DA GAMA, EM 1978
por Luis Filipe Chateaubriand

Naquela tarde de domingo de 1978, o Vasco da Gama jogava pelo empate para conquistar o segundo turno do Campeonato Carioca de Futebol.
No entanto, se o Flamengo vencesse, seria campeão do estado, pois já havia vencido o primeiro turno e, assim, conquistaria também o segundo turno.
O jogo começou como seria previsível: o Flamengo, atacando; o Vasco da Gama, se defendendo e tentando jogar nos contra-ataques.
O rubro-negro, do técnico Cláudio Coutinho, foi criando chance atrás de chance. Mas todas elas paravam nas mãos do goleiraço Emerson Leão, que fazia uma partida de altíssimo nível.
E, assim, o Vasco da Gama, do técnico Orlando Fantoni, parecia que conquistaria o segundo turno. Parecia…
Inclusive, no único contra-ataque vascaíno que merece ser citado, já no final do jogo, Paulinho Piracicaba saiu na cara do gol, mas chutou bisonhamente!
O jogo se encaminhava para o seu encerramento.
Mas eis que, em uma pressão do “Mais Querido”, o lateral cruz-maltino Marco Antônio, sem necessidade, colocou a bola para escanteio.
Para a surpresa de muitos — dir-se-ia mesmo de todos — Zico foi bater o corner. Eram 43 minutos do segundo tempo.
Ao fazer a cobrança, este escriba suspeitou que Zico fez um leve aceno com a mão, para que Rondinelli fosse para a área. Seja como for, Rondinelli foi.
Roberto Dinamite, que devia acompanhar Rondinelli, ficou estático na meia-lua.
O cruzamento saiu alto, preciso, e alcançou Rondinelli na entrada da pequena área, enquanto o zagueiro vascaíno Abel ficou preso ao chão, observando.
Rondinelli testou com força, com violência, com precisão — no alto e no canto direito do goleiraço Leão — que, desta vez, não pôde fazer nada.
Flamengo 1 x 0 Vasco da Gama.
Ainda houve tempo, no jogo, para Zico e Guina se desentenderem e ambos serem expulsos.
Mas a meia dúzia de defesas espetaculares de Leão não serviram para nada…
O Flamengo venceu o jogo, sagrou-se campeão e, nos seis anos seguintes, ganharia tudo que é possível no futebol, tornando-se o maior protagonista do “Esporte Bretão” do país!
MINHA VIDA E BRASIL X ITÁLIA
por Rubens Lemos

Está marcada para o dia 5 de julho a cirurgia que farei para extirpar um câncer de próstata. Quem me conhece, minimamente, sabe o quanto estou nervoso e tenso apesar da qualidade do responsável pelo procedimento, o médico urologista Verdi Dantas Júnior.
A data coincide com o 43o aniversário da derrota da magnífica seleção brasileira de futebol para a Itália por 3×2, uma tragédia segundo milhares (eu me incluo) de contemporâneos que testemunharam a frustração e, de forma fidedigna, conservam o sentimento de fracasso ou de quase-vitória passe o tempo que for.
Desde aquela tarde de um dia de semana inglesa, proferi palavrões em português claro e assumi o meu medo de fantasmas. Paolo Rossi, o autor dos três gols italianos, elegi um Nosferatu impeditivo de um carnaval em meio de ano num país em Ditadura em capítulo derradeiro.
Tenho medo de sofrer outra vez a agonia daquele 5 de julho. Era apenas um menino cheio de sonhos a desafiar quem achava o timaço de 1970 impossível de ser superado. Era uma criança intrometida em conversas de adultos e convicta como são as crianças de que sairíamos da Espanha com a Taça de excesso de bagagem.
Se bem que um grupo de 11 jogadores com Serginho Chulapa de centroavante desce, em alguns degraus de fantasia, a história de pensamentos deliciosos que o Brasil conseguiu repetir a cada um dos quatro primeiros jogos. Serginho Chulapa foi a antítese da virtude, o contrário do orgasmo, o centauro derrotado.
A perda de um simples jogo, como disseram alguns que nunca gastaram os fundilhos da calça ou chuparam laranja pura em arquibancada imunda, não seriam suficientes para tornar cada um amante do futebol, expulso do impulso de ser pátria, a pátria de ninguém do livro do gênio François Silvestre, meu amigo França exilado em Martins, a 300 km de Natal.
Costumo buscar nos cemitérios, por onde ando sem medo, contradição do meu trauma de almas penadas, a paz que encontro no silêncio ausente das ruas de uma cidade transfigurada. De uma Natal cada vez maior e espremida no seu próprio aspecto de miniatura deliciosa quando era uma aldeia.
Caminhar por túmulos é conhecer a igualdade entre os humanos defuntos, falecidos e finados, nenhum maior que o outro, mesmo que mausoléus se atrevam a contrariar a regra estabelecida sabe-se lá por quem ou pelo Deus que, católico, acredito que decida na prorrogação final.
Aquela derrota de 5 de julho foi fatal para uma geração inteira de pretensos adolescentes humilhados pela interrupção do querer ser tetracampeão e acima de tudo, ser tetracampeão jogando melhor do que os vencedores de 1958, 1962 e 1970.
Não havia Pelé, mas existiam Zico, Sócrates, Falcão, Leandro, Júnior, Eder, Paulo Isidoro, Oscar e Luisinho, o meia que atuava como quarto-zagueiro.
Tínhamos uma equipe a bailar em qualquer cenário com um coreógrafo teimoso a comandá-la. Telê Santana pagou por não escalar, pelo menos uma vez, Edinho, Batista e Roberto Dinamite, o artilheiro de sorriso triste, humilhado ao não ser relacionado sequer para o banco em nenhuma das quatro pelejas.
Brasil 2×3 Itália foi a maior desgraça futebolística nacional, semelhante apenas ao Maracanazo de 1950, quando os uruguaios vieram aqui, carregando chuteiras no ombro e nos venceram, sepultando, em metáfora doída , um estádio com 200 mil pessoas.
Quem sofre como eu os 3×2 perdidos esquece que a Itália era um timaço, com o quarentão Dino Zoff no gol, o líbero Scírea comandando o time na saída da defesa para o meio onde estavam dois solistas, Tardelli e Antognioni. E, no ataque, Paolo Rossi, Bruno Conti e Graziani. Eles eram bons, mas foram os intrusos de uma comoção coletiva que se encaminhava para a decisão do Mundial da Espanha.
Se aproxima o momento de minha cirurgia. Já recebi sugestões de não falar sobre o maior trauma de minha vida na coluna. Minha diferença é não ser cópia. Minha vontade é ser verdadeiro o tempo todo. Assim, dia 5 de julho, Doutor Verdi me fará vingar 1982, arrancando o Paolo Rossi que carrego da cintura para baixo e me deixando ser o Quixote de cada dia.
O COMEÇO DO FIM DO MUNDIAL DE SELEÇÕES
por Reinaldo Sá

Prestes a completar um século de existência, a FIFA aposta todas as suas fichas em um torneio mundial que reúne os principais vencedores dos seis continentes do planeta. Com uma jogada de marketing de alto nível, essa primeira edição com 32 clubes nos leva a uma nova realidade — e a um questionamento: o que vale mais hoje em dia, jogar pelo clube ou pela seleção do seu país?
As pátrias estão interligadas em um intercâmbio sem fim, que leva muitos atletas a buscarem uma dupla nacionalidade para alcançar a principal vitrine do futebol mundial: o continente europeu. Afinal, é lá que estão os maiores investimentos, concentrados nos clubes de primeira linha.
As mudanças começaram em 2000, com um torneio realizado no verão brasileiro, sediado em São Paulo e no Rio de Janeiro. Na época, o Brasil era tetracampeão mundial de seleções, e os títulos continentais e intercontinentais eram dominados por argentinos e uruguaios. Os confrontos entre sul-americanos e europeus aconteciam, inicialmente, em duas partidas. Depois, a partir de 1980, a Toyota adquiriu os direitos exclusivos para realizar a decisão em jogo único.
Essa metamorfose no contexto futebolístico faz com que as pátrias se tornem apenas o local onde o clube está sediado — e não mais as seleções como base de formação dos atletas, como um dia já foi. Que o diga o Brasil.
Enquanto isso, a Copa do Mundo de seleções, agora com três sedes e 48 participantes, começa a sofrer um processo de esvaziamento nos bastidores. Resta-nos aguardar as cenas dos próximos capítulos até o centenário do mais importante torneio de seleções. Nessa queda de braço, afinal, quem será o verdadeiro campeão mundial: os clubes ou as seleções?
92 ANOS DA LENDA VIVA
por Elso Venâncio

Ao ser reconhecido enquanto caminhava na praia ou nas ruas de Ipanema, a lenda viva Evaristo de Macedo conversava com todos. Bem humorado, sempre gostou de relembrar a sua carreira de jogador, além das seleções e dos clubes que dirigiu mundo afora. Dentro das quatro linhas, foi o primeiro brasileiro a atuar e ser ídolo nos dois gigantes espanhóis, protagonistas de uma rivalidade que transcende o futebol. O Real Madrid representa a realeza, enquanto o Barcelona é um símbolo do povo catalão e do seu desejo de independência. “Sou bem tratado nos dois e sempre convidado para suas festas”, afirma Dom Evaristo.
Revelado pelo Madureira, Evaristo de Macedo fez sucesso com a camisa do Flamengo. Após se destacar no segundo tricampeonato carioca do clube, em 1953, 1954 e 1955, o craque decidiu deixar a Gávea para jogar no Barcelona. “O passe era meu e negociei direto com os espanhóis”, conta Evaristo, que ostentava o fato de ser o camisa 10 da Seleção Brasileira. Na época, a antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD) só convocava quem atuava no Brasil. “Pelé só surgiu na Copa da Suécia porque eu fui para a Europa”, garante, com sua habitual irreverência.
A ida para o futebol espanhol rendeu bons frutos. Evaristo é tetracampeão da centenária La Liga, com dois títulos pelo Barcelona e dois com o Real Madrid. Após pendurar as chuteiras, teve uma vitoriosa carreira de técnico. Passou por dezenas de clubes, sobressaindo-se principalmente no Flamengo, no Santa Cruz e no Bahia, onde dá nome ao centro de treinamento. Entre outros trabalhos, levou o Catar a duas Olimpíadas. Também dirigiu a Seleção Brasileira, em 1985, e no ano seguinte a do Iraque, na Copa do Mundo disputada no México.
Evaristo de Macedo era o ídolo de Washington Rodrigues. Nas três vezes em que dirigiu o Flamengo (1993, 1998-1999 e 2002-2003), teve indicações do inesquecível Apolinho. Uma das passagens ficou marcada pelo encontro com o astro Romário, que tinha poderes e regalias que nenhum outro jogador teve na história rubro-negra. Às vezes, nos intervalos dos jogos, Romário fazia duras afirmações: “O Maracanã está cheio por minha causa. Vocês não jogam porra nenhuma”. Certa vez, o Flamengo perdia por 1 a 0 para o Atlético Mineiro, e Romário estava furioso. Decidido, Evaristo partiu para cima do Baixinho:
— Acabou? Foi a última vez que você grita no vestiário! Aqui, quem manda e fala sou eu!
No segundo tempo, Romário empatou o jogo e foi comemorar no banco, descontraído, apontando para o treinador: “E aí? Já fez gol assim?”. Em jogada individual, marcou de novo e virou para 2 a 1, motivo para nova provocação: “Meu técnico, gostou?”, perguntou o artilheiro, rindo, abraçado com os companheiros.
Romário gostava de escalar os times. Cercado de amigos, pedia a algum deles para conversar com os treinadores. Com Evaristo, nem pensar! Os dois acabaram se entendendo e ficaram próximos. Antes dos treinos, Evaristo contava histórias e completava no final: “Eu joguei mais que o Baixola. Muito mais”. Romário ria como criança.
Nascido no Engenho Novo, o carioca Evaristo de Macedo tem vários feitos históricos. Um deles é o de, até hoje, ser o único atleta a marcar cinco gols num mesmo jogo pela Seleção Brasileira. Foi na goleada por 9 a 0 sobre a Colômbia, em 1957, pelo Campeonato Sul-Americano. Morador de Ipanema, Dom Evaristo completará 92 anos no próximo domingo, dia 22, sendo uma das maiores lendas vivas do esporte mais popular do mundo.
MARACANÃ – O TEMPLO DOS DEUSES
por Ricardo Alves (Rico)

Ah, meu caro, quem viveu o Maraca nos anos dourados sabe que ali não era apenas cimento e arquibancada, era paixão pura! Hoje, esse colosso do futebol mundial apaga 75 velinhas — e cada uma delas é uma lembrança que faz o coração bater mais forte.
Quantos craques desfilaram por ali: Pelé, o Rei e seu milésimo gol; Garrincha, o anjo das pernas tortas; Nilton Santos, a enciclopédia do futebol; Beckenbauer, o Kaiser; Zico, seu maior artilheiro; até Lionel Messi deu o ar da graça. Foi ali, meu amigo, que a bola chorou e sorriu, que a galera vibrou como nunca.
Quem esquece aquele 16 de julho de 1950? Brasil e Uruguai na final da Copa. O estádio fervia como caldeirão de feijoada. Todo mundo de radinho na mão, terno engomado e charuto na boca. A bola rolou, o gol de Friaça, o grito entalado na garganta… e de repente, um silêncio mortal. O Maracanã virou trauma nacional.
Mas o tempo não para, dizia o poeta. Em 2016, o ouro olímpico — tão esperado, tão sonhado — foi carimbado no peito do Maraca. Uma nova geração chorou, mas de alegria.
Quantos gols de placa não saíram dali? Quantos gritos de “goooool” ecoaram por aquelas arquibancadas de concreto? Até a música se rendeu ao Maraca: Sinatra cantou e encantou o público, Paul McCartney fez marmanjo chorar de emoção.
O tempo passou, vieram as reformas, a geral virou saudade, mas o Maracanã continua lá: imponente, altivo, de braços abertos como o Cristo Redentor. O concreto pode ter mudado, mas o coração da bola continua batendo forte.
Parabéns, Maracanã! Parabéns a todo torcedor que já vibrou ali, que chorou, que riu, que abraçou o vizinho de cadeira. Porque ali, meu amigo, é o verdadeiro TEMPLO DOS DEUSES!