DOUGLAS, MEU HERÓI
por Marcelo Mendez
Sabe qual é? Douglas é o meu herói e foda-se o resto!
E tô pouco me fodendo se ele enche a cara, se sai com a mulherada, se quebra na noite, foda-se! Vomito em cima de moralistas hipócritas e não tenho nada a ver com a porra da vida de ninguém, não sou fiscal da cama de ninguém, trabalho muito e não tenho tempo pra futricagem. Nada disso me interessa!
Douglas é meu herói para muito além do tanto que ele joga de bola. É meu herói porque em tempos chatos, carolas, bicudos, cheio de “pofexô” burro e retranqueiro, ele é a resistência. É a insistência de que o futebol pode ser jogado com arte, com malandragem, com inteligência.
É no atalho que a mesmice cria, que Douglas deita e rola. É no vacilo do óbvio ululante que Douglas brilha.
Na final, contra o Atlético-MG, mesmo cercado por três marcadores, conseguiu dar um passe magistral de calcanhar deixando o companheiro Éverton na cara do gol, mas o chute parou nas mãos do goleiro Victor!
É um cara que entra em campo para dar meia dúzia de tapa na bola e acelerar seu time como um bólido de duas mil Ferraris em fúria. É um cara que se diverte jogando bola com a 10 nas costas como tem que ser.
Agora quero só desabafar pela arte, saudá-lo e agradecê-lo porque é muito bom vê-lo jogar bola.
Obrigado, Douglas. Você joga por todos nós.
CRAQUES CELESTES
Junto com o Canal 100, a equipe do Museu da Pelada participou ontem à noite, no Minas Centro, da festa de comemoração dos 50 anos da conquista da Taça Brasil, atual Campeonato Brasileiro, em 66! Grande destaque da final, contra o Santos, de Pelé, Dirceu Lopes bateu um papo emocionante com Sergio Pugliese!
Tendo vestido a camisa do Cruzeiro por 14 anos, o craque elege o título de 66 como o mais importante da sua brilhante carreira! Além disso, Dirceu afirma que jogar na Raposa foi a maior alegria da sua vida.
– Eu não tenho nem palavras pra expressar a felicidade por vestir a camisa do Cruzeiro por esse tempo todo! Devo tudo a esse clube! Jogar no Mineirão com 100 mil torcedores gritando seu nome não tem preço!
Durante o papo, o ex-jogador revelou um episódio divertidíssimo. Enquanto estava concentrado em um hotel de São Paulo, recebeu a visita de Garrincha, que o elegeu como o maior jogador que viu jogar!
– Eu só não desmaiei porque eu estava deitado na cama quando ele chegou! – disse o craque do Cruzeiro.
A ausência na lista dos convocados para a Copa de 70, sem dúvidas, é a maior frustração de sua carreira. Dirceu, no entanto, afirma que suas glórias e conquistas anulam qualquer tipo de decepção.
– Ouvir do Pelé que eu sou o maior jogador da história do Cruzeiro é muito gratificante!
O VOO DO PERIQUITO
por Marcelo Vieira Dias
O Periquito ter ido embora num estranho domingo sem futebol não cabe no poema. Logo ele, jogador das divisões de base do Ferroviário e filho de Newton Ferreira, lendário centroavante maranhense na década de 1930, de quem herdou a posição e o amor pela bola. Mas, franzino, Periquito acabou desistindo cedo dos caminhos do futebol profissional – foi para o Rio de Janeiro e lá fez-se Ferreira Gullar, poeta, crítico, tradutor, ensaísta, jornalista, defensor das liberdades, vascaíno e apaixonado, como sempre, pelo futebol.
O poema “O gol” é o texto mais conhecido do Periquito sobre futebol, mas não foi o único. As referências ao esporte estão espalhadas por suas obras, colunas, versos e incontáveis entrevistas que ele concedeu ao longo da vida.
Canhoteiro é considerado um dos melhores pontas da história
Nos idos da década de 1940, Periquito formava, com Esmagado e Canhoteiro, a mais talentosa das linhas de ataque que se apresentavam nas peladas do Campo do Ourique, no Centro de São Luís. Na meia esquerda, Esmagado, que durante mais de uma década brilharia com as camisas do Ferroviário e do MAC, combinava raça e técnica. Anos depois, já técnico, ele fundaria uma das primeiras equipes de futebol feminino do Brasil, o Aurora.
Mais à frente, na ponta esquerda, Canhoteiro já entortava e desentortava zagueiros, exatamente como faria, alguns anos depois, no São Paulo e na Seleção Brasileira, o que o levou a ser chamado de “Garrincha do Morumbi”.
Um dia, muitos anos depois, Periquito contou a Armando Nogueira que tinha sido colega de pelada de Canhoteiro. Armando, imediatamente, pensou em preparar o encontro dos dois. Canhoteiro, ao saber da novidade, entre gozador e incrédulo, perguntou a Nogueira: “Não me diga, o Periquito virou poeta?!”.
E que poeta, Canhoteiro….
O GOL
A esfera desce
do espaço
veloz
ele a apara
no peito
e a pára
no ar
depois
com o joelho
a dispõe a meia altura
onde
iluminada
a esfera
espera
o chute que
num relâmpago
a dispara
na direção
do nosso
coração.
ÁRBITRO SHOW
por André Mendonça
“Sempre fui ruim de bola e o último a ser escolhido! Entre jogar e apitar, preferia ser o juiz nas peladas”. A frase é de Clésio Moreira dos Santos, um dos árbitros mais famosos do Brasil. Aposentado dos jogos profissionais desde 2004, o “Margarida” ganhou fama nacional, principalmente, pelo seu jeito espalhafatoso de apitar as partidas. Em entrevista ao Museu da Pelada, Clésio contou um pouco da sua trajetória na carreira.
Se dentro de campo o Margarida controlava as partidas sempre com bom-humor, alegrando jogadores e torcedores, fora dele nem tudo foram flores. A arbitragem deixou de ser uma brincadeira e passou a ser uma necessidade quando seu pai abandonou a família e Clésio teve que arrumar uma maneira de ajudar em casa. Antes de fazer o curso de arbitragem, apitou alguns jogos para ganhar uma pequena quantia de dinheiro.
Muitos não sabem, mas o início do Margarida nas partidas profissionais foi como bandeirinha e, só em 1994, a lenda do futebol brasileiro começou a desfilar, literalmente, no meio dos gramados.
– Apitei profissionalmente durante 16 anos, sempre com muita irreverência. Por causa desse meu jeito, muitos times exigiam a minha escalação nas partidas para atrair a torcida! Era uma atração à parte! – lembra o árbitro.
Por conta do jeito inusitado de apitar as partidas, as comparações com o árbitro Jorge José Emiliano dos Santos, o primeiro “Margarida” do futebol brasileiro, foram inevitáveis. Embora o estilo fosse bem parecido, Clésio garante que não copiou o saudoso árbitro.
– Eu já tinha visto alguns árbitros apitando de maneira extravagante, mas comecei a colocar gestos próprios em prática. Tive o prazer de estar com o Jorge Emiliano uma vez, quando fui seu árbitro reserva em uma partida em Florianópolis.
Nas muitas entrevistas que deu ao longo da carreira, Clésio sempre afirmou que “foi o percussor de usar uma cor tão feminina (rosa) num esporte tão machista, que é o futebol”. De acordo com ele, a escolha pelo rosa aconteceu por que o uniforme preto deixava os árbitros parecidos com manequins de funerária.
Apesar de ser casado com Marlussi e pai de três filhos, Mariana, Guilherme e Pedro, o árbitro que vestia cor de rosa conviveu com muitas piadas de mau gosto durante a sua carreira. Clésio afirma, no entanto, que sempre soube controlar as partidas e nunca deixou isso atrapalhar.
– No início cheguei a ouvir algumas piadinhas dos jogadores, mas nada que me deixasse irritado. Eu sempre tirava aqueles momentos com muita criatividade e os jogadores ficavam sem reação!
Em 1995, no seu segundo ano como árbitro principal, deu um grande passo na carreira e começou a trabalhar na CBF. No quadro nacional, sua estreia ocorreu na partida entre Internacional e Flamengo, no Beira-Rio. A partida, aliás, é considerada por Magarida como a mais marcante de sua vida.
Embora recebesse constantes ligações de Ivens Mendes, na época presidente da Comissão Nacional de Arbitragem de Futebol, alertando para não fazer gracinhas dentro de campo, Clésio revelou que aquela sua performance era inevitável.
– Confesso que ao entrar em campo, no meio de 22 jogadores, com aquele cheirinho de cânfora, eu não aguentava e começava a soltar a franga!
Hoje em dia, aos 57 anos de idade, Margarida continua dando “show” em partidas beneficentes, sempre com muita irreverência, e garante que a agenda fica cheia do início ao fim do ano, não só no Brasil.
– Apito partidas beneficentes, amistosas e, se precisar, valendo os três pontos! Tenho viagens por todo o Brasil e já passei por mais de 40 países. Já tenho uma turnê agendada para 2017 na Inglaterra, Espanha e França.
DESCULPE-NOS, COLÔMBIA
por Zé Roberto Padilha
Infelizmente a visão que tenho do mundo foram passadas, e reprisadas, pela telinha que meu pai comprou em 1956. E perduravam até hoje. Era uma inédita televisão Emerson bege, e a Rua Barão de Entre-Rios vinha toda noite assistir aquela novidade com a gente. Se os americanos foram colonizados pelos ingleses, e perderam a oportunidade de nos descobrir, trataram de aperfeiçoar sua tecnologia e cismaram de colonizar a nossa mente. E, em cada canto do nosso país, minha geração, dos anos 50, foi dominada pelos seus filmes e a cultura que nos passavam em preto e branco
Nossos heróis não foram Zumbi, o Rei dos Palmares, muito menos Tiradentes, o primeiro a ir para as ruas protestar contra o aumento dos impostos e os abusos do governo. Eles foram Tarzan, Capitão Marvel, Lassie e Rin-tin-tin. Seus nativos originais, os indígenas americanos, foram exterminados em seu habitat pelos vírus, canhões ingleses, e acabaram expulsos do seu território. Mas a versão produzida pelos estúdios da MGM e Paramount era o contrário: John Wayne, Clint Eastwood e o Trinity eram os mocinhos que defendiam as aldeias atacadas por “sanguinários” peles vermelhas. Pobres bandidos do bem fazendo cara feia no cinema para a gente. Quando entramos na universidade e tivemos acesso aos relatos dos vencidos, era tarde: já tínhamos colecionados todos os discos do Elvis. E meu pai comprado toda a coleção do Franck Sinatra e meus filhos dançaram no colégio a coreografia de Thriller.
Quando John Kennedy morreu, choramos mais lá em casa do que por Getúlio Vargas. Quando Jango foi para o Uruguai retirado do seu cargo pela ditadura militar, não era com o futuro da nossa bela primeira dama, a Maria Tereza, que estávamos preocupados: era com a Jacqueline Kennedy que se casava com Onassis. Gatos, então, coitados, esta criatura adorável, trataram de retirar do nosso cotidiano pois nos desenhos animados o Tom não parava de perseguir o Jerry. Era o bandido da história e quando aparecia nos filmes de Hitchcock, pelo regime de cotas, era preto, sinistro, símbolo do azar e de atrair coisa ruim. E todos os brasileiros passaram a ter um cão e desprezar os gatos dentro de suas casas.
E com vocês, povo colombiano, não foi diferente. A versão da telinha produzida por Hollywood não teve exaltação a Simon Bolívar, a Francisco Santander, seus libertadores das garras do domínio espanhol. Seu herói por aqui sempre foi Pablo Escobar. E seus produtos de exportação não passavam de maconha e cocaína. Quantas vezes Arnold Schwarzenegger foi até suas selvas, as vilas imundas dos cenários que produziam, trazer reféns de volta em meio a violência dos seus traficantes? E em nenhum filme foi falado que o maior mercado consumidor de cocaína do mundo era o norte-americano.
E, de repente, em uma quarta-feira entristecida, toda a não ficção exportada por eles é substituída por um gesto que nos deixou tão emocionados quanto envergonhados. Nenhuma nação do mundo seria capaz de produzir ao vivo, não em falsos cenários, um espetáculo tão respeitoso e bonito quando enlutaram seu estádio, e o ocuparam todo à sua volta, para glorificar seus adversários. E ainda conceder-lhes o título que por tanto lutaram.
A partir de hoje, povo colombiano, nós, brasileiros, prometemos não ir mais às locadoras buscar mentiras magistralmente dirigidas contra vocês. Mesmo que tenha a Angelina Jolie no papel principal. Recebam as nossas sinceras desculpas e nem precisamos pensar em vingança: eles mesmos acabam de escalar um “bandido” para dirigir o seu destino.