SAUDADE DO CEREZO
por Serginho 5Bocas
A maior lembrança que guardo de Toninho Cerezo foi na Copa da Espanha quando ele, apesar de não ter jogado na estreia por suspensão automática, gastou a bola nas quatro partidas seguintes em que esteve em campo. Eu vi e posso afirmar que ele fez parte de um dos melhores meios de campo, se não o melhor, de todos os tempos, mas quem foi Cerezo?
Volante que iniciou e se consagrou no Atlético Mineiro, alguns achavam que ele era desengonçado, outros implicavam com sua meia arriada e diziam que era um grande peladeiro, todo o mais puro desdém ou desconhecimento de causa mesmo. O certo é que fez parte de uma geração mineira espetacular e ao lado de Reinaldo, Paulo Isidoro, Marinho, Eder, Palhinha, entre outros, fez história no Galo.
Marcou presença em duas Copas do Mundo (78 e 82) e quase esteve na terceira (86), sendo cortado poucos dias antes da competição por contusão. Na verdade, Telê fez uma opção entre os “velhos” e os lesionados, escolhendo levar, Falcão, Zico, Sócrates e Junior, deixando Cerezo de fora.
Cerezo por duas vezes foi considerado o melhor jogador do Campeonato Brasileiro numa época em que as feras jogavam todas por aqui. Depois da Copa de 82, foi levado para a Itália, onde jogou na Roma ao lado de Falcão e na Sampdoria, comandando uma garotada espetacular. Neste período, venceu um Campeonato Italiano, duas Copas Itália, uma Recopa Europeia e um vice na Liga dos Campeões em 1992, já aos 37 anos.
Cerezo ainda teve fôlego aos 38 anos para comandar o São Paulo de Telê no Mundial de Clubes contra o Milan em 1993. Jogou tanto nesta partida que ganhou o carro Toyota de melhor em campo.
Na seleção, seu melhor momento foi em 1982 com o mesmo Telê. Estava jogando o fino até a derradeira partida contra os italianos, quando ficou injustamente marcado porque passou uma bola perigosa na intermediaria para o lateral Júnior, que perdeu a dividida para Paolo Rossi e daí saiu o segundo gol. Depois ainda foi infeliz, porque foi atrasar de cabeça para o goleiro um cruzamento despretensioso de Antognoni e originou o escanteio do terceiro gol italiano. A tarde foi muito madrasta com Cerezo.
Aquilo tudo foi uma tremenda covardia do destino com um “cracaço” de bola. Ele, ao lado de Falcão, formava uma dupla de encher os olhos, seus talentos eram complementares e também tinham muita coisa em comum. A saída de bola era primorosa e ambos apoiavam o ataque constantemente.
Quem dera hoje tivéssemos um peladeiro desse na seleção brasileira, alguém que fizesse a transição da defesa para o ataque com a rapidez, facilidade e a tranquilidade que Cerezo fazia, que estivesse no campo todo e se apresentasse para o jogo com a qualidade que ele disponibilizava para o time.
Ai que saudade do Cerezo!
Nota: Meu sonho de infância como de qualquer garoto flamenguista daquela época era ser Zico, até começar a jogar campo e querer ser Falcão ou Cerezo, que jogavam na “minha”, o Pelé e o Garrincha dos volantes. Não deu para mim nem de longe.
QUATRO FINS DE ANO
por Claudio Lovato
Roberto Paulo terá mais um fim de ano de recordações. Há 12 anos, desde que parou de jogar, seus fins de ano têm sido assim. Ele participa de peladas com ex-companheiros, confraterniza com eles, toma sua cerveja, dá boas risadas e então volta para casa para se entregar às recordações dos tempos em que seu nome era gritado no maior estádio do Brasil.
O fim de ano de Raul será de reflexão. Ele acaba de fazer 34 anos e decidiu parar. Alguns amigos tentaram dissuadi-lo da de decisão. Acham que ele poderia jogar em bom nível por mais dois anos, pelo menos. Mas ele quer parar. Quer mais tempo para a família e para si próprio. Ele, porém, tem medo de estar tomando a decisão errada. Não sabe se está preparado para parar. Não sabe se algum dia estará. Por isso terá um fim de ano de reflexões importantes e inevitavelmente inconclusas.
(Foto: Ricardo Nogueira)
Para Zé Maurício, o fim de ano será de pura preocupação e tristeza. Foi dispensado pelo clube que defendeu por três anos e, até agora, ninguém demonstrou interesse em contratá-lo. Seu empresário – isto não é segredo para ninguém – está muito mais preocupado em resolver a vida de outros quatro ou cinco jogadores antes da dele. Ele não se engana: nunca foi e nunca será um craque; é um volante que muitos consideram apenas um quebrador de bola. Ele já aprendeu: não cabem ilusões quanto a isso – e, de resto, nem quanto a qualquer outra coisa nesta vida.
Hélio está feliz da vida neste fim de ano. Tem 19 anos e sabe que vai passar a fazer parte do grupo principal no ano que vem. Tanta dificuldade, tanta solidão longe de casa, tantos sacrifícios, mas ele chegou lá, e por isso está feliz neste fim de ano. Levou camisas do clube para o pai, para os irmãos e para os primos. Levou para a mãe um vestido fino e três pares de sapato comprados numa loja cara de shopping center. Hélio está onde sempre quis e não passa por sua cabeça que possa existir neste momento, neste mundo de meu Deus, alguém, uma pessoa sequer, que não esteja como ele está: feliz.
PELADA BENEFICENTE
Ninguém duvida que dezembro é o nosso mês preferido. Além de ser uma época festiva, é quando todos os boleiros estão de férias e se reúnem para jogar peladas solidárias pelo Brasil.
Nosso parceiro de Santos, Rafytuz Santos foi até a Vila Belmiro para acompanhar o jogo beneficente dos amigos do Narciso e teve a oportunidade de trocar uma resenha com jogadores e músicos que ressaltaram a importância da causa.
Marcos Assunção, Léo, Giovanni, Domingos, Dodô (vocalista do Pixote), MC Gui e MC Livinho foram algumas das personalidades que fizeram parte da festa e deram uma palavrinha para o Museu.
Natal Solidário
NATAL SOLIDÁRIO
texto: André Mendonça | fotos: Daniel Planel | vídeo e edição: Daniel Planel
Fim de ano é aquela época festiva de presentear quem a gente ama. No caso do Museu, a paixão é pela pelada, seja ela qual for. Por isso, a convite do parceiro Anderson Jedi, fomos até a favela da Kelson’s, no Complexo da Maré, para prestigiar o racha do volante Michel, campeão da Libertadores pelo Grêmio, e aproveitamos a oportunidade para equipar a escolinha de futebol da região.
Foi no grandioso campo de terra da Kelson’s que Michel deu os primeiros passos no mundo da bola. Escoradas na grade, dezenas de crianças observavam o jogador do Grêmio e, apesar das dificuldades, viam através dele que o sucesso só depende de si mesmo.
Disposta a ajudar e reduzir um pouco as barreiras, a equipe do Museu da Pelada se comprometeu a “abastecer” as escolinhas de futebol que passam por dificuldades, com a doação de coletes, bolas, redes e materiais esportivos em geral. Vale ressaltar que, como não temos nenhum tipo de patrocínio, tudo isso é sempre proporcionado com a colaboração de amigos e a venda das camisas do Museu para quem nos admira e nos acompanha.
– Foi aqui nesse terrão batido que o sonho começou a se construir. Era chuteira rasgada, bola velha. Fico muito feliz de estar aqui hoje podendo mostrar que o sonho pode se tornar realidade! – disse Michel.
A entrega do material foi feita pouco antes da bola rolar e a felicidade era visível no rosto de cada garoto. De acordo com o volante do Grêmio, o futebol ajuda na formação do ser-humano.
– O futebol ajuda a construir sonhos e tirar os menores da criminalidade. A gente tem que fazer o que pode e, por isso, eu agradeço ao Museu da Pelada pela força que vocês estão dando a gente hoje.
Professor da escolinha, Farney de Lira se desdobra para conseguir orientar todos os garotos. Embora ainda jogue futebol profissionalmente, reconhece a importância de suas aulas.
– Muitos jovens estão perdidos nas drogas, mas graças a Deus e ao nosso amigo Michel estamos conseguindo alcançá-los. O Museu da Pelada é um canal de benção para as nossas vidas, que esteja sempre nos ajudando porque nós estamos precisando desse recurso! – finalizou para uma salva de palmas da garotada.
Além de equipar as escolinhas, salvamos acervos pessoais e ajudamos ex-jogadores no que for preciso, pois foram eles que fizeram nossa infância mais alegre. A intenção é uma só: estarmos juntos, sempre, abrindo portas para quem precisa e celebrando a vida em nossas resenhas memoráveis!
JOIA DA COLINA
Embora esteja sempre relembrando os craques do passado, o Museu da Pelada não pode deixar de lado as promessas que têm um futuro brilhante pela frente. Durante a pelada de fim de ano do volante Michel, do Grêmio, na favela da Kelson’s, conhecemos o menino Léo Araújo, joia da base do Vasco.
Com apenas dez anos de idade, o lateral-direito do sub-10 da Colina já acumula diversos títulos com a camisa cruzmaltina, sobretudo contra o Flamengo.
– Já joguei três finais contra o Flamengo e ganhamos todas! Eles secam a gente porque sabem que na final eles perdem sempre!
Vale destacar que Léo faz parte das equipes de futebol de salão e de campo do Vasco da Gama e, por isso, precisa de muita organização para conciliar as atividades com os estudos na Escola Municipal Cantor e Compositor Gonzaguinha, onde cursa o quarto ano do Ensino Fundamental.
Antes de chegar ao Vasco, no entanto, o garoto jogava futebol de salão pelo Clube Vital, em Quintino. Durante um duelo contra o cruzmaltino, no ano passado, comeu a bola e foi convidado para treinar em São Januário.
– Me sinto muito feliz em estar vestindo a camisa do Vasco da Gama e conquistando vários títulos. Enquanto houver um coração infantil o Vasco será imortal! – disse o jovem cheio de personalidade.
Ao ser perguntado sobre qual era o seu maior sonho e quem era a grande inspiração no futebol, o lateral não titubeou:
– Me inspiro no Daniel Alves e no Michel, que é aqui da comunidade. Sonho em jogar no Real Madrid e conseguir ajudar a minha família.
A torcida do Museu da Pelada é que o sonho desse jovem se torne realidade e que ele continue com alegria nas pernas para resgatar a poesia perdida do futebol brasileiro!