SAUDADES DO QUE NÃO VIVI
por Mateus Ribeiro
Qualquer ser humano que não tenha passado os últimos Séculos fora do Planeta Terra sabe que o futebol é um caminhão de emoções. Alegria, tristeza, frustração, decepção, agonia, euforia, e tudo mais que um torcedor possa sentir. É fato que algumas outras atividades e situações de nossa vida podem trazer tamanha carga emocional também, porém, apenas e tão somente o futebol consegue trazer o sentimento mais absurdo e inexplicável de todos: a saudade do que nunca se viveu.
Como um apaixonado, são vários os momentos que eu gostaria de ter vivenciado. Depois do gol de Basílio em 1977, talvez o momento que eu mais queria ter presenciado foi aquele fatídico 05 de julho de 1982. A Tragédia do Sarriá, que completa 35 anos exatamente hoje, foi meu maior trauma futebolístico durante alguns anos. Desde que me conheço por gente, sempre ouvi meus pais falando de um tal Paolo Rossi, sempre com os adjetivos mais carinhosos possíveis. De tanto ouvir meu pai falando de Cerezo, Falcão, Paolo Rossi, Sócrates, Sarriá, eu queria saber o que de tão estarrecedor aconteceu 03 anos, 03 meses e 28 dias antes do meu nascimento, e que mesmo assim, mexia demais comigo.
Certo dia tomei coragem e perguntei para Papai o motivo de 1982 ser um tabu tão grande. Ouvi que “depois de 1950, foi a derrota mais amarga do futebol brasileiro”. Não perguntei mais muita coisa, afinal, com oito anos de idade não conseguiria digerir nada de muito relevante. As coisas começaram a mudar de figura quando, durante a Copa de 1994, ouvi um parente falar que “se a Seleção de 82 não ganhou a Copa, não seria a de 94”. Ouvir aquilo me deixou extremamente nervoso. Afinal, se a Seleção de 1994 estava longe de ser aquelas coisas, pelo menos para este que vos escreve, aquele elenco era um verdadeiro apanhado de heróis, a Liga da Justiça Copeira. Além do que, tudo aquilo me despertou um questionamento: “Se o time de 94 pra mim é bom, imagino como é esse time de 82”. E desde aquele momento, decidi que seria questão de honra ver Romário, Dunga, Taffarel e sua turma vingarem as vítimas de Paolo Rossi.
Após o fim da Copa de 94, a euforia do título apagou um pouco dos questionamentos sobre a derrota tão falada na minha família e nos programas esportivos.
Depois da porrada de 1998, já estava mais velho, e mais preparado para sofrer. Sendo assim, resolvi por mim mesmo pesquisar sobre a Copa de 1982. Na época, Internet era um sonho distante. Comecei a me virar com livros, revistas e alguns VHS que contavam a triste historia daquele Mundial.
Descobri que a Seleção só tinha feras, todos comandados por um treinador de renome, o grandioso Telê Santana. Realmente, foi difícil entender como aquele esquadrão conseguiu perder uma Copa.
Munido de algumas informações, fui questionar meu pai (minha eterna referência futebolística) sobre a derrota por 3 a 2, e ouvi uma frase emblemática: “Não existe time invencível”. A frase entrou na minha cabeça de uma forma quase hipnótica. Depois de ouvir isso, comecei a analisar as coisas mais friamente.
A Copa de 2006, e todo o seu carnaval em cima do famigerado “quadrado mágico” me fez viver talvez aquilo que muita gente viveu em 1982: a sensação de que a taça estava garantida, e de que ninguém poderia parar o Brasil. Novamente, um time de azul apareceu no meio do caminho e acabou com os planos. Sem comparações, mas isso foi o mais próximo que vivi de 1982. Talvez com a diferença de que eu jamais acreditei naquela turma que o Parreira levou em 2006, enquanto em 1982, imagino que o país todo viveu um conto de fadas.
Aprendi que o brasileiro tem uma facilidade gigantesca em se empolgar. Seja com um time mágico, seja com um time ok que consegue resultados obrigatórios, como classificação para a Copa, Copa das Confederações e Copa América. Aprendi também que jamais deve se subestimar um adversário do porte da Itália. Independente da fase.
Mas tudo isso não importa. Posso tirar toda e qualquer conclusão. Queria estar vivo e assistindo ao jogo entre Brasil e Itália naquele 05 de julho de 1982. Gostaria de ter chorado, de ter ficado cheio de raiva, de ter xingado o Telê, o Cerezo. Queria ter a oportunidade de mandar o Paolo Rossi para o inferno, queria achar um culpado, queria falar que a arbitragem teve alguma culpa (mesmo que isso fosse mentira, pra um perdedor é ótimo usar isso como justificativa), queria chutar a tv, queria assistir aos programas esportivos da época. Dane-se que a Itália foi correta. Dane-se que o Brasil tinha falhas. Eu queria (e quero) voltar no tempo para poder viver aquele triste dia. Afinal, o futebol não é feito apenas de rosas, possui seus espinhos. E garanto que os espinhos daquele 05 de julho calejaram muita gente, que depois pode comer o filé 1994 e 2002, após roer o amargo osso em 1982.
Pode parecer loucura, mas sinto falta de ter passado alguma decepção com uma derrota da Seleção. Conforme mencionei acima, passei por algo similar em 1998, mas depois daquilo, nunca mais torci pelo time verde e amarelo. Não por causa da Copa em si, mas pelos personagens que começaram a frequentar as convocações, tudo o que envolve o time da CBF, enfim. Em 2002 já ligava para a Copa do Mundo tanto quanto ligo para o preço do petróleo. Já não fazia sentido sofrer por aquilo, e até hoje não perco um segundo sequer ouvindo Tite, Dunga, Scolari, ou quem quer que seja. Mas passo horas vendo o time de 1970, o de 1958, e até mesmo o time “perdedor” de 1982. E o de 1986 também. Afinal, sempre existe o que possa se aprender, mesmo nas derrotas.
E lá se vão 35 anos. Apesar de tantos anos, continuo com a mesma saudade do que nunca vivi. Continuo com a mesma tristeza por não ter ouvido meu pai falar do time de Telê com o mesmo sorriso no rosto que falava do time de Zagallo (e Saldanha). Porém, como não gosto de passar vontade, uma eu não vou deixar passar: VÁ PARA O INFERNO, PAOLO ROSSI.
E você, qual a saudade do que você nunca vivenciou? Conte pra nós!
AS MURALHAS DO SALÃO
por Sergio Pugliese
(Foto: Arquivo)
O ala Serginho, do Vila Isabel, driblou um, dois, três e chutou seco no canto, uma pintura! Tratado como lenda, o craque sabia que seu tirambaço tinha endereço certo. Os torcedores, inquietos, preparavam-se para comemorar o título, mas esqueceram-se de avisar ao adversário, então Wagner Firmino Rebelo Cardoso, considerado até hoje um dos três maiores goleiros de futebol de salão de todos os tempos, incorporou o homem-elástico e, num voo espetacular, evitou o gol com a ponta dos dedos. Milagre! O Maracanãzinho tremeu! A sequência de belas jogadas não cessava com tantas feras em quadra. Na época, o Vila ganhava tudo com Serginho, Adílson, Aécio, Ernesto Paulo e Cauby, o Bibi. O Mackenzie não ficava atrás e Fernando, Silvinho, Apio e Paulo Sergio abusavam do talento! Na final histórica, em 75, deu Mackenzie: 2 a 1.
– O Wagner era meio time, nunca vi nada parecido com ele – afirmou Carlinhos Tiroteio.
E se alguém tem moral e bagagem para opinar, ele é o cara! Só pelo Monte Sinai foi campeão brasileiro, em 81, e tri carioca, 79/80/81. Pelo Campeonato de Securitários, torneio concorrente ao Carioca, foi campeão pelo Bandeirantes, Capemi e Atlântica Boavista, e tri invicto pela seleção carioca dos securitários. Convidado pela equipe do A Pelada Como Ela É para eleger os melhores goleiros do final da década de 60 a 80, época de ouro do futebol de salão, ele ouviu vários amigos, atletas, torcedores e reuniu três de seus cinco eleitos numa festa no ginásio do Sindicato dos Securitários, no Engenho de Dentro. Fomos lá, claro! Conhecemos Wagner, 65 anos, o número 1 de Tiroteio, o ex-Bradesco Serginho Coelho, 46, segundo lugar, e Fernando Damasceno, 56, campeão carioca pelo Monte Sinai e vice pelo Vila e Cassino Bangú. Os outros dois votos foram para José Arthur, do Grajaú Country, o quarto lugar, e Miguel, do Imperial.
– Essa eleição vai dar polêmica, hein! – apimentou o craque Sérgio Sapo, carrasco de vários arqueiros e um dos convidados vips da festa.
– A escolha é minha! – reagiu Tiroteio.
Com um apelido desses quem iria contrariar? Mas, calma, o “Tiroteio” deve-se apenas ao fato de ter sido pavio curto em algumas fases da carreira, mas ele é amado e admirado por um Maracanã lotado. A festa estava concorrida e o reencontro entre os amigos foi emocionante. Na resenha, Tiroteio lembrou outra final espetacular vencida por Wagner: a decisão do Carioca, de 69, Grajaú Tênis 4 a 1 no São Cristóvão, em Figueira de Melo. O goleirão, cria do Grajaú, pegou até pensamento! Mas nem tudo são louros e sobre Mackenzie e Vila, em 75, o gigante Fernando Damasceno, não traz boas recordações. Vinha jogando, mas na decisão perdeu a vaga para o uruguaio Mundo Libre e, do banco, assistiu a vitória de Wagner, um de seus ídolos, além dos goleiros Hermes, do América, Mário Ricardo, da seleção brasileira, Mauro, do América, Batman, do Rocha Miranda, Serginho Aranha, do Vila, Manga, do Jacarepaguá, e Bidoni e Paulinho, do Carioca.
– Foi uma época de goleiros fantásticos – comentou Serginho Coelho, tricampeão mundial de clubes pelo Bradesco, entre outros tantos títulos.
Serginho Coelho foi lançado na arena dos leões por Carlinhos Tiroteio com apenas 15 anos de idade e não se intimidou. Na Taça Brasil, em 81, o teste de fogo! O Monte Sinai foi vencendo todos os clássicos até chegar a final, em Cuiabá, contra o poderoso Corinthians. Mas um time com Serginho, Cilo, Ney Pereira, Ricardo Rogério, Vevé, Trepinha, Jaiminho e Julio Nigri ia ter medo de quem? Final 3 a 0, gols de Vevé. O menino Serginho era uma realidade e choveram propostas, até mesmo para o time de campo do Atlético (MG). Ê, tempo bom! O presidente do Sindicato dos Securitários, Adolfo Lima, fã da turma se deliciava com as histórias. No momento da foto histórica, uma surpresa! Chegou Vevé!! Vevé é ídolo de toda uma geração e, assim com Serginho do Vila Isabel, tem status de lenda.
– Você tem que estar nessa foto, me garantiu muitos bichos! Venha! – determinou Tiroteio.
Vevé, 61 anos, integrou-se ao grupo e, sorrindo, ouviu Tiroteio lembrar a final do Carioca de 79, primeiro título importante da dupla. O Monte Sinai venceu com direito a golaço de Vevé, com lençol e tudo. Mário Ricardo, goleiro do Carioca, não conseguiu impedir. “Sorriam!”, pediu o fotógrafo. Wagner, Serginho Coelho, Fernando Damasceno, Carlinhos Tiroteio e Vevé esbanjaram sorriso. Tinham motivos para isso, pois construíram a história do futebol de salão, hoje tão modificado, mecânico e chamado futsal.
– Futsal parece nome de remédio para digestão!!! – detonou Tiroteio.
Quando ia disparar a metralhadora giratória, rapidamente foi acalmado pela turma do deixa disso. A rapaziada conhece o tamanho do pavio do homem, então, às gargalhadas, desviaram o assunto, voltaram aos anos dourados e saíram da quadra em direção ao bar abraçados ao mestre.
Oscar Bernardi
EM BUSCA DA CABEÇADA PERDIDA
texto: Marcelo Mendez | fotos e vídeo: Marcelo Ferreira | edição de vídeo: Daniel Planel
A história dessa entrevista começou no dia 05 de julho de 1982, aos 42 minutos de uma partida que começou ao meio dia no Brasil e que jamais acabará, pelo menos no coração de uma geração que por acaso é a minha.
Eram jogados 42 minutos do segundo tempo quando Éder bateu naquela bola do lado do campo e ela encontrou a cabeça de Oscar.
Resoluto, o dono da camisa 3 subiu, de olhos abertos, peito estufado e altivo, encheu a testa na bola e no pé da trave, Dino Zoff foi buscá-la. Foi o fim daquele jogo, daquele maldito 3×2 para a Itália. Começou ali o maior dos meus calvários, a minha maior desventura, em ver futebol e querer reencontrar aquele encanto que senti na Copa de 1982.
Sei que os tempos são outros.
O tempo passou e hoje não sou mais o menino que fui em 1982.
Me beijaram a boca algumas vezes, me fizeram poeta, me fiz Jornalista e entre tantas pautas, 35 anos depois daquela segunda-feira de 1982, fui até a casa de Oscar para bater um papo sobre sua carreira, sua vida, sua trajetória e claro, sobre 1982.
Hoje, seria fácil para mim se fosse apenas pra sofrer. Mas eu vi 1982…
Quem viu aquele time jogar sabe do que é a felicidade. Quem viu aquele time jogar, vai torcer pra sempre para a cabeçada de Oscar entrar, mesmo sabendo que isso não vai acontecer?
Não?
Bom… Assistam ao zagueirão em Museu da Pelada…
AINDA É CEDO, MONTILLO!
por Zé Roberto Padilha
Zé Roberto Padilha (Foto: Guillermo Planel)
De um jogador do seu nível ético e profissional não era de esperar outra coisa: seguidamente impedido por contusões a cumprir o seu contrato, não acha correto continuar a receber e não jogar. E levado pela emoção atrelada a uma profissão praticada a céu, microfones e corneteiros abertos, reúne a família, a imprensa e comunica que vai encerrar a carreira. Tudo compreensível. Menos para o futebol. Ele não pode se dar o luxo de perder tão precocemente um talento como o seu.
Deus concede um dom a cada um de nós. E um tempo certo para suas criaturas o exercerem. Aos 33 anos, está provado, o homem alcança o máximo do seu desempenho físico e intelectual. Sabe aquela manga espada no auge? Pois bem, ela teria 33 anos se colhida no tempo certo. Portanto, não contrarie seus desígnios, cuide das suas contusões dentro do tempo manual de instruções da fisioterapia e não volte porque a sua consciência, mais o clamor das arquibancadas e o desejo do Jair Ventura assim o determine. Quem é do ramo sabe que a sua quinta contusão nada mais foi que conseqüência da primeira mal curada porque todo mundo lhe queria ver jogar.
Tinha a sua idade quando ia jogar a toalha também. Jogava no Americano, de Campos, e capengava nos treinamentos após minha quarta cirurgia no joelho esquerdo. Até que apareceu um anjo negro em minha vida: Professor Paulo Nascimento. No lugar de me levar para o campo, me conduzia ao parque aquático do clube. Meus companheiros vestiam shorts, eu a sunga. Calçavam chuteiras, eu o pé de pato. Não tinha mesmo mais nada a aprender nos treinamentos, a não ser produzir nos jogos, e a natação, aos nos condicionar sem impactar as articulações, me concedeu mais quatro anos de sobrevida. Comecei com 100, 200, e hoje, aos 65 anos, nado 2.000 metros, claro, sem aquela intensidade.
Se durante a semana algum companheiro torcia o nariz porque refrescava o treino e garotas bonitas se bronzeavam ao lado, e o corneteiro de plantão cochichava “Ué, o clube contratou um jogador ou um nadador?”, tudo desaparecia domingo quando voava em campo. Caixa ampliada, cabeça motivada com pneus e amortecedores preservados.
Vamos tentar? Tenho um filho botafoguense em casa e sei da alegria que teve com sua chegada e das lágrimas que compartilhou contigo na despedida. Tenho certeza que litros de lágrimas cheias de cloro e esperança vão lhe trazer de volta para o bem de quem ama o futebol arte. E com os exemplos de cidadão decente que sempre nos concedeu
Obs. Só tem um problema: sabe aquela confraternização concorrida de final de ano com amigo oculto? Esquece. Daqui pra frente será apenas entre você e o guardião da piscina. Mas é esta solidão semanal que lhe trará de volta à multidão que lhe aguarda de braços abertos no Engenhão.
NADA SERÁ COMO ANTES
por Marcos Vinicius Cabral
Depois da Copa da Espanha, em 1982, o futebol passou a ser encarado por resultados.
Aquela derrota para a Itália do até então ineficiente Paolo Rossi, não acertou apenas uma geração de grandes jogadores, mas expôs uma fratura difícil de cicatrizar, a partir de então, no futebol brasileiro.
Sendo assim, foi posto de lado o futebol arte, envolvente, de toque de bola e acima de tudo, o futebol que vencia e convencia a qualquer custo.
Se Telê Santana (teimoso à mineira) não fez súditos, aquela seleção não teria como servir de exemplo para as menos favorecidas em material humano.
Aquela derrota, fez um mal à saúde do futebol que até hoje, vive à base de encontrar substitutos para aqueles 11 exuberantes atletas e sangra em nós.
Passados 23 anos do tetracampeonato e 15 do pentacampeonato, os programas dos canais fechados não cansam de comemorar essas datas e a galera – que nem era nascida em 82 – vai na onda compartilhando nas redes sociais.
Com isso, cada vez mais me orgulho e tenho a plena consciência do quanto aquela seleção me fez feliz, apesar do insucesso naquele Mundial.
Sobretudo, para um povo carente de ídolos, ter Romário em 94 e Ronaldo Fenômeno em 2002 como tais não chega a soar estranho e nem nevrálgico.
Então, seleções de Dunga & Cia e Kleberson & Cia, vocês, mesmo tendo beijado aquelas taças, jamais, eu disse jamais, serão e representarão o que Waldir Perez, Leandro, Oscar Luizinho e Júnior; Cerezo, Falcão, Sócrates e Zico; Serginho e Éder representaram não só para mim mas para o mundo da bola.
Parabéns aos jogadores de 82, verdadeiros campeões!