TALENTO DESPERDIÇADO
por Serginho5bocas
Josimar era fera na bola! Criado nas peladas da Cidade de Deus, levava jeito para o futebol desde pequeno. Joia da base do Botafogo, que na época revelava muitos craques sob a batuta de Neca e do técnico Joel, fez parte dos titulares da seleção brasileira de juniores, vice campeã no mundial da categoria em 1981. Na época, jogava no meio de campo com Leomir, que viria a ser do Fluminense, e tinha como companheiros, Mauro Galvão, do Inter, Julio Cesar, do Guarani, Paulo Roberto, do Grêmio, e Cacau do Goiás.
No canto direito, Josimar comemora um dos seus gols pela seleção
Como se costuma dizer, Josimar era “bola”, mas não tinha sido convocado para nenhuma partida da seleção de Telê que iria disputar a Copa de 1986 e nem fez parte do grupo que teria alguns cortados antes da competição. Mas quis o destino que Leandro pedisse dispensa e, como só teria Edson, do Corinthians, Telê decidiu chamá-lo.
Josimar estava voando, como sempre, tinha um fôlego acima da média e seria provado que a decisão fora mais do que acertada, pois os jogos no México seriam ao meio-dia e na altitude. Ou seja, Telê precisava de alguns jogadores com ótimo preparo físico, pois também estava levando alguns veteranos remanescentes de 1982. O craque chegou como reserva, mas não demorou a ganhar a vaga lá no México. Fez dois gols espetaculares e deixou uma impressão tão boa com suas atuações que foi escolhido pela imprensa como o melhor lateral daquela Copa.
Um detalhe inusitado é que durante os treinos, Josimar tinha o melhor aproveitamento nas cobranças de pênaltis entre todos os jogadores. Antes do jogo contra a França, dizem que não errou nenhuma das cobranças. O problema era que ele levava tudo na sacanagem e batia os pênaltis nos treinamentos sem tomar distância e bem devagar, matando o goleiro de raiva. Em razão dessa displicência, não foi relacionado para as cobranças que, por ironia do destino, nos fez amargar mais uma derrota daquelas de doer. Não sei se com ele ganharíamos, mas seria no mínimo diferente.
Foi tudo tão bom na vida dele que, após a Copa, o lateral foi convocado para uma destas seleções da FIFA e, num jogo amistoso, fez o gol da vitória de 1×0 com passe de Maradona.
Posteriormente, foi vendido para o Sevilla, da Espanha, mas não vingou. Voltou ao Brasil contratado pelo Botafogo, mas nunca mais seria o mesmo. Josimar ainda jogou algum tempo na seleção, mas foi perdendo espaço e as noitadas faziam ele frequentar mais as páginas policiais e de fofocas do que as de esportes.
Terminou sua carreira vagando por clubes sem expressão e sem o viço e a alegria que dava gosto de ver quando ele jogava no inicio da carreira. Josimar foi mais um daqueles talentos desperdiçados, aqueles jogadores que não conseguem cuidar do seu maior patrimônio, o seu próprio corpo, seu instrumento de trabalho.
Uma pena que o triste exemplo de Josimar não faça surtir nenhum efeito em muitos jogadores atuais que levam a vida no mesmo ritmo e, ás vezes, até mais alucinante do que o ex-lateral.
Dizem que hoje ele dá aulas para meninos que sonham ser jogador como ele foi. Espero que aprendam só a parte boa, que convenhamos, foi espetacular, mas, infelizmente, durou tão pouco.
Ademir da Guia
ENCONTRO COM O DIVINO
texto e entrevista: Marcelo Mendez | fotos: Rodrigo Pinto | vídeo: Marcelo Ferreira e Victor Limeira edição de vídeo: Daniel Planel
Não se trata apenas de futebol e jornalismo.
Ademir da Guia e Marcelo Mendez (Foto: Lucas Ivoglo)
Tampouco falamos apenas de uma entrevista que se faz, entre mortais, em que um pergunta e o outro responde, não; Nada disso. Falar com Ademir da Guia é muito mais do que uma pessoa comum, como eu, pode vir a mensurar a vocês meus iguais.
Ademir da Guia é o encontro possível com a Divindade.
É no minuto que escorre a lágrima, no átimo de segundo que a mente é fulminada pela criação de um verso, no instante mágico em que a razão é suspensa ante a criação de um poema ou de uma sinfonia, que se chega perto de Ademir da Guia.
Estar perto dele nos eleva a um plano que mortal algum merece estar. Um olimpo onde mora tudo que é lindo, tudo que é encanto, tudo que é belo e divino. É estar com Proust, com John Coltrane, com Matise, Picasso ou Goya. É virar uma esquina que outrora foi comum e nela ver o jardim das acácias de Monet. É sentir a beleza em estado puro.
Pelo tempo em que Ademir da Guia esteve campo, o mundo decerto foi melhor. O tempo dos homens foi outro e a luz dos dias foi muito mais intensa e feliz. Por gramados do mundo afora, o eterno camisa 10 do Palmeiras contemplou o futebol com odes e épicos. Pela vida assim seguiu e, agora, aqui estamos para falar disso tudo.
Caro leitor do Museu da Pelada, estou aqui para te dar os parabéns. Você terá a honra de ver Ademir da Guia.
Bem-vindo ao que há de Divino…
REI DAS EMBAIXADINHAS
vídeo e edição: Rodrigo Cabral
Não é nenhuma novidade que muitos talentos são desperdiçados e acabam fracassando na profissão de jogador! Marcelo Mendes é um deles! Habilidoso, o craque até fez testes em alguns clubes do Rio de Janeiro, chegou a ser aprovado, mas não seguiu na profissão!
Embora exerça o trabalho de gari há alguns anos, o craque jamais esqueceu a paixão pela bola! Desde pequeno, Marcelo demonstrava uma intimidade absurda com a redonda! Sendo assim, passou a treinar embaixadinhas e se tornou um fenômeno no quesito!
O craque já ficou incríveis seis horas e dois minutos batendo a bola com a cabeça, sem deixar cair, e é o recordista brasileiro de embaixadinhas com o pé, totalizando 2210 toques! Em busca de novos recordes, Marcelo passou a treinar embaixadinhas com o coco e não é que o resultado também foi impressionante? Foram 190 toques e mais um recorde para a conta dele!
A equipe do Museu da Pelada foi até a Praia de São Conrado, no Rio de Janeiro, conferir um pouco do que esse personagem da bola é capaz de fazer!
Valeu, Marcelo!!
O DIA QUE O COROTE E MOLOTOV VIBROU
texto: Marcelo Mendez | foto: Maristela Ranieri
Era um dia diferente na várzea de Santo André.
Ao contrário dos domingos de sol, de manhãs de feiras livres, do gosto de pastel e dos cheiros dominicais, dessa vez a pauta era em um sábado que repentinamente se fez de inverno, em tons acinzentados que outrora talvez pudessem ser chamados de melancólicos, mas não.
Dada o quão especial era aquela pauta na várzea, o sol em acordo com o destino resolveu se recolher para gerar em mim um outro tempo. Um momento de mais silencio, de mais solidão até, para que toda reflexão acerca do momento que estava por viver, fosse feita.
Era um sábado. Dia de receber no campo do 7 de Setembro, em Santo André, o meu time, o nosso time. Corote&Molotov para além de time de futebol é uma experiência que ousa ser única no futebol. Uma união entre moradores de rua de três ocupações da região da Radial Leste em São Paulo (São Martinho, Alcântara Machado e Cimento) e ativistas que correm junto com esses moradores na luta por moradia.
Lembro de quando o companheiro Paulo Escobar me chamou para fazer parte de tudo. Não pude recusar.
Conhecendo a ocupação Alcântara Machado, conheci Carequinha, Gordinho, Tibuia, Olodum, Ceará, Baixinho, Índio, Carlos, Dione, Japa e mais outros que formam conosco o nosso time. Tive destes a honra de conhecer as suas histórias, lutas, agruras, dores e ouvi as mais lindas histórias de vida e resistência. Me emocionei por um milhão de corações que pulsam por paixão e fúria, que clamam por igualdade, que não querem pena de ninguém, querem justiça e não se fazem de rogado em lutar por tudo isso.
Começamos a batalhar então e o Corote já está na ativa há dois meses. As coisas do trabalho, no entanto, me impediram de vê-los em ação e isso só foi possível no último sábado, quando os amigos do Racing Sacadura nos enfrentou. Lá fui eu…
Em meio a esse sábado acinzentado e frio, encontrei meus amigos de time trocados, orgulhosos, felizes, na beira do campo e prontos para o jogo. Olhei para cada um de seus rostos e vi neles uma alegria que contagiaria a qualquer ser vivente. Mas ainda tínhamos que jogar e o match era duro.
Até o final perdíamos por 2×1 e Guilherme, o nosso técnico, se retorcia em táticas, enquanto eu, Caróu e Adriana torcíamos por uma sorte diferente daquela que tínhamos, quando Escobar bateu uma bola no gol e o goleiro do Racing rebateu.
No rebote, Dione correu. Mas correu por muito mais que apenas uma bola. Nos pouco mais de 20 metros que nosso menino atacante correu, uma vida veio à tona. Era correr pelo sonho, pela alegria, pelo que a vida jamais poderia deixar de dar para as 650 pessoas das ocupações da Radial Leste e para todos os brasileiros que lutam por moradia nesse País. Dione correu…
Pegou aquele rebote e estufou as redes. Gol! Comemorou como se a vida fosse de fato algo muito bom, abraçou seus companheiros de time, de luta e de vida e foi feliz como é de direito ser.
Nesse momento em que os nossos festejavam, me afastei. Fui para um canto do campo e vendo os jogadores do Corote&Molotov, chorei da mesma forma que se chora por uma grande vida. A lágrima grossa que me escorria a barba enquanto via os nossos felizes é a mesma que desce o rosto agora que escrevo essa crônica e eu devo a esses jogadores toda a alegria desse sábado que jamais deixará de existir em mim.
Obrigado, amigos.
Amo vocês, profundamente….
LANÇAMENTO
O casal Alexandre Araujo e Aline Bordalo lança hoje o livro “Onde a Coruja dorme e outras histórias”, às 19h, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon!
O livro é destinado, sobretudo, para crianças e adolescentes e as historinhas brincam com expressões conhecidas do futebol, e recriam significados para elas.
Alexandre é jornalista e radialista e apresenta os programas Pop Bola e Panorama Esportivo, na Rádio Globo. Sua esposa, Aline Bordalo foi repórter esportiva e apresentadora da Band, SBT, SporTV e Globo Esporte e atualmente escreve para o site Paixão Futebol.
Imperdível!!