FUTEBOL E SAMBA
por André Felipe de Lima
Futebol e samba formam uma das mais harmoniosas relações culturais no Brasil. Ir a um estádio de futebol ou a um bar após os jogos e não ouvir um samba é como se estivéssemos assistindo a um “empolgante” clássico entre Spartak de Moscou e Dínamo de Kiev na antiga União Soviética sob um frio siberiano de quebrar os ossos. Aqui, samba na arquibancada é lei. Mesmo que divida espaço com alguns gritos importados de torcidas portenhas e adaptados pelas ditas “organizadas”. Não importa. O que cai no gosto do povo é o samba. “Domingo, eu vou ao Maracanã…”. Esse, sob a voz de Neguinho da Beija-Flor, é canção obrigatória. Tornou-se hino da inebriante festa promovida por torcedores ao perceberem que a fatura está liquidada a favor do time para que torcem.
Beth Carvalho e Cartola
Futebol, samba, sambistas… estes sambistas que amam seus clubes. Cartola, especulam, teria feito das cores da sua Estação Primeira de Mangueira uma adaptação do pavilhão do seu amado Fluminense. Da bandeira tricolor, descoloriu o grená tornando-o rosa e manteve o verde. Daí nasceu a “Verde e Rosa” mais famosa do mundo. Cartola não foi, porém, quem imortalizou sambas sobre futebol. Um nome se destaca nesse quesito: Wilson Batista, um rubro-negro ferrenho que era capaz de chorar sangue pelo Flamengo. Fez dois sambas antológicos sobre o clube da Gávea.
Vascaínos sambistas também tem aos montes. Noel Rosa (que dizia torcer pelo Fausto, logo vascaíno, mas que também torcia pelo Monteiro, do Andarahy), Nelson Sargento, Martinho da Vila, Paulinho da Viola, Aldir Blanc, Luiz Melodia… nenhum deles imortalizou o Vascão em suas composições. De botafoguenses há também uma leva bacana, na qual integram Roberto Ribeiro (que foi goleiro do Goytacaz e chegou a treinar no Fluminense), Walter Alfaiate, Mauro Duarte e Beth Carvalho. É dela, da Beth, a letra do samba que embalou a torcida após o título carioca de 1989, que tirou o Botafogo da fila de espera após 21 anos de “jejum”: “Esse é o Botafogo que eu gosto/ Esse é o Botafogo que eu conheço/ Tanto tempo esperando esse momento, meu Deus/ Deixa eu festejar que eu mereço/ Mas é esse/ Esse é o Botafogo que eu gosto/ Esse é o Botafogo que eu conheço/ Tanto tempo esperando esse momento, meu Deus/ Deixa eu festejar que eu mereço/ É tão bonito ver/ Minha gente sorrindo de emoção/ O meu Brasil/ De ponta a ponta chorando, vibrando/ Saudando o Botafogo campeão/ O meu Brasil/ De ponta a ponta chorando, vibrando/ Saudando o Glorioso campeão”.
Mas foi Wilson Batista o sambista nitidamente mais empolgado. O primeiro samba dele sobre o seu amado Flamengo, “E o juiz apitou!”, é uma deliciosa crônica sobre o time do primeiro tricampeonato estadual (1942 a 44): “Eu tiro o domingo para descansar/ Mas não descansei/ Que louco eu fui/ Regressei do futebol/ Todo queimado de sol/ O Flamengo perdeu/ Pro Botafogo/ Amanhã vou trabalhar/ Meu patrão é Vascaíno/ E de mim vai zombar/ Foram noventa minutos/ Que eu sofri como louco/ Até ficar rouco/ Nandinho passa a Zizinho/ Zizinho serve a Pirilo/ Que preparou pra chutar/ Aí o juiz apitou/ O tempo regulamentar/ Que azar!”.
O segundo, “Samba Rubro-negro”, faz uma homenagem ao timaço tricampeão de 1953 a 55: “Flamengo joga amanhã/ Eu vou pra lá/ Vai haver mais um baile no Maracanã/ O mais querido
Tem Rubens, Dequinha e Pavão/ Eu já rezei pra São Jorge/ Pro Mengo ser campeão/ O mais querido/ Tem Rubens, Dequinha e Pavão/ Eu já rezei pra São Jorge/ Pro Mengo ser campeão/ Pode chover, pode o sol me queimar/ Que eu vou pra ver/ A charanga do Jaime tocar: Flamengo! Flamengo! / Tua glória é lutar/ Quando o Mengo perde/ Eu não quero almoçar/ Eu não quero jantar”.
Em São Paulo, Adoniran Barbosa fez do seu Corinthians fonte de inspiração. Compôs “Corintiá – Meu amor é o Timão”. A letra diz assim: “Como é bom ser alvinegro/ Ontem, hoje e amanhã/ Respirar o ar mistura/ Do Tietê a Tatuapé/ Lá no alto a velha Penha/ Da Anchieta e Bandeirantes/ Ver São Jorge lá na lua/ Abençoando a fazendinha/ Onde mora um gigante
Tem igreja e tem biquinha/ Coríntia, Coríntia/ Meu amor é o Timão/ Corítina, cada minuto/ Dentro do meu coração/ Belém, Vila Maria e Mooca/ E São Paulo extensão/ Mogi, Guarulhos, Itaquera/ Tudo vibra Coringão/ É o Cornítia de ‘nóis’ tudo/ É paulista é campeão”.
A paixão em verbo dos sambistas paulistanos pelo Corinthians não deve nada a de alguns do Rio pelo Flamengo ou Botafogo. Baltazar, centroavante inesquecível, cuja história lembramos recentemente nesta página, era um indefectível ídolo e seus gols de cabeça cativavam uma legião de fãs. Daí para o samba um pulo. Nasceu a marchinha carnavalesca “Gol de Baltazar”, nítida reverência ao Timão campeão paulista de 1954. A letra composta pelo corintiano Alfredo Borba é até hoje cantada pelos blocos no carnaval de São Paulo. Foi imortalizada na voz de Elza Laranjeira: “Gol de Baltazar/ Gol de Baltazar/ Salta o “Cabecinha”/ Um a zero no placar (bis)/ O Mosqueteiro, ninguém pode derrotar/ Carbone é o artilheiro espetacular/ Cláudio, Luizinho e Mário/ Julião, Roberto e Idário/ Homero, Olavo e Gilmar/ São os onze craques, que São Paulo vai consagrar”.
Na década de 1970, o futebol incorporou o sambalanço de Jorge Ben Jor e de Bebeto. Nas rádios, as letras dos dois torcedores inveterados do Flamengo tocavam ad nauseam. Jorge Ben, que passeou pelos times infantis do clube da Gávea, foi o pioneiro. No seu cultuado álbum “Ben”, de 1972, ele fez de um jogador do Flamengo, o João Batista de Sales, mais conhecido como Fio Maravilha, o craque rubro-negro mais famoso de sua época. A letra foi, contudo, atabalhoadamente embargada na justiça pelo próprio Fio, que foi, provavelmente, muito mal instruído por cartolas e advogados chinfrins. Jorge Ben lamentou e alterou a letra para “Filho Maravilha”. Somente em 2007 é que o compositor pôde retomar a versão original autorizada pelo Fio Maravilha. Mas, aí, perdeu a magia.
Deixando a paixão clubística de lado, Jorge Ben também fez sucesso com o sambalanço “Zagueiro”, do LP “Solta o Pavão” (1975), o mesmo que inclui “Jorge de Capadócia”. “Zagueiro” é uma verdadeira “lição” de como um beque deve fechar a zaga do time. Jamais perguntaram ao Jorge Ben o que o motivara a compor uma letra, digamos, futebolisticamente didática. Técnicos de hoje deveriam obrigar seus comandados a ouvi-la.
No LP seguinte, o “África Brasil” (1976), Jorge Ben anunciou a célebre “Ponta de Lança Africano (Umbabarauma)”. Muita gente associa a música ao ídolo do Jorge Bem: Zico.
O samba psicodélico foi imortalizado pelo Jorge Ben, e ele jamais deixaria o futebol fora desse parangolé lingüístico na MPB dos anos de 1970.
Embalado pela conquista do título de Campeão Mundial pelo Flamengo, em 1981, no Japão, Bebeto compôs um sucesso estrondoso sobre o time do coração. “Arigatô, Flamengo” foi, sem revanchismo, cantada por torcedores de todos os times nos blocos e bailes do Carnaval de 1982. Hoje, a música está bloqueada até mesmo no Youtube por direitos autorais. Foi árdua a missão para achar um link com a gravação completa na Internet. Porém conseguimos.
Mas e Pelé? E Garrincha?… eles, os dois maiores ídolos do nosso futebol não mereceram sambas como homenagem? Sim, mereceram. E qual foi o primeiro samba ou chorinho sobre futebol? Muitos dirão: “E o Chico Buarque, tricolor, também compôs letra sobre futebol…”. Eu sei. Vão cobrar também: “Escolas de samba e futebol, quais sambas encantaram na Sapucaí?”. É papo que não acaba mais…
Mas estas e outras histórias ficarão para uma continuação desta série sobre samba, MPB e futebol. Enquanto isso, ouçam os excelentes sambas da rapaziada citada aí em cima. Até lá.
GATO DE GELO
por Luan Toja
Poucas vezes vi tamanha manifestação de confiança e frieza como foi a do goleiro Gatito Fernández na partida de ontem entre Olímpia e Botafogo válida pela Pré-Libertadores.
Após o time paraguaio abrir o placar com Montenegro aos 35 do segundo tempo, o técnico alvinegro, Jair Ventura, ainda arriscava-se de modo a tentar definir o confronto antes do término dos 90 minutos. Tendo para tal, até mesmo, colocado o atacante Guilherme no lugar do volante Airton, visando tornar o time mais ofensivo em busca do empate e, consequentemente, da classificação no tempo normal.
Entretanto, Gatito, que havia entrado no decorrer da etapa final no lugar do contundido Helton Leite, ignorou a vontade de seu comandante e logo depois de sofrer o gol paraguaio começou a fazer cera em todas as oportunidades que teve pra isso, no intuito de levar a decisão da vaga para a disputa de pênaltis. Desta forma, a cada defesa, demonstrava uma impressionante firmeza em seu próprio taco, superando as expectativas dos torcedores que receavam a entrada de um goleiro ‘frio no jogo’.
Gatito não entrara frio. Entrara gelado! Ora, se Jefferson é o homem de gelo, Fernández é o gato de gelo. A autoconfiança do goleiro logo foi justificada ao defender três das quatro cobranças penais paraguaias. A segunda defesa, na qual estatelado e impávido espalmou a bomba à queima roupa de Jorge Mendoza é, inclusive, uma das mais fantásticas da história do futebol, ultrapassando a de Gordon Banks em cabeçada do Divino Crioulo na Copa de 70. E assim, Gatito garantiu, devida e majestosamente, o lugar de um dos maiores clubes da América do Sul na fase de grupos da Taça Libertadores.
VASCONHA
Nada passa batido diante dos olhos de lince do nosso câmera Guillermo Planel. No dia da apresentação do atacante Luis Fabiano, quando gravava imagens para um projeto pessoal, flagrou a reunião de um grupo de vascaínos na Urca. Até aí, tudo normal, visto que o goleador foi recebido com muita festa pelos torcedores.
O que despertou a curiosidade de Guillermo, no entanto, foi uma das bandeiras do grupo, que estampava o nome da torcida “VASCONHA” e o rosto do ex-presidente uruguaio Pepe Mujica, padrinho do grupo vascaíno. Vale lembrar que, em 2014, Mujica legalizou a maconha em seu país, alegando ser uma maneira de lutar contra a economia do mercado negro.
Fomos pesquisar mais sobre a rapaziada do Vasconha e reparamos que a turma se diferencia das demais torcidas organizadas, a começar pelo número de integrantes que não chega nem perto do habitual. Contudo, é importante ressaltar que o grupo não tem a intenção de ser uma organizada e busca apenas torcer em paz, como podemos notar na descrição da página do Vasconha no Facebook: “Na varanda sagrada da Colina Histórica, surge uma amizade em prol do C.R. Vasco da Gama. A luta é pelo respeito à instituição. Nosso Padrinho é o Mujica!”.
Em um momento de grande discussão sobre a descriminalização da maconha, o grupo vascaíno parece ter saído na frente e levantou, literalmente, a bandeira. Você apoiaria tal iniciativa?
FESTA DO AREIA
Através do parceiro Dime Cordeiro, um dos maiores zagueiros do futebol de praia do Rio de Janeiro, recebemos o convite para participar da festa de 50 anos do tradicional Areia, do Leme, e não pensamos duas vezes antes de aceitar e ser um dos patrocinadores da confraternização.
Se hoje em dia o futebol de praia está longe de ser o esporte mais praticado entre a garotada, o mesmo não se pode falar do passado. Grandes craques do Brasil deram os primeiros passos nas praias do Rio de Janeiro, em uma época em que centenas de pessoas se aglomeravam para assistir aos clássicos em Copacabana.
Neimar, Neyvaldo e Dime
O Areia Leme, sem dúvida era um dos times mais temidos pelos rivais. Enquanto Dime Cordeiro fazia a segurança lá atrás, Neimar e Neyvaldo faziam chover no ataque e balançavam a rede com extrema facilidade.
– Jogamos juntos por uns 20 anos e vivemos grandes momentos na praia.
O artilheiro Neyvaldo reforçou a felicidade por participar dos 50 anos da equipe.
– O mais legal disso tudo é que a amizade permanece. O Areia é um grupo de amigos. Além de companheiros de time, somos amigos desde os seis anos de idade.
Quem também fez questão de participar da festa foi o craque Adílio. Embora tenha sido ídolo do Royal, do Leblon, rival do Areia, o ídolo do Flamengo vê o encontro como uma boa lembrança do futebol de praia do Rio de Janeiro.
Ao ser perguntado sobre qual time costuma vencer o duelo, Adílio puxou a sardinha para o seu lado:
– O Royal vencia mais!
Ao saber da resposta de Adílio, Dime preferiu não polemizar:
– Nessa época eu ainda não era nascido.
Por fim, o camisa 8 da Gávea exaltou a amizade com Neimar, com quem dividiu as quadras com a camisa da seleção brasileira e foi campeão mundial na Holanda.
– Esse cara é meu ídolo. Tive o prazer de conviver com ele durante um mês e meio e aprendi muito com ele! – retribuiu Neimar.
DIA DA ALEGRIA
Recentemente, com muita alegria e satisfação, comemoramos um ano de Museu da Pelada, um projeto novo, que superou todas as expectativas possíveis com resenhas emocionantes e inigualáveis! Além de celebrar, a confraternização também serviu para agradecer a todos que nos acompanham e nos ajudam a ir em busca da poesia perdida e do ineditismo num esporte que se torna cada vez menos romântico.
O local da festa não poderia ser outro: o Bar da Pelada, do parceiro Guilherme Careca, na Rua Souza Lima, em Copacabana. Palco de futuros encontros com os jogadores, o bar recebeu grandes amigos e a festa contagiava até os transeuntes. A cerveja estupidamente gelada somada ao som de Silvio Villas, o rei do cavaquinho, animava a galera, que soltou a voz relembrando sambas históricos.
– É HOJE O DIAA DA ALEGRIAA… – cantavam em coro.
Além de Moacyr Luz, Afonsinho, Sérgio Sapo, quem também não quis ficar de fora da festa do Museu foi Rodrigo Santoro. Mesmo sem saber que era a nossa confraternização, o ator, que já contou de suas experiências no futebol para o Museu, gostou da algazarra e se deliciou com a saborosa feijoada do Bar da Pelada. No dia seguinte, a ansiedade pelo aniversário de dois anos do Museu já tomava conta da nossa equipe!
Cada texto, curtida, foto, compartilhamento, elogio, crítica, sugestão e comentário são muito gratificantes! Recebemos com muito orgulho e é um dos nossos maiores combustíveis!! Vocês fazem parte do Museu!!
Vem muito mais por aí!! É só o começo de uma longa trajetória!!