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A TRISTE MILONGA DO JUIZ FRACO NA VÁRZEA…

por Marcelo Mendez


(Foto: Reprodução do site Amigos da Várzea Fria)

Dos sábados pela manhã nada se espera de muito diferente das idiossincrasias que esse dia reserva para quem mora nos Bairros do ABCD, como no meu caso, no Parque Novo Oratório. Geralmente é assim, desde que existem os sábados pela manhã. Via de regra é isso, mas no último sábado vivi a exceção da coisa toda. Eu teria um jogo de várzea para fazer.

Pois é.

Da vez em questão não aconteceria clássica peleja dominical que rege a tradição do futebol varzeano. É assim desde sempre, desde que havia os campos espalhados pelas periferias que não existem mais, por sonhos que não se sonham, por poesias que não escritas, por músicas que não são mais tocadas, por paixões que não são mais vividas. Sendo assim, de acordo com o que não mais se tem, do que se nega, o fato de haver jogo na várzea sábado à tarde, afora de mudar minha rotina, nada de mais estranho provoca. Dessa forma lá fui eu.

Munido de caneta Bic, bloco de notas e alguns sambas assoviáveis e épicos, rumei para o Estádio do Nacional no meu Parque Novo Oratório para cobrir a rodada inicial do Torneio Uniligas, uma copa que reúne os campeões e vice das sete cidades do ABCD. Um campeonato que vem com toda pompa de uma competição recheada de patrocinadores, apoios, olhos atentos de todos e muitos interesses, até alguma ansiedade, ora veja.

A peleja se daria entre os times do Metalúrgico de São Caetano e o IV Centenário de Santo André. A expectativa era grande, afinal trata-se de times formados pelo que há de melhor no futebol amador da Região. Tinha camisas novas, bolas boas, técnicos atentos, focados, jogadores aflitos pelo tocar na bola. Tudo, portanto, estava pronto para que houvesse ali um daqueles jogos de muita pompa e grita. No entanto, apesar do dia ser outro, mesmo não havendo aquele romantismo de outrora, as coisas citadas são do Universo da Várzea e este, meus caros, é impar. Sendo assim, não demorou muito para que aparece-se um personagem que fizesse jus a esta tradição.

Dez minutos de jogo e então temos a primeira falta dura; Um carrinho dado com a voracidade de um solo de sax de Sonny Rollins, a riscar a perna do atacante. O árbitro, ali ao lado da jogada o que faz? Nada. Absolutamente nada. Avisado pelo auxiliar muito custa a apitar uma falta, mas não uma falta portentosa, digna de um zagueiro bufão, não; apitou uma faltinha, desconsiderando totalmente o clima do jogo, tal e qual um juiz de jogo de condomínio. O resultado foi péssimo.

A partir dali surge então o juiz fraco. Sim meus caros. O juiz fraco não coíbe nada, não grita, não se impõe, não ta nem aí para nada disso. Ele tem no semblante, toda a tragédia de uma obra Shakespeariana, tem toda a melancolia de um Huckleberry Finn, tem a tristeza dos amantes de amores frustrados.

 Não há nele a febre de uma paixão impossível, não existe em seus atos, o impulso que vira um jazz flamejante, um rock sanguíneo, nem a epifania do primeiro beijo na boca de uma adolescente virgem. Nada disso. Ele além de triste, nada mais que é um correto. Sim, vos afirmo:

O juiz fraco é um honesto! Nele não há o encanto de um juiz tendencioso, não há a poesia daquele clássico apito caseiro, nada disso. Erra porque é ruim. Falha porque apenas é fraco. Ouve gritos, xingamentos e palavrões diversos por obstinação, como ouviu o juiz de sábado. Ao término, após o 1 a 1 final me aproximei do moço. Vendo seu rosto melancólico, nada falei. Apenas lhe dei um abraço.

Sem entender muito, ele retribuiu me abraçando fortemente…

DINO DA COSTA, O PRIMEIRO BRASILEIRO ARTILHEIRO DO CALCIO

por André Felipe de Lima


Dino da Costa foi o primeiro brasileiro a se consagrar no “Calcio” (como chamam o futebol na Itália) ao se tornar artilheiro do Campeonato Italiano, quando marcou 22 gols com a camisa da Roma na temporada 1956/57. O centroavante nasceu no Rio de Janeiro em 1º de agosto de 1931. Das peladas nas ruas da Penha, na zona norte do Rio, em um clube do mesmo bairro em que morava, para os juvenis do Botafogo, em 1947, deu os seus primeiros passos no futebol.

Quem o levou a General Severiano foi seu tio Rogério. Quando chegou ao time de aspirantes, Dino teve sua primeira chance entre os profissionais graças ao técnico Pirillo, craque de bola em passado ainda mais remoto, vestindo as cores do Internacional, do Peñarol, do Flamengo e do próprio Botafogo. A estreia aconteceu durante a vitória de 3 a 0 sobre o Madureira, no dia 14 de abril de 1951. No jogo, Dino marcou dois gols. Ele e o ponta-direita Joel, que trocaria General Severiano pela Gávea numa das transações mais polêmicas do futebol carioca do início dos anos de 50, tinham acabado de sair do time de aspirantes.

Mais tarde, sob o comando do folclórico técnico Gentil Cardoso, garantiu a vaga de titular e, de quebra, foi renovando contratos vantajosos a ponto de conquistar um salário de onze mil cruzeiros mensais, em fevereiro de 1955. Estava a meses, portanto, de ter o passe negociado ao futebol italiano.


Dino partiu, mas deixou bons investimentos com o que ganhou no Botafogo. Comprou três terrenos no interior do Estado do Rio de Janeiro. Foi, contudo, no campo de futebol suas mais significativas conquistas. Dino da Costa consagrou-se como artilheiro do Campeonato Carioca de 1954, com 24 gols, jogando sempre pelo Botafogo, único clube que defendeu no Brasil antes de se transferir para o futebol italiano.

Embora desejasse ser artista de rádio, um anseio de muitos jovens de sua época, a vocação para o futebol era latente e a de goleador simplesmente espantosa. Que o digam os rivais do Botafogo. No tradicional clássico “Vovô”, contra o Fluminense, Dino da Costa marcou 11 gols, marca que o posiciona em segundo lugar, atrás apenas de Heleno de Freitas, na lista de artilheiros alvinegros contra o Tricolor. Frente ao Flamengo assinalou seis vezes e contra o Vasco, sete. Apesar da excelente performance diante dos rivais, Dino confessou ao repórter Isaac Cherman, em 1955, que o Botafogo era “clube mais azarado do Brasil”.

Após uma excursão à Europa em 1955, a diretoria do Fogão vendeu, além do próprio Dino da Costa, que passou a vestir a camisa da Roma, seus outro excelente atacante, o craque Luiz Vinícius de Menezes, conhecido como “Leão de General Severiano”, que seguiu para o Napoli. Com o passe de Dino e Vinícius, o Botafogo embolsou 10 milhões de cruzeiros, o equivalente a 50 mil dólares na época.


O último jogo de Dino da Costa pelo Alvinegro aconteceu no dia 9 de julho de 1955, em Praga, na vitória de 1 a 0 [com gol de Vinícius] sobre o Dínamo. Dino vestiu a camisa do Botafogo em 176 partidas e marcou 144 gols, sendo artilheiro também do torneio Rio-São Paulo de 54, com sete gols.

As negociações dos passes de Dino da Costa e Vinícius renderam uma fortuna ao clube, mas também uma grita incessante dos torcedores. No primeiro jogo, contra o Vicenza, no dia 18 de setembro de 1955, Dino da Costa marcou um gol na goleada de 4 a 1 da Roma sobre o Vicenza, clube em que seu ex-companheiro de Botafogo jogaria na década seguinte. A torcida Alvinegra ficou revoltada, e não era à toa, já que ao fim da temporada italiana de 1956/57 Vinícius foi o segundo artilheiro, com 18 gols, atrás apenas de Dino, que assinalou 82 gols pela Roma em 163 jogos, incluindo os da Série A, disputados entre 1955 e 1960.

Dino da Costa permaneceu no futebol italiano, onde também se destacou na Fiorentina, pela qual disputou 30 jogos e marcou oitos gols, e no Atalanta, com 52 jogos e 18 gols, de 1961 a 63. Rodou por vários clubes da “vecchia bota”, vestindo as camisas da Juventus, pela qual marcou 12 gols, Hellas Verona e Ascoli, último clube da carreira, na temporada 1967/68. De 1955 a 1968, o desempenho do jogador brasileiro na Série A do Campeonato Italiano foi extraordinário: marcou 108 gols em 282 jogos.

Cidadão brasileiro, porém oriundi, Dino da Costa obteve a dupla nacionalidade e chegou a entrar em campo uma vez pela Squadra Azzurra. O jogo aconteceu no dia 15 de janeiro de 1958 e a Itália perdeu de 2 a 1 para a Irlanda do Norte, com um gol dele, o implacável Dino da Costa. Mas o jogo valia muito. Era decisivo para ver quem iria à Copa do Mundo de 1958, a ser realizada na Suécia. Foi a última vez que a Itália ficou fora de uma Copa. Dino formou o ataque da Azzurra com outros dois grande nomes do futebol sul-americano, os uruguaios (e oriundi como ele) Alcides Ghiggia e Juan Alberto Schiaffino, que nos fizeram chorar na final da Copa de 50, no Maracanã.

Quando encerrou a carreira nos gramados, o ex-atacante do Botafogo ingressou imediatamente em outra profissão que não lhe afastasse do futebol: a de treinador.
Poucos ainda se recordam do craque Dino da Costa no Botafogo, mas o goleador é considerado um dos maiores artilheiros da história do Fogão e incontestável ídolo da história da Roma.

***

A biografia de Dino da Costa consta do quarto volume (de um total de 18), a Letra “D”, da enciclopédia “Ídolos – Dicionário dos craques do futebol brasileiro, de 1900 aos nossos dias”, que será lançada no primeiro semestre de 2018, pela Livros de Futebol.com. Ainda este ano, disponíveis no mercado os dois primeiros volumes, as letras “A” e “B”. Aguardem!

 

QUANDO NISKIER DESCOBRIU BIGODE. E BIGODE DESCOBRIU A VIDA SEM A BOLA

por André Felipe de Lima


(Foto: Reprodução Esporte Ilustrado)

Nascia um repórter com “Bigode”. Sim, bigode, mas não um bigode comum. Era o Bigode, aquele lateral-esquerdo que brilhou no Atlético Mineiro, no Fluminense e no Flamengo. Esse ficou famoso pelo lance capital da Copa de 50, mas pouco se fala (ou se escreve) sobre a fase de repórter do jornalista e escritor Arnaldo Niskier, que escreveu, quatro anos após o Maracanazo, sobre a volta por cima do Bigode, claro, o da Copa de 50.

Seis anos antes de assumir a chefia de reportagem da revista “Manchete”, Niskier, que contava apenas 19 anos de idade e já assinava crônicas esportivas no jornal “Última Hora” (desde os 16 anos), escreveu aquela que talvez tenha sido uma de suas primeiras reportagens mais elaboradas no começo da carreira: “Bigode ‘ressuscitou’ duas vezes”, publicado na “Gazeta Esportiva Ilustrada”, em novembro de 1954.

Escrevera assim o broto do jornalismo carioca: “O futebol é o tipo de esporte cheio de caprichos. Assim à semelhança de uma mulher exigente”. Toda a pompa do “nariz de cera” preparava o enredo da reviravolta na vida de Bigode após o fiasco da Copa de 1950 e a passagem tosca pelo Flamengo.

Para Niskier, Bigode tinha prestígio consolidado por um estilo “duro como carne de pescoço”. Ao jovem Niskier, Bigode contrariou a tese de que era um jogador violento: “Eu não me acho violento. Ou, se o sou, é uma violência (sic) leal. Não busco o adversário. Vou na bola”.

Ao repórter juvenil, o jogador criticou o sindicato dos jogadores da época. Para Bigode, a entidade descontava mensalidades na folha salarial dos jogadores e não tinha força alguma para defendê-los, sobretudo na questão do passe. “Os clubes acabam sempre levando a melhor”.

Como apurou o bravo repórter Niskier (que sequer imaginaria, no longínquo 1954, tornar-se um dia imortal das Letras), a transferência de Bigode do clube das Laranjeiras para o da Gávea foi conturbada devido a um “mal-entendido” do departamento médico do Fluminense. “Diziam que o médio tinha acabado para o futebol, estava ‘morto’ para as lides desportivas. Mas, bem tratado, recuperou-se, chegando a brilhar no grêmio da Gávea”.


Niskier frisou, contudo, que o treinador Flávio Costa mostrou-se desinteressado por Bigode, dispensando-o para promover o lateral Jordan, que acabara de ser contratado ao São Cristóvão. Coube ao cartola do Fluminense, Benício Ferreira, resgatar o antigo ídolo do clube. E pelo Fluminense conquistou seu maior título na carreira: a Copa Rio de 1952, uma espécie de campeonato mundial de clubes. Mas o fim da trajetória nos campos de futebol era iminente.

Após a carreira, Bigode evitou falar sobre futebol. Morou parte de sua vida na pequena São Mateus, no Espírito Santo, e na Rua Viveiros de Castro, em Copacabana. Ao contrário de Barbosa, que teve um destino impiedoso e vida paupérrima, Bigode conseguiu amealhar uma economia (“mais de um milhão de cruzeiros”, como dissera a Niskier) suficiente para tocar a vida. A passagem pelo futebol carioca permitiu-lhe comprar imóveis (teve cinco somente em Sagrada Família, bairro de BH), oito terrenos na Vila Industrial (também Minas) e empreender uma loja de material de rádio, televisão e refrigeradores, na Travessa Belas Artes, no Centro do Rio de Janeiro, com um sócio vascaíno, Amadeu Barbedo.

Nas eliminatórias para a Copa do Mundo, Brasil e Uruguai enfrentaram-se em junho de 2000. Bigode pisou, enfim, novamente no Maracanã para gravar seu pé no Hall da Fama do estádio e reencontrou Ghiggia. Os dois se abraçaram. “Foi meio difícil, mas não podia me negar a falar com ele”. Se quis abraçar Ghiggia, nunca mais quis conversa com Juvenal. “Essas vaias são para você”, teria dito Juvenal após o gol de Ghiggia. Bigode magoou-se. “Um companheiro me culpou pela derrota. Foi o que mais doeu”.

Bigode ficou só. Todos de sua família morreram. No final da década de 1990, após sofrer um acidente na mão que o impediu consertar aparelhos eletrônicos. o seu ganha-pão, decidiu deixar o Rio de Janeiro e migrar para São Mateus, no interior do Espírito Santo, onde foi acolhido por uma família que conhecera no Rio de Janeiro.

Na madrugada de uma quinta-feira, dia 31 de julho de 2003, problemas respiratórios e circulatórios, uma pneumonia crônica e um choque séptico derrotaram Bigode, que estava internado no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII, em Belo Horizonte.

No Cemitério Bosque da Esperança, na capital mineira, jaz aquele que, ao lado de Barbosa e Juvenal, foi um dos mais injustiçados pela “inquisição do futebol brasileiro”. Talvez, a torcida do Atlético Mineiro tenha redimido o craque. Era verdadeiramente idolatrado em Minas Gerais, como disse ao repórter Irapuan Barbariz: “A maior emoção já experimentada por mim, em tôda a minha vida esportiva, ocorreu em Belo Horizonte: integrava o quadro do Atlético e, após derrotar o São Paulo FC, em que figuravam King, Piolim, Noronha, Luizinho, Remo e outros, fui, à noite, ao Cinema América, ao entrar, recebi uma verdadeira ovação dos expectadores, pois eu havia consignado o tento único da pelêja e êles acharam por bem comemorar em mim a vitória alcançada, fazendo-me alvo de suas manifestações”.

Ao longo da carreira, o “Bigodinho de Arame” – como o chamavam na infância – merecia muitos apupos. Mas aquele gol do Ghiggia não deixou isso acontecer.

CÃO QUE LATE NÃO MORDE

por Mateus Ribeiro


Muito barulho por pouca coisa. Assim pode ser resumida a passagem de Felipe Melo pelo Palmeiras. A expectativa criada em cima dele foi algo descomunal, inacreditável, absurda, em todos os sentidos. Tal qual em qualquer história, quando a expectativa é grande, a decepção é proporcional. Ao menos nesse caso, Felipe Melo não decepcionou, e foi um mico enorme.

Voltemos um pouco no tempo. Mais precisamente, para o ano passado. Palmeiras endinheirado, campeão brasileiro, torcida em lua de mel com o time. Contratações viriam para a disputa da Libertadores, o que é algo absolutamente normal e aceitável. De repente, do dia para a noite, o clube anuncia a contratação de Felipe Melo. Confesso que me assustei, uma vez que achava o jogador desnecessário para o projeto do alviverde. Bom, na minha opinião ele é desnecessário em qualquer projeto, e explicarei minha opinião no texto.

Dito e feito. Com poucos meses de clube, o volante foi afastado, e ao que tudo indica não atuará mais pelo Palmeiras. Uma história que tinha muitas chances de terminal mal. E terminou.

Novamente, vamos voltar no tempo. É notável e da ciência de todos que acompanham futebol que Felipe Melo nunca foi nada além de um jogador “ok” até oito, nove anos atrás. Sabe se lá Deus o motivo (na verdade, “desconfio” de empresários e patrocinadores), Dunga inventou esse cara na seleção. Até então, um jogador com passagens nada marcantes no Brasil, e que perambulou por alguns times da Europa, até chegar na Juventus. E em uma daquelas coisas que só o futebol (e alguns esquemas obscuros) proporcionam, foi parar na Copa do Mundo. No jogo da eliminação contra a Holanda, deu um belo passe para Robinho fazer o gol. Acredite se quiser, ele e sua legião de fãs usam esse lance até hoje para justificar todo o culto ao volante. Bom, venhamos e convenhamos que foi um dos únicos momentos de sua carreira que merecem ser relembrados. Porém, sua atuação no segundo tempo foi desastrosa (como a de todo o time, façamos justiça), e a coroação veio através da expulsão infantil após o pisão em Robben. Ali, Felipe Melo conseguiu reinventar sua carreira, por mais incrível que isso possa parecer.

Se antes Felipe era apenas um jogador sem muito protagonismo, após esse lance virou um personagem construído por doses cavalares de revolta, ódio e descontrole emocional. Começou a ser cultuado por torcedores da Turquia, e até mesmo por alguns brasileiros. Pior ainda: virou símbolo de raça e um dos ícones da tal “luta” contra o futebol moderno.


Antes que me venham com pedras e xingamentos, vamos encarar os fatos. Tudo isso seria muito legal, não fosse por um motivo: tudo, ABSOLUTAMENTE TUDO que esse cidadão faz e fala é artificial. Plastificado. Ou, como gostam de dizer, fake. Nada ali soa verdadeiro. Mesmo porque em seus primeiros anos de carreira, sua única preocupação era jogar futebol. Depois que percebeu que dar chilique desnecessário proporcionaria mais momentos relevantes, resolveu encarnar esse personagem insuportável e desnecessário, porém, cultuado.

Alguns mais exaltados chegam a dizer que com sua presença, o 7 a 1 não teria acontecido. Concordo. Talvez com ele, o time da CBF talvez nem chegasse até as semifinais. Outros acham realmente relevante o fato dele ter se tornado ídolo de uma torcida pelo fato de se comportar feito um maluco. Enfim, no meio de tudo isso, Felipe conseguiu ir parar na Inter de Milão pra ganhar uns trocos. Não ficou muito tempo, e seu nome começou a ser ventilado em clubes brasileiros.

Já famoso pelas suas declarações vazias e seu comportamento similar ao de uma criança rica que não ganha os presentes que pede no aniversário, eis que Felipe Melo é apresentado no Palmeiras. Chegou falando que iria dar tapa na cara de adversário, porém, com responsabilidade. Difícil imaginar que um jogador dotado de tamanha necessidade de autoafirmação tenha responsabilidade profissional para qualquer coisa. Enfim, grande parte da torcida comprou essa ideia. Achou lindo. Adorou a ideia de pagar um salário exorbitante para alguém que, em 15 anos de carreira, não consegue fazer um vídeo de cinco minutos com seus melhores lances. Bom, por mais dinheiro que o patrocinador tenha, rasgar grana não parece ser uma opção muito saudável.


No início, tudo eram flores. Qualquer carrinho ou jogada que ele participava era um êxtase por parte de seu fã clube. Fã clube que mesmo depois de ver a canalhice que esse imbecil cometeu com Roger Guedes continuou o idolatrando. Fã clube que achava linda toda entrevista após o jogo, onde esse produto da imprensa fazia questão de gritar. Fã clube que achava lindo as comemorações agressivas dele em gols marcados pelo Palmeiras.

Não existem meias palavras para falar sobre esse cara. Felipe Melo não tem lugar no Palmeiras. Na verdade, em nenhum clube sério. Não há problema em ser um jogador superestimado, até porque, esses hoje existem aos montes. Os problemas iniciam quando ele começa a acreditar que realmente é do tamanho que o pintaram, e quando ele enfiou na cabeça que ser o meninão polêmico lhe traria bons frutos.

Trouxe a idolatria de alguns mais carentes e uma demissão. Demissão que eu espero que abra os olhos de dirigentes e comentaristas por aí.


Felipe Melo não é tudo isso. Não é essencial para ninguém. Tal qual o tal de Pepe, é um imbecil criminoso travestido de jogador de futebol. Fala muito. Joga pouco. Ilude demais. Uma equação que dificilmente dá certo. Durante um tempo, enganou. Espero que daqui pra frente, não engane mais.

Que no futebol, nasçam mais cães de guarda da volância. Porém, cães de guarda verdadeiros, e não fabricados. Afinal, de jogadores mascarados e sem alma, o futebol está cheio. E não precisamos de mais.

Até a próxima.

Campeões de 92

CAMPEÕES DE 92

texto e entrevista: Marcello Pires | vídeo e edição: Daniel Planel 

Um por um eles foram chegando à Gávea. Uns ostentando uma forma física de causar inveja a muito boleiro da atualidade, outros tentando esconder uma barriguinha saliente, mas a alegria e a química que dentro de campo encantaram os torcedores rubro-negros na conquista do pentacampeonato brasileiro ainda estavam ali. Cristalinas, intactas. Após 25 anos daquele 19 de julho de 1992, um domingo que começou trágico com o rompimento de quase 13 metros de grade no primeiro andar da arquibancada, causando a morte de três pessoas e ferindo outras 82, e terminou em festa no gramado do Maracanã, os improváveis heróis comandados pelo saudoso Carlinhos foram justamente homenageados pela atual diretoria do Flamengo, representado pelo presidente Eduardo Bandeira de Mello, que abriu e encerrou a cerimônia.


Entre um aperto de mão e um abraço apertado de quem já não se via há mais de duas décadas, as gozações seguidas de gargalhadas e uma imensidão de lembranças marcantes deram o tom da festa. Com exceção do técnico Carlinhos e do atacante Gaúcho, que nos deixaram em 2015 e 2016, respectivamente, além de Uidemar e Marcelinho, que não compareceram, todos os campeões de 1992 estavam ali. Saudosos e em êxtase, simplesmente por terem sido lembrados num país sem memória e que pouco valoriza seus ídolos do passado.

– Eu não quero ficar aqui me vangloriando, mas já conquistei muitos títulos. Fui campeão do mundo, ganhei cinco Brasileiros, quatro Copas do Brasil, uma Libertadores, e nunca tinha recebido uma homenagem como essa. Só posso agradecer ao Flamengo, que foi onde tudo começou e é a minha segunda casa – disse um emocionado Zinho.

Quem também se emocionou e emocionou a todos, principalmente o ex-meia Djalminha, que não segurou as lágrimas, foi Inês Galvão. Viúva do atacante Gaúcho, um dos destaques daquela conquista, a atriz agradeceu ao Flamengo e ao maestro Júnior pela homenagem ao ex-marido e lamentou ele não estar vivo para poder sentir o amor dos rubro-negros por ele. 


– Achei muito bacana quando o Júnior me chamou para que nós viéssemos receber essa homenagem. O Gaúcho antes de tudo era um flamenguista e tinha muito orgulho de ter jogado pelo Flamengo. Ele tinha muito orgulho de vestir essa camisa, de ser o centroavante daquele time e de ser um ídolo do Flamengo, embora ele não tivesse a exata noção do quanto era amado pelos torcedores. Por isso, me sinto muito honrada e tenho certeza que se ele estivesse aqui conosco também estaria com essa homenagem. Passa um filme na cabeça, desde quando o Júnior falou comigo sobre essa homenagem que fiquei lembrando de toda a trajetória dele no Flamengo. Foi uma história muito bonita que ele construiu aqui. Aquele título foi muito especial, Nós temos um memorial em casa e a foto que ele mais gostava era a do time de 92. Foi uma pena que ele tenha ido embora tão novo e não possa estar conseguindo ver tudo isso. Tomara que sim, pois a partida dele foi um choque muito grande e talvez ele não tenha tido essa dimensão – disse a viúva do atacante, que marcou 100 gols em 200 jogos pelo Flamengo.

Maestro e jogador mais experiente daquele grupo, Júnior ressaltou a mescla dos mais velhos com a qualidade da molecada que havia conquistado a Copa São Paulo de Juniores. Último remanescente daquele timaço que marcou época de 78 a 83, o jogador que mais vezes defendeu o Flamengo não considera aquela conquista uma surpresa.


– Acho que a surpresa foi só para as pessoas que não trabalhavam aqui e não sabiam o que estava acontecendo, principalmente na fase final do campeonato. Me senti com uma responsabilidade grande porque era o último remanescente da época de ouro do Flamengo e junto com essa garotada vínhamos das conquistas da Copa do Brasil e do Estadual, além da Copinha que eles tinham ganhado. Acho que tudo isso aumentou ainda mais nossa responsabilidade na fase final. Eu sempre fui o irmão mais velho, aquele que dava os conselhos e que dizia as coisas que iriam acontecer na vida deles e que eu já tinha passado. Ainda tivemos um comandante acima da média que era o Carlinhos, que conhecia muito bem eles. Acho que essa mescla com Gilmar, Gottardo e nosso saudoso Gaúcho, onde fizemos uma espinha dorsal, e essa molecada que veio junto acabou sendo determinante para nosso sucesso. Sem dúvida foi uma geração que poderia ter dado muito mais frutos do que deu naquele período. Muitos deles foram brilhar em outros clubes e viraram ídolos – explicou o Maestro Júnior.

Outro pilar daquela conquista, Piá também agradeceu a homenagem e diz que não tem como esquecer o chocolate no primeiro jogo da decisão, quando os rubro-negros marcaram três gols em apenas 23 minutos. 

– Temos que comemorar sempre. Para mim foi uma conquista muito especial, jamais vou esquecer aqueles 3 a 0 contra o Botafogo, foi um dos melhores jogos que fiz na minha carreira – lembrou, saudoso, o ex-lateral-esquerdo rubro-negro.

Autor do segundo gol do Flamengo na decisão, Nélio recorda que o fato de o grupo ser composto por mais de sua metade com jogadores formados no clube fez toda a diferença na reta final da competição. Segundo o camisa 10 daquela conquista, a molecada queria mostrar serviço e que poderia ser útil ao clube após a saída de alguns veteranos. 

Se Nélio permaneceu, Paulo Nunes não. Mesmo contra sua vontade, o camisa 7 lembra que, assim como Marcelinho e Djalminha, foi obrigado a deixar o clube. Mas nada disso é capaz de manchar sua participação na conquista de 92. Eternamente grato ao técnico Carlinhos por ter lhe dado a primeira oportunidade nos profissionais, o atacante destacou a união daquele grupo e fez questão de lembrar do amigo Gaúcho.


– Nós somos muito amigos até hoje e estamos sempre nos falando. Não só os meninos, mas os mais velhos também. Todos nós tivemos grandes histórias em outros clubes, mas foi aqui que começou tudo. Aqui é a nossa origem, eu comecei aqui com 13 anos e tomei muito puxão de orelha do Maestro, do Gilmar e do Gottardo. Ninguém queria sair do Flamengo na época, mas fomos tirados do clube, podíamos ter dado muito mais. Mas é a vida, faz parte. Eu sou um funcional Gaúcho boy, era um cara que eu tinha como um irmão, um parceiro, meu ídolo e cobrei a Inês que temos que nos ver mais. Ele foi um irmão que me ajudou e me criou, um pai amigo, que me levava para as festas, que me mostrou o Rio de Janeiro, me mostrou a alegria de jogar futebol, aprendi todas as minhas comemorações e meus devaneios com ele. Eu andava com ele em Goiânia e ele não tinha noção de que ele era o Gaúcho do Flamengo – afirmou, emocionado, o atacante.

Se Paulo Nunes e Gaúcho eram os mais extrovertidos e gozadores do grupo, Charles Guerreiro era um dos mais calados. Natural de Belém, do Pará, o volante que se firmou como lateral direito era um dos mais felizes e emocionados com a homenagem. Um dos mais experientes do grupo, Charles lembrou com carinho da conquista e das vítimas que acabaram perdendo suas vidas naquele domingo de emoções fortes e distintas.


– Esse título ficou na história do clube. Vim lá do norte de Belém do Pará, em 91, e lembro que quando cheguei ao encontrei aquela mística “de que craque o Flamengo faz em casa”. Fico muito feliz de ter saído de um clube pequeno, chegado ao Flamengo e conseguido participar do pentacampeonato brasileiro e me tornar ídolo do clube. É o grande título da minha carreira apesar daquela tragédia muito triste ocorrida no Maracanã. Foi difícil para todos os jogadores entrarem em campo, mas de uma certa forma aquele episódio nos deu uma motivação extra e entramos com mais vontade ainda de homenagear aqueles torcedores. Mas nós sentimos muito por eles, pois poderiam ser pessoas da nossa família – lamentou Charles Guerreiro, que chegou à seleção quando defendia o Flamengo.

Dois dos sobreviventes daquela terrível tragédia, Charles Gonçalves e Gabriela Tereza não conseguiram esconder a emoção. Numa mistura de sensações, eles agradeceram ao Flamengo e voltaram 25 anos no tempo para finalmente viver aquela decisão. 

– Primeiro temos que agradecer ao Flamengo pela lembrança, é sempre bom participar dos eventos do clube, mas nosso vínculo é de paixão. O clube segue a vida dele, e nós a nossa paixão. Mas foi legal as homenagens a esses jogadores, principalmente à Inês Galvão, esposa do Gaúcho, que era o nosso herói e o cara que colocava as bolas para dentro. A recepção foi maravilhosa e só temos que agradecer ao clube por ter nos proporcionados esse momento ao lado dos jogadores. Nós fomos juntos ao jogo e estamos juntos aqui – recordou Charles.

Mais emotiva que o amigo, Gabriela lembrou do amigo Fred, uma das três vítimas fatais daquele 19 de julho. 


– É muito bom ver todos juntos novamente, alguns são meus amigos, levo essa amizade por muito tempo. O Sávio morou na concentração do Flamengo por muito tempo, do lado da minha casa, estou sempre com o Júnior no Carnaval, mas é bom ver todos juntos novamente e lembrar-se de um jogo que nós não assistimos. O nosso jogo foi hoje e por alguns momentos nós esquecemos aquele momento triste. É um dia muito difícil porque hoje faz 25 anos que o Fred morreu, Mas nós somos Flamengo, que é uma religião e muito maior do que qualquer coisa. Vou contar para minha neta que conheci todo mundo e que tive o prazer de estar aqui nessa noite tão especial – disse, emocionada e com a voz embargada, Gabriela, que batizou o filho com o nome do amigo morto na tragédia.