Escolha uma Página

O ORÁCULO DO MÉ

por Serginho5Bocas


Naquele ano, se tivesse Copa do Mundo, o Zico seria o artilheiro. O homem estava com à capeta, só no Mengão foram 81 gols em 70 partidas, sem contar os gols pela seleção.

Naquela tarde, seu Zé, o pai do “digaré”, entrou no bar e gritou “mengô,,,, mengô,”, quase levou um pau do seu tião, o dono do estabelecimento. Sebastião, ou apenas Tião, era um senhor sem muita instrução, meio ignorante, mas com um enorme coração. Só tinha um probleminha, era botafoguense doente, e não suportava a ideia de alguém entrar no seu bar e falar bem do Zico ou do Flamengo.

Seu Zé, já muito “chapado”, queria só se divertir, e aí “botava pilha” no seu Tião com provocações. Mas naquele dia abusou, disse que estava com vontade de ganhar um dinheirinho fácil do pessoal do arco-íris, e então lançou o desafio:

– Sou Flamengo, dou quatro gols de vantagem e só vale gol do Zico!

Caramba, aquilo soou como uma bomba no ouvido do seu Tião, que imediatamente retrucou:

– Boto uma caixa de cerveja, seu “prego”!  Ficou maluco? Aposta que eu quero ver agora!

Seu Zé, sem perder a pose, aceitou na mesma hora. Não sei se conscientemente ou somente para não dar o braço a torcer:

– Fechado! Concordou com um aperto de mão bem apertado.

Estava feito, agora era esperar o jogo e saber quem seria o vencedor da aposta.

Chegada a hora do jogo, não me lembro se foi contra o Serrano ou ADN (Zico fez o mesmo número de gols nos dois times), o Flamengo enfiou um sonoro 6 a 0, e Zico fez simplesmente todos os gols da partida, com direito a gol que o Rei Pelé tentou na Copa de 1970 sem sucesso, driblando o goleiro sem tocar na bola. Dá pra imaginar a cara do seu Tião quando recebeu a notícia?

Pois bem, logo pela manhã eu, Manel e outros colegas fizemos ponto no bar, só para ver como o Zé iria cobrar o seu Tião. Demorou um pouco, mas depois do almoço, chegou o seu Zé.  Vinha com um ar de ironia, uma certa soberania no olhar, acho que por dentro explodia em gargalhadas, gargalhadas sonoras e contidas pra não humilhar.

Então pede no balcão:

– Tião! Bota uma gelada pra mim!

Seu Tião sem falar uma palavra, traz a cerveja e coloca no balcão, junto com um copo.

Zé bebe uma, duas, três e finalmente na quarta, após um longo e angustiante silêncio, quando nós já não aguentávamos mais, solta a pérola:

– Tião, traz agora uma com gosto de pato…

Não deu nem tempo de completar a frase, voou um abridor de garrafa que passou tinindo pela cabeça do Zé, e uma tremenda confusão se formou. Depois de muito deixa disso, a situação se normalizou e nós rimos muito com as piadas do Zé.

Acho que aquela caixa de cerveja foi a mais saborosa que o Zé já tomou, e também a mais dolorosa que o seu Tião já pagou. Naquele dia o Galo fez um oráculo do MÉ se dar bem, e um botafoguense tomar mais bronca dele ainda.

Club de Regatas Vasco da Gama!

 por Eduardo Semblano


Mais uma mancha de um capítulo que já dura 16 anos, este livro que está sendo escrito desde 2000 e, de lá pra cá, após a virada épica sobre o Palmeiras e o fechamento do ano em janeiro de 2001, com o fatídico título do Brasileiro (Copa Joao Havelange)! 

O Vasco fez nesse tempo a MAIOR mancha dentro de campo de um gigante na história desse país (outros tem bem maiores com ajuda de arbitragem e etc), falo isso com muita tranquilidade. O Flu foi à 3ª divisão, mas em um tempo mais curto e com uma forma diferente de disputa, um surto em sua história. Também fez vexame, mas o do Vasco é pior. 

O que será do Vasco???

O torcedor hoje tem a certeza que brigará pra não cair em 2017, só esse sentimento já mostra tamanha vergonha e “apequenamento” que os envolvidos na direção do Vasco tem feito ao longo desse sombrio período! 

O Vasco da Gama tem 118 da história, de vanguarda, de batalhas contra os mais favorecidos, de diversos esquadrões, de brilhos em todas as décadas, e não só lampejos de determinados times ou gerações. O Vasco foi enorme desde de sua gestação e fundação, a cada virada de ano a angústia era pra saber o que ganharia, quem revelaria, que nova página linda seria escrita… O Vasco é isso!

Seu estádio outrora de vanguarda hoje se definha, está velho, obsoleto e encolheu por segurança. Sua piscina de glórias e torneios enormes até ontem não tinha água, seu ginásio de maternidade de tantos craques que no futsal surgiam foi reformado por uma vaquinha da torcida, seu CT, que de CT não tem nada, também parou no tempo, está largado! Sua camisa, que tanto vale há anos, não tem as maiores empresas mundiais produzindo, até confecção própria já vimos! Uma briga descabida e sem medir consequências com a maior “patrocinadora” do Brasil, a TV Globo, eleições fraudulentas e motivo de inserções polícias a cada ano de eleição. Uma dívida enorme que parece impagável, o respeito que se foi, a simpatia que se perdeu e mais do que isso, o vexame e vergonha de seus torcedores em ver o clube nesta situação e não poder fazer nada! 

Ao Vasco da Gama CAMPEÃO de terra e mar fica apenas a torcida para que quem dirigiu e coordenou o clube nesses 16 últimos anos suma de lá, que nunca mais pise na colina histórica e que o Vasco não seja das bravatas e atrocidades em todas as esferas, que o Vasco volte a ser do povo, dos negros, brancos e portugueses, de todos os brasileiros espalhados por todo planeta que em seu peito, junto ao coração, carregam a cruz mais famosa do MUNDO, a Cruz de Malta do CLUBE DE REGATAS VASCO DA GAMA! 

Fui CLEAR????
 

HERÓIS DA RESISTÊNCIA

por Sergio Pugliese


CUBA – O general Fidel Castro Ruiz pode ser considerado um dos maiores símbolos de longevidade e resistência ideológica da história. Grande combatente e anti-imperialista até o último fio de barba não há como negar que El Comandante também enfrentou seus momentos de fraqueza e, ainda menino, rendeu-se aos encantos do beisebol, esporte originalmente criado pelos americanos. O fascínio aumentou ano a ano e ele praticamente transformou-se num garoto-propaganda da turma dos tacos. Viajando pelo interior da ilha de Fidel em busca de um campo de pelada, missão praticamente impossível, pois o futebol também perde em preferência para o vôlei, box, basquete, xadrez, pelota de mão etc etc etc, a equipe do A Pelada Como Ela É localizou, na histórica cidade de Santiago de Cuba, Raciel Sarmento, professor de uma escolinha e o verdadeiro líder da resistência cubana, pois jamais se dobrou aos encantos do yankee beisebol e diariamente, contra tudo e contra todos, reforça seu “exército” com mais e mais peladeiros-mirins-socialistas. Isso, sim, uma verdadeira revolução!

– Venceremos essa guerra e um dia Cuba se dobrará ao futebol – divertiu-se ele, funcionário da escola primária Clodomira Acosta.

A missão não é fácil. Pelas ruas e bares, os nomes mais falados são os de Industriales, Havana e Santiago de Cuba, times de beisebol que fazem a cabeça dos habitantes da ilha. E jogadores como Norgeluis Veras, Alex Ceibel, Quinderán, Pacheco, Contrera e Hermán Mesa sacodem o coração dos cubanos. O taxista Rogelio Evangelista Machado, que funcionou como guia de nossa equipe, demorou a encontrar um campinho de futebol e o primeiro foi no Centro Recreativo Ciroa, onde Raciel Sarmento treinava a garotada. Mesmo assim as melhores quadras do espaço eram usadas para basquete e pelota de mão. 

– O futebol vem se tornando um grande foco revolucionário dentro desse país de fortes ideologias esportivas – brincou Sarmento, enquanto posava com o time para o fotógrafo e documentarista Guillermo Planel. 


Num estalo, o motorista lembrou-se de outro campo e Fidel ganhou alguns pontos quando chegamos ao local, na verdade, o Quartel de Moncada, principal referência da revolução cubana. Moncada foi a primeira grande tentativa de Fidel Castro tomar o poder no país, em 26 de julho de 1953, junto com 165 homens. Fracassou e foi preso por dois anos. É neste cenário, um batalhão crivado de balas, que hoje abriga uma escola primária, onde a resistência revolucionária de nossa pelada encontra seu espaço máximo, num dos lugares mais visitados de Cuba. Mas, fora isso, campos de futebol são artigos raros por lá. De grama sintética, então, nem se fala. Algumas peladas que encontramos eram jogadas com bola de basquete e improvisadas em áreas destinadas ao beisebol. 

Voltamos ao campo de Raciel Sarmento. 

Quase no fim do treino uma bolinha de pelota perdida foi parar no campo de pelada. Antes de devolvê-la ao dono, o menino Bairon iniciou uma série de embaixadinhas e fez diversas firulas com maestria. Fez lembrar os malabarismos de nosso Robinho, mas declarou-se fã de Ronaldinho Gaúcho. No fim da exibição foi aplaudido pelas “galeras rivais” e encheu o professor de orgulho. Os pequenos revolucionários partiram e deixaram vazio o campinho careca. Frank, Rolando, Ricardo, Ernesto, Victor, Fran, William e Michel, apesar de dois nomes de origem norte-americana, são frutos dessa saudável resistência esportiva. São os pequenos heróis de uma luta continental, que tem Ronaldos, Romários e Zidanes, como ídolos universais, e o sonhador Raciel Sarmento, anônimo mas determinado professor de escolinha, como símbolo maior de persistência.

 

A ESTAGIÁRIA

por Sergio Pugliese


Rogerinho segura os saquinhos cheios de borracha

O primeiro mandamento do boleiro é jamais usar a pelada em álibis, afinal ela é sagrada, insubstituível. Mas tentações existem e alguns atletas inexperientes acabam sucumbindo ao canto da sereia. O problema é quando o tiro sai pela culatra e eles são obrigados a enfrentar a ira da Dona Encrenca. Rogerinho, centroavante matador, foi um desses…

Na volta do racha era certo Cristina reclamar daquela borrachinha preta sujando o banheiro. A borracha em questão é aquela usada para amaciar as quadras de grama sintética, realmente uma chatice porque entra na chuteira e gruda no corpo. De tanto as mulheres chiarem, a maioria dos craques dá uma geral no próprio campo e espanca o tênis no chão até sumirem todas. Rogerinho, não. Ele andava mal intencionado com Aninha, a estagiária do trabalho, e concluiu que as pretinhas poderiam ser suas aliadas. Um dia chegou ao campo com vários saquinhos plásticos, tipo sacolé, e encheu cada um deles com o pó de pneu. Alguns amigos estranharam, claro.

– Vai vender na feira como cocaína africana? – brincou Rômulo.

– Não! Lucas, meu filho, adora brincar com isso – disfarçou.

O assunto morreu, mas os melhores amigos sabiam dos bastidores. Uma relação em crise e o frescor da estagiária bastaram para as borrachinhas brotarem dia sim, e o outro também, no piso do banheiro. Ao invés da santa pelada ia namorar. Na volta, antes de entrar em casa, umedecia a camisa e o short na torneira da garagem para dar vida ao suor e, claro, enchia a chuteira com o resíduo. O problema foram as repetições e esse apetite voraz pela bola despertou a pulga há anos adormecida atrás da orelhinha de Cristina. E na festa de aniversário de Rogerinho, não teve jeito, o caldo entornou.

– Vamos cantar parabéns! – convocou Cristina.

Madrugada, caipirinha pulsando na mente e os peladeiros tortos, inclusive o desavisado Rômulo. No caminho para o salão, o goleiro resolveu elogiar o comportamento de Rogerinho para Cristina e arranjou um problemão.

– Rogerinho é mesmo um paizão, vai para o campo e fica enchendo saquinhos de borracha para dar ao filho.


Os saquinhos cheios de borracha que Rogerinho recolhia

Rogerinho vinha logo atrás com os cúmplices Stênio e Ribamar. Os três espantaram-se e tentaram frear a língua de Rômulo, mas era tarde.

– Como assim? – perguntou Cristina, desconfiadíssima.

– Ué, fica de quatro só enchendo saquinho…

Stênio puxou Rômulo pelo braço.

– Bebeu demais, maluco?

Rogerinho relembrou os tempos de Tablado e lançou no ar um olhar perplexo enquanto um “fud…” retumbava sua cabeça. Cristina sentiu o cheiro da traição e entrou no quarto. O parabéns foi suspenso. Quando o maridão ainda bolava uma saída, ela ressurgiu com Lucas, pijama de bolinhas, olhos fechados.

– Lucas, você gosta de brincar com borracha moída?

O menino cambaleava.

– Deixa ele dormir – apressou-se Rogerinho. E emendou: – Brincamos de pista de asfalto, rastilho de pólvora, chuva de carvão…

– Elementar, meu caro 171, já desconfiava, você espalha esse treco no tênis como se tivesse jogado!!! – desvendou a mãe, ao estilo Sherlock Holmes.

– O que é chuva de carvão? – perguntou Lucas.

– O menino tá zonzo, acha que é pesadelo. Amanhã tiramos isso a limpo – exigiu Rogerinho.

Cristina entrou e não voltou mais.

No silêncio da varanda, Ribamar provocou.

– A estagiária valia essa borrachada toda?

Quase teve briga.

Rogerinho não dormiu e cedinho acordou Lucas. Pegou os sacolés que ainda restavam no porta-luvas e começou a criar brincadeiras. O moleque não entendeu nada, mas divertiu-se com a companhia do pai. Cowboy na mão, Rogerinho falava: “Vamos Tom, encha esses barris de pólvora!”. Cristina passou pelo corredor e assistiu a cena, incrédula. De cara amarrada, esboçou um “cara de pau” e voltou a dormir.

Texto publicado originalmente na coluna a “A Pelada Como Ela É” no dia 02 de junho de 2012.

COISA DE CINEMA

:::: por Paulo Cezar Caju ::::


Alô, saudosistas de plantão, na próxima terça-feira, às 20h, no Museu do Futebol, em São Paulo, o negão aqui estará na telona, na inauguração do 7º CineFoot, estrelando “Barba, Cabelo e Bigode”, sem qualquer exagero, um filmaço de Lucio Branco. Eu sou o Cabelo, Nei Conceição, o bigode, e Afonsinho, a barba. É muita poesia envolvida!

Assistindo, vocês entenderão um pouco de minha ranzinzice com o futebol atual. Nem falo de qualidade, mas de comportamento, de conteúdo. O Lucio Branco conseguiu abocanhar essa poesia e algumas cenas nos levam às lágrimas, como Nei e Afonso, amigos inseparáveis, tocando a bola na beira da praia e caminhando pelas ruas de Paquetá. Aquilo era futebol. Não precisava nem do Maracanã para fazermos futebol porque futebol vai muito além dos gramados. Chega, eu preciso comentar é sobre o futebol atual.

Então aí vai: quer dizer que para não cair o Inter trouxe o Argel, depois o Falcão, Celso Roth e, agora, o Isca? Deixa pra lá! Só lembrando que o Vasco já perdeu para o Ceará, no Maracanã, numa dessas Segundas Divisões que o clube participou. Mandaram o Levir Culpi embora faltando quatro rodadas para o campeonato terminar. Coisa de gênio.

Outro dia ouvi uma horrível sobre o Flamengo e seu cheirinho: agora de hepta só restou o endereço do clube, na Lagoa, na Epta-cio Pessoa, meu Deus! Não reclamo dos treinadores do Sul, mas da escola retranqueira. Cuca é do Paraná, vizinho dos gaúchos, que dominam o futebol, mas não foi influenciado. Apesar de ter algumas recaídas, seus times são mais ofensivos e ele merece ser campeão.

Pronto, falei, agora deixa eu voltar a pensar naquele tempo em que até o nome dos craques carregavam poesia: Nei Conceição, preciso dizer mais alguma coisa?