Pelada da Barra
pelada da barra
vídeo e edição: Daniel Planel
Há muito tempo a equipe do Museu estava para visitar a famosa pelada do parceiro Carlinhos Cortazio e não havia data melhor do que a festa de fim de ano. O que nos impressionou, logo de cara, foi o carisma do anfitrião e a quantidade de craques que estavam presentes.
Basta entrar no Facebook de Carlinhos para entender o que a pelada representa na sua vida. Além das dezenas de fotos ao lado de ídolos do futebol brasileiro, seu nome no Facebook é “Carlos Cortazio Pelada da Barra”, praticamente um sobrenome. Antes de chegar ao aconchegante Clube da Barra do BNDES, no entanto, o racha rodou por vários campos.
– A pelada começou em 1966 na PUC. Depois jogamos na Superintendência de Transportes Oficiais, Ilha da Fantasia, num campo onde hoje é o Windsor, sítio em Vargem Grande, Santa Mônica, Riviera e estamos aqui há seis anos.
Nesse tempo, craques como Adílio, Zico, Nei Conceição, Jair Pereira, Dé Aranha, Silva Batuta, Arturzinho, Mendonça, Afonsinho, Andrade e muitos outros deram aquele tapa ao lado de Carlinhos Cortazio. Mais do que companheiros de peladas, os craques se tornaram grandes amigos do anfitrião, que serviu um delicioso churrasco regado à cervejas geladíssimas. Se alguém duvida dessas amizades, é só ver a “declaração” do craque Nélio ao amigo boleiro em uma postagem no Facebook:
“Não é o seu aniversário, mas toda reverência a esse velhinho que amo de paixão e que tem por mais de 40 anos sua pelada na Barra da Tijuca!!! Carlos Cortazio, queria agradecer a solidez da sua amizade e a ternura das suas palavras quando estamos juntos todas as segundas. Um grande beijo no seu coração e obrigado por fazer parte do seu ciclo de amizade”.
Podemos dizer que o grupo de pelada montado por Carlinhos Cortazio é o sonho de todos aqueles que têm uma paixão pelo futebol. Afinal de contas, quem nunca teve vontade de bater uma bolinha com o ídolo?
QUERO MEUS FONES!
:::::::: por Paulo Cezar Caju ::::::::
“Minha alma canta, vejo o Rio de Janeiro, estou morrendo de saudade, Rio teu mar, praias sem fim, Rio você foi feito pra mim, Cristo Redentor, braços abertos sobre a Guanabara, este samba é só porque Rio eu gosto de você….”.
Sempre que o Botafogo voltava ao Rio, após suas longas excursões pela Europa, os comandantes dos voos costumavam colocar “Samba do Avião” quando estávamos próximos ao pouso. Muitos jogadores choravam. Saudade de casa, da família, das namoradas, da praia e do Maracanã, nosso palco principal.
Hoje, moro em Florianópolis e sempre que retorno ao Rio essa canção embala meus pensamentos. Vocês entendem por que é tão difícil não comparar futuro e passado? Manga, Gerson, Jairzinho, Roberto Miranda, Carlos Roberto….hoje, não sei escalar o Botafogo.
Passei alguns dias aqui na Cidade Maravilhosa e preparo minha volta para Santa Catarina. A cidade está sem brilho, reclamação geral das administrações de governo e prefeitura. No táxi, o programa esportivo exalta Tite, nosso novo herói.
Olho para o lado e vejo os campos do Aterro, agora com grama sintética, vazios. Vários mendigos dormem no parque. “Essa cidade está abandonada”, reclama o taxista.
Estou indo almoçar com Francisco Horta, o homem que me convenceu a trocar a França pelo Fluminense. Aceitei muito por causa do calor e da magia dessa cidade. Na estreia, 1 x 0 contra o poderoso Bayern, no Maracanã. Só o Horta conseguia essas proezas.O Rio é outro, o futebol é outro. “Aceita, PC!!!!”, grito comigo mesmo em meus atormentados pensamentos.
Encontro Horta e nos abraçamos longamente. Na sala, alguém lembra que os estaduais começam em alguns dias. Nos entreolhamos e mudamos o rumo da prosa. O Horta revolucionou o Campeonato Carioca! Qual jogador não queria disputar o nosso estadual? Hoje eles fazem o sinal da cruz, só querem saber de seus fones de ouvido. Investiram pesado para o Pelé ser o garoto-propaganda do Carioca, prometem mudar as regras.
Chega a ser constrangedor.Preços caríssimos para assistir quem? Qual é o craque do Carioca? Luiz Fabiano novamente machucado? GuM? Diego? Pimpão? O Flamengo promete jogar com os reservas. Será que a torcida vai notar a diferença?
Federação, presidentes, conselheiros deveriam se mobilizar para montar bons times. Ah, estão com dificuldades em encontrar craques? Basta assistir a Copinha e confirmarão que as bases estão estraçalhadas.
Virem-se, vocês estragaram, vocês consertem!!!! Fim do almoço, entro no táxi e peço “aeroporto”. O motorista me reconhece e logo pergunta: “E aí, PC, e o nosso Fogão?”. Ah, como eu queria ter esses fones de ouvido.
O MENINO E AS COPAS
por Marcelo Mendez
São boas as lembranças que tenho de 1978.
Eu já morava na Rua Tanger, no Parque novo Oratório, mas a minha vida ainda estava toda atrelada à velha casa da Avenida das Nações, onde nasci e onde moravam meus tios e primos. Era ainda a época do loteamento do 2º sub-distrito de Santo André, quando muita gente chegava para o lado de cá do rio que divide a cidade.
Um tempo diferente, com muito terreno vazio, ruas de terra e a vida sem pressa. Eram os anos em que as árvores do bairro ainda venciam a necessidade de se ter garagens para carros. Os carros, aliás, eram bem poucos no Parque Novo Oratório. Assim como os telefones…
Na rua em que morávamos, havia apenas um, o da Angélica. As pessoas davam uma graninha para ela e, então, recebiam recados, avisos de entrevistas de empregos e com um pouquinho de moedas a mais, dava até para ligar para o parente distante, maioria no Nordeste. Um dia daqueles, meu pai fez uso do serviço e depois voltou para nos contar:
– Liguei la para Tia Dete, vamos assistir a abertura da Copa na casa dela, em cores!
Copa?!
Aos 8 anos de idade eu não sabia bem ao certo o que era tal de “Copa do Mundo”, mas ouvindo as conversas dos primos mais velhos descobri que seria jogada num lugar chamado Argentina e que era uma coisa de futebol, então gostei muito. E por um tempo da minha vida, gostei demais.
Para contar dessa minha viagem pelo mundo das Copas, começa aqui essa série no Museu da Pelada. Semanalmente, sempre as quartas, contarei de um episódio ligado a essa competição que tanta gente move. Venham conosco e fiquem ligados que amanhã a primeira publicação sai do forno!
AQUI NÃO PRECISA DE TÍTULO
por Julio Alencar
Muitos torcedores, quando querendo falar que tal time é grande, que tal time é pequeno, acabam por muitas vezes querer medir o futebol. Ora, eu te pergunto, quem pode medir o futebol? Quais são as medidas? Títulos, vice-campeonatos, número de derrotas, tempo sem fazer gol, bolas de ouro, etc e os escambau?
Para mim, a medida do futebol é tão limitada quanto a do campo de jogo, 64m x 100m. Não estou querendo dizer que todo time é igual, seria leviandade da minha parte, pois o meu time é maior que muitos tantos que não ouso nem falar os nomes.
Muitos dirão: fato é que a história é o registro dos campeões. Realmente, pode ser, mas acontece que a história não é feita só de vencedores, dentro dos números dos artilheiros existem a história dos defensores. Quando registra-se um drible, é sempre um ato entre um marcador e um atacante, e subitamente… o Garrincha transforma Telê em João.
As histórias existem e estamos aí para reverenciá-las. Se observarmos atento aos detalhes, verão que não existem hierarquias no futebol, além do goleiro que pode usar as mãos e juiz que apita, o jogo são onze contra onze.
E para aqueles que insistem em classificar o melhor no futebol em números, é melhor ficar de olho no placar, pois são os números que valem. Título é só um nome escrito num papel ao lado do ano, e o futebol é muito maior que isso.
Texto publicado originalmente no blog VIVA LA RESENHA.
JANEIRO INESQUECÍVEL
por Marcos Vinicius Cabral
Não existe rubro-negro que não tem o sonho de conhecer o Zico.
Estive perto deste sonho há 21 anos, quando formei o meio campo com Benjamin – cracaço do futebol de areia – nos testes para enfrentar o time do Rio de Janeiro Futebol Clube, que era comandado pelo ex-zagueiro Jaime e que anos mais tarde viria mudar seu nome para CFZ (Centro de Futebol Zico).
Naquela sexta-feira, 18 de outubro de 1996 – uma semana após o falecimento de Renato Russo – enquanto o país e os amantes do rock nacional ainda estavam anestesiados com o desaparecimento físico do poeta da Legião Urbana, eu tentava superar o trauma da perda no gramado do Estádio Antunes, na Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro.
Apesar do enlutamento pessoal pela morte do cantor e compositor que foi o porta voz da minha geração – a tradicional Geração Coca-Cola -, fui a bordo no Fusca caramelo ano 1968 conduzido por Paulo Polaco que ia conversando com meu pai nos quase 60 km de distância que separavam São Gonçalo e Recreio dos Bandeirantes.
Antes do último treino que definiria os que ficariam e seriam federados após avaliação da comissão técnica, no caminho que dá acesso ao campo, ouvi um “boa sorte, garoto”, vindo do maior camisa 10 que tive o privilégio de ver em ação no futebol brasileiro: ele mesmo, o Zico!
Foi naquele simples gesto, que havia notado que aquele ídolo não era de barro e sim de carne e osso!
Se por um lado a vida não conspirou a favor para realizar um dos meus sonhos – mesmo com a bênção do “Galinho” -, Deus me reservou outros maiores como ser pai, marido, jornalista, cartunista, escritor e pintor de quadros.
O tempo passou e em 2010, nos (re)encontramos no lançamento do livro “Minha paixão pelo futebol”, escrito pelo maestro Júnior, na Livraria Travessa, em Botafogo.
Na verdade, não chegou a ser um (re)encontro, pois um mar de séquitos a sua volta impossibilitou um contato mais próximo.
De qualquer forma consegui driblar os marcadores implacáveis naquela noite, entreguei uma caricatura ao autor que fazia sua estreia no mundo literário e tirei uma foto com o maior goleador do Estádio do Maracanã, com 333 gols marcados.
Muita emoção para uma noite apenas!
Porém, nada disso seria possível se não tivesse as ajudas dos amigos Fladilson, responsável por marcar meu lugar na interminável fila, e Flávio, que fez o registro fotográfico, com a Gabrielle à tiracolo e com apenas três anos de idade à época.
Se realmente “O tempo não para”, como verbalizava o poeta rebelde Cazuza na canção homônima dos versos cortantes e lançada em 1988, para mim esse tempo não parou mesmo.
Em 2015, mesmo sendo autodidata, pude enfim, iniciar um curso que há muito era desejo: pintura a óleo!
Não demorei muito para conhecer a técnica que a pintura a óleo exige e em virtude de ser chargista profissional desde 1993, ficou fácil desenhar nas telas aquilo que desejasse.
A ideia era pintar de tudo e preencher nas telas tristes alguns nomes do futebol brasileiro que me fizeram feliz em algum momento na vida.
E foi assim que certa vez, numa conversa informal com o maestro Júnior, descobri sua paixão por cavalos.
Preparei as tintas em uma tela de 70 cm x 60 cm, pintei um puro-sangue inglês e fui em companhia da minha esposa Raquel, da minha filha Gabrielle e da minha cunhada Renata em Copacabana entregar ao recordista de partidas do Clube de Regatas do Flamengo, como um “muito obrigado” por tudo que fez com o manto rubro-negro.
Passados alguns meses, resolvi homenagear um dos maiores nomes da lateral-direita de todos os tempos: Leandro.
Segundo o Museu da Pelada em uma matéria, o “Papa” da lateral foi pintado em uma tela de 80 cm x 70 cm, esbanjando sua categoria nos gramados.
O “peixe-frito” não foi nem uma homenagem, convenhamos, foi uma obrigação, já que foi o cara que me incentivou a jogar futebol e eu tentava sempre imitá-lo nas peladas em Niterói e São Gonçalo.
Foi e continua sendo o meu ídolo, além é claro, de ter se transformado em um grande amigo em virtude da produção da sua biografia que eu e Gustavo Roman pretendemos lançar em breve.
Portanto, se os imortais camisas 2 e 5 do Flamengo mais vencedor da sua história haviam recebido de presente suas telas, faltava pintar o “Deus” da camisa 10.
E pensando nisso, em 2015 comecei a procurar uma foto que representasse bem o que o Zico foi para o futebol brasileiro.
Achei em uma revista antiga aqui em casa toda em preto e branco em que apenas o Galinho estava colorido e conduzia a bola com sua habitual elegância.
O jogo?
Um Flamengo e Atlético Mineiro, ocorrido em 29 de novembro, válido pelo Campeonato Brasileiro de 1987 no Maracanã e que seria o primeiro de dois jogos das semifinais, vencido por 1 a 0 com gol de Bebeto.
Eu poderia ter escolhido outra foto mas aquele campeonato organizado brilhantemente pelo Clube dos Treze, teve um adendo especial à obra de arte: na seara dos Campeonatos Brasileiros foi o título mais difícil que o Flamengo conquistou.
Os arquirrivais podem questionar tudo, menos que Zé Carlos, Jorginho, Leandro, Edinho e Leonardo; Andrade, Ailton e Zico; Renato, Bebeto e Zinho, sob o comando do saudoso Carlinhos, o “Violino”, venceram dentro das quatro linhas a competição.
Em busca de perfeição perdida nas pinceladas dadas nas aulas da professora Bette ou nas madrugadas, me vinha à mente as suas cobranças de faltas.
Isso, também era obra de arte!
Nas misturas das tintas para se encontrar o tom exato do resultado desejado, poucas não foram as vezes que lembrei-me de suas jogadas magistrais com um saudosismo escancaradamente exacerbado.
A obra em si levou alguns meses para ser finalizada mas nada que comprometesse o mês estipulado para ser entregue ao atleta que foi exemplo dentro e fora de campo: janeiro.
E foi naquele mês, no dia 16, que saí de casa com destino de encontrar com o maior jogador de futebol que tive o privilégio de ver: Arthur Antunes Coimbra ou simplesmente Zico!
Portanto, como havia marcado com o ele às 15h, três dias antes, através do WhatsApp, sair de casa às 13h me dava uma certa tranquilidade de não me atrasar.
Em companhia de Sílvio Júnior de Barros, meu amigo nas peladas gonçalenses a quem chamamos carinhosamente de “Imperador”, fomos conversando para tentar disfarçar nosso nervosismo com o iminente encontro.
Naquela segunda-feira o céu azul cobalto era preenchido por nuvens dispersas e embranquecidas que em sintonia com as águas da Baía de Guanabara, formavam uma paisagem sedutora.
A todo instante, nas vezes que fixávamos os olhos no horizonte que parecia não ter fim, lembrava do meu falecido avô materno, que nos deixou em 1983 quando eu ainda era um garoto que completaria 10 anos.
O saudoso seu José era apaixonado pelo Zico e em seus últimos anos de vida teve inúmeras alegrias proporcionadas por ele.
Pois bem, às 14h20 falei um “boa tarde” para o porteiro do Centro de Futebol Zico e chegava então para o grande dia.
Assim que adentramos as dependências do clube, fomos cumprimentados pelo cinegrafista Cleomir Tavares, do Museu da Pelada.
E logo em seguida, com passos milimetricamente dados, descia a escada caracol, o jogador que mais fez meu finado avô feliz na vida: Zico!
Nos cumprimentou e pude, enfim, lhe entregar o quadro.
Alguns minutos depois, o ex-jogador Ailton, camisa 8 e pulmão daquele Flamengo de 1987, chegou para ver a obra, já que ele também fora pintado.
Dei lhe um abraço apertado, tiramos algumas fotos e falei do amor que meu velho avô nutria por ele na região serrana de Nova Friburgo.
Ele sorriu e juntos penduramos o quadro em uma das paredes do clube do qual ele é dono.
Ficamos pouco tempo ali em virtude dos seus compromissos pessoais.
Deu tempo ainda de pedir para autografar algumas camisas rubro-negras e fazer uma matéria com o Aílton que em seguida foi embora.
Saí dali, nos despedimos, fui ao estacionamento pegar meu carro em passos modorrentos e pensando na alegria que meu avô estaria sentindo de tudo aquilo.
Ah… como eu queria que ele estivesse aqui!
Porém, naquela segunda-feira, 16 de janeiro de 2017, olhei para o céu e agradeci a Deus por ter me proporcionado viver aquela história.
Foi ali, inesperadamente, que aquele instante se transformou em um grande momento, quando senti uma leve brisa tocando meu rosto em forma de resposta:”Meu neto, estou aqui!”.