A PRIMEIRA PARTIDA DE FUTEBOL NO BRASIL
por Vanderlei Tomaz
Recentemente fomos surpreendidos com a notícia veiculada na imprensa mineira sobre a descoberta pelo amigo pesquisador Ernesto Giudice Filho, responsável pelo Arquivo Histórico do Instituto Granbery, de que no dia 24 de junho de 1893 aconteceu no antigo campo de esportes do colégio, na Rua Batista de Oliveira, uma partida de “foot-ball” entre as equipes “gregos” e “troianos”, formadas por alunos.
O fato foi noticiado pelo jornal local O Pharol e está documentado no diário do Professor John McPhearson Lander, norte-americano, então reitor da instituição que viu esta prática na Inglaterra e foi responsável por trazer a bola e as regras do jogo para nossa cidade. O que nós sabíamos até então é que quem introduziu o futebol no Brasil foi o inglês Charles Miller, em 14 de abril de 1895, data do primeiro jogo, na cidade de São Paulo (na Várzea do Carmo, no Brás, entre equipes formadas por funcionários de duas companhias).
O professor Lander e o antigo campo de futebol do Granbery.
Diante dos fatos – fartamente documentados – divulgados pelo professor Ernesto, precisamos rever este assunto e passar a creditar ao Professor Lander, ao Colégio Metodista Granbery e a Juiz de Fora o feito memorável de serem responsáveis pelo primeiro jogo de futebol no Brasil.
MESTRES DO SALÃO
por Sergio Pugliese
“Caro Sérgio, estou indo dormir triste e preocupado. Acabo de ler que o Vila Isabel, simpático clube da 28 de Setembro, está atolado em dívidas e encerrará as atividades. Joguei no Grajaú Tênis por oito anos e enfrentei o Vila por diversas vezes, sempre contra timaços. Fiz amigos, como Mazuta, Zé Mário, Bottino e Marquinhos, sem falar nas lendas Serginho, Aécio, Gizo, Celso, Adilson e outros que formaram o melhor time de futebol de salão de todos os tempos. Quem viu, sabe. Não valeria uma pelada de mobilização?”. A mensagem do amigo Luiz Antonio, o Tonico, camisa 10 do Xavier, acendeu o sinal de alerta e fomos nos aprofundar no tema. A conclusão de nosso farejador Reyes de Sá Viana do Castelo foi a pior possível: com o crescimento dos condomínios os clubes de bairro reduziram drasticamente o número de sócios e para sobreviver muitos desmantelaram seus times principais e outros, sem opção, fecharam as portas. Na década de 60 e 70, os campeonatos estaduais pegavam fogo, o nível era altíssimo e os torcedores lotavam as quadras para babar com o talento de Hugo Aloy, do Fluminense, Julinho, do Flamengo, e Edgar, do Imperial. Eram memoráveis clássicos, mas o charme perdeu o fôlego e Jacarepaguá, Canto do Rio, Mackenzie, Manufatura, Bonsucesso, Piedade, Atlas, São Cristóvão, Helênico, Monte Sinai, Vitória, Grajaú Tênis e tantos outros deixaram seus times pelo caminho.
– O salão era um celeiro de craques e sem qualquer bairrismo os times paulistas, para conquistarem os primeiros campeonatos nacionais, tiveram que contratar cariocas – garantiu o vitorioso técnico Sebastião de Sá-BE TUDO, o Tião Búfalo.
Para debater a época de ouro dos times de salão, a equipe do A Pelada Como Ela É reuniu para uma resenha, na Associação Atlética Banco do Brasil, na Tijuca, seis jogadores fenomenais, verdadeiras lendas e considerados por muitos especialistas insuperáveis em suas posições até hoje: o ala Serginho, do Vila Isabel, o ala esquerdo Álvaro, do Carioca da Gávea, o ala direito Mauro Bandit, do Vasco, os pivôs Tamba, do América, e Paulinho Careca, do Cassino Bangu, todos da década de 60 e 70, e o beque parado Paulinho Shaolin, do Bradesco, da geração seguinte.
– Não há similares no mercado de hoje – atestou Tião.
Três craques do futsal, Sérgio Sapo, Marinho Picorelli e Marcelo Grisalho ajudaram nossa equipe a reunir o grupo. Quando chegamos na AABB, Mauro Bandit já estava lá. Me emocionei ao vê-lo porque já ouvira incontáveis histórias sobre ele durante esse um ano e três meses de coluna: “não há nada igual”, “a bola some em seus pés”, “é um mago”. Mauro Bandit começou no infanto do Carioca da Gávea e passou por Fluminense, Flamengo, Vasco, Palmeiras, Lázio e Ortan, da Itália, Toledo e Interview (pentacampeão), da Espanha, e Maatrich, da Holanda. Aí, estourou o joelho. Em Alicante, criou o primeiro curso de treinadores e se a Espanha hoje é uma potência na modalidade ele é um dos responsáveis. De repente, seus olhos brilharam. Álvaro e Paulinho Careca chegaram!
– Meus Deus, nunca vi jogadores como eles – comentou, baixinho, para ele mesmo.
Álvaro foi eleito o melhor jogador do Brasil várias vezes, atuou pelo Flamengo, Vila, Grajaú Tênis, Municipal e seleções carioca e brasileira. Chegou de mochila porque ia bater uma bolinha depois. Paulinho Careca, o mais escrachado de todos, chegou anunciando que nunca perdera para ninguém ali e que no início da carreira amargou a reserva por três anos para o filho do diretor do Grajaú Tênis. Ali todos eram unânimes. Paulinho Careca, Vevé, do Vasco, Tamba e Hugo Aloy estão entre os melhores pivôs de todos os tempos. E olha que Tamba começou como quarto goleiro do Grajaú Tênis. Paulinho Shaolin chegou e foi saudado como o pioneiro na marcação lateral aos pivôs. Mas quando Serginho do Vila surgiu a reverência foi ampla, geral e irrestrita. Serginho, hoje corretor imobiliário, é uma espécie de guru e o ídolo absoluto de toda uma geração. Aproveitou seu prestígio e fez dois pedidos: para a Prefeitura não deixar os clubes de bairro morrerem e a inclusão do futsal como modalidade olímpica.
Em volta, torcedores da velha guarda não acreditavam no que viam. “Se jogassem hoje todos estariam milionários”, disse o fã Ricardinho. Mas os ídolos também encantavam o menino Gabriel, de 11 anos. Filho de Marcelo Grisalho, ele cresceu ouvindo histórias do pai sobre cada um deles. Quarenta anos depois, ainda ídolos! Não é para qualquer um! Ali, naquela mesa da AABB, estava reunido um time dos sonhos, gente humilde, boleiros de verdade. No fim da entrevista, Álvaro convidou todos para assistirem sua peladinha. Não iam perder essa! Foram em fila, como nos bons tempos. Se apoiaram no gradil e entreolharam-se com enorme admiração. Os mestres do salão estavam em quadra novamente.
Da esquerda para direita: Tamba, Tião Búfalo, Álvaro, Mauro Bandit, Serginho do Vila, Paulo Shaolin e Paulinho Careca.
Texto publicado originalmente na coluna A Pelada Como Ela É, no dia 16 de julho de 2011.
NARRA, PEQUETITO!
No dia 30 de novembro de 1966, no Mineirão, Cruzeiro e Santos se enfrentaram pelo primeiro jogo da decisão da Taça Brasil e a “Máquina Azul” não tomou conhecimento do adversário, adquirindo uma enorme vantagem para a partida fora de casa. Com uma exibição de gala do craque Dirceu Lopes, o Cruzeiro, que ainda contava com Raul, Procópio, Piazza, Tostão, Evaldo e Natal, aplicou uma goleada de 6 a 2 na equipe de Pelé, Pepe, Zito, Gilmar e Carlos Alberto.
No jogo de volta, mesmo podendo perder por até três gols de diferença, a equipe celeste venceu o Santos por 3 a 2, em pleno Pacaembu, e levantou de forma incontestável a Taça Brasil de 1966!
Na festa de 50 anos da conquista, Osvaldo Reis, o Pequetito narrou novamente um dos três gols de Dirceu Lopes no Mineirão, levantou a galera e emocionou o craque celeste! Imperdível!!!
FECHAM-SE UPAS, ABREM-SE CONCAS
por Zé Roberto Padilha
Tem um novo escândalo estampado nas páginas dos jornais e, desta vez, não é desvio de verbas de algum político. Nem outra obra superfaturada da Odebrecht. Tão escancarada e absurda a notícia que nem precisou de delação premiada para ser divulgada. Está escrita com cínica naturalidade e lida com uma passividade maior ainda. Pior: não assustou ninguém a ponto de ser capa da Veja. Incorporou-se de vez ao cinismo coletivo.
Mesmo com os salários dos servidores públicos do estado atrasados e parcelados, com a maioria das UPAs fechadas, com prefeitos sumidos por todo o país porque não conseguirem pagar o 13º salário, estava lá nas páginas esportivas de O Globo: Conca, um craque de futebol, pois se fosse gênio teria vestido um dia a 10 da seleção argentina, vai receber salários de 2 milhões de reais. Serão 227 salários mínimos para jogar 90 minutos, isto quando o joelho esquerdo duas vezes operado permitir, enquanto um trabalhador brasileiro vai ganhar apenas R$ 880,00 para cumprir sua jornada de trabalho de 44 horas semanais. O Presidente da República, seu vice, ministros de estado e deputados federais, com as responsabilidades inerentes aos seus cargos, receberão R$ 33.700,00. Será que existe um escândalo maior que este?
Então vamos recuar ao tempo do maior ídolo da história do Flamengo, Zico, e comparar sua remuneração com o “candidato a ídolo” que se apresenta e como recebiam os políticos que governavam o país naquela ocasião. Aos 22 anos, no auge de sua forma em 1976, o salário mínimo do país era de CR$ 768,00 e Zico ganhava CR$ 31.000,00. Isto é, 40 vezes o salário do mais humilde torcedor rubro-negro, mas que lhe dava tantas alegrias que a cada partida parecia, de tão feliz que saia do Maracanã, ter ganho sozinho na loteria. O Presidente da República, Ernesto Geisel, recebia soldo de General do Exército, CR$ 16.100,00. O futebol remunerava bem seus ídolos, seus comandantes e, como hoje, maltratava seus operários. Mas a notícia da remuneração absurda do Conca agride a nossa consciência e afasta de vez os arquibaldos, os geraldinos, que já haviam sido vetados na Copa diante do padrão FIFA de cadeiras, camarotes e áreas Vips. Elitizou-se o futebol e sacanearam de vez o bolso e a saúde do pobre torcedor.
Com o salário próximo a realidade do seu torcedor, Zico, ia para sua casa, em Quintino, subúrbio do Rio, com seu Chevette, almoçava no La Mole, levava a Sandra para dançar na New York City Discotheque e fazia suas compras no Porcão como a maioria dos cariocas. Com a carteira assinada, funcionário do clube, não tinha fotos com patrocinador para faltar ao treino da tarde. Ele não perdia um e ficava ensaiando cobranças de faltas à exaustão. Com o absurdo que recebe, Conca teve que blindar sua Mercedes que o levará ao mais sofisticado condomínio do Recreio, vai jantar no Fiorentino, Copacabana Palace e sua aparição mais próxima de um torcedor rubro-negro, a gerar carinho e cumplicidade, não passará dos seus manobristas.
Só tem uma saída para estancar este novo escândalo, e desta vez nem precisamos do Sérgio Moro: cada um torcedor do Flamengo fará, a partir da primeira rodada, sua delação protestada e não irá aos estádios. Vai pegar seu radinho e ouvir as partidas diante das suas UPAs fechadas. Se o futebol é o ópio do povo, como poderão gritar Mengo! se no lugar do Zico vir a Zica, faltar Captopril, Isordil, a manter vibrando o coração desta nação?
UPA fechada
DOENÇAS DA MINHA GERAÇÃO
por Victor Kingma
Outro dia estava lendo o artigo de um pediatra que mostrava a sua preocupação com o aumento alarmante do índice de obesidade na infância e adolescência nas últimas décadas, conseqüência da inatividade física.
O médico demonstrava ainda a sua apreensão com o aparecimento precoce de várias doenças, como hipertensão e stress, oriundas da era dos computadores, celulares e afins. Então pensei:
– Que doenças atormentavam a infância e a adolescência da minha geração, nos anos 60 e 70, e de tantas outras do passado?
Talvez uma inflamação no rosto, causada por uma espinha espremida ou, quem sabe, uma passageira verminose, fruto da alimentação com as mãos mal lavadas – prontamente curada por um bom vermífugo caseiro.
Hipertensão precoce, com tantas e saudáveis opções de divertimento, com certeza, não existia.
Obesidade, devido à falta de atividade física, também não. Afinal, gastávamos toda nossa energia correndo atrás da bola, carregando o carrinho de rolimã ladeira acima, após a “perigosa” descida, ou fugindo do pegador, nos piques de rua. Aliás, naqueles tempos, a preocupação de nossos pais quase sempre era outra:
– Menino, como você está magro! Larga um pouco essa bola e vem comer alguma coisa! Tem tomado direito o seu Biotônico Fontoura?
Stress na infância e adolescência daquela época era coisa que nem se ouvia falar. Aliás, nem conhecíamos essa palavra americanizada.
O que de pior podia acontecer e nos deixar emburrados, e não estressados, como a criançada de hoje quando a conexão sai do ar, era ficar de fora das peladas com a molecada do bairro.
Isso quase sempre acontecia quando arrancávamos a tampa do dedão do pé em alguma topada. Nada que não pudesse ser resolvido com a ajuda do providencial mercúrio cromo e um pedaço de pano para cobrir o ferimento. Pelo menos até a próxima e dolorida topada dos pés descalços em alguma pedra ou toco, nos irregulares “estádios” de terra batida.