Escolha uma Página

ESQUERDINHA E O MAIS IMPROVÁVEL ZICO SURGEM NO PARQUE NOVO ORATÓRIO

por Marcelo Mendez

Já era comum vê-lo ali parado todas as vezes que a gente jogava no Campinho dos Padres.

Sempre acompanhado de sua bicicleta barra forte, vestido com roupa suja de concreto, fumando seu cigarro, olhando atentamente para a cancha, aquele senhor de pele queimada de sol e de vida ficava ali por nos observar as jogadas.

Fez isso para mais de dez, quinze vezes até o dia em que finalmente chegou até onde estávamos após a gente sapecar um 8×2 em cima da Rua Camerum:


– Ei moleque, como você chama?

– Marcelo. E você? Que você quer?

– Calma, rapaz. Meu nome é Esquerdinha, sou técnico aqui do Nacional do Parque Novo Oratório e tô montando a categoria mirim do time. Você quer ir la sábado, fazer um teste?

– Teste? Como teste? Cê tá todo dia aí vendo a gente jogar. Seguinte; Num vou fazer teste no seu time não e tem mais, se quiser que eu vá, vai ter que levar meus parceiros também. Senão num vou.

Nesse momento, Esquerdinha arregalou o olho, surpreso com minha firmeza, que na época, eu nem sabia que chamava isso, “firmeza”. Pra mim era amizade. Tá comigo, tá sempre e em todas. Mas ele aceitou. Disse pra todo mundo ir sábado no campo do Nacional para a gente jogar por lá, na tal categoria mirim.

Eu, Carlão, Pedrinho topamos, os outros acharam muito cedo essa coisa de ir pro campo às 07 da manhã do sábado e não quiseram saber. Mas no final, veio o problema:

– Vão de chuteira, hein? – recomendou o Esquerdinha, enquanto subia na sua barra forte pra ir embora.

Caraca… Chuteira!

A gente não tinha uma. Também não tinha a menor chance de ter. Em 1981 a vida era dura no Parque Novo Oratório, meu pai desempregado, minha mãe fazendo salgadinhos pra vender e comprar comida pra eu e minha irmã, como íamos arrumar chuteira?

– Foda-se a chuteira, Marcelo. A gente é Rua Tanger, jogamos de kichute e tênis velho e se ele quiser a gente, vai ter que ser assim! – disse o Carlão. Eu e Pedrinho concordamos e assim fomos para o tal jogo, sábado…

A camisa 10 e eu…

Chegando lá, havia alguns moleques, que junto com a gente, formavam um grupo com 12 caras.

– Tá bom, já dá o time. Vamos para o vestiário!

Vestiário…

Alí com 11 anos de idade foi a primeira vez que tive contato com esse lugar tão santo no futebol. Ali, com as meias e calções azuis amarrados e pendurados no cabide, as camisas amarelas com uma faixa central azul, arrumadinhas em um monte. As camisas do Nacional do PNO. Esquerdinha foi distribuindo a partir da posição de cada um:

– Goleiro… lateral-direito…

Pedrinho levantou a mão quando ele falou, “Meia Direita”. Carlão, alto, forte, todo tanque de guerra, levantou a mão quando o Esquerdinha falou “Centroavante”. Depois disso ele parou me olhou e perguntou.

– E você, Marcelo?

– Eu o que?

– Joga do que?


– Eu quero jogar onde joga o Zico! – respondi com toda a convicção que o desejo dá pra gente, nessas horas de encanto.

Nesse momento, Esquerdinha me olhou com um sorriso no rosto. Depois foi até o monte, pegou a camisa, trouxe até a mim, sentou do meu lado e falou um lance que marcaria toda minha vida:

– Marcelo, essa aqui é a camisa 10. Cê ta vendo ela?”

– Sim, tô…

– Pega ela (Eu peguei…), olha bem pra esse número das costas; Daqui pra frente, você é o meu camisa 10, o 10 desse time, o 10 do Nacional do PNO. Pelo tempo que você jogar bola, você usa essa camisa e nunca mais deixa ninguém tirar ela de você. Joga, mas joga muito. Você vai ser o comandante do meu meio-campo, combinado?”

Combinado. Aceitei a tarefa, peguei a camisa e vesti.


Enquanto aquele pano grosso descia pela minha pele, me senti o cara mais realizado do mundo aos 11 anos de idade. Naquele momento, além de ser jogador da Rua Tanger, eu também passei a ser jogador do Nacional do PNO.

Entrei naquele campo de terra com a tarefa de comandar o time que ali estava se formando e tal e qual a nossa seleção havia escolhido o Zico para ser o seu 10, no Parque Novo Oratório, o Esquerdinha me escolheu para a mesma missão.

No Parque Novo Oratório, o Zico era eu…

SÃO JORGE: CORINTHIANO OU FLAMENGUISTA?

por Frederico Silveira (Futebol Comportamental)


No dia de São Jorge, as duas maiores torcidas do país têm motivos para celebrar: afinal, o Santo Guerreiro está intimamente ligado à história e tradição de Corinthians e Flamengo. Mas, qual a ligação do santo com alvinegros e rubro-negros?

A história com o Corinthians é intensa, e repleta de simbolismos dos mais variados. Em 1926, o Alvinegro adquiriu um terreno, localizado no bairro do Tatuapé, no extinto Parque São Jorge, que viria a se tornar a sede do clube. Do antigo parque, restou apenas o nome, que o Timão resolveu adotar. A sede social, fundada em 1928, fica na Rua São Jorge, 777, no bairro Parque São Jorge. Por isso, o santo teria sido adotado como patrono do clube. Em 1967, foi construída também uma capela em sua homenagem.

A capela, aliás, traz outra vertente dessa ligação sagrada entre o Santo Guerreiro e o Timão. O monsenhor Arnaldo Beltrame, responsável pela capela do clube, relata que São Jorge era o padroeiro do Corinthians Football Club, equipe inglesa que, em excursão ao Brasil, teria sido fonte de inspiração para o nome do time paulista, em 1910; consequentemente, o santo também teria sido adotado como padroeiro.

Independentemente da origem histórica, fato é que a união entre Corinthians e São Jorge se fortaleceu e se materializou em 1974, um ano complicado para todo corinthiano. Com um jejum de 20 anos sem conquistar um título, a equipe caía frente ao arquirrival Palmeiras na final do Campeonato Paulista. Foi então que o compositor Paulinho Nogueira gravou o sucesso “Meus 20 anos (Ai, Corinthians)”. Nos versos, um apelo ao santo: “Meu São Jorge, me dê forças, pra poder um dia, enfim, descontar meu sofrimento em cima de quem riu de mim”.

Três anos depois, em 1977, o Corinthians viria a quebrar o jejum de títulos. No dia 13 de outubro, o Timão vencia a Ponte Preta por 1 a 0, no Morumbi. A partir de então, os torcedores adotaram de vez o apego ao santo, consolidando inclusive o mascote do clube, o mosqueteiro D’Artagnan de São Jorge.


Em 2011, o clube lançou uma camisa que trazia a figura de seu padroeiro:

Já a ligação do Santo Guerreiro com o Flamengo não está vinculada a raízes históricas e nem geográficas: a conexão com o santo se dá através do gosto popular de sua torcida. História bem parecida com a da própria cidade; muito embora São Sebastião seja o padroeiro oficial, na prática São Jorge, erigido pelo povo, acaba cumprindo esse papel. Tanto é assim que o dia 23 de abril é feriado no Rio de Janeiro.

No Mengão, São Judas Tadeu, o padroeiro oficial do clube, é tratado com muito carinho pelo rubro-negro, por toda a história vinculada a ele; essa conexão remonta da Igreja São Judas Tadeu, no Cosme Velho, onde aos párocos, rubro-negros doentes, eram atribuídas as vitórias do Flamengo, através da conexão com o santo. Dali em diante, ele ganhou muitos adeptos entre os flamenguistas, a ponto de se tornar o padroeiro do clube.

Já São Jorge é tratado pelos torcedores como o padroeiro extra-oficial, por ser identificado com o “povão”, com a “massa”, e um santo muito querido, até pelos mais ilustres rubro-negros. Em 1976, o craque Zico, com dores na perna direita e ameaçado de corte na seleção brasileira, doou uma camisa do Flamengo autografada para a Igreja Matriz de São Jorge, em Quintino. A camisa 10 rubro-negra foi colocada sobre a imagem do santo e a paróquia levou a prenda a leilão, movimentando a festa e ganhando a capa do Jornal O Globo em 24 de abril daquele ano. Devoto, o Galinho de Quintino fez sua primeira comunhão na Igreja de São Jorge.

E, assim como no Corinthians, São Jorge aparece em uma célebre música vinculada ao Flamengo: o Samba Rubro-Negro (O mais querido), de autoria do compositor Wilson Batista, em parceria com Jorge de Castro, foi imortalizado na voz de João Nogueira, e atravessou gerações como um dos principais hinos informais do Mengão. Num de seus versos, traz: “Eu já rezei pra São Jorge, pro Mengo ser campeão”.

Corinthians ou Flamengo? Não importa quem tenha a maior ligação com o Santo Guerreiro: o que importa é a fé e devoção que move seus torcedores, invocando a sua força e proteção em todas as demandas, seja nas vitórias ou nas derrotas de seus amados clubes. Salve Jorge!

 

Texto publicado originalmente no blog Futebol Comportamental em 23 de abril de 2016

MAIS UM IMORTAL 

por Marcos Vinicius Cabral


Ontem foi o último jogo oficial do goleiro Júlio César, que com o número 12 às costas e diante do América-MG, foi aplaudido por 52.106 torcedores.

Uma despedida discreta, convenhamos, para o terceiro goleiro que mais vezes vestiu a camisa número 1 do Flamengo, atrás apenas de Cantarelli, com 557 jogos e o saudoso Zé Carlos, falecido em 2009, com 352 jogos.

Quis o destino que seguisse os passos no futsal de três monstros sagrados rubro-negros: Zico – que jogou no River Football Club, em Piedade -, Júnior – que jogou no Sírio e Libanês, no Recreio dos Bandeirantes – e Leandro – que jogou no Tamoyo Esporte Clube, em Cabo Frio – quando vestiu pela primeira vez um par de luvas no Grajaú Country Club, em 1988.


Nascido em Duque de Caxias e criado na Penha, subúrbio do Rio de Janeiro, Júlio César chegou ao Flamengo aos 12 anos.

Aos 17, já era profissional e caiu nas graças da exigente torcida num Fla-Flu, ao defender um pênalti.

Saiu em 2005, conquistou o mundo e passados 21 anos, virou – merecidamente – idolo da maior torcida do Brasil.

Disputou duas Copas do Mundo e apesar do nefasto 7 a 1 contra os alemães no Mineirão, em 2014, esse não foi para mim, ao menos, motivo para lembrar dele.

Contudo, sua melhor atuação com a camisa do Flamengo foi o segundo jogo da final do Carioca de 2001, em pleno Maracanã.


E sobretudo naquela partida – conhecida como o tri no gol do Pet aos 43 minutos – com defesas improváveis, nosso arqueiro ajudaria na conquista daquele titulo.

Foi inesquecível!

Parabéns Júlio César e seja bem-vindo à seletíssima galeria dos imortais jogadores nesses quase 123 anos de história.

Fernando + Cacá

PERSONAGENS DO MILÉSIMO

entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | fotos e vídeo: Daniel Perpetuo

Na noite do dia 19 de novembro de 1969, 65.157 pagantes foram ao Maracanã assistir ao duelo entre Vasco x Santos na expectativa de assistir ao milésimo gol de Pelé. Até que aos 37 minutos do segundo tempo, o árbitro Manoel Amaro de Lima aponta a cal após um choque entre o Rei do Futebol e o zagueiro Fernando. O resto é História.

Até aí nenhuma novidade, mas o que muitos não sabem, sobretudo a garotada mais nova, é que o lance que originou o pênalti rende resenha até hoje, quase 50 anos depois.


Por isso, graças ao craque Jeremias, ídolo do América-RJ, a equipe do Museu da Pelada foi até Maricá tirar teima com Cacá, o bandeirinha daquela partida, e o zagueiro Fernando, responsável pela infração no Rei do Futebol. 

– Eu já jogava no América-RJ, mas não poderia ficar de fora daquele jogo que entraria para a história. Fui para a arquibancada com o meu primo Marcos! – revelou Jerê.

O xerifão do Vasco jura de pés juntos que nada fez e que Pelé usou sua malandragem para cavar o pênalti:

– Ele entrou na área, bateu na minha perna e o árbitro marcou pênalti. Tínhamos tantos árbitros bons no Rio, mas escalaram um juiz lá de Pernambuco. (…) Me parece que as coisas já estavam meio arranjadas para ser no Maracanã.

Cacá tem opinião contrária ao zagueiro. Acontece que na festa de lançamento do livro Craques do Passado, de Leonardo Barros e Kiko Charret, o bandeirinha havia dito que o lance foi normal e o árbitro errou ao apontar a cal:

– Eu sou seu amigo e não queria magoá-lo naquela festa, mas para mim foi pênalti! – revelou para a surpresa de todos.

Visivelmente chateado com o suposto erro do árbitro até hoje, Fernando teve uma trajetória que vai muito além de um lance polêmico. Durante a carreira, atuou por Juventus-SP, Vasco, Bangu, Vitória, Bahia  e outros clubes baianos, sempre honrando as camisas.

No Vitória, fez parte de um timaço que contava com o saudoso craque Mário Sérgio, em 1972. Ao falar do amigo, Fernando não conteve as lágrimas.

– Fui padrinho de casamento dele e ele tem um filho chamado Fernando em minha homenagem. – lembrou.

Depois que pendurou as chuteiras passou a se dedicar a carreira de treinador. Desde que assumiu o comando da escolinha do América, por indicação de Jeremias, já foi pentacampeão da região e os troféus estão espalhados por sua casa.

 

 

Festa da Petrovasco

FESTA DA PETROVASCO

entrevista: Sergio Pugliese | texto: André Mendonça | fotos e vídeo: Daniel Perpetuo

Pelo segundo ano consecutivo, tivemos a honra de receber o convite para a festa de aniversário da torcida Petrovasco através do parceirão Rodrigo Saavedra. Como a rapaziada é super do bem, rola pelada e ainda por cima conta com a presença de grandes ídolos do passado, topamos na hora.

Formada inicialmente por funcionários da Petrobras (concursados e terceirizados), a torcida passou a aceitar vascaínos convidados que se identifiquem com os mesmos valores que persegue. “Uma torcida que é Vasco acima de TUDO”, como eles próprios costumam se definir.

– É uma grande família, que tem prestígio e reconhecimento. A partir do momento que  gente começou a se envolver politicamente com o clube na busca de um tripé que a gente sempre defendeu: democracia, renovação e transparência. A Petrovasco é eterna! – disse Rodrigo.

Para prestigiar o evento, levamos também o parceiro Rodrigo Quintanilha, vascaíno de carteirinha que está sempre ligado nas resenhas do Museu no Facebook. Ao se deparar com Mauro Galvão e Sorato, logo de cara, parecia estar vivendo um sonho.

– Caraca! Já começa assim? Fico até emocionando. Já me desarmou! – brincou com o zagueiro.

Aos poucos a festa foi enchendo e vários jogadores que honraram a camisa vascaína foram chegando. Leandro Ávila, Donizete Pantera, o goleiro Acácio, Gaúcho, Odvan… Mas o ponto alto foi quando Geovani apareceu. Ao lado dos filhos, o Príncipe da Colina distribuiu dezenas de autógrafos e levou a galera ao delírio ao dar o pontapé inicial para a pelada.

– Fico muito feliz por receber esse carinho até hoje!

Como o camisa 8 é um dos mais requisitados pela rapaziada, aproveitamos a oportunidade para bater um papo bacana com o craque, que relembrou sua trajetória, falou sobre seleção e muito mais. Mas isso é história para os próximos capítulos!