O TRISTE DIA DOS MENINOS BOTAFOGUENSES
por Antônio Carlos Guimarães
Tarde do dia 12 de maio de 1965.
No Rio de Janeiro, Botafogo e Fluminense se preparam para uma partida do Torneio Rio-São Paulo.
Em Aguinhas, Sul de Minas Gerais, no pequeno gramado da pracinha do prédio da antiga prefeitura (onde hoje funciona o fórum), seis meninos, alunos do Grupo João Bráulio, batiam bola.
Ao fundo, na casa do promotor Dr. Ferreira, apaixonado torcedor do Fluminense, no rádio ligado em volume máximo, Jorge Curi preparava-se para mais um clássico do futebol brasileiro — o Clássico Vovô.
……………………………….
Time Mirim do Águas Virtuosas – 1966. Na foto: Andrezinho, Zé Maria, Xepinha, Rubens Nélson e Roberto
— Já dá dois times, vamu jogar! — disse o Guima. — Três do Botafogo e três do Fluminense, tá dividido. Topa?
— Par! — Ímpar! — Ganhei! — disse o Alexandre — Bola é nossa e ocês tira a camisa!
— Bola só sai na linha de fundo, num vale ficar dentro do gol, canelada é chute direto, dois num é falta, quem isola, busca — um deles anunciou as regras do jogo.
— E num vale bicuda, que a bola ainda nem foi usada — ordenou Andrezinho, o dono da bola de capotão número 3, estalando de nova.
De quatro metades de tijolos montaram as traves. No esquadrão alvinegro, alinharam-se Guima, Xepinha e Rubens Nélson. No tricolor, Alexandre, Zélias e Andrezinho. Guima e Alexandre, zagueiros; Rubens Nélson e Zélias, no meio; Xepinha e Andrezinho, no ataque.
Alexandre, Zélias e Guima, do Juvenil do Águas Virtuosas
E dois jogos inesquecíveis começaram ao mesmo tempo…
— É goool! Gooooollllll! Jaiiiirziiinhooo, camisa número 7! Eram decorridos seis minutos da etapa inicial! — esgoela Jorge Curi, para alegria do trio botafoguense. Inspirado, Xepinha recebe lançamento de Rubens Nélson e, à lá Jairzinho, dribla dois e anota o primeiro gol.
E jogo que segue, lá e cá…
Durou, no entanto, pouco mais de meia a hora a alegria dos botafoguenses. Em menos de sete minutos escutaram, por três vezes, bordões inconfundíveis do locutor caxambuense, anunciando a virada tricolor, que marcou, sucessivamente, com Evaldo, Antunes e Amoroso:
— Golaço! Açoo! Açooo!!!
— Dá-lhe garoto!
— Anootem!… Teempo e plaacar no Maior do Mundo! São decorridos 42 minutos da etapa inicial. Fluminense 3, Botafogo 1!
Botafogo de 1965. Em pé: Mura, Zé Carlos, Afonsinho, Manga, Rildo e Dimas. Agachados: Roberto, Gerson, Sicupira, Jairzinho e Artur. (Reprodução: www.literaturanaarquibancada.com)
— Ééé, mas aqui tá 3 a 1 pra nóis, num dianta chorar — falou Guima tentando abafar a gozação dos tricolores.
— Pois nóis vai virar no segundo tempo! – afirmaram confiantes Rubens Nélson e Xepinha. — Jairzinho e Roberto vão fazê quatro gol!
— Sou tricolor de coração! Sou do time tantas vezes campeão! — prosseguiu zombeteira a torcidinha mirim do Fluminense, sem dar ouvidos às bravatas alvinegras.
Veio o segundo tempo e Antunes, Gílson Nunes e novamente Evaldo selaram a sorte do Botafogo: 6 x 1 Fluminense!
— É goleada! É goleada!
— Aqui tamém é goleada, seus bobo! Tá 5 a 1 pro Bota, hehe!
— Pelada na pracinha num vale goleada no Maracanããã!!!… — devolveu a equipe tricolor.
De repente, no rádio:
— É pênalti para o Fogo! Pênalti!!! — Jorge Curi anuncia.
Expectativa na pracinha.
— Correu, atirou. É gol! Gooolll!!! Gérson, camisa número 10. Eram decorridos 33 minutos de luta na etapa final! Agora, noo placaarrr: Fluminense 6, Botafogo 2!
— Falta 15, ainda dá pra empatar! — Xepinha falou, sem muita convicção.
— Esperança é a última que morre! — Guima tentou animar o trio alvinegro.
— Navio já afundou! Navio já afundou! Num adianta chororô! — Os tricolores, dando pulinhos de contentamento, devolveram no ato.
Mas logo se calaram, pois Xepinha, magoado e de cara feia, meteu a bola no vão das pernas de quantos adversários viu pela frente e assinalou, inapelavelmente, no improvisado maracanã de Aguinhas: Botafogo 7, Fluminense 1.
Mas o sofrimento não havia acabado: aos 35 minutos do segundo tempo Gílson Nunes deu números finais ao que se tornaria o mais triste dia da vida dos meninos botafoguenses: FLUMINENSE 7, BOTAFOGO 2!
E, para cúmulo do azar, Andrezinho marca um gol…
E, assim, no Sul de Minas, em Aguinhas, o jogo também terminava: BOTAFOGO 7, FLUMINENSE 2!…
……………………………….
— A revanche será no jogo de botão, na sala de tacos da casa do Guima — avisou Alexandre, mordido pela derrota, mas mostrando sete com os dedos para os amigos botafoguenses…
Texto em homenagem a Alexandre, Zélias, Andrezinho, Rubens Nélson e Xepinha — amigos da infância e da bola, que conservo até hoje.
PARABÉNS, TOSTÃO
texto: Marcelo Mendez | fotos: Revista do Cruzeiro
Eu não vi Tostão jogar.
Li muito mais sobre o camisa 9/10 do que o assisti em campo. Talvez por isso não o imagino quando revejo seus golaços, mas o reencontro em mim, no meu coração e nas minhas memórias afetivas quando leio Marcel Proust.
Não sei qual o motivo.
Talvez pela obsessão em comum, pela sanha em alcançar a substância do tempo para poder se subtrair de sua lei, seja pela sanha de tentar apreender, pela escrita, a essência de uma realidade escondida no inconsciente recriada pelo nosso pensamento, seja pela magnitude de um gol seu, de uma caneta ou uma cotovelada dada em um inglês na hora do passe, seja por tudo:
Tostão é a essência da busca de um tempo perdido.
De um futebol que não se joga mais, de um poema que não pode mais ser escrito, de um verso que não é mais declamado, de um tempo em sonhos que não se pode mais ser sonhado; Tostão em campo ou, na caneta a bordo de sua coluna, de suas crônicas é incessante busca do encanto que se perdeu.
Hoje, ao completar seus 70 anos de idade, muito, mas muito mais do que saudar o grande craque que ele foi, eu venho ao Museu da Pelada saudar o gênio que ele segue sendo. Agradecer a vida por tê-lo em nosso dia a dia, em nosso cotidiano meramente mortal, nos dando a honra de dividir suas letras.
Por tudo isso, saúdo Tostão em seu aniversário, um homem que para mim é muito maior que Marcel Proust, por que oras…
O francês não foi tri campeão do mundo…
Parabéns, craque!
“A tabelinha de Pelé e Tostão confirma a existência de Deus”. – Armando Nogueira (Foto: Reprodução Internet)
PLANET GLOBE
Liderada pelo parceiro Guaraci Valente, a divertida rapaziada da Planet Globe, a seleção brasileira de artistas, dá show dentro e fora dos gramados! Veja a festa que as celebridades fizeram no aniversário do Flamengo!
Vale destacar que os craques já iniciaram os treinamentos no CFZ para buscarem o bicampeonato mundial! A Copa do Mundo Fut7 de Artistas será realizada na cidade de Hamadã, no Irã, entre os dias 11 e 19 de fevereiro. Os brasileiros foram campeões em 2007, na Rússia, com craques como Marcos Palmeira, Du Moscovis, Silvinho Blau Blau e Heitor Martinez! Pra cima deles!!!
VICE-LANTERNA CAMPEÃO
por Edison Corrêa
Mil novecentos e oitenta e dois foi inesquecível para doze garotos com idades entre 11 e 12 anos que participaram do Campeonato Carioca de Futebol de Salão (sim, ainda era essa a denominação do esporte) daquele ano. Os motivos serão conhecidos abaixo.
Antes da estória propriamente dita, ocorrida há 35 anos, passo a apresentar alguns personagens inesquecíveis do fato que narrarei posteriormente. À época, o presidente do Grajaú Country Clube (GCC) era um grande incentivador dos esportes, notadamente do atual futsal, exercendo o cargo de vice-presidente do clube durantes anos: Paulo Roberto Mello. O Diretor de Esportes, não menos vibrante, era apaixonado pelo ofício: Luiz Leon Haddad, ex-presidente da Federação de Futsal do Estado do Rio de Janeiro e pai de um ex-presidente do clube, Ricardo Leon Haddad. Nosso treinador da categoria mirim no 1º turno do certame ainda jogava profissionalmente na categoria adulta: Edinho, beque parado, meu xará. O técnico do 2º turno, um engravatado representante comercial, também treinava a categoria adulta, mas aceitou o desafio de pegar um time de meninos cabisbaixos, derrotados e tristes: Sebastião “Tião Bufallo”, um ícone dentro das quatro linhas do salão. O massagista do time, Zé Carlos, um negro forte, portador de necessidade especial, que usava uma bengala de ferro para andar e correr (e como corria, mais que qualquer outro em sua função!) a fim de atender os contundidos com aquela “água milagrosa”, além de – pasmem! – preparar suco de laranja e de limão para os atletas numa garrafa térmica azul. “Seu” Ivo e Luizão: técnicos da escolinha do GCC, formadores de atletas das categorias fraldinha, pré-mirim e mirim, base daquele time. Tuninho: o roupeiro, bigodinho fino, magro, jeito malandro de ponta-esquerda, amigo dos jogadores.
Não me alongarei nos pormenores, pois o fato principal foi a reviravolta de um elenco de atletas que não via uma luz no fim do túnel naquele torneio. No final do 1º turno, vencido pelo grande São Cristóvão, de Djalminha (ex-seleção brasileira de futebol de campo), filho do craque Djalma Dias; e de Jessé, um crioulo artilheiro que depois viria jogar justamente no GCC, o Grajaú amargou a vice-lanterna da competição. Pior que isso: as outras categorias do futsal do clube (fraldinha, pré-mirim, infantil, infanto-juvenil e juvenil, menos a adulta) haviam conquistado o turno, adquirindo o direito de ir para os finais do campeonato. Os olhos desconfiados dos boleiros e corneteiros do clube voltaram-se para o inexperiente técnico Edinho que, tal como acontece no futebol de campo, não resistiu à pressão e voltou a ser simplesmente atleta na categoria adulta.
Foi então que, corajosamente, Paulo Roberto e Leon deram uma cartada decisiva, que iria alavancar as vitórias daquele time que, diziam as boas e más línguas, “era excelente, mas brincava demais com a bola nos pés” devido à visível habilidade! Tião, então, pegou o grupo à unha e exigiu seriedade total nos treinos e, principalmente, nos jogos. Treinou técnica e taticamente a equipe, inclusive jogadas de bola parada. Queria chutes certeiros para o gol, não importando se a bola bateria na trave, no goleiro ou entraria. Ao final do returno, o urubu havia virado cisne, já que a conquista da taça de campeão deu a medida exata de onde aqueles garotos poderiam chegar: no lugar mais alto do pódio. Porém, um perigo se anunciava: nas finais, um outro adversário (tão forte quanto São Cristóvão e GCC) havia se classificado pelo maior número de pontos, ficando em segundo lugar nos dois turnos. A sina do vice-campeonato não poderia ter escolhido time mais afeito: o Vasco da Gama, de Luiz Antônio, craque de bola, ex-GCC, maior artilheiro da história da categoria pré-mirim (atual sub-11) com mais de 100 gols num único certame, ex-Fla/Flu no futebol de campo. O artilheiro cruzmaltino conhecia todos os jogadores do oponente, pois havia jogado, em seu primeiro ano na categoria (1981), no mirim do GCC.
As finais foram batalhas inesquecíveis, dignas da narração de um Waldir Amaral. Após empate no jogo Vasco X São Cristóvão, ganhamos o São Cri-Cri por 2 X 1. Enfim, o jogo final iria ser entre o Vasco, do já citado Luiz Antônio e do grande goleiro Hugo, Huguinho para os mais chegados – e nós, que tínhamos o seguinte elenco: Flávio “Cantarelli”, Alexandre e Renato “Pantera” (goleiros), Dudu, André e Marcelo Noronha (beques-parados), Marcelo “Cabeção” e este que vos escreve (alas-direita), Raulzinho e Márcio André (pivôs); Rominho e Jorge (alas-esquerda). Os titulares, todos no segundo ano da categoria, eram mais experientes. Os reservas, ao contrário, estavam apenas no primeiro ano de mirim e sempre entravam em quadra quando as partidas estavam “saindo faísca”, sem negar fogo e com a mesma categoria. Esta partida final foi digna de entrar nos anais deste esporte criado no Brasil.
Porém, me aterei somente ao ato final do jogo, um teatro que Shakespeare nenhum colocaria defeito. Faltando menos de um minuto, talvez trinta segundos, para o término da partida, que estava empatada em 3 X 3 (resultado que garantiria a taça para o Country), o boa-praça Rominho, um dos atuais proprietários do aprazível Bar do Adão, no Grajaú, colocou infantilmente a mão na bola. Naquele momento, tenho certeza absoluta de que o coração de Leon (sem trocadilho!) deve ter batido na casa dos duzentos, pois ele, que já passava todos os jogos do GCC (de todas as categorias!) à beira da quadra fumando seu cigarro desesperadamente e gritando com o juiz, estava de olhos fartamente esbugalhados. Quem iria correr para a bola, claro, era o craque do Vasco, Luiz Antônio. Naquela época de bola dura, que mal quicava, onde o lateral era batido com as mãos e o goleiro não podia “atravessar” a “pelota” de uma quadra para outra, tudo era mais difícil. Inclusive para o batedor, que não tinha como ser facilitado pela abertura da barreira devido ao número limite de faltas – ainda não existia tal regra também.
Bem, amigos, o que se sucedeu a seguir foi prato cheio para crônica do tricolor Nelson Rodrigues: Luiz Antônio bateu para fora, fato raro para este atleta, principalmente pela distância onde houve a punição. Ato contínuo, Leon pulou para a quadra, invadindo o jogo e gritando: “Acabou! É campeão!”. Numa fração de segundos, dezenas, talvez centenas de torcedores, seguiram o diretor do GCC e começaram a comemorar o título. O árbitro do jogo, se não me engano Daniel Pomeroy, ícone do futebol de salão dos anos 80, que apitou os anos 90 no futebol de campo e foi o único a dar um cartão amarelo em toda a minha carreira, apitou o fim do jogo e seguiu para o vestiário. Tapetão? Negativo! Ninguém, nem mesmo a cartolagem salonista da época, tiraria aquele merecido título de 1982 do mirim do GCC, um digno campeão de raça, fibra e, principalmente, superação!
Em pé: Luiz Leon Haddad, Renato “Pantera”, Flávio “Cantarelli”, Alexandre, Paulo Roberto, Rominho, Alexandre (treinador de goleiros), Tião Búffalo, Luis Carlos (Diretor de Esportes); e “Seu” Ivo;
Agachados: Marcelo “Cabeção”, André, Edinho, Márcio André, Jorge, Raulzinho, Marcelo Noronha e Dudu.
(Foto: Edison Corrêa, Senior)
Wladimir
ÍDOLO DA FIEL
texto: Marcelo Mendez | vídeo: Marcelo Ferreira | edição de vídeo: Daniel Planel
A tarde chuvosa em São Paulo não diminuía minha ansiedade…
Na minha vida de jornalista, óbvio que já falei com muita gente, que já entrevistei todo mundo, que vi pessoas que amei na minha vida, tanto quanto as que detestei. A seriedade do ofício me fez respeitar todas.
Mas não posso dizer que entrevistar um ídolo seja igual.
Ídolos não envelhecem, não têm defeitos, não sofrem, não são para os outros, não morrem… Ídolos são nossos.
Wladimir é um desses.
Quando moleque, vendo-o jogar vivi os maiores paradoxos possíveis. Ele era o lateral esquerdo do Corinthians! Como podia eu, Palmeirense, verde até a medula, gostar de um desses do lado de lá?!
Wladimir não foi apenas lateral esquerdo…
Homem culto, engajado, inteligente, bem articulado, fã do Zé Kéti, dançarino de muita classe, lutou por todas as causas sociais pertinentes a sua época enquanto jogador, sempre com o mesmo belo sorriso no rosto.
Artífice da Democracia Corintiana, Wladimir foi uma figura política muito presente naquele começo de anos 80, fundamental para que, eu e outros meninos de 13 anos na época, começassem a entender o Brasil.
Hoje, homem velho, jornalista, não escondo o frio na barriga que me deu antes de falar com ele. Mas quando ele chegou, sorriu e a resenha fluiu. O resultado, você vê agora em Museu da Pelada…