AVE, MANCINI
por Zé Roberto Padilha
Zé Roberto Padilha
Ele foi contratado para realizar uma pré-temporada atípica: dirigir em 2017 um clube de futebol sem time. Todos os outros treinadores que disputariam com ele o estadual, a Recopa, a Copa Sul Americana e a primeira divisão do Campeonato Brasileiro tinham perdido alguns jogadores e contratados outros. Mantiveram as suas bases, no máximo em um mês um novo sistema tático estaria definido. Com Vagner Mancini foi diferente: teve que organizar uma nova comissão técnica, nem o massagista ele encontrou no vestiário, e formar um novo time, já que perdeu para a posteridade dezessete jogadores. Não encontrou nem titulares, nem reservas.
Quem os levou foi quem o iluminou nesta espinhosa missão: recusou vários medalhões que se ofereceram em meio a um mar de altruísmo e fraternidade que se formou pelo país e pelo mundo, e montou um elenco de bons jogadores que carregavam, acima de tudo, uma história de superação e luta. Do Flamengo veio o Luiz Antonio, que estava no Sport, o Atlético Mineiro cedeu Lucas e Dodô, do Palmeiras Nathan e Vitor Ramos, o Londrina colocou o Caike à sua disposição e o São Paulo emprestou o Reinaldo. Douglas Grolli veio do Cruzeiro e Apodi, Neném, Osman e Wellington Paulista foram indicados por ele. Por mais que fosse um técnico rodado, nos primeiros coletivos teve que perguntar a um deles, como um treinador da base: “Em qual posição você se sente melhor meu filho?”.
(Foto: Reprodução)
Mesmo assim, como num milagre após o desastre, a bonança após a tempestade, conseguiu armar um time tão competitivo que alcançou o título estadual. Foi vice-campeão da Recopa e está classificado para as semifinais da Copa Sul Americana, ao lado do Flamengo. E após dez rodadas do Campeonato Brasileiro, ocupa a décima terceira colocação à frente de Atlético Mineiro e São Paulo. Vagner Mancini, sua comissão técnica e todo seu elenco mereciam ser reverenciados. No mínimo, respeitados. Mas ontem, sete meses depois de toda esta bonita história de reconstrução, saíram de campo vaiados após perderem em casa para o Atlético Mineiro. A imagem de um torcedor da Chapecoense exaltado, xingando os jogadores ao final da partida, só contido pela polícia, nos faz refletir: será que o luto acabou? Sabemos que o oficial decretado é de três dias, em caso de um Presidente da República, como Tancredo Neves, ele foi de oito dias. E quanto ao falecimento de um clube de futebol onde a emoção está sempre colocada acima da razão?
Segundo a psicologia, “O luto complicado não é definido por seu tempo de duração. Trata-se da compreensão de um tempo de Kairós, que designa o momento certo, e não o tempo de Chronos, que mede a quantidade de dias ou de horas”. Compreensão de um tempo. Seria mesmo pedir muito para um universo que vaia até minuto de silêncio, que fica na tocaia esperando o ônibus adversário passar com pedras na mão e que não é capaz de enxergar, mesmo jogando em casa, o valor destes novos heróis que o criador enviou para substituir os seus.
BALADA NÚMERO 7, O CANTO DO ENCANTO NA VÁRZEA
por Marcelo Mendez
(Foto: Reprodução)
A várzea sem dúvida é um berço santo de subversão de tudo que a razão tenta empurrar goela abaixo sem nenhum charme. Na várzea impera a transgressão dos sentidos.
Pensando assim, o que pode então ser mais subversivo que a figura lendária do ponta, do ponta direita?
Em tempos de glória do futebol nacional, a posição do lado do campo, foi representada por nomes como Julinho Botelho, Tesourinha, Friaça e o maior de todos, Garrincha. Eram tempos em que se driblava em cima do lenço que ficava por sobre a linha lateral, tempos em que a magia se fazia pelo lado do campo. E agora, em 2017, aonde está esse ponta?
Sim, ele está com a camisa 7 do Santa Rosa de Mauá e atende pelo nome de Fernando.
Em um domingo de multi cores, aceitei o convite de meu amigo Marcelo Ferreira a acompanhá-lo no oficio de suas funções cobrindo o futebol da bola de marrom de Mauá. A cidade do ABC Paulista acorda com um sorriso na cara em dias de jogo na várzea…
Carrinhos de feira apostos, vira-latas de fronte às maquinas de frango e seus cheirosos galetos, meninos que comem pastéis, homens que carregam instrumentos de samba de olho no relógio a esperar pela hora adequada para a primeira latinha de cerveja.
É um domingo de várzea…
A beira do alambrado da Vila Mercedes começa a encher para a segunda partida das oitavas de final do principal campeonato da cidade. Mocidade x Santa Rosa jogariam e então alguém me diz:
– Presta atenção nesse camisa 7 do Santa Rosa…
Prestei…
A inexorável mística que há na camisa 7, se faz nos pés de Fernando. Na primeira bola que pega, ele olha na cara do seu marcador o desafiando para o duelo de pernas que o futebol faz. Para, balança a anca para um lado, sai para o outro e a galera vem junto:
“OOOOOOOOLÉÉÉÉÉÉÉÉÉ!!!!”
É o maior momento do futebol. O drible do menino no marcador bufão é o que salva pra além do futebol; Consagra a vida!
Quando a bola vinha aos pés de Fernando ele a colava junto ao seu pé direito e não deixava ninguém tirá-la dele. Com a ginga de um bailarino, driblava lindamente, driblava todos, driblava todo mundo! Ao redor de sua cintura, estava ali, toda a imortalidade de gingas e gafieiras lendárias, de seus pés, sambas e picardias a fazer todos sorrirem.
Fernando driblava e sorria.
Seu time venceu, ele fez os dois gols e mesmo que não fizesse isso não importaria muito. No campo da Vila Mercedes, com a camisa do Santa Rosa, Fernando jogou por muito mais que um título. Jogou pela poesia. Driblou as caretices todas e ali naquele campo, perpetuou todo um sem-fim de odes épicas a craques imortais.
Nesse domingo, Fernando jogou por mim. A ele agradeço.
Profundamente, agradeço…
RENOVA, BRASIL!
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
(Foto: Nana Moraes)
No restaurante a tevê estava ligada em algum jogo ruim da Copa das Confederações e ninguém reparava. E olha que a casa estava cheia. Alguém da mesa ao lado até perguntou ao garçom que jogo era aquele, mas ele não soube responder. Meu Deus, que evento ruim, esvaziado e desinteressante.
Com exceção da Alemanha, que sabiamente transformou o torneio em um laboratório para a Copa de 2018, o resto é o resto. E olha que gosto do Chile, mas não vi nenhuma pinta de renovação por ali.
Camarões é a mesma correria de sempre e não evolui, não consegue deslanchar. Talvez quando pararem de investir em técnicos europeus e apostem em algum profissional do próprio país a situação melhore.
O que será de Portugal quando Cristiano Ronaldo pendurar as chuteiras? Eles ainda apostam em Pepe e Quaresma, não dá.
Projeto, de verdade, é do Alemanha, de Joachim Löw.
A lista dele para as Confederações teve apenas três campeões mundiais, entre eles Draxler, craque do PSG.
Acho o futebol dele parecido com o do Luan, do Grêmio, outro que deveria ser titular no Brasil junto com Philippe Coutinho, Marcelo, Neymar e Gabriel Jesus.
A nossa seleção precisa apostar com mais intensidade nessa renovação e deixar um pouco de lado Paulinhos, Fernandinhos e Renatos Augustos. O Luan joga com prazer e é leve. E é dessa leveza e alegria que precisamos. Mas é preciso acreditar.
O Löw escala o time e não faz substituições. Quem faz isso?
Joachim Löw
A Alemanha está preparando mais uma geração maravilhosa. Se vai ser campeã na próxima Copa, não importa, a conversa não é essa.
Esse projeto alemão começou em 2002 quando Beckenbauer convocou a cúpula de futebol e determinou “vamos parar apenas de correr e marcar, vamos driblar e encantar”.
Tiveram respaldo para isso, investiram pesado na base, o resultado veio e continuará vindo por muitos anos.
Renovar exige coragem e corajosos são raros em nosso futebol.
– texto publicado originalmente no jornal O Globo, em 25 de junho de 2017.
País
UM PAÍS PASSADO A LIMPO
entrevista: Sergio Pugliese | texto: Marcos Vinícius Cabral | fotos e vídeo: Guillermo Planel | edição de vídeo: Daniel Planel
Era final de maio e, ao sair para trabalhar, fui interpelado pelo Naldo, dono com seu sócio Ailton do mercado Carijó há 20 anos, na esquina da rua onde moro, aqui no Boa Vista, em São Gonçalo:
– Marquinhos, você tem que dar uma moral ao País! – disse apertando meu ombro esquerdo.
Por alguns segundos, pensei em o que significava “dar moral”, porém, antes de engatar a primeira marcha, ele de bate pronto mandou:
– Você não escreve pro não sei o quê da Pelada? – perguntou em tom Hitleriano sem saber que apenas colaboro.
– Sim, querido! Escrevo. Mas o que você quer que eu faça por ele, uma matéria? – perguntei já sabendo a resposta.
Ele se virou de costas, atravessou a rua e gritou:
– Passa na casa dele mais tarde! – sugeriu apontando com o dedo indicador a direção da casa do lendário goleiro do América-RJ na década de 70.
Fui trabalhar e, na hora de almoçar, por volta das 13h, resolvi dar uma passada na casa do goleiro que quase foi vendido ao Atlético de Madrid depois de fazer chover com defesas acrobáticas na vitória do Mecão, em 1977, no Torneio Teresa Herrera, disputado na Espanha.
Parei com meu carro em frente à sua casa e buzinei duas ou três vezes no máximo.
O portão de madeira se abriu e era País, com seus quase dois metros de altura (na verdade ele tem 1,87) e com sua magnificência dos tempos de atleta.
A generosidade que sempre o acompanhou enquanto foi jogador de futebol ficou escancarada ao beijar a minha mão, como agradecimento, após eu ter falado que faríamos uma matéria com ele.
Em seguida, liguei para o Sergio Pugliese e ao comentar com ele sobre fazer uma matéria com o País, ouvi do outro lado da linha:
– Sen-sa-ci-o-nal, marca com ele no primeiro sábado de junho, que iremos em São Gonçalo fazer! – disse um entusiasmado garimpador de histórias.
Então, voltei à casa de País e marquei com ele, que apesar do ceticismo demonstrado em seu olhar, fez um sinal de joia com sua enorme mão.
Dito e feito.
A equipe do Museu da Pelada chegou naquele sábado (3) para uma resenha muito especial.
Na varanda de sua casa, na rua Marajó, próximo à BR-101, um pouco antes do Piscinão da cidade – desativado há anos – País falou de tudo um pouco.
E não deixou de contar, por exemplo, do começo de carreira, na década de 70, quando contra o Flamengo pegou uma falta na gaveta cobrada por ninguém menos que Zico, sendo inclusive parabenizado pelo Galinho após a partida.
E também aos risos, contou que no encontro seguinte contra o camisa 10 rubro-negro, duas faltas bem cobradas e indefensáveis, fizeram com que ele após a partida retribuísse o gesto do jogo anterior, e ao apertar a mão da jovem promessa do clube da Gávea, reconhecesse nele, o maior batedor de faltas do futebol brasileiro.
De tudo o que foi conversado, a maior mágoa foi não ter sido vendido pelo presidente Wilson Freire Carvalhal para o Atlético de Madrid, podendo ter feito, sua independência financeira.
O papo rendeu tanto, que um dos maiores goleiros da história do América-RJ, recebeu uma caricatura feita por mim, enquanto falava de suas inúmeras defesas ao longo da conversa.
Sem contar o rico material fotográfico, que será carinhosamente digitalizado pelo Museu da Pelada.
Imperdível aos que gostam de uma boa resenha.
Marcos Vinícius, Márcio Soares Figueiredo, País e Guillermo Planel
CRIAS DO ATERRO
Crias do Aterro, Sebastião Lazaroni, Filé e Álvaro Canhoto relembraram os lendários campeonatos de pelada do Rio de Janeiro. Os torneios eram organizados pelo saudoso Jornal dos Sports com o intuito de arrecadar fundos e reunia boleiros de todos os cantos da cidade!