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VISTO ASSIM DO ALTO….

texto: André Mendonça | fotos: Custodio Coimbra


Custodio Coimbra

Assim como os primos craques de bola, Zico e Eduzinho, Custodio Coimbra nasceu com um talento fora do normal. Apesar de ser um pontinha enjoado, sua habilidade maior não é com os pés, mas com as mãos. Fotógrafo de O Globo desde 1989, Custodio é considerado por muitos como o Zico da fotografia. Com grande talento com a sua Nikon 60, o craque coleciona brilhantes registros ao longo de sua carreira.

Recentemente, Custodio enviou ao Museu da Pelada um ensaio magnífico de fotos aéreas de diversos campos de futebol espalhados pela cidade, desde terra batida até gramados de alto nível. Vale destacar que, apesar de complicados, os registros aéreos são uma especialidade dele e as fotos dos campos não foram planejadas.

– Sempre que faço esses voos fico atento a tudo e registro aquilo que me chama a atenção. Os campos de pelada no meio de uma favela, em um prédio, chamam a atenção. Eu não vou atrás deles, eles que passam no meu campo de visão entre uma matéria e outra.

Criado em Quintino, Custodio sempre foi apaixonado por futebol e jogava peladas com o primo Zico. Com o passar do tempo, aquele que seria o futuro camisa 10 do Flamengo despertou um talento excepcional e passou a jogar com os adultos. Alguns anos mais velho, Edu já treinava para se tornar jogador profissional. Posteriormente, os irmãos bons de bola tiveram a ideia de criar um time de pelada para se divertir nos finais de semana e montaram o Juventude. Um timaço! Com menos talento do que os primos, Custodio fazia parte apenas do segundo time, o que estava longe de ser uma vergonha.

– Eu era aquele que chamam de reserva do reserva. Pela consideração, o Edu me garantia uma vaga no segundo time do Juventude. Eu entrava no fim do jogo para atuar como ponta-direita. Mas o time era muito bom, eu estava bem abaixo do nível deles. O Edu me dava essa moral! – lembrou o fotógrafo.

Se o talento com os pés não se pode comparar com o dos primos, o mesmo não se pode falar das mãos. Com dez anos, foi “mascote” de um clube de fotografia em Quintino e se apaixonou pela profissão que exerceria alguns anos depois. Na época, fazia-se o registro, a foto era revelada e, posteriormente, ampliada. Como mascote, preparava a química no laboratório e se encantava quando a foto aparecia “magicamente” na câmara escura. Logo começou a fotografar e não parou mais.

Como virtudes de um bom fotógrafo, Custodio destaca a calma, a lucidez e agilidade. Sobre a última característica, o craque revelou que a adquiriu quando fazia registros de jogos de futebol. Por ser uma atividade extremamente dinâmica, acaba exigindo um alto grau de agilidade do fotógrafo. Custodio, no entanto, conhecia bem o ambiente dentro das quatro linhas e tirou de letra o desafio. Além de cobrir a Copa do Mundo de 90, na Itália, o craque das lentes, como um bom rubro-negro, registrou inúmeros jogos do timaço do Flamengo de 81, liderado por seu primo.

– Para registrar o futebol é preciso estar com os dois olhos abertos. Um olho fica no foco da câmera e o outro atento ao deslocamento dos jogadores. Quando eu via um cara se deslocando, apontava a câmera para ele, pois sabia que ia receber o passe. Em 90% das vezes ele recebia mesmo. É aquela máxima: só recebe quem se desloca. Eu apliquei isso ao meu trabalho.

Calma e lucidez, as duas outras virtudes, são necessárias porque o fotógrafo precisa saber lidar com a situação em que se encontra independentemente da gravidade dela. Diante de um incêndio, por exemplo, o fotógrafo não pode se desesperar. Segundo Custodio, “tudo acontece” e é preciso ter calma e atenção para não perder a oportunidade de fazer um bom registro.

– A fotografia é como uma onda. Ela vai se formando e você vai fotografando sucessivamente. O momento de maior tensão, e também o de maior beleza, ocorre na hora que ela vai estourar. Esse momento é que faz uma foto ser diferente da outra.

Foi juntando todas essas técnicas que o fotógrafo conseguiu fazer os registros mais importantes da vida dele. Com muitos momentos marcantes na vitoriosa carreira, o craque aponta a cobertura do velório de Tancredo Neves, em 85, como o mais especial. Não pelo velório em si, mas pela confusão que ocorreu no evento. Os policiais demoraram a abrir o portão do Palácio da Liberdade, em Minas Gerais, e a multidão derrubou a grade de contenção. Cinco pessoas morreram e dezenas ficaram feridas. Por acaso, Custodio era o único fotógrafo que estava na área em que ocorreu a tragédia e, consequentemente, foi o único a registrá-la.

– Foi um momento trágico, mas super marcante. Eu era um cara novo e passei a ser reconhecido por muitos fotógrafos após esse trabalho. O Jornal do Brasil deu três fotos desse meu material na primeira página e mais quatro páginas dentro só com foto-legenda.

Vale destacar que, em conjunto com a mulher, a jornalista Cristina Chacel, o craque está prestes a lançar o livro “Guanabara Espelho do Rio”. A obra vai contar a história da Baía de Guanabara, desde a construção dos fortes até a inauguração do Museu do Amanhã. De acordo com Custodio, são quase 400 anos de história resumidos em 20 anos de trabalho.

RESENHA DE CAMPEÃO

vídeo: Rodrigo Cabral

No último mês, a Índia foi palco de um torneio de futsal internacional, o Futsal Premier! Com grandes lendas dentro de quadra, como Ronaldinho Gaúcho, Giggs, Crespo, Cafu e Falcão, do futsal, a competição reuniu seis times. 

Vale destacar que, fora das quatro linhas, os times também estavam muito bem representados. Dos seis, três eram treinados por ídolos brasileiros no esporte: Ney Pereira, Bocão e Sérgio Sapo.

A equipe do Museu da Pelada reuniu os treinadores para uma divertida resenha no Caldeirão do Albertão. A ausência ficou por conta de Sérgio Sapo, que foi representado pelo pai.

– Modéstia à parte, eu jogava muito mais do que ele! – comentou, para a gargalhada de todos.

Campeão, Ney Pereira já foi eleito o melhor treinador de futsal do mundo pela Revista Futsal Planet! Bocão é ídolo na Espanha por incansáveis golaços e Sérgio Sapo já foi bicampeão mundial.


O craque Bocão foi o técnico do time de Ronaldinho Gaúcho

CAMISA HISTÓRICA

por André Mendonça


Do lado direito, Rogério tieta Falcão com a camisa do Madureira

Uma camisa com pedidos esgotados logo no primeiro mês, exportada para 14 países, com recorde de vendas! Barcelona, Real Madrid, Chelsea? Madureira, o Tricolor Suburbano! Graças à ideia genial do designer Rogério Nunes, o clube carioca ganhou repercussão mundial em 2013 por conta de uma camisa que estampava o rosto de Che Guevara, em homenagem aos 50 anos de uma excursão da equipe para Cuba. Se para a grande maioria o sucesso foi surpreendente, quem desenhou a camisa já sabia que estava fazendo algo histórico.

– Se eu falar que não imaginava esse sucesso é mentira! Eu estava juntando o futebol, com uma figura pop, que é o Che Guevara. Tudo isso em um clube que não sofre rejeição nenhuma! Se fosse camisa do Flamengo, os vascaínos não comprariam, por exemplo! – explica Rogério.

Jornalista e sócio do site do FutRio, que dá visibilidade principalmente aos clubes de menor porte do Rio de Janeiro, Rogério apresentou o projeto da camisa a Carlos Gandola, gestor do Fut 7 Madureira, para ser utilizada nos jogos da equipe. De acordo com ele, o site é o que contribui para o bom relacionamento com os diretores.

Apaixonado por camisas de futebol desde criança, Rogério só começou a desenhar profissionalmente em 2012. Justamente por conta do site, tinha a liberdade de bater na porta dos clubes e oferecer o projeto. Dessa forma, desenhou belas camisas para o Gonçalense, Angra, Bonsucesso, Portuguesa da Ilha, entre outros. Todas elas, no entanto, tinham uma particularidade: história.


Fã de Che, Maradona posa com a camisa do Madureira

– Na minha cabeça, a palavra design não significa simplesmente desenho. Desenho, em inglês, é draw. Não são apenas traços ou uma coisa estética, tem que ter uma história por trás, por isso é sempre um projeto.

E a história dessa camisa do Madureira é linda! Após a revolução de 1959, Cuba passava por um momento conturbado e o Tricolor foi o primeiro clube de futebol a desembarcar no país, em maio de 1963. A excursão para a ilha comunista não poderia ter sido melhor. Em cinco jogos disputados, foram cinco vitórias, derrotando até o Industriales, campeão nacional. O último amistoso da equipe contou com a presença de ninguém menos que o guerrilheiro Che Guevara.

– A camisa não tem nenhum cunho político. Mesmo não sendo tão fã de futebol, o Che presenciou um jogo do Madureira. O objetivo foi lembrar aquele momento histórico. Dava pra ver a felicidade estampada no rosto do Che! Aquela foto é uma das poucas em que ele aparece sorrindo.


Falcão jogando pelo Fut 7 do Madureira com a camisa histórica

Antes mesmo da estreia do uniforme dentro das quatro linhas, o sucesso já se desenhava. Através do Twitter do FutRio, Rogério postou a foto da camisa, gerando um grande alvoroço e muitos compartilhamentos. Se o design inovador da camisa já não fosse o bastante, o craque Falcão, do futsal, disputou um campeonato pelo time de Fut 7 do Tricolor Suburbano na época, o que contribuiu ainda mais para o êxito. Por conta da grande repercussão, Elias Duba, o presidente do clube, decidiu utilizar o uniforme também nos jogos da equipe profissional de futebol.


Em homenagem à viagem foram dois uniformes com o rosto de Che estampado. Um grená e o outro da bandeira de Cuba, com as cores azul, branca e vermelha. De acordo com Rogério, as duas tiveram um sucesso parecido.

– As pessoas mais velhas, que vivenciaram aquela época, gostavam mais da grená, que é uma cor revolucionária. Mas a molecada se amarrava na colorida. Ficou bem dividido! Até hoje vejo as pessoas usando.

Para dar uma noção de números, o Madureira vendia, em média, quatro camisas por mês. Depois do lançamento desse uniforme, em setembro de 2013, passou a vender 30 por semana. Somente no primeiro mês, foram 15 mil pedidos e, obviamente, o clube não deu conta. Segundo Rogério, o sucesso poderia ser ainda maior se a empresa de material esportivo fosse uma Nike ou uma Adidas.

No ano seguinte, em outubro de 2014, Rogério desenhou outra camisa para o Madureira. Dessa vez, em alusão à excursão da equipe para a China comunista, em 1964, que completava 50 anos. Depois da recepção de Che em Cuba, os jogadores do Tricolor foram recebidos por Mao Tse Tung na China. A excursão ficou conhecida como “a viagem proibida”, já que os jogadores ficarem presos no país e só puderam voltar em troca dos 12 chineses que estavam apreendidos no Rio.

– Não teve o mesmo sucesso da camisa do Che, mas foi bom! Rolou uma dificuldade para lançar a camisa, não ficou pronta no tempo previsto e talvez isso tenha prejudicado um pouco. Se fosse lançada no dia do Golpe Militar ela teria um sucesso maior!

O trabalho de Rogério, tanto na confecção de camisas, quanto no site FutRio, é fundamental para os clubes de menor porte ganharem a visibilidade que tanto precisam.

– No site, cobrimos jogos do Serrano, Volta Redonda, Madureira, entre outros. Muitas vezes, somos o único veículo do Rio que marcamos presença nos jogos fora de casa!

JORZINHO

Hoje é aniversário do técnico Jorginho! Ao lado de Zinho, o ex-jogador foi fundamental para o crescimento do Vasco neste ano! Sabia que o entrosamento da dupla também sobressa nas peladas?

LONGE DO PÓDIO, PRÓXIMO DO LIXO

por Zé Roberto Padilha


O esporte brasileiro vive das sobras. Sé há crise em Brasília, é o primeiro recurso que cortam por lá, e a contenção vai descendo os estados e chegam zeradas aos cofres dos municípios. Suas gestões são entregues a politizados meninos que, infelizmente, jogaram bola de gude no carpete. E levantaram suas pipas no ventilador. Como, então, alcançar o seu valor na formação do cidadão? Em busca das sobras, nossa secretaria de esportes desembarcou de caminhão na cidade do Rio de Janeiro, em maio de 2013, durante a derrubada do Parque Aquático Julio Delamare, que foi jogado ao chão como se nadássemos em centros de formação esportiva. Por lá, havia uma plataforma de saltos, uma piscina olímpica e uma bela pista de atletismo. Graças a um amigo, Roberto Gonçalves, uma vida dando saltos para salvar a sua modalidade esportiva, fomos buscar alguns trampolins, macarrões e colchões que seriam doados durante a demolição para nossos projetos similares em Três Rios.


Djan Madruga é um dos maiores nadadores que o Brasil já teve

Em meio ao carregamento, notamos o que o motorista, seus ajudantes e o encarregado da distribuição enxergaram, mas não sentiram: dezenas de troféus entulhados em um canto. Eram 42 no total, muitos estavam quebrados, mas eram lindos, imponentes, e certamente carregavam em suas plaquinhas a história do Djan Madruga, pelos sul americanos.  Da Juliana Veloso, pelas plataformas dos jogos pan americanos. O que para eles eram entulhos, para nós, ex-atletas, era história. Frutos de uma saga de heróis que superaram o descaso de um país que trata o esporte como subproduto. Que se não tiver duas gêmeas bonitas no nada sincronizado não viram notícias. Se não tiver uma saltadora com uma bunda enorme não alcança a atenção da nossa mídia que o César Castro, nosso numero 1, merecia. Fora isto, imperceptíveis e inalcançáveis serão as condições para alcançarem qualquer medalha olímpica. Perguntamos, na ocasião, ao encarregado do Black Friday esportivo: 

– Para onde vão levar aqueles troféus?

– Ninguém sabe ainda para onde vão! – respondeu. 

Mas estavam com uma cara, e um empilhamento num canto, que certamente ganhariam um certo destino: a lata do lixo. Em um Brasil sem memória, em que outro lugar seriam encaminhados? Daí solicitamos, e nos foi consentido na ocasião, até com certo alívio, colocá-los no caminhão, transportá-los pela BR-040 e guardá-los em nossa secretaria de esportes em Três Rios.

Vivemos em um país que tem a maior reserva de água doce do mundo. O maior aqüífero, o Guarani, e o maior dos rios, o Amazonas. E das águas abundantes, sejam elas em mar aberto ou fechadas em piscinas curtas, rasas ou profundas, com braçadas, bolas ou remos, não retiramos uma só medalha. As razões para o fracasso são as mesmas observadas na Copa do Mundo: cartolas que comandam as confederaçõesnas tribunas, ex-atletas nas cabines de televisão. Quem não suou e desconhece os caminhos do sucesso, comanda. Quem os conhece e poderia ensiná-los as novas gerações, coloca o terno do SporTV, pega o microfone e comenta. O resultado vocês sabem, nenhum atleta que nadou, em todos os estilos ou sincronizado, saltou, remou ou jogou water pólo alcançou o pódio. Lá pisaram raras criaturas extraterrestres,  atletas que escolheram para defender dois dos maiores símbolos de um país eternamente explorado: a luta, para se salvar, e o tiro, para se proteger das injustiças.


Particularmente, como atleta e disputando competições desde os 16 anos, sei que a medalha a gente leva para casa. Os troféus a agremiação e as entidades esportivas levam para a sede.  Quando são descartados, não temos mais dúvidas do descaso que dão à nossa luta. Sabemos que muitas águas continuaram a passar por baixo das nossas pontes. Quando trazem um Ayrton Senna, autódromos e kartódromos proliferam pelo país. Quando surge um Gustavo Kuerten, as quadras de tênis são invadidas por várias gerações que terão no esporte um poderoso aliado, ao lado da educação, em suas vidas. Mas quando não mais surgem heróis no esporte, suas conquistas se aproximam de uma lata de lixo, outros caminhos lhe serão abertos. Muito deles distante do pódio em que alcançariam a plena cidadania.