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RECEITA DE FUTEBOL QUE VEM LÁ DO CEARÁ

por Nando Antunes


BANDEIRA DO CEARÁ :::: O Ceará está de parabéns porque além de nos passar as receitas maravilhosas de sua culinária, agora também nos dá, de "mão beijada", uma receita otimista do velho e bom futebol brasileiro.

BANDEIRA DO CEARÁ :::: O Ceará está de parabéns porque além de nos passar as receitas maravilhosas de sua culinária, agora também nos dá, de “mão beijada”, uma receita otimista do velho e bom futebol brasileiro.

No final de setembro, participei de palestras em algumas cidades do Ceará, na companhia sempre prazerosa do competente amigo Rondinelli, nosso deus da raça, e de Francisco Ribeiro, grande incentivador do futebol interiorano daquele estado. Percorremos algumas cidades serranas e o nosso ponto de partida era sempre na cidade de Reriutaba. Ali, além de palestras para atletas mirins, entregamos os troféus de campeões e vice-campeões amadores de Reriutaba. É impressionante, mas alguns jogos, à tarde, num dia útil da semana, lotam os estádios. No dia seguinte, fomos a Guaraciaba do Norte, localizada no alto da serra, a 900 metros de altitude. Participamos da solenidade de fundação da liga independente de futebol da cidade, com representantes de mais de 50 clubes. Ao lado do prefeito da cidade tivemos o prazer de ver o presidente de cada clube recebendo o documento legal, com o seu devido CNPJ. Fomos também a Croatá, São Benedito, Ypu e Cariré. Em todas as regiões, fomos muito bem recebidos e ficamos impressionados com a organização crescente no futebol amador do Ceará. Sem dúvida, um caminho a ser seguido para melhorar a nova estrutura de nosso futebol e sair do fundo do poço.

Nestas cidades que citamos acima, a criação da liga independente foi uma grande sacada. Em reriutaba participam do campeonato anual 24 clubes na série A e 24 clubes na série B. Em Guaraciaba do Norte, esse número é superior. Em Ypu, Cariré e São Benedito, a mesma coisa. Nestas seis cidades, se somados, são mais de 340 clubes, todos muito bem estruturados e amadores. Ora, como o nosso país tem mais de 5.000 municípios, pode-se imaginar a imensa quantidade de clubes disputando competições organizadas por ligas independentes e que não precisariam se curvar às federações e muito menos à CBF. Seriam dezenas de milhares de clubes por este Brasilzão, em campeonatos municipais. Com certeza, daí começaria a despontar futuras promessas para o nosso “caidinho” futebol brasileiro.

Receita simples que os municípios do Ceará estão passando para os demais municípios brasileiros. Isto não é uma ideia, mas uma realidade e deve ser copiada.

Fomos felizes testemunhas desta nova emancipação, tão simples e muito motivadora de jovens em seus respectivos municípios. O interior do Ceará está de parabéns porque além de nos passar as receitas maravilhosas de sua culinária, agora também nos dá, de “mão beijada”, uma receita otimista do velho e bom futebol brasileiro já desgarrado do que há de pior no futebol: a perpetuação de falsos donos do futebol. Que outros municípios usem esta receita, simples e eficiente.

O ONTEM, O HOJE, O SEMPRE

por Marcelo Rodrigues

Com as semifinais da Liga bombando, com os confrontos acirrados entre Carlos Barbosa e Sorocaba, e o de mais tarde, Orlândia x Corinthians, veremos a partir da segunda que vem, dia 23, e, depois, dia 30, os vencedores disputando as partidas da grande final. Por merecimento as quatro melhores equipes chegaram nas semifinais.

Agora é o detalhe do detalhe. Um bom goleiro, um lance de gênio, quebra de velocidade, velocidade extrema, pressão, quebra de pressão, lances individuais, boas mexidas e sacadas, arbitragem, lances polêmicos e fator quadra, tudo pode ser decisivo.

E na mão de quem ficar o título, estará bem guardado.

Sorte a todos e que o futsal saia ainda mais vencedor!!

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Adilson, Serginho, Celso e Aécio. O quarteto do Vila, um dos melhores de todos os tempos

Adilson, Serginho, Celso e Aécio. O quarteto do Vila, um dos melhores de todos os tempos


O craque Adilson no lançamento  de seu livro

O craque Adilson no lançamento  de seu livro

O fim de semana nos trouxe ainda uma grande nostalgia. 

No sábado, pela manhã, pelada no Clube Caça e Pesca, capitaneada por Mauro dos Santos (Mauro Bandit) e, em seguida, encontro no Vila Isabel com os craques de todas as épocas para prestigiar o lançamento de livro “Futebol de Salão, a origem”, do craque Adilson. Foi emocionante registrar o encontro entre Serginho, Adilson, Aécio e Celso, quarteto do Vila, um dos melhores de todos os tempos. À noite, encontro com os astros do máster do Corinthians e da seleção paulista de veteranos, numa deliciosa resenha, no bar Divino. Domingo, logo cedo, amistosos entre o máster do Botafogo e do Corinthians, e do super máster de Rio e São Paulo.

Boleiros de várias gerações, piadas, “pilhas”, histórias fantásticas e a certeza da felicidade ao ver vários ídolos.

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A magia está no ontem, a realidade está na telinha com a Liga e o futuro tem que ser a UNIÃO entre magia e profissionalismo.

O Lulu Santos disse:

“Nada do que foi será, de novo do jeito que já foi um dia. Tudo passa, tudo sempre passará!”.

A minha imagem desses caras não vai passar nunca, assim como o profissionalismo que hoje se torna fundamental, não pode ser esquecido.

Nossa filosofia de jogo sendo mantida, nossos gênios se adaptando e o profissionalismo invadindo, esse é o FUTURO e é nisso que aposto. Quem estiver fora desse pensamento, ou não respeita nossos ídolos, parou no tempo. Eu respeito muito as duas coisas.

Aqui é FUTSAL NA VEIA.

PS: volto semana que vem falando sobre as finais da Liga.

AS JOBETES

texto: Sergio Pugliese | foto e vídeo: Rodrigo Cabral


A escalação, da esquerda para a direita: Françoise Imbroise, Daniella Sholl, Mariucha Moneró e Fabiana Sobral. Abaixadas: Isabela Kassow, Marcia Penna Firme, Eliane Bardanachivili, Leila Youssef e Leila Magalhães.

A escalação, da esquerda para a direita: Françoise Imbroise, Daniella Sholl, Mariucha Moneró e Fabiana Sobral. Abaixadas: Isabela Kassow, Marcia Penna Firme, Eliane Bardanachivili, Leila Youssef e Leila Magalhães.

A primeira a entrar “em campo” foi a técnica Mariucha Moneró, talvez para manter intacta a fama de disciplinadora. Pura impressão. De cara, chutou o balde e pediu chope e pizza. Em seguida, surgiu, elegantérrima, a goleira Isabela Kassow, de óculos, marca registrada que não dispensava nem durante as partidas incendiárias no campo chapiscado do Mimosão, apelido da quadra do Sindicato dos Metroviários, vizinho à Vila Mimosa, onde aconteciam os torneios de futebol entre os jornais cariocas. Foi o primeiro brinde da noite, na Fiorentina, no Leme, palco escolhido pelas ex jornalistas do JB para o reencontro, 23 anos depois, do timaço da redação.

– Só eu mesma para convocar uma goleira de óculos – divertiu-se Mariucha, que na época integrava a editoria de Esportes e dividia a função de técnica com o saudoso Oldemário Touguinhó. 

Bastou um jogo para Oldemário perceber que o time das coleguinhas era, digamos, debilitado tecnicamente. Não perdeu tempo e marcou treinos noturnos, secretíssimos, no campo do América para aprimorar os chutes, trocas de passes e criar jogadas ensaiadas. A evolução foi visível!

– Chegou Daniella Sholl! – anunciou Mariucha.     

Foi Daniella quem postou a foto do time no Facebook, o que gerou um caminhão de curtidas e a ideia do evento. Camisa 10, formava com Malu Fernandes um ataque devastador. A outra atacante era Eliane Bardanachivili, a quarta a chegar e emendar no chope. Ninguém tinha jogo no dia seguinte! Mariucha revelou que sofria uma pressão enorme para substituir Elaine porque ela insistia em chutar para o próprio gol. Bardana gargalhava! Aos poucos, a Fiorentina foi ficando pequena. Devido a histeria, por conta da chegada de cada estrela, teve muito cliente mudando de mesa. Também pudera, até embaixadinha Dani Sholl resolveu fazer dentro do restaurante!!!

– Cuidado com os pratos – suplicou um garçom.

Das atletas que estavam na foto apenas Françoise Imbroise, confundida com Kiki Ramalho, não pode ir porque estava em Minas. Mas as outras confirmaram: Dani Sholl, Mariucha, Celia Abend, que vendia empadas nos jogos e era a presidente da Liga das Senhoras Decentes do JB, a pontinha Fabiana Sobral, Isabela Kassow, Marcia Penna Firme, que jogava de meias Kendall, Eliane Bardanachivili e a talentosa dupla de Leilas, Youssef e Magalhães, a última a chegar por conta do temporal. Mas foi!!! A torcida também compareceu em peso! Paula Santa Maria, Elba Boechat, Isabela Abdala, Marcus Veras, Paulo Maurício, o massagista Octávio Guedes, Viviane Cohen, Dulce Jannoti e Cláudia Antunes.

– Chegou Stelinha!!! – berrou Fabiana.

A competitiva Dani Sholl ergueu a sobrancelha, franziu a testa, fez cara de poucos amigos. Tinha motivo. Stelinha era estrela de O Dia de quem as “jobetes” nunca venceram. A turma do deixa disso não precisou entrar em cena, mas Dani ficou bicuda. O time da Riachuelo era uma máquina, treinada pelo eterno Tim Lopes. Tinha Marluci Martins, Martha Esteves, Marta Mendonça, Renata Schmitt, Renata Fraga, Rachel Vita, Rosane Bekierman e a própria Stellinha Moraes.

– Não posso negar, mas elas não viam a cor da bola – arriscou-se a dizer, protegida por Fabiana Sobral e Isabela Kassow, que depois foram companheiras de redação.

O clima era de festa! Reencontros emocionam, ainda mais de jornalistas cheios de boas histórias para contar. Mariucha lembrou que foi a primeira mulher de jornais brasileiros a cobrir uma Copa do Mundo. Amava Esportes e odiava quando algum chefe a mandava cobrir bueiros explodindo. Naquela mesa barulhenta, podem ter certeza, a mulherada já fez de um tudo, de coberturas de carnaval e de eleições a tiroteios no morro, denúncias de escândalos, réveillon, manifestações. Era uma grande época! JB brigava cabeça a cabeça com o Globo e O Dia chegava a vender 1 milhão aos domingos. Rogério Reis era o editor de fotografia do JB!!! Olha o nível!!! Ainda tinha Flávio Pinheiro, Roberto Pompeu de Toledo, Marcos Sá Correa, Dácio Malta. As redações eram como o Maracanã e, hoje, encolheram como ele. Jornalistas são vaidosos, nostálgicos. Mas divertidos, muito divertidos!!!

– Sobrevivemos! – resumiu Isabela Kassow.

Na hora da foto oficial, a mulherada sentiu falta de Dani Sholl e Malu Fernandes, a coxa mais grossa do time. Quando ela se machucava surgiam massagistas de todos os cantos. Acreditem, as duas estavam na calçada do restaurante disputando campeonato de embaixadinhas!!!! Na chuva!!! Os clientes pararam para ver. Dani, de salto alto, xingava a bola quando a coitadinha escapava e Malu reclamava do tênis. Por uma embaixadinha, Dani venceu. Aproveitando que todas estavam ali, na torcida, a foto de 23 anos atrás foi reproduzida, sob temporal, com Malu no lugar de Françoise. Espírito intacto! Se o tempo passou, o fotógrafo não captou.

O reencontro das ex jornalistas do JB 23 anos depois, do timaço da redação.

Daniella Sholl

Malu Fernandes e Leila Magalhães

Fabiana Sobral e Stella de Moraes

Stella de Moraes

Mariucha Moneró e Marcia Penna

Eliana Bardanachivili e Isabela Kassow


23 anos depois... Malu Fernandes (substituindo Françoise Imbroise), Daniella Sholl, Mariucha Moneró e Fabiana Sobral. Abaixadas: Isabela Kassow, Marcia Penna Firme, Eliane Bardanachivili, Leila Youssef e Leila Magalhães.

23 anos depois… Malu Fernandes (substituindo Françoise Imbroise), Daniella Sholl, Mariucha Moneró e Fabiana Sobral. Abaixadas: Isabela Kassow, Marcia Penna Firme, Eliane Bardanachivili, Leila Youssef e Leila Magalhães.

O rei da cocada

:::: PÉ NA AREIA ::::
por Sergio Pugliese


Cocada reuniu uma legião de amigos, que vão de estrelas profissionais a peladeiros geniais, para os 60 anos de praia.

Cocada reuniu uma legião de amigos, que vão de estrelas profissionais a peladeiros geniais, para os 60 anos de praia.

Olha que já rodei por aí, hein!!!! Olha que já conheci campinho escondido por aí, hein!!! Olha que já ouvi histórias que mais parecem de pescador, hein!!!! Olha que já participei de resenhas hilárias, hein!!! Olha que já conheci gente bacana, divertida e com o espírito boleiro que sempre buscamos, hein!!!! Mas, olha, o Cocada é demais!!! Demais porque consegue reunir uma legião de amigos, que vão das estrelas profissionais Jayme de Almeida, Fred, PC Caju e Junior Capacete aos peladeiros geniais, como Tonico, do Xavier, Wilson Itália e Sheinberg, do Caiçaras, e Luiz Fernando Pessoa, do Clube 17. Também tinha o Sylvinho Blau Blau e quem mais vocês imaginarem, no condomínio Novo Leblon, na Barra da Tijuca. Todos queriam pelo menos alguns segundos para abraçá-lo e falar algumas palavras, curtas que fossem, mas que transmitissem o respeito, a admiração e o carinho que sentiam por ele.

– O Cocada é um ícone, um exemplo para quem ama futebol e preza a amizade – resumiu Blau Blau, na festa de 60 anos do parceirão.

Cocada jogou com os amigos, mas estava aceleradíssimo. Abraçava um por um, mas circulou com mais frequência entre a churrasqueira e a chopeira.

Estava difícil fotografá-lo. De repente, alguém me segura pelo braço e faz um pedido especial.

– Você tem que falar sobre o time principal do Caiçaras, o que jogava das oito às dez, e fez história!!!

Era Wilson Itália, um desses craques diferenciados. Quem sou eu para negar. Pedi a escalação.

– Marcinho, Sheinberg, eu, claro, Luiz Landau, Ricardo Peixoto, Ricardo Hardman Roliço, Joaquim Hardman, Fernando Martinez, Sergio Reis, Hisan Mattos, Sérgio Landau, Demétrio Dimões, Mozó, Miguel, Hugo Celso e os saudosos Paulo Reco e Fábio Roliz – responde, na ponta da língua.

Adoro isso, afinal a saudável rivalidade não morre nunca. Isso porque Zé Brito, outro cracaço-aço-aço, também do Caiçaras, já apareceu várias vezes na coluna destacando o seu time, que jogava em outro horário. Enquanto esperava Cocada abraçar mais um amigo, ouvia ao lado uma deliciosa historinha do dia em que Joaquim, do Naval, foi expulso _ mais uma vez _ na decisão do Campeonato do Aterro, contra o Embalo do Catete, arrancou o apito da mão do árbitro e o pisoteou até esmigalhá-lo. Johnson, o organizador da pelada do Novo Leblon, circulava orgulhoso. Tudo estava dando certo no evento!

– Tudo será pouco para o Cocada – comentou Fred, irmão de PC Caju.

Na tevê, anunciaram o cancelamento de Brasil e Argentina por conta do temporal. Ninguém prestou atenção porque, naquele momento, nada, nada, mas nada, era mais especial do que prestigiar Cocada.        

PS: A festa cocadense continua hoje à noite, no Novo Leblon!!! Às 21h, a Banana Banda, com Ivan Mundim, na batera, vai fazer os peladeiros suarem a camisa!!!! Parabéns, Cocada!!!!!



SERGIO PUGLIESE tem mestrado em chutes de trivela, doutorado em resenhas e é pós-graduado em gols no ângulo. Por quatro anos e meio assinou a coluna A Pelada Como Ela É nas páginas de O Globo, mas, agora, é o ponta arisco do Museu da Pelada.


FOTO E VÍDEO

FOTO E VÍDEO

DANIEL PERPÉTUO, jornalista, embrenhado na câmeras DSLR desde a Copa do Mundo de 2014, vive pescando uma imagem para contar uma história. Eterno camisa 1 das terras de Araribóia.

FUTEBOL SÃO ONZE

por Lucio Branco


No muro, Barba, Cabelo e Bigode, personagens do documentário

No muro, Barba, Cabelo e Bigode, personagens do documentário

“No princípio era o Verbo”.

Meio pretensioso, e até desnecessário, admito, citar o Evangelho de S. João logo na abertura da minha primeira colaboração aqui no Museu da Pelada. Foi só para evitar a expressão “Pontapé inicial”, um clichê que soaria muito óbvio no primeiro parágrafo da estreia de uma coluna intitulada “Futebol Arte”. Em suma, preferi um clichê a outro.

Mas vamos lá…

Como é sabido, as vanguardas do início do século XX não escondiam a sua falta de apreço pelos museus. Os dadaístas, por exemplo, proclamavam a sua destruição imediata. É uma atitude que faz sentido no Velho Mundo. Aqui, ela parece bem menos recomendável. Cultivador da desmemória, o Brasil não fez a mais básica lição sugerida pela História: conhecê-la primeiro. E é justamente o que o Museu da Pelada faz, em tempos de progressiva mercantilização do jogo. O site resgata o seu passado e assume lugar na linha de frente da sua valorização como manifestação sociocultural de primeira grandeza. Realmente, os museus poderiam contribuir em ser, geralmente, bem mais do que depósitos de mofo a expor o já consagrado. Não é o caso deste Museu, o qual, antes de tudo, exercita a memória para compensar a atual aridez de novidades verdadeiramente relevantes no mundo profissional da bola.    

Curiosamente, no “país do futebol” o legado deixado por craques, times, clubes, etc mais antigos tem pouco espaço até mesmo na construção do imaginário popular. Faça o teste: pergunte a qualquer torcedor o que ele sabe sobre o seu time antes de ter começado a acompanhá-lo. Para não fugir ao tema, “Quem vive de passado é museu” é quase sempre a resposta automática. No caso, um ditado bem mais pretérito do que aquilo que ele acusa. E com o mesmo grau de legitimidade, por exemplo, que o ainda surpreendentemente vivo “Futebol é o ópio do povo”. Ou seja: nenhum. (Apesar do empenho em contrário das forças política e economicamente interessadas.)

Quando o Sergio Pugliese me convidou, há alguns dias, para colaborar com o site, não pude dar outra resposta senão “Agora!”. 

O primeiro contato entre nós partiu de mim, há mais de um ano, ao lhe apresentar o meu projeto de documentário em longa-metragem, Barba, Cabelo & Bigode, sobre a trajetória dos craques da bola e da consciência Afonsinho, Paulo Cézar Caju e Nei Conceição. Os personagens/narradores do filme também já haviam marcado presença na sua coluna “A pelada como ela é”, por tanto tempo hospedada n’O Globo. Estava eu, então, em luta pelo financiamento coletivo (crowdfunding), para dar início às filmagens. Com certeza intuindo nossas afinidades no universo em questão (embora ele vascaíno e eu botafoguense), Pugliese foi monumental no incentivo. E, de lá pra cá, a coisa fluiu como deveria – escrevo logo após as últimas horas da segunda campanha formal de crowdfunding relacionada ao filme, agora destinada a sua finalização. A meta foi atingida e Barba, Cabelo & Bigode sai ano que vem. Confiem nisso.

Sem rodeios, o Pugliese fez a proposta: – “Relaciona aí futebol com cultura em geral: cinema, literatura, música etc, você sabe…”. A resposta veio no mesmo tom: – “Deixa comigo”.

Sustento que o association, ele próprio, é uma das inúmeras formas de expressão cultural que passou a trilhar um caminho próprio desde que aportou no Brasil. Acredito que isso é uma fatalidade sob o sol que nos ilumina: tudo se aclimata ao seu brilho. Garanto: determinismo zero na afirmação.

Mas não se trata de uma exclusividade nossa – cada país, região ou localidade no mapa-múndi responde pela espontaneidade e autonomia na importação de qualquer fenômeno cultural. A tão acionada antropofagia oswaldiana/tropicalista até poderia servir como chave de interpretação do que falamos aqui, caso o autor de O rei da vela e os posteriores baianos entendessem mais da modalidade que consagrou artistas bem mais populares que eles. (Uma ressalva: Gilberto Gil, autor do célebre verso “Prezado amigo Afonsinho”, demonstra saber do que fala no seu depoimento para Barba, Cabelo & Bigode.) As artes dialogam com o futebol porque têm com ele um nítido parentesco. Cinema, poesia, música e dança já estão ali desde o primeiro toque na pelota. Considerando a contribuição brasileira na renovação técnica, dinâmica e corporal do esporte, fica ainda mais evidente que é de estética que estamos tratando aqui.

Como este é um texto introdutório da minha colaboração com o site, adianto que escreverei sobre personagens e passagens da História do futebol que me parecem os de maior relevo, apesar de, na imensa maioria das vezes, a versão oficial desta não achar o mesmo. E, claro, sempre conforme a sua dimensão cultural, como o Pugliese pediu.

Para concluir, confesso: originalmente pensei em “Futebol são onze” para o nome da coluna. Depois, concluí que “Futebol Arte”, como me foi sugerido pelo Pugliese, era mais pertinente pela abordagem dela. Façamos justiça: o aforisma “Futebol são onze” é fruto da verve do Nei Conceição. Em meio às inúmeras perguntas do roteiro de Barba, Cabelo & Bigode, ele saiu-se com esse súbito insight. O Nei, um tímido que sabe falar muito com tão pouco, tem familiaridade com a transcendência. Essa sentença, creio, guarda um significado que vai muito além da sua circunscrição originalmente desportiva. Já a testei em mais de uma conversa alheia ao “violento esporte bretão” e não fui interpelado a respeito. Para mim, bastou como prova do seu inegável alcance metafísico.

Recomendo o uso.